Feliz Desnatal
Por Alexandre Inagaki ≈ segunda-feira, 26 de dezembro de 2011
Dizem que tempo é dinheiro; balela. Tempo vale muito mais do que dinheiro. Afinal de contas, a gente é capaz de arregaçar as mangas, batalhar e tapar os buracos causados por faturas atrasadas, juros para pagar, nome sujo no SPC. Horas perdidas, porém, não se recuperam jamais. A vida é muito preciosa para ser desperdiçada com coisas improdutivas como discussões na internet.
Chega o fim de ano e com ele algumas tradições inevitáveis, como as piadas com aquela música da Simone e as reflexões sobre a Vida, o Universo e Tudo Mais. E, embora eu mantenha a convicção pessoal de que datas são meras convenções (lembro daquelas palavras de Dickens, que descrevem uma sensação de #tudoaomesmotempoagora que não vem de hoje: “foi a estação da Luz, a estação das Trevas, a primavera da esperança, o inverno do desespero”), não posso deixar de sentir um certo alívio por este ano estar acabando.
Há algumas semanas fiz o seguinte desabafo no Facebook: “Que ano doido tem sido este 2011 para mim: muitas coisas boas, muitas coisas ruins. Sim, sim, eu sei que todo ano é assim. Mas o que tem diferenciado 2011 de outros anos da minha vida é a intensidade de todos esses eventos. Em 2012, espero que a vida não seja essa montanha-russa de altos e baixos que andou me atarantando. Mais serenidade, por favor!”
Escrevi essas palavras movido principalmente pelos problemas de saúde do meu pai, que sofreu duas cirurgias complicadas em menos de duas semanas e teve que passar o Natal num quarto de hospital. Poderia ter sido o mais melancólico e macambúzio dos dias, mas o fato é que, no fim, acabamos conversando horas sobre os tempos em que ele ajudava o meu avô, que ganhava a vida vendendo carvão nas ruas de Mogi das Cruzes, fazendo entregas com uma charrete puxada por um cavalo chamado Moleque. Foi um bom Natal. Afinal, o fato é que o local onde a gente está pouco interessa; importante mesmo é passar um dia como este ao lado das pessoas que amamos.
Ainda no clima de reflexões de final de ano (e de serendipidade), acabei esbarrando com uma mensagem que escrevi em 2003, que eu havia enviado para amigos por e-mail. Se eu reescrevesse este texto, mudaria uma ou duas sentenças por conta das experiências que vivi de lá para cá, mas a essência seria a mesma. Eis o texto, pois:
MENSAGEM DE DESNATAL
O que me mais incomoda é o excessivo contraste entre o Natal e o resto do ano. Note: a cidade enche-se de enfeites e luminosos que piscam, como que desejando tornar-se outra que não seja a urbe cinzenta de sempre. Mas por que cargas d’água pessoas deixam de fechar os vidros de seus carros aos pedintes, cumprimentam desafetos do serviço, contribuem com instituições de caridade, trocam abraços e presentes apenas agora?
Costumo dizer que datas não passam de convenções, e que certos estavam os personagens de Lewis Carroll, que diariamente faziam festas para comemorar o Dia do Desaniversário. Afinal de contas, por que celebrar aniversários, que ocorrem apenas uma vez por ano, e ignorar os demais 364 dias?
A mensagem de fim de ano que deixo, pois, é esta: todo dia é ocasião para acreditar no amor a despeito da aleatoriedade do universo, reafirmar esperanças (inclusive as que mofam amarfanhadas no armário do olvido), evocar sementes e estrelas como símbolos de potencial e concretização, abraçar demoradamente cada pessoa querida no mínimo 42 vezes por mês, adiar sua lápide e, principalmente, tratar de ser feliz.
Feliz Desnatal e um Próspero Ano Todo a você!
Alexandre Inagaki
Alexandre Inagaki é jornalista, consultor de projetos de comunicação digital, japaraguaio, cínico cênico, poeta bissexto, air drummer, fã de Cortázar, Cabral, Mizoguchi, Gaiman e Hitchcock, torcedor do Guarani Futebol Clube, leonino e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos, não necessariamente nesta ordem.
Pingback: Fotos, decorações e ideias para o Natal mais bizarro de todos os tempos - Pensar Enlouquece, Pense Nisso
Pingback: Quando eu era criança… | Pensar Enlouquece, Pense Nisso