Volta e meia surge algum pretexto pra que a gente pegue o pano úmido da memória e remova a camada de pó que já cobriu certas lembranças. E foi assim que comecei a resgatar a época na qual eu chamava minhas professoras de “tias”. Eu devia ter uns 5 ou 6 anos de idade, e cursava o 1o. ano do primário no Colégio Raio de Sol, uma escola particular que ficava em frente ao estádio do Pacaembu.
A classe não tinha mais do que oito alunos. E, embora a maior parte das minhas reminiscências dessa época já tenha se dissipado feito poeira no vento, ainda me lembro dos nomes de alguns dos meus coleguinhas de classe: Ivo, Sumaya, Priscila (minha primeira paixão platônica, da época em que eu sequer imaginava o que significava essa expressão), Richard, Roberta. Mas já me esqueci dos sobrenomes; ou seja, não conseguirei reencontrá-los no Orkut. Quanto ao colégio, eu sei que já não existe mais (ah, a inexorável passagem dos anos).
Mas enfim, tergiverso, tergiverso e quase fujo do assunto deste post. Foi a tia Marta, minha primeira professora, quem me deu o primeiro livro que li na minha vida: A Margarida Friorenta.
Estamos vivendo um período de micareta futebolística, no qual a Seleção Brasileira, à medida em que avança na Copa, proporciona alguns feriados adicionais a este ano sui generis. E, enfim, depois que toda essa agitação cessar, quando as vuvuzelas insuportáveis (expressão redundante) forem devidamente guardadas no fundo do armário, creio que enfim tomaremos consciência de que o inverno, tal qual naquele jingle clássico das Casas Pernambucanas, está batendo à porta querendo entrar. Ao invés de ficar meditabundo no sofá da sua casa, vendo filmes velhos e reprises de seriados sob cobertores, enquanto seus dentes tilintam de frio, por que não aproveitar a época para dar uma espairada?
Disse Dena Kaye: “Viajar é fazer uma jornada para dentro de si mesmo.” Conhecer novos lugares, dar um drible na rotina cotidiana, perder-se para poder se reencontrar: nada como uma boa viagem para recarregar nossa barra de energia. E, já que o frio está batendo à porta, por que não acompanhá-lo em grande estilo, passando esta temporada em uma pousada aconchegante na montanha, fazendo passeios ecológicos ou curtindo boa música em um dos diversos festivais de inverno sediados em Minas Gerais? Sua extensa programação de eventos está disponível na Wikiminas, espaço para a troca colaborativa de informações sobre os destinos turísticos da terra natal de Carlos Drummond, Fernando Sabino, Beto Guedes, Adélia Prado e Guimarães Rosa.
Passear de Maria-Fumaça até Ouro Preto, embebedar-se com a vista do alto dos teleféricos em Poços de Caldas ou Caxambu, respirar História nas igrejas de São João Del Rei, deleitar-se com os doces caseiros de Monte Verde, andar de mountain bike em Salão de Pedras, curtir shows musicais no festival de Mariana… Em meio a tantas atrações e passeios, uma ferramenta como o Tourist Analizator, que traça seu perfil de turista (Boêmio? Zen? Aventureiro?) a partir da avaliação de seus posts mais recentes no Twitter ajuda incautos a definirem suas rotas de viagem.
Ao comentar um livro de José Saramago, escreveu Contardo Calligaris: “Viajar é isto: deslocar-se para um lugar onde possamos descobrir que há, em nós, algo que não conhecíamos até então.” Por que não fazer de Minas Gerais o lugar de sua autodescoberta? :)
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P.S.: O título deste post cita uma das minhas músicas prediletas do Clube da Esquina, composta por Márcio Borges, Lô Borges e Fernando Brant.
Anthony Burgess, autor de Homem Comum Enfim, muito provavelmente a melhor introdução à obra de James Joyce, escreveu: “Ulisses é um livro para se ter, para se conviver com ele. Tomá-lo emprestado é provavelmente mais do que inútil, porque a sensação de urgência imposta pelo limite de tempo de leitura luta contra o lento andamento do livro, uma música pausada que exige um ouvido sem pressa e oferece pouco ao olho ligeiro, nutrido pelo jornal”. Relendo estas palavras, penso na aparente contradição que representa a celebração do Bloomsday na Internet, este meio fomentador de leituras em diagonal e portadores do Distúrbio de Déficit de Atenção.
Saca aquela frase surrada do Lennon, sobre vida ser o que acontece enquanto fazemos planos? Pois bem, ela meio que resume minha filosofia. Toda vez que me perguntam onde pretendo estar daqui a dez anos, não tenho uma resposta pronta. Tal como um jazzista, vou improvisando notas enquanto procuro acompanhar a música da vida. Provavelmente por causa disso, não liguei para a suposta falta de respostas a todos os enigmas exibidos nas seis temporadas de Lost. Simplesmente apreciei a viagem durante todo o tempo que ela durou.
Em um primeiro momento, imagino que as pessoas que odiaram o fim de Lost são as mesmas que lêem livros de Agatha Christie com o intuito de adivinhar a identidade do assassino. Ao invés de se preocuparem tanto com respostas - como se a vida desse respostas definitivas para todas as perguntas que temos -, deveriam conhecer melhor o conceito de MacGuffin cunhado por Alfred Hitchcock: um elemento na trama que serve para distrair a atenção dos espectadores e alavancar a ação do filme, mas que não passa de um pretexto para que o verdadeiro tema da obra seja abordado pelo autor.
Lost foi um seriado sobre fé vs ciência, livre-arbítrio vs destino, mas, principalmente, sobre redenção, esperança e amor. É difícil falar sobre esses temas sem resvalar no piegas, e entendo perfeitamente as críticas ranzinzas que compararam o fim de Lost a um capítulo final das novelas de Manoel Carlos ou à cena do reencontro de Jack e Rose em Titanic. Mas eu, que embarquei nas tramas envolvendo eletromagnetismo, viagens temporais ou aparições de mortos sem ansiar por respostas, me preocupei mais com o destino de cada um dos personagens do seriado. E, por isso mesmo, fiquei tão satisfeito com o episódio final, que me fez cair em lágrimas pelo menos quatro vezes, nas emocionantes cenas de reconhecimento e reencontro; porque as pessoas importaram muito mais do que quaisquer interrogações que foram feitas ao longo de seis anos.
Ainda que respostas fossem dadas para cada mistério, não creio que elas seriam satisfatórias. Alguém gostou de saber que a Força no universo de Star Wars nada mais é do que excesso de Midi-chlorians no sangue dos jedis? Ou ficou satisfeito com a explicação didaticamente modorrenta que o Arquiteto deu naquela cena longa e soporífera de Matrix Reloaded? Bah.
Em vez disso, prefiro admirar as entrelinhas que os roteiristas de Lost deram para que cada um de nós use seu livre-arbítrio e suas crenças pessoais a fim de teorizar sobre a ilha, a igreja e o significado de seu belíssimo episódio final. Pois sábias foram as palavras proferidas por Riobaldo, personagem de Guimarães Rosa em Grande Sertão: Veredas: “Vivendo, se aprende; mas o que se aprende, mais, é só a fazer outras maiores perguntas”.
Há teorias muito boas sobre Lost pululando na rede. Dentre elas, destaco os textos que li nos blogs TV Squad, Dark UFO, Let’s Blogar e Trabalho Sujo, que jogam alguma luz nos mistérios. Mas que, no final das contas, são substratos para que cada um de nós espelhe-se em sua resposta pessoal.
Não me apego a nenhuma religião em especial. No entanto, creio que exista algo além desta vida. Não tenho motivos racionais para crer nisso; simplesmente tenho esperanças. E é pautado na minha crença pessoal de que a vida é boa e cheia de possibilidades que eu prossigo, movido pelo pensamento de que estamos todos neste mundo louco por algum motivo que nos transcende. Em um poema que escrevi há alguns anos, digo:
Carrego dentro de mim sonhos e sentimentos que morrerão comigo,
momentos que não existem em nenhum lugar mais
além do meu coração:
pôr-de-sol, brisa no rosto, conversa com amigos, sorriso de mulher.
Instantes que valeram por uma vida inteira,
rastro de estrelas num céu poluído e aparentemente vazio.
Não posso deixar de lembrar que o último episódio de Lost, “The End”, tem o mesmo nome de uma canção dos Beatles cujo verso derradeiro resume, para mim, o espírito de todo o seriado: “E, no final, o amor que você recebe é igual ao amor que você doa”. Que assim seja.
Desde fevereiro assino uma coluna quinzenal no portal Yahoo!, atualizada às quintas-feiras, na qual falo de tecnologia, com foco em redes sociais e novas tendências. Hoje, o tema da minha coluna é a profusão de produtores independentes de vídeos, que recorrem a sites como YouTube e Ustream para compartilhar seus trabalhos audiovisuais.
P.S. 1: Na semana derradeira da última temporada de Lost, assino embaixo, em cima e dos lados das palavras de Ulisses Mattos: “Lost é igual mulher. Se você tentar entender muito, perde a graça”.
Em meio ao dilúvio de informações que nos bombardeiam diariamente, a gente acaba deixando de prestar atenção em coisas que fazem parte do nosso dia-a-dia. É até natural: atos cotidianos como abrir uma porta, ligar o computador, tomar um copo d’água são realizados de forma mecânica e corriqueira. O perigo, porém, reside na hora em que deixamos de prestar mínima atenção em certas atitudes que cometemos sem atentarmos para as possíveis consequências. Nessas horas, sempre lembro daquela história da Teoria do Caos e do Efeito Borboleta (sim, aquele filme com o Ashton Kutcher foi baseado nessa tese) que diz que o bater de asas de uma borboleta no Oceano Pacífico catalisa uma série de pequenos grandes eventos que pode resultar no surgimento de um tufão do outro lado do planeta. Quem já leu o conto “Um Som de Trovão”, de Ray Bradbury, também está familiarizado com essa teoria.
Pois bem: foi preciso que eu fosse contatado por uma agência para que eu buscasse por mais informações a respeito de algo tão trivial quanto uma pilha. Dê uma olhada ao seu redor e note cada objeto que está no seu campo de visão. Eu, por exemplo, vejo neste exato momento um copo, um toy art de um bonequinho ninja, uma caneta, um estojo com CDs, um dicionário, meu smartphone. Quais foram os caminhos trilhados por cada um dos objetos que vejo à minha frente? Quantos anos de pesquisas foram gastos no desenvolvimento de cada peça que compõe o meu celular? Como será a fábrica que produziu este boneco ninja que minha namorada comprou porque o olhar sério dele fez com que ela se lembrasse de mim? Onde ficam as árvores que deram origem às páginas deste dicionário? Quantas pessoas devem tê-lo folheado na livraria antes que viesse parar na minha casa? Enfim, são as viagens maionésicas, ao melhor estilo “Ilha das Flores”, que começaram a se passar na minha cabeça quando pesquisei um pouco mais sobre as pilhas Rayovac, sobre as quais fui contratado para falar. Deverá ser a última vez em que me chamam pra fazer isso, aliás: estou tergiversando e enrolando tanto quanto nas vezes em que comecei a puxar papos antes de convidar alguma mulher bonita para sair. :)
Mas o caso é que fiquei besta ao descobrir que, segundo dados da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica, nada menos que 1,2 bilhão de pilhas e 400 milhões de baterias de celular são vendidas anualmente no Brasil, movimentando mais de R$ 900 milhões. E, ao ler o release da campanha, outras informações interessantes me chamaram a atenção. O leigo aqui sempre comprou pilhas alcalinas levado pelo (des)conhecimento comum de que elas são melhores porque duram mais. E não sabia, por exemplo, que em equipamentos que requerem descargas leves e contínuas, como controles remotos, relógios de parede e rádios portáteis, pilhas comuns são as mais recomendadas. Pois as alcalinas são a melhor opção apenas no caso de aparelhos que exigem descargas de energia rápidas e fortes, como aparelhos de som e brinquedos. Ou seja: por causa da minha falta de curiosidade em me informar decentemente sobre o assunto, por décadas tenho gasto dinheiro com pilhas mais caras sem necessidade.
Outro dado relevante: cerca de 40% das pilhas vendidas no Brasil são falsificadas, produzidas e vendidas sem o controle das autoridades. Ou seja, ao contrário das pilhas Rayovac, que atendem às normas do Conselho Nacional do Meio Ambiente e não contêm metais pesados como mercúrio e cádmio, esses produtos piratas que você encontra em qualquer barraca de camelô, além de serem contrabandeados e não gerarem impostos, contaminam a natureza com uma série de matérias-primas cujos efeitos colaterais são de tirar o sono de qualquer consumidor desavisado.
A opção ideal é, sem dúvida, o uso de pilhas recarregáveis, que podem ser reutilizadas centenas de vezes. No Brasil, elas ocupam ainda um nicho pequeno. Segundo dados do Instituto Akatu, as recarregáveis, indicadas para aparelhos de alta tecnologia como câmeras digitais e tocadores de Mp3, representam não mais do que 5% do mercado. Aproximadamente 65% das vendas são de pilhas comuns; e as demais, de alcalinas.
Por desconhecimento, acabamos por adquirir produtos inadequados. Sem um consumo devidamente consciente, gastamos dinheiro com produtos mais caros e desnecessários. E aí cito uma declaração de Thiago Melo, gerente de produtos da Rayovac, que afirmou: “Do ponto de vista do consumidor, ainda há muito que se esclarecer em relação à categoria de pilhas. Algumas indústrias costumam divulgar informações desencontradas em campanhas publicitárias. Assim, ao contrário do que se pensa, as pilhas alcalinas nem sempre são a melhor opção”. É nessa hora que meneiei a cabeça, pensando em todos esses anos gastando mais e de forma errada.
Há um mês a Rayovac lançou uma campanha ousada, intitulada Desafio Rayovac, que foi parar na Justiça (vide matéria do jornal O Globo) por reclamações feitas pelo seu concorrente direto, a Duracell. Pudera: a campanha foi baseada em testes realizados pelo laboratório sueco Intertek (e devidamente reconhecidos pelo Inmetro), que comprovam que as pilhas alcalinas Rayovac duram tanto quanto as da Duracell. Porém, com um singelo detalhe: cada pilha Rayovac, em média, custa R$ 0,50 a menos. A campanha segue à toda. Pois, segundo decisão da 6ª Vara Civil do Rio de Janeiro, “a propaganda comparativa é, na realidade, um instrumento do consumidor, pois através dela terá opções de decisão”.
Eu, que antes de aceitar fazer este publieditorial pesquisei por informações disponibilizadas em todos os links deste post, não poderia concordar mais com a decisão judicial que aprovou a continuidade da campanha Desafio Rayovac. Informação é poder. Principalmente nestes tempos em que você, que lê este texto, tem condições de fazer suas próprias apurações graças a todo um mundo de informações, podendo contestar o que lê, vê e ouve por aí baseado em dados disponíveis nestes tempos de blogs e redes sociais. Navegue pelos links deste texto, faça suas próprias pesquisas em outras fontes, conteste este post ou a Rayovac à vontade. Mas, principalmente, não faça de seus atos de consumo algo automático, movido unicamente por impulsos primários ou campanhas publicitárias. Citando uma música antiga dos Engenheiros: “Ouça o que digo, não ouça ninguém”.
De todos os beijos literários, creio que não há nenhum que seja capaz de bater a descrição feita por Julio Cortázar no capítulo 7 de O Jogo da Amarelinha. Se alguém souber de outro beijo mais arrebatador na literatura, por favor, deixe a transcrição do trecho nos comentários. A tradução para o português é de Fernando de Castro Ferro.
Não deixe de conferir o texto original em espanhol de Cortázar, meu escritor predileto. E de ouvir esta preciosidade na voz do autor de outras obras-primas como As Armas Secretas e Todos os Fogos o Fogo (que contém um de meus contos favoritos, “A Auto-Estrada do Sul”).
Alexandre Inagaki é jornalista e consultor de comunicação em mídias digitais. É japaraguaio, cínico cênico. torcedor do Guarani Futebol Clube e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos. Já plantou semente de feijão em algodão, criou um tamagotchi (que acabou morrendo de fome) e mantém este blog. Luta para ser considerado mais do que um rosto bonitinho e não leva a sério pessoas que falam de si mesmas na terceira pessoa.