“Progressiva, degenerativa e irreversível”

Por Alexandre Inagakisexta-feira, 02 de novembro de 2007

Hoje de manhã, ainda imerso no típico estado de molesma que costuma atingir a gente em dias de feriado, zapeei a televisão e vi que o padre Marcelo Rossi estava celebrando uma espécie de “showmissa” no autódromo de Interlagos. Me despertou atenção a chamada do evento: “Show da Vida – Saudade Sim, Tristeza Não”. Concordo discordando desse mote.

Sim, neste dia de Finados reservo uma parte do dia para lembrar de meus amigos e parentes que morreram e que fazem falta por aqui. Recordo-os com carinho, resgatando os bons momentos que tive a sorte de compartilhar com eles. Porém, é mais do que natural ver pessoas que ainda sofrem pelas perdas que sofreram, e fico um tanto quanto incomodado com uma espécie de ditadura da felicidade que reina atualmente, fazendo com que seja socialmente desejável aparentarmos estar felizes, serelepes e “pra cima” o tempo todo.

Por certo não foi esta a intenção do incauto padre, mas o nome de sua showmissa me fez pensar que não é obrigação de ninguém ter de secar suas lágrimas a fórceps. Cada um reage à sua maneira e ao seu tempo às perdas que a vida nos impõe. Há os momentos de ser feliz, do mesmo modo que há momentos em que necessitamos deixar que a tristeza seja externada por meio do choro incontido e das lágrimas, certa vez definidas por Paulinho da Viola como “pedras preciosas da ilusão”.

* * *

“Fulano passou desta para melhor”. “Sicrana bateu as botas”. “O gato subiu no telhado”. Por que usamos tantos eufemismos para nos referirmos à morte, fato inevitável à vida de todos nós? Será que a tememos tanto a ponto de o simples fato de citá-la nominalmente precisar ser evitado?

Não existe consenso sobre o que ela seja. Pode ser o fim de tudo ou, simplesmente, um novo começo, o primeiro passo para um novo estágio de nossa existência no universo. Castigo absurdo, tabu delicado, condição inaceitável? Bem. o fato é que nós não gostamos de falar “nela”. Ao mesmo tempo, nutrimos um interesse que pode ser adjetivado como mórbido. Manchetes de jornais anunciam que filhos matam pais, ídolos morrem no auge de suas carreiras, serial killers atacam misteriosamente, tragédias vitimam centenas, internautas buscam no Google por fotos de acidentes. A morte nos intriga, a morte faz parte intrínseca da vida. No entanto, somos incapazes de encará-la de frente. O que se passa conosco?

* * *

Nossa relação com a morte é decidida por nossas raízes culturais. No mundo ocidental, ela é tabu. Tudo que possa recordá-la é retirado de nossa vista. Idosos são recolhidos em asilos, e os doentes morrem longe de nossos olhos, em UTIs assépticas, afastados de seus parentes. A morte é vista como nosso adversário-mor - de capa negra, rosto cadavérico e foice na mão, é a própria personificação do Medo.

Do outro lado do mundo, os brâmanes hindus a encaram como uma transição semelhante àquela que transforma uma lagarta em borboleta. Já em algumas tribos indígenas brasileiras, os velhos se deitavam na rede e simplesmente aguardavam pela hora de partir. Não comiam, nem bebiam; apenas aceitavam que sua hora tinha chegado, e se curvavam frente ao imponderável. Enquanto isso, fundamentalistas muçulmanos realizam missões suicidas, transformando-se em homens-bomba ou jogando aviões contra arranha-céus porque crêem, piamente, que ao cumprir sua missão na “guerra santa” (a maior das contradições em termos) receberão passaportes para a sonhada Terra Prometida.

Para nós, ocidentais, a coisa é bem diferente. Cada vez mais relutamos em aceitar a tal Indesejada das Gentes, e o imaginário hollywoodiano é bastante ilustrativo sobre esse assunto. Mesmo quando a morte se sobrepõe, há sempre uma maneira de se encaixar um final feliz - o casal do filme Titanic “ressuscita” no fim, e o par romântico de Ghost vive um amor que perdurará mesmo no “outro lado da vida”.

* * *

O fenômeno da edulcoração progressiva da morte no Ocidente é relativamente recente. Conforme relata o historiador Phillippe Ariès em seu livro “História da Morte no Ocidente - da Idade Média aos Nossos Dias”, foi a partir do século 18 que a morte ganhou uma conotação dramática, passando a ser vista como um ato que roubava o homem de sua família e amigos. Transformaram-na em tabu, e os familiares de um moribundo passaram a tentar poupá-lo e a ocultar de terceiros a gravidade de seu estado. Um contraste radical com o modo como a proximidade da morte era encarada no começo da Idade Média: naquela época, um moribundo recolhia-se ao seu leito na companhia de parentes, amigos e vizinhos, cumprindo um ritual de despedida. O doente pedia perdão por seus erros, legava seus bens e aguardava naturalmente pelo seu destino final, desprovido de maiores arroubos dramáticos ou macabros. Uma visão serenamente lúcida: afinal de contas, se a morte é parte essencial da vida, por que estranhá-la?

Outro exemplo cotidiano de como o mundo ocidental modificou sua postura frente à morte é o modo como os tradicionais contos de fada passaram a ser relatados. O francês Charles Perrault (1628-1703), e os irmãos alemães Jacob e Wilhelm Grimm (cujo primeiro livro saiu em 1812) foram os pioneiros a recontar em papel relatos que passavam de geração a geração, como as histórias de Chapeuzinho Vermelho, O Gato de Botas, O Pequeno Polegar e Cinderela. Na época, esses contos infantis eram vistos como uma forma de educar as crianças para os fatos da vida, e finais tristes eventualmente faziam-se necessários. Walt Disney, ao transpor tais relatos para a tela cinematográfica, preferiu oferecer a seus espectadores happy ends devidamente domesticados.

Um exemplo? A última frase de Perrault em sua versão da história de Chapeuzinho Vermelho acaba assim: “O malvado lobo atirou-se sobre Chapeuzinho e a comeu”. Seja sincero: você nunca achou uma tremenda forçação de barra um caçador ouvir os gritos da menina, salvá-la e ainda abrir a barriga do lobo para tirar a vovozinha ainda viva de lá? Outro exemplo lapidar: na história dos irmãos Grimm, a madrasta da Branca de Neve não caiu do penhasco, como mostrado no desenho da Disney. Na versão original alemã, ela foi obrigada a dançar com um par de chinelos de ferro em brasa até cair morta, em plena festa de casamento da princesa!

* * *

Pesquisa realizada pelo psicólogo americano Lisl Goodman, publicada no livro “Death and the Creative Life”, de 1981, mostra que o medo de morrer está fortemente ligado a uma frustração perante a vida. Entrevistas realizadas com centenas de pessoas entre 17 e 70 anos revelaram que as mais temerosas eram justamente aquelas que não haviam concretizado seus projetos. Segundo Goodman, “para esses a vida tinha sabor de uma obra inacabada”.

Contudo, como nos ensinaram os Rolling Stones, “I can’t get no satisfaction”. Na falta do que fazer, sempre arranjamos algum motivo para nos apegar à vida. Eu quero ver o pôr-do-sol de amanhã, sentir a brisa de cada manhã no rosto, chupar jabuticaba, correr descalço pela grama, dançar em frente ao espelho, beijar outros lábios, nutrir novos sonhos e esperanças. Enfim, viver.

* * *

A ciência avança. Os progressos da medicina, os estudos do Projeto Genoma e os novos remédios que prometem retardar o envelhecimento fazem com que deixemos de pensar em nossa finitude. E, se ela vier enfim, há quem se creia na criogenia como um meio de sobreviver à própria morte.

Robert Ettinger, professor de física da Universidade de Michigan, escreveu em 1964 um livro intitulado “A Perspectiva de Imortalidade”. A obra lançava um conceito polêmico: se, logo após a morte de uma pessoa, seu cadáver fosse imerso em nitrogênio líquido interrompendo-se o processo da decomposição), seu corpo poderia ser mantido até um futuro em que seja desenvolvida uma tecnologia capaz de reanimá-lo para a vida. Crentes nos dons milagrosos dessa técnica conhecida como criogenia, cerca de 130 pessoas estão congeladas dentro de cápsulas de aço, de cabeça para baixo e mantidas em nitrogênio a uma temperatura de cerca de 196 graus negativos (especula-se que, olha ele aí novamente, Walt Disney seja uma delas). Contudo, é opção para poucos: o custo para o congelamento e manutenção de um corpo é de 120 mil dólares.

Mas sobreviver à própria morte não necessariamente requer fortunas. Mesmo porque ninguém (com poucas exceções, como a do falecido ex-presidente João Figueiredo) deseja ser esquecido e passar a eternidade em uma lápide empoeirada e sem flores no dia de Finados. Através da arte, poetas, pintores, escultores e cineastas alimentam o desejo de permanecer para além da vida, criando obras que sejam capazes de sobreviver a suas mortes físicas. Do mesmo modo, há aqueles que criam instituições ou museus perpetuando seus nomes, como Alfred Nobel e John Rockfeller. A luta contra o olvido post mortem faz parte da condição humana.

* * *

Talvez tudo fosse mais fácil se agíssemos como certas ordens católicas em que os monges, ao se encontrarem nos corredores de um mosteiro, cumprimentam-se com a expressão “memento mori”. Que significa, em latim, “lembre-se de que você vai morrer”. A saudação, que nada possui de mórbida ou pessimista, é uma espécie de exercício espiritual para a aceitação da própria morte. Mais do que isso: é um lembrete para investir na vida.

“É preciso viver cada dia como se fosse o último”. O clichê é verdadeiro: aceitar a morte significa aprender a valorizar cada momento presente. Talvez o exemplo maior tenha sido dado pelo sociólogo Herbert de Souza, o Betinho. Que, consciente da proximidade de seu fim físico, soube viver com muito mais intensidade e generosidade. E faleceu aos 61 anos, em sua casa, no dia 9 de agosto de 1997, cercado por amigos e parentes.

Mais do que a morte, é preciso dissipar em nós o medo de viver. Recordo aqui as palavras de Oscar Wilde: “São poucas as pessoas que realmente vivem; a maioria delas apenas existe”.

* * * * *

P.S. 1: As ilustrações deste post foram extraídas do Día De Los Muertos, excelente site que explica como o povo mexicano externa sua relação com a morte através de um feriado de três dias: uma celebração da vida na qual os mexicanos relembram e homenageiam seus entes queridos já falecidos. A propósito: se você repousar o mouse em cima das ilustrações, poderá ler alguns aforismos relacionados com o meu texto.

P.S. 2: Trechos deste artigo foram publicados originalmente na edição 082 do finado Spam Zine.

P.S. 3: Com a palavra Paulo José, ator que, apesar de ter sido diagnosticado com o Mal de Parkinson há mais de dez anos, permanece firme em suas atividades no cinema, teatro e televisão desde então:

Quando o Parkinson foi diagnosticado e o médico me receitou Prolopa, eu perguntei até quando deveria tomar o remédio. Aí, com um ar meio maquiavélico, ele me respondeu: ‘Você tem uma doença progressiva, degenerativa e irreversível’, e ficou me olhando com uma cara trágica, como se quisesse tirar minha esperança. Mas aí eu lembrei que a vida que a gente leva também é assim: progressiva, degenerativa e irreversível. Percebi ali que o homem é produzido para ter só 30 anos. Depois disso, as peças começam a sair da garantia.

Pense Nisso!
Alexandre Inagaki

Alexandre Inagaki é jornalista, consultor de projetos de comunicação digital, japaraguaio, cínico cênico, poeta bissexto, air drummer, fã de Cortázar, Cabral, Mizoguchi, Gaiman e Hitchcock, torcedor do Guarani Futebol Clube, leonino e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos, não necessariamente nesta ordem.

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  • http://www.oceuevermelho.wordpress.com mirianne

    Olá, Inagaki! Gostei bastante do texto! Uma coisa que eu estava aqui pensando com meus botões é que talvez, além do modo ocidental de “contar” sobre morte (seja por histórias fictícias ou não) para crianças, haja também um pouco da visão sobre criança que se tem. Quer dizer, a idéia de criança que se tem hoje foi algo construído ao longo da história. Ariès dizia que na Idade Média as crianças eram vistas como pequenos adultos. É só lembrar que o ECA foi instituído só na década de 90. As histórias que os irmãos Grimm contaram/reproduziram acabaram por datar de uma época em que a idéia de criança era provavelmente outra. Se por um lado, a outra forma que eles encontraram de contar histórias era mais crua/realista para as crianças, parece que hoje as máscaras da Disney e derivados mostram uma nova forma de se ver as crianças. Agora, tentar mascarar a morte pra criança, acho que é meio inútil já que ela tem o luto de uma forma nebulosa, mas tem. O problema é ser nebuloso assim; afinal, sabe-se lá o que a falta de realidade/morte na vida faz, né!? Arrisco dizer que, provavelmente, um impertinente buraco existencial.
    E é um paradoxo, é confuso e até estranho mascarar como ainda se mascara quando se tem um ataque televisivo ao qual as crianças (e adultos também) estão expostas, sobre o qual você mencionou algo mais à frente em outro post.)
    Abraço.

    Ótimo comentário e contribuição para o meu texto, Mirianne. Obrigado mesmo!

  • http://incautosdoontem.blogspot.com Ulisses Adirt

    Sei lá porquê, Ina, mas essa postagem sobre a morte já apareceu umas 3 vezes no meu leitor de feed. Isso acabou me fazendo pensar em você quando eu estava passando pelo Conjunto Nacional e vi essa homenagem à Frida Kahlo. Tirei uma foto. Fica de presente para vc. Abraços.

    O link da foto é: http://farm3.static.flickr.com/2293/2072856290_a8fc4c3fa9.jpg

    Ulisses, não tenho idéia de porque esse post tem “ressuscitado” no seu feed. Mas enfim, ao menos inspirou você a tirar a foto. Valeu pelo recuerdo!

  • http://prasemprepitchula.blogspot.com Silvia

    Como esse post é grande e precisava de uma leitura dedicada, deixei ele para um momento oportuno. Li hoje e resumindo: Para mim, é um dos melhores que você já escreveu! Maravilhoso! Nem vou comentar muito, por que não precisa!
    Bjss

    Obrigado pelo feedback, Silvia! :p

  • http://respostasimbecis.blogspot.com/ Semiramis

    Progressiva, degenerativa, irreversível.
    E tem gente que pensa que isso é tratamento pro cabelo…!

  • José Mário

    Nossa.. SPAMZINE!!!!

    Isso rendeu um “flashback” da minha própria vida…

    Abraços!!

    Caro José, é sempre um prazer encontrar algum ex-assinante do Spam Zine por aqui. :D Um abraço!

  • http://www.superfluo.com.br Jot

    Bom, já que o assunto é morte, ouça “Canto para minha morte”, do Raul Seixas.
    Um trecho:

    Vou te encontrar vestida de cetim,
    Pois em qualquer lugar esperas só por mim
    E no teu beijo provar o gosto estranho que eu quero e não desejo,mas tenho que encontrar
    Vem, mas demore a chegar.
    Eu te detesto e amo morte, morte, morte
    Que talvez seja o segredo desta vida

    Gosto bastante da música.

    E, pqp, nunca vou cansar de ler seu blog :)

    Jot, excelente lembrança: a letra dessa canção, uma parceria do Raul com o Paulo Coelho, é magistral. E, hey, valeu pelo comentário! Um abraço!

  • http://arquivinho.blogspot.com/ Arquivinho

    Olá! Sou do blog Arquivinho (http://arquivinho.blogspot.com/) e gostaria de lhe propor parceria. Leia minha Política de Parcerias e, caso aceite, entre em contato. Parabéns pelo ótimo blog!

    Aninha, não faço escambos de banners. De qualquer modo, agradeço pelo seu interesse. Um abraço e boa sorte com seu blog!

  • http://elismarchioni.multiply.com elis marchioni rojas

    Ah… eu sou sempre radical. Por mim, cemitérios não existiriam. Não vejo paz alguma ali.

  • http://www.obusilis.net Moziel T.Monk

    Bem, tudo que eu peço é tempo para me acostumar a idéia da morte :)

  • http://acabamascontinua.wordpress.com Thiago

    Mestre Ina,

    Sabendo do seu apreço pela produção musical de nossa terra, não podia deixar de lhe mostrar esse post: http://musicasocial.blogspot.com/2007/10/os-100-maiores-discos-da-msica.html

    É a lista da Rolling Stones Brasil com os 100 melhores discos produzidos por acá.

    Se já o tinha visto, o que eu suponho, dê seus pitacos. Se não, espero que se divirta tanto quanto eu.

    =)

    Abraço!

    Olá Thiago, além de ter citado en passant a lista da Rolling Stone em meu post sobre “Detalhes” do Roberto Carlos, fiz em março de 2004 meu próprio rol dos 10 melhores discos de música popular brasileira. []‘s!

  • http://meucantinhodeideias.zip.net/ Ere

    Ótimo texto.
    Realmente nos faz refletir sobre a Morte. Estive no Mexico na semana passada e realmente a celebraçao del Día de los Muertos é algo tão rico quanto o texto que vc escreveu.
    Bjs

    Puxa, um dia espero poder testemunhar in loco como é o Día de Los Muertos no México. Invejei você. B)

  • http://diariodelaxitocina.blogspot.com Cíntia

    ah, e “memento mori” saiu da porta da geladeira e veio pro mural do apto novo, foi aqui que me dei conta do quao inspiradora e liberadora pode ser essa frase.

  • http://elismarchioni.multiply.com elis marchioni

    Absurdamente lindo este teu texto. Vou guardá-lo como um dos meus preferidos. Tive muitas perdas familiares, mas isso não me faz ir ao cemitério em dias de finados ou aniversário de morte. Acho que cemitérios são lugares que nem deveriam existir, são espaços que poderiam ser aproveitados para moradia, comércio, parques, enfim.
    Não vejo sentido em um lugar para guardar restos mortais e energias ruins (já que as pessoas são vão lá para chorar, desesperar-se e abandonar corpos). Sim, a cremação é mais digna e não ocupa tanto espaço físico. Pena que tem tanta burocracia.
    Beijo.

    Um tanto quanto radical a sua visão sobre cemitérios, Elis. Mas eu vou lhe confessar que nas vezes em que vou a cemitérios costumo refletir muito sobre a natureza da vida a partir das lembranças dos meus parentes falecidos que estão por lá. Creio que é um bom lugar pra gente parar um pouco com o ritmo incessante de nossos dias, apertar a tecla “pause” e pensar na gente.

  • http://diariodelaxitocina.blogspot.com Cíntia

    Mais um post sensacional.

    Sabe, acredito mesmo na versao de Goodman, acho que a dificuldade em lidar com a morte é justamente pensar no que nao aproveitamos com as pessoas queridas, no que deixamos de realizar. E o caráter definitivo dela.

    Mas me parece impossível ter sempre as contas com a vida e as pessoas importantes dela em dia, entao talvez o bom seja simplesmente entender que as coisas sao assim e chorar quando se tem que chorar.Me aperece anormal é uma pessoa nao ter sofrido ou passado por alguma dessas dores da vida. Pra mim, nesses casos, ou nao viveu ou é meio psicopata.

    E quanto à “ditadura da felicidade”, estou bem de acordo mesmo com você. Ou como diria Benedetti, em “defensa de la alegría”, “hay que proteger la alegría de la propia alegria”…

    De todas formas, se tiver que acertar minha relaçao com a morte, possivelmente seja quando nos encontremos cara a cara.

    Ótima a citação do Benedetti. Como de habitual, agradeço pela sua valiosa colaboração para um post meu, Cíntia. :D Um beijo!

  • http://www.detetivetony.com.br Detetive Tony

    Ótimo seu blog. Já o conhecia faz tempos, mas tá ficando melhor! Sucesso!!!

    Abraços,

    Detetive Tony
    http://www.detetivetony.com.br
    Detetive Particular
    nvestigação Empresarial

  • http://blogafora.blogspot.com/ Márcia W.

    Ina,
    sobre cremação, não sei se a legislação mudou em relação a isso no Brasil, mas alguns anos atrás, no Rio, minha família descobriu que para ser cremado você tem que fazer um documento no cartório declarando isso. Sem esse documento, a Santa Casa (único crematório do Rio) não crema ninguém nem com depoimento da 300 pessoas dizendo que o morto falou que desejava isso um milhão de vezes. Fomos todos da família fazer esse documento para poupar os sobreviventes de mais esse peso quando você está querendo viver o luto.
    Então, memento mori para vocês e carpe diem.

    Márcia, eu imagino que essa exigência jurídica surgiu por causa das investigações criminais que são feitas em casos de mortes por motivo não-natural, quando ocasionalmente a Justiça solicita a exumação de um corpo. Bem, obrigado pela informação: ainda estou na fase em que penso que não morrerei tão cedo e não preciso ligar pra esse tipo de coisa, mas é sempre bom se prevenir… Um beijabraço, memento mori e carpe diem pra você também!

  • http://fiquelouco.blogspot.com Guilher Grunewald (LESHRAC)

    Aplaudo esse post em pé ( e não é puxação de saco), ao começar a ler, eu pensei na hora no “História da morte no Ocidente”, do Philippe Aries, e a idéia da morte interdita no atual ocidente e toda a idéia do “American way of death” de como realmente a morte se apresenta no dia-a-dia como banal, mas na realidade como tragédia, o morto na foto/video é normal, na sua frente é algo trágico, por isso toda a criação de um aparato para maquiar a morte, e não deixa-la atrapalhar nossa vida, já que pensar nela faz com que as pessoas se questionem o que querem enquanto vivas, e isso pode ser complicado.

    E sobre conto de fadas recomendo a leitura de um ensaio de Robert Darnton, presente no livro “O Grande Massacre de gatos” chamado: “Histórias que os camponeses contam: o significado de mamãe ganso”, esse ensaio busca toda uma História cotidiana dos camponeses franceses à partir da análise de contos presentes no livro da mamãe ganso em suas várias versões, ele vai assim buscando os elementos e representações iniciais e básicas desses contos e como foram recontadas, para buscar esses homens que passaram praticamente sem deixar registros.

    Simplesmente fantástico!

    Fortuna!

    Guilher, obrigado pela dica do ensaio do Robert Darnton, eis mais boa pedida de leitura complementar a este post. Um abraço!

  • http://fakezone.blogspot.com André

    hein?!? quem morreu ?

  • Mariângela de POA

    Este post está maravilhoso Ina, até convoquei o marido para compartilhar tamanha belezura,há 2 anos a morte passou por aqui levando uma pessoa muito querida que escolheu vir morrer em nossa casa,a irmã do marido. Foi um sofrimento sem tamanho,apesar da serenidade da enferma(acho que era a mais lúcida no meio de toda loucura,apesar do câncer violento que a matou em 4 meses). Te digo que quando a gente presencia a morte assim tão próxima a gente enxerga aí também a nossa própria morte,me via de certa forma ali no lugar dela. Depois de uma experiência tão avassaladora como esta que vivemos( a filha junto,na época com 7 anos,ficou do lado da tia que tanto amava,contava histórias e tal..) é impossível não pensar em viver intensamente cada dia que lucramos pois sabe-se lá o que está por vir..beijo e obrigada pela linda reflexão.

    Mariângela, obrigado por compartilhar sua experiência. A vida é um constante aprendizado… Um beijo!

  • http://anny-linhaozzy.blogspot.com Anna

    “São poucas as pessoas que vivem; a maioria delas existe.” Oscar Wilde. Está
    explicado o medo da morte.
    Comentei com uma amiga, hoje sobre este assunto. É verdade, o ser humano vive como se fosse eterno. Se lembrasse sempre da morte, teria um viver melhor e menos medo da morte…Como os frades que vc citou.
    Abraço

  • http://www.drikaflor.zip.net drikaflor

    E olhe que fiz um resumo…nem coloquei tudo no meu perfil….quando me fizeram esqueceram o manual de instrução…
    bjinhos

    Mesmo se a gente tivesse nascido com manual de instrução, provavelmente nem o leria. Eu, ao menos, não tenho paciência: fuço e remexo nas coisas ao invés de apelar para o manual. B)

  • http://www.drikaflor.zip.net drikaflor

    Que blog é esse??!!!! Muito bom…
    Não sei por que as pessoas acham que chorar incute tristeza…nem sempre…e quando é….tristeza é alma da inspiração…bjinhosssss

  • http://prascabecas.blogspot.com Cláudio Costa

    Sensacional este post. Diria que você filosofou, ponto. E filosofar é preciso.

    Navegar, filosofar, pensar é preciso, do mesmo modo que viver é um ato pra lá de impreciso, pra citar o trocadilho do Pessoa. ;) Um abraço!

  • Inagaki!
    Que post mais esclarecedor e instigador! Parabéns! Sobre a tristeza, se notar bem, parece patológico senti-la, como se fosse um mal a ser extirpado. A psicanalista Elisabeth Roudinesco fala em seu livro “Por que a Psicanálise”? que todos nós sujeitos, temos o direito e o dever portanto, de não mais manifestar nosso sofrimento e de nào mais nos animar com outros ideias que nào seja o pacifismo. A tendência de nossa “sociedade moderna” é medicalizar a emoçào, ou seja ; tristeza , raiva , ódio seriam “doenças” e como então nos atrevemos a senti-las, não é mesmo?
    Bem… sobre a morte; Lacan num seminário dizia que assim como o brilho do sol , nunca poderemos encará-la de frente. Penso que (prá brincar um tantinho…) seria uma falta de educação morrermos e atitudes desta ordem devem ser evitadas, escondidas ou por que não negadas por esta cultura que nos impõe a dita-dura da felicidade. Um abraço! Rô.

    “Medicalizar a emoção”, eis uma expressão que sintetiza bem uma tendência (quase praga) contemporânea. Um abraço!

  • Bear

    Ina, você vive se superando (um bom modo de viver, não?). Eu não fico mais surpreso quando encontro um texto seu como este.

    Riquíssimo!! Sinto não ter uma palavra melhor para qualificá-lo. Adorei a leitura, me vi concordando com tudo, aprendi diversas coisas, tive inveja de você e até um pouco de pena, por aqueles que não vão ter acesso ao seu texto.

    Foi bom saber do “Memento mori”. Não conhecia. Eu costumo responder “Estou vivo!” ou “Ainda estou vivo!”, quando me cumprimentam perguntando como estou. Invariavelmente, o interlocutor estranha: “Que que é isso? Que coisa mais negativa!”. E eu tenho que explicar que é exatamente o contrário. É uma constatação e uma celebração da vida, que eu gosto de fazer com freqüência.

    Parabéns, Ina. Vou indicar este texto para meus amigos.

    Obrigado, Celso. É bom aproveitar este espaço de vez em quando pra dar as minhas filosofadas. Pensar enlouquece, mas loucura é a melhor maneira da gente encarar um mundo que soa cada vez mais insano nestes tempos de pós-modernidade, não? Um abraço, e permaneçamos vivendo!

  • http://www.literatus.blogspot.com/ Andrea

    O pior da morte é a “sem gracisse” das pessoas e o que dizer nessas horas. Nada a dizer, às vezes só pegar na mão e ficar quieto do lado, tá ótimo.
    Ir ao cemitério é outra coisa que não faço. Não é lá que gostariam que ainda estivessem, não acredito nisso.
    Eu queria era ter um entendimento oriental dessas coisas. Tenho uma amiga, a escritora Ana Suzuki, que fala de um modo tão natural da morte que chega a me deixar tranquila, sabia?
    Pra quem como ela já perdeu um filho e muitas pessoas próximas, é uma grande lição.

    bjimm querido
    Andrea

    Pois é, Andrea: palavras não substituem um abraço, este é um fato inequívoco. Aliás, gostaria de ser cremado, e de poupar meus amigos e parentes de irem ao cemitério nos dias de Finados. Se quiserem recordar de mim após a minha morte, não será visitando minha lápide que o farão com mais carinho ou precisão.

  • http://www.ex_pressao.blig.ig.com.br Tábata Mori

    “Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo propósito debaixo do céu: há tempo de nascer e tempo de morrer; tempo de plantar e tempo de arrancar o que se plantou; tempo de matar e tempo de curar; tempo de derribar e tempo de edificar; tempo de chorar e tempo de rir; tempo de prantear e tempo de saltar de alegria…” (Eclesiastes 3.1-4)

    Maravilhoso esse texto. Gostei de tudo. Concordo que temos uma visão temerosa da vida e não é fácil nos livrar dela mesmo tendo uma convicção cristã de que o céu nos espera.

    A Bíblia não fala que temos que ser feliz, aliás, ela fala “tereis dias maus, tende bom ânimo”. Ainda assim, muitos usam o nome de Deus para vender felicidade a preços exorbitantes ou cobram uma certa felicidade que só é possível quando estamos em paz… inclusive em relação a morte.

    Arrivederci,

    Tábata, foi exatamente esse trecho do Eclesiastes que ficou em minha cabeça enquanto escrevi alguns parágrafos deste post. Ah, obrigado pelas palavras gentis.

  • http://blogafora.blogspot.com/ Márcia W.

    Pois é, Ina, além de progressiva, degenerativa e irreversível, não me lembro quem disse que a vida é uma doença fatal sexualmente transmissível! Realmente impressionante como a gente lida mal com o fim do filme. Acho super bacana religiões onde os deuses também nascem E morrem.
    Como o Marcus também detesto o passou dessa para melhor mas “não morreu, descansou” também é páreo duro, né?

    Márcia, creio que nenhum eufemismo substitui satisfatoriamente a palavra exata. Eu até concebo a morte como um descanso, sim, mas dizer que uma pessoa “não morreu, descansou”, é um paradoxo inútil que não consola nem diz a que veio.

  • http://attu.typepad.com/universo_anarquico/ tina oiticica harris

    Ontem, quando arrastei os dois internautas da casa para uma leitura de “O Corvo” do Edgar Allan Poe, o Nic questionou por que Lenore “não seria mais”. Bem no comecinho. O poema, feito para ser lido de uma vez só, coloca-nos face à entrega do ser humano ao inquestionável, em que não há respostas. Li um post sobre a morte aqui, acho que foi sobre Meg . A era de eufemismos parece ter começado do Renascentismo, valorização do homem, e aumentado a partir da Revolução Burguesa, valorização do tempo.
    Só penso em morrer quando estou doente. Na maior parte do tempo sou feliz que vivo, tenho meus seres queridos ao meu lado e uma certa paz. Aqui não há feriadão nem Finados. Recusei-me a lembrar dos mortos em dia estabelecido, não existe aqui mesmo. Legais os textos sobre os desenhos e legal dar crédito a desenhos óbvios del día de los muertos. Bom dia, Alexandre Inagaki.

  • http://cabideladigital.blogspot.com daniel

    pra quem não sabe sonhar, a morte é o fim!

  • http://guimarob.wordpress.com Roberson

    Uma recomendação, caso ainda não conheça: o livro “Solidão dos moribundos” de Norbert Elias. Explica os porquês da medicalização da morte. A morte nos hospitais, longe da família e o fato de hoje se esconder a morte (especialmente das crianças).

    Obrigado pela dica, Roberson. Realmente não conhecia esse livro.

  • http://www.simpatiaeesculacho.blogspot.com Marcos

    Certas coisas não tomam meu tempo como “há vida em Marte?”, “existe vida após a morte?”, “existe reencarnação?”, “Deus existe?”, “eram os deuses astronautas?”. Acho que é isso que chamam de materialismo, pra mim é apenas ocupar o tempo com coisas com as quais posso interagir e essas descobriremos ou não muito tarde e nem teremos a chance de contar o que descobrimos.

  • http://cozidocompapricas.blogspot.com Natanael Mahon

    “…sorrisos,creme dental e tudo, e por que é que a felicidade anda nos bombardeando? é pra provar que ninguém mais tem o direito de ser infeliz…” já cantava Tom Zé sobre a imposição da alegria. Afinal, se tristeza tem fim ou não, não sei;Mas que tem sua vez é certo.

  • http://www.hipermail.com/blog/o-que-vem-depois.php Caryorker

    O que vem depois?
    Hoje dia de finados segue então uma boa seleção de 12 filmes (Tim Burton na cabeça) que falam sobre vida após a morte. Between heaven and hell: 12 films featuring unusual afterlives Não, não incluíram Ghost que foi filmado em…

  • http://grandeabobora.com marcus

    Eu detesto a expressão passar desta para melhor. Eu não acredito em vida após a morte; logo, não o melhor que podemos ter durante nossa existência é o que temos aqui e agora.

  • http://www.bloginutilblog.blogspot.com Dani

    Nunca tinha pensado na expressão ‘ditadura da felicidade’, e achei bem interessante quando li no seu post.
    Verdade. Como se o luto tivesse hora pra acabar…
    ;)

Pense Nisso! Alexandre Inagaki

Alexandre Inagaki é jornalista e consultor de comunicação em mídias digitais. É japaraguaio, cínico cênico. torcedor do Guarani Futebol Clube e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos. Já plantou semente de feijão em algodão, criou um tamagotchi (que acabou morrendo de fome) e mantém este blog. Luta para ser considerado mais do que um rosto bonitinho e não leva a sério pessoas que falam de si mesmas na terceira pessoa.

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A vida é boa e cheia de possibilidades.
A vida é boa e cheia de possibilidades.
A vida é boa e cheia de possibilidades.