Qual o livro que mais marcou sua infância?
Por Alexandre Inagaki ≈ terça-feira, 29 de janeiro de 2008
O primeiro livro que ganhei em minha vida chama-se “A Margarida Friorenta”. Na época, eu cursava o pré-primário, tinha cinco anos de idade e estudava no Colégio Raio de Sol, que ficava na Rua Monte Alegre. Singelo, não? O livro contava a história de uma flor que à noite tremia e chorava de tanto frio que sentia. O final feliz é alcançado graças ao carinho de uma menininha, que dá um beijo na margarida e faz com que o frio vá embora. Graças ao Fosfosol do Google, resgatei o nome da autora do primeiro livro que tive na vida, e que deve ter ido embora junto com as mudanças de domicílio que sempre fazem com que a gente deixe pra trás algumas coisas do passado: Fernanda Lopes de Almeida. Eu, que quando criança fui cativado por autores como Stella Carr, Pedro Bandeira, Ray Bradbury, Fernando Sabino e Agatha Christie, poderia citar muitos títulos que aos poucos foram construindo minha sede de palavras, mas jamais me esqueci deste livro com título um tanto quanto emo que foi o primeiro volume de minha estante: “A Margarida Friorenta”.
No total, recebi 127 e-mails de leitores interessados em participar da promoção Coração de Pedra, que responderam à seguinte pergunta: qual foi o livro que mais marcou a sua infância? Mais do que a quantidade de mensagens, me surpreendeu o fato de cerca de 90% delas terem sido enviadas por pessoas que nunca vi deixarem comentários por aqui. Foi uma bem-vinda surpresa: a promoção acabou se tornando uma maneira de conhecer melhor os leitores mais “quietos” que visitam regularmente este blog. Mais bacana ainda foi constatar a qualidade dos textos que recebi, justificando suas respostas. A ponto de, em vez de premiar apenas duas respostas (que ganharão, cada um, um exemplar de Coração de Pedra e alguns brindes como o Coolnex Card e um bottom do Pensar Enlouquece), resolvi presentear mais cinco leitores com um pequeno kit com algumas lembranças legais, como fitas de São Google e exemplares da revista Pix.
Antes de reproduzir os textos dos sete ganhadores da promoção, quero deixar aqui a lista com todos os títulos citados, que creio que servirão como boas sugestões de leituras para crianças de todas as idades. Eis a biblioteca básica da infância dos leitores do Pensar Enlouquece:
6 citações: O Pequeno Príncipe (Antoine de Saint-Exupéry).
5 citações: Meu Pé de Laranja Lima (José Mauro de Vasconcelos).
4 citações: Harry Potter (a série de sete volumes escrita por J. K. Rowling).
3 citações: O Menino do Dedo Verde (Maurice Druon) e O Menino Maluquinho (Ziraldo).
2 citações: As Batalhas do Castelo (Domingos Pellegrini), A Bolsa Amarela (Lygia Bojunga Nunes), Um Cadáver Ouve Rádio (Marcos Rey), Dom Quixote de La Mancha (Miguel de Cervantes), O Gênio do Crime (João Carlos Marinho), Harry Potter e a Pedra Filosofal (J. K. Rowling), A História Sem Fim (Michael Ende), Ilusões: As Aventuras de um Messias Indeciso (Richard Bach), Menino de Engenho (José Lins do Rego), O Rapto do Garoto de Ouro (Marcos Rey), O Reizinho Mandão (Ruth Rocha) e Zezinho, o Dono da Porquinha Preta (Jair Vitória).
1 citação: Alice no País das Maravilhas (Lewis Carroll), Amor de Perdição (Camilo Castelo Branco), Anarquistas, Graças a Deus (Zélia Gattai), Assassinato no Expresso Oriente (Agatha Christie), As Aventuras de Tom Sawyer (Mark Twain), Os Barcos de Papel (José Maviael Monteiro), Bom Dia, Todas as Cores! (Ruth Rocha), Buraco de Formiga, Buraco de Tatu (Lúcia Pimentel Góes), O Cachorrinho Samba (Maria José Dupré), Caminho Suave (Branca Alves de Lima), Canção do Exílio (Gonçalves Dias), Cândido (Voltaire), Capitães de Areia (Jorge Amado), O Caso da Borboleta Atíria (Lucia Machado de Almeida), Cazuza (Viriato Correa), A Chegada do Invasor (Flávio de Souza), A Cidade e as Estrelas (Arthur C. Clarke), toda a coleção Vaga-Lume da Editora Ática, Confissões de Adolescente (Maria Mariana), Confusões e Calafrios (Silvia Cintra Franco), A Cor da Ternura (Geni Guimarães), Coração (Edmundo De Amicis), A Corrida Gaiata (uma versão da fábula da corrida entre a lebre e a tartaruga), “um dicionário”, Dom Casmurro (Machado de Assis), A Droga da Obediência (Pedro Bandeira), Os Doze Trabalhos de Hércules (Monteiro Lobato), Éramos Seis (Maria José Dupré), Eu, Christiane F., 13 Anos, Drogada, Prostituída… (Kai Herrmann & Horst Rieck), fábulas dos Irmãos Grimm, O Feijão e o Sonho (Orígenes Lessa), Fernão Capelo Gaivota (Richard Bach), Flicts (Ziraldo), Grimble (Clement Freud), O Hobbit (J. R. R. Tolkien), A Ilha Perdida (Maria José Dupré), O Iluminado (Stephen King), A Inspetora (série de livros de Santos de Oliveira, pseudônimo de Ganymédes José), Os Karas (a série protagonizada pela Turma dos Karas, escrita por Pedro Bandeira), O Lago das Lágrimas (Emily Rodda), A Lenda do Castelo de Montinhoso (Vera Krijanovskaia e J. W. Rochester), O Livro de Ouro da Mitologia (Thomas Bulfinch), “O Livro de Ouro da Playboy”, A Mão e a Luva (Machado de Assis), Manu: A Menina que Sabia Ouvir (Michael Ende), O Maravilhoso Mágico de Oz (Lyman Frank Baum), A Marca de uma Lágrima (Pedro Bandeira), Memórias de um Burro (Condessa de Ségur), A Menina e o Pássaro Encantado (Rubem Alves), O Menino Sem Imaginação (Carlos Eduardo Novaes), O Outro Lado da Ilha (José Maviael Monteiro), A Pedra no Sapato do Herói (Orígenes Lessa), Pollyanna (Eleanor H. Porter), Pollyanna Moça (Eleanor H. Porter), Receita Para um Dragão (Simone Saueressig), O Rei Caracolinho e a Rainha Perna Fina (Maria Heloisa Penteado), Reinações de Narizinho (Monteiro Lobato), Robinson Crusoé (Daniel Defoe), Rosinha, Minha Canoa (José Mauro de Vasconcelos), O Saci (Monteiro Lobato), Sangue Fresco (João Carlos Marinho), Saudade (Tales de Andrade), “Se Eu Fosse Grande” (não encontrei o autor), O Senhor dos Anéis (J. R. R. Tolkien), A Serra dos Dois Meninos (Aristides Fraga Lima), Sítio do Pica-Pau Amarelo (coleção completa de Monteiro Lobato), Stardust (Neil Gaiman), Os Três Porquinhos (autor desconhecido), A Turma da Rua Quinze (Marçal Aquino), O Velho e o Mar (Ernest Hemingway), Veludinho (Martha Azevedo Pannunzio), Viagem ao Centro da Terra (Julio Verne), Vidas sem Rumo (S.E. Hinton), Vita Brevis (Jostein Gaarder), A Volta ao Mundo em 80 Dias (Julio Verne), Vupt, a Fadinha (Lúcia Tulchinski) e um livro descrito desta maneira pela leitora Elizabeth Alves: “Não recordo o título, mas a história e suas conseqüências estão fresquinhas: um menino adorava ir a uma casa vizinha para ouvir o pássaro cantar na gaiola. Ia sempre, pois achava lindo. Foi quando descobriu que aquele canto era de tristeza, e libertou o pássaro”.
Obrigado a todos que participaram da primeira promoção do meu blog. E aproveito pra anunciar que ainda hoje já rolará uma nova por aqui, na qual oferecerei o box de um dos melhores seriados que estão sendo exibidos na TV atualmente. B) Mas, enfim, é isso aí: clique no botão abaixo para descobrir quem são os ganhadores da promoção e ler as suas respostas!
Eis os cinco ganhadores do “kit Pensar Enlouquece”: Carlos Guittar Oliveira, Eva Miranda, Joana Dambrós, Múcio Guimarães e Simone Fernandes Miletic.
Carlos Guittar Oliveira
Bem, tudo começou quanto tinha por volta de 12 ou 13 anos, não me recordo exatamente. Meu pai tinha em seu quarto uma coleção de revistas pornográficas que descobri entrando na puberdade, em cima de seu guarda-roupas. Tinha revistas de sexo explícito, de contos e fotonovelas, algumas em preto e branco ainda. Aquilo me divertia muito, claro, principalmente os contos eróticos. Bastava ficar sozinho em casa que corria lá em cima do guarda-roupas pra fazer minhas leituras. Certo dia, acredito que ele desconfiou (sei lá) e as revistas simplesmente sumiram. Senti falta delas mas não procurei saber que fim deram, com medo de alguma “represália” ao ser descoberto.
No meu quintal havia uma bicicleta velha, que eu insistia em montar e desmontar sem muito sucesso. Aconteceu que meu pai fez uma catança no quintal, e o que ele achou que poderia ser útil, colocou no forro de casa. Lá ele colocou as peças de minha bicicleta. Passado alguns meses, eu resolvi subir até lá e resgatar as peças de minha bicicleta. Nunca tinha subido até o forro, e pela primeira vez o fiz. Chegando lá, me deparei com várias coisas antigas, velhas e empoeiradas, e dentre essas coisas, adivinha o que encontrei? A coleção de revistas pornográficas de meu pai…
No meio de toda aquela bagunça e poeira, além de rever minhas histórias eróticas, encontrei um livro que me prendia muito a atenção (depois, é claro, de me deliciar com as histórias). Foi o primeiro livro que li na vida, até hoje não sei porque ele estava lá, talvez tinha sido de outro morador, realmente não sei. O livro era “Ilusões - As Aventuras de um Messias Indeciso”, de Richard Bach, editora Record. O livro contava a saga de um aventureiro que encontrou um messias que fazia peripécias, traspassava paredes e tudo mais, e passou a ensinar esse aventureiro como fazer certas coisas.
Comecei a ler o livro, mas não podia trazê-lo pra casa, senão descobririam que eu tinha achado as revistas. Hoje sei que talvez meus pais nem se lembrariam do livro, mas na época aquele era meu segredo, e não podia deixar que descobrissem. Foi uma leitura muito agradável, tirando o incômodo de subir toda vez até lá para ler, mas eu era recompensado tanto pela leitura do livro quanto pela leitura das revistas. Realmente elas tomaram bastante tempo na minha puberdade. Foi depois dessa leitura que não parei mais de ler até hoje. Sinto uma enorme revolta com o sistema de ensino na época, que não incentivava tanto a leitura como tentam pelo menos nos dias de hoje.
Quem gostava de ler certamente iria encontrar um livro em alguma oportunidade,(nem que fosse no forro de casa), mas quem não gostava, não tinha a oportunidade de aprender. Hoje sei que os maiores analfabetos são os que sabem ler, e não o fazem. Apesar de engraçado, foi assim que a leitura chegou até minha vida, espero ser mais fácil ensinar meus filhos a aprenderem a ler. Não vou esconder nenhum livro no sótão ou no forro de casa. Talvez em cima do guarda-roupas. ;)
Eva Miranda
Fui uma criança muito solitária. Gordinha, asmática, temperamental. Por causa da falta de ar, acabei me dedicando a ficar dentro de casa. Geniosa, tentava chamar a atenção sendo diferente.
O que pode ser mais diferente do que uma criança que diz gostar de estudar? Esse era o meu mantra, Ina. “Eu aaaaamo estudar, professora”.
Não sei o que veio primeiro, a afirmação ou o gosto. Sei que eu gostava mesmo. Nas férias, minha mãe me passava dever de casa. Eu corria, ávida, pra ler meu livro “Eu Gosto de Português”. Só não fazia os exercícios por uma preguiça medonha de escrever.
Nessa avidez por uma diversão que não demandasse correr e pegar chuva, eu me apaixonei pelas letrinhas. Eu podia te contar dos meus devaneios lendo “Se… será, Serafina?”, e repetindo as frases do livro como se fossem meus slogans, contando pra minha mãe a história do dia que eu virei samambaia. Mas eu ainda era muito criança.
O livro que me marcou pra sempre foi do Lobato. Eu ganhei a coleção inteira do “Sítio” de capa dura azul. Mamãe me deu porque, depois que eu vi um número musical no programa da Mara Maravilha (nos tempos do short de veludo), onde um monte de meninas dançava aquela deliciosa música da Baby ex-Consuelo e do Pepeu Gomes: “Emília, Emília, Emília…”, fiquei meio obcecada em conhecer a verdadeira história da Emília.
Adorei tudo, o lindo e colorido “Reinações de Narizinho”, o aventuresco “Caçadas de Pedrinho”, “A Chave do Tamanho” e seu sabor de ficção científica. Mas o meu Top Book foi, é, sempre será, “Os Doze Trabalhos de Hércules”.
Quando Pedrinho, Emília e o Visconde resolvem viajar usando o pó de Pirlimpimpim pra acompanhar os feitos hercúleos, a Saga “Sítio” já atingiu um ponto interessante: o leitor que tivesse lido os livros na ordem já teria intimidade com os personagens no seu ambiente habitual (o Sítio) e já teria alguma base de mitologia grega (dada pelo próprio Lobato no livro “O Minotauro”).
Eu devorei os dois tomos sofregamente. Hércules, o grande e burro herói nacional da Grécia, que recebe Emília como sua “dadeira de idéias”, o Visconde como escudeiro e Pedrinho como Oficial de Gabinete, tornou-se uma imensa paixão da minha pré-adolescência. Musculoso, burro que nem uma ovelha, bom e colérico, cheio de ódios e de amores.
Além disso, Lobato é um gênio. O ordinário coloca na boca do Visconde vários e vários lindos mitos gregos. Faz-nos passear entre olivais e montanhas, entre o Oráculo de Delfos e Creta.Nos coloca frente a frente com a luta de Perseu com a Medusa. Nos conta a história de Medéia e Circe. Aos nove anos, eu ainda não sabia, mas ler “Os Doze Trabalhos de Hércules” me fez ganhar referências que são válidas até hoje, e que me ajudam inclusive a entender o Renascimento e algumas obras de arte.
E, além de tudo, Lobato me fez entender pra sempre que todo herói é fraco, ainda que segure o mundo nas costas.
Joana Dambrós
Quando criança, eu era leitora voraz de gibis, fossem eles quais fossem, pela facilidade em recebê-los em casa mensalmente. Porém, sempre que minha mãe ia para uma cidade vizinha, um pouco maior que a nossa e que tinha a sorte de ter livrarias, pedia a ela que me trouxesse um ou dois livros. Sempre tive a mania de ter os livros que leio, embora nem sempre seja possível, afinal, para mim, ler não é o bastante: delicio-me com as ilustrações da capa, leio as abas com resumo, história do autor, aproveito cada vírgula mais de uma vez. Também recomendo e empresto meus mimos para que outros aproveitem da mesma forma que eu.
Enfim, numa das tentativas de pedir um livro para minha mãe, ganhei dois: A Marca de uma Lágrima, do Pedro Bandeira (uma história bacana de conflitos juvenis) e aquele que é para mim o mais marcante, que já li e reli zilhões de vezes, e leria mais muitas ainda: A Cor da Ternura, da Geni Guimarães.
Neste livro, ela narra sua história de uma forma muito leve, transmitindo através do olhar de uma garotinha, que cresce no decorrer do livro, seus conflitos. Seus piores momentos, como quando a mãe engravida mais uma vez e a atenção que era toda dela já não é mais, como o leite que ela mamava no peito da mãe; a solidão na qual ela se viu, que a fez apegar-se a uma aranha que vivia no seu quarto; as dificuldades de crescer, de relacionar-se com outras crianças, de ir à escola e, inocentemente, não entender o preconceito dos outros consigo.
Ah, não mencionei anteriormente, mas Geni é negra e pobre. E os bons momentos, como suas fantasias saboreadas no balanço de pneu, sempre interrompidas pelas outras crianças que estavam na fila para brincar. Ela, quando menina, sonha tão alto quanto as balançadas do brinquedo, e, conforme amadurece, percebe que estes sonhos são como o céu, tão lindo e tão distante. Percebe que sua cor, de certa forma, a condena, levando-a a se esfolar pedras no tanque de casa porque não a quer. Mas, no fim das contas, depois de cada sonho e de cada luta, Geni vence uma barreira, e ajuda muitos a vencerem as suas, principalmente as do preconceito.
Este livro é o meu favorito e sempre está na memória pela maneira como a autora narra sua vida, não diferente de tantas com as quais cruzamos todos os dias, talvez até as nossas; de como lidamos com o nosso preconceito e com o preconceito dos outros e da sua interferência no curso da vida. Traz à tona reflexões importantes mas de uma maneira tão lúdica e gostosa que lembra aqueles doces multicoloridos que mascaram um leve sabor azedo no final. Não importa quantas vezes eu o leia, ele sempre me deixa com os olhos marejados e um gigante nó na garganta.
Múcio Guimarães
Dizer qual livro marcou minha infância é extremamente difícil. Foram todos os do Júlio Verne, que eu lia de uma talagada só, os do Monteiro Lobato que lia um, pensando no próximo, as aventuras do Tarzan, O Tesouro da Juventude - será que alguém se lembra desse?
E só nas férias, que eu passava na casa da minha avó em Divinópolis - MG, já que nos idos de 1960 minha família não tinha dinheiro para comprá-los. Toda a minha família me incentivava muito a ler, mas minha avó não me deixava trazer nenhum para Belo Horizonte - ela dizia que tinha outros netos. E durante o semestre escolar, eu sempre pensando nas férias, quando teria todo o tempo do mundo para explorar aquela estante rococó, fechada a chave que só era libeada para tirar um quando o outro voltava.
Mas pensando bem, a melhor sensação que eu tive com a leitura foi no dia que minha tia Elza me ensinou como usar um dicionário. Aquela coisa de ordem alfabética (desconhecida para mim até então), de saber o significado das palavras sem ter de perguntar a nenhum adulto, o descobrir de palavras mágicas, até então desconhecidas, a estima lá em cima pela aprovação dos adultos.
Desde esse tempo nunca mais deixei de estar lendo um livro, mesmo que tivesse de andar vários quilômetros a pé até a Biblioteca Pública de Belo Horizonte, onde passava a entender melhor minha vida, através da visão de vida dos outros.
E assim continuo fazendo, descobrindo a cada hora novos autores e novas visões da vida que nos dão Dennis Lehane, Margaret Atwood e, por fim, mas não menos importante, mesmo aos 52 anos de idade, J. K. Rowling e meu herói Harry Potter. Aliás, estou lendo pela segunda vez o último da série, dessa vez com calma, atenção e prazer redobrado, pois da primeira vez eu o li em menos de dois dias.
Simone Fernandes Miletic
Poxa, escolher um livro só? Difícil tarefa.
Não lembro qual foi o primeiro livro que li, mas lembro que meu pai me deu Pequeno Príncipe, relido a exaustão e até hoje guardado, hoje com páginas caindo, capa machucada, manchas no branco das folhas.
Lembro de ter lido a coleção inteira de Monteiro Lobato, com Narizinhos e Pedrinhos, em menos de duas semanas, como se daquilo dependesse minha vida.
Mas lembro mesmo é de ir toda semana ao Shopping Center Norte com minha mãe e ela me deixar escolher dois livros na Livraria Siciliano, só dois. Lembro que as prateleiras infanto juvenis ficavam no fundo da loja, nada dessa coisa de colorir tudo para atrair crianças. Lembro de escolher os dois livros, em sua maioria da Coleção Vaga-Lume da Editora Ática (que saudades!) e leva-los para casa, chirava-os até no caminho.
Antes do jantar um já tinha ido, no dia seguinte o segundo. E lembro de meu pai falando que eu não comia comida porque era traça, vivia de livro.
Hoje ainda gasto boa parte do meu dinheiro com livros. E se você não me der esse (quando vi a promoção já tava no site da Livraria Cultura para ver o preço) vou comprar eu mesma. E viajar nas asas da imaginação, voltar a ser criança.
Ah, o livro? Podem ser quase todos que li? Acho que os dos Marcos Rey eram os que mais me empolgavam. Mas quando li Harry Potter voltei a ser criança.
Os nomes dos dois ganhadores do livro Coração de Pedra e mais um “kit Pensar Enlouquece” são… Ibrahim Cesar e Mariana Ferreira.
Ibrahim Cesar
Respondendo a promoção…”qual o livro que mais marcou sua infância e justificando sua escolha”. Acho que nem vou ganhar mas só de ler a referida linha ele me veio à mente e me fez lembrar daqueles tempos, como se de repente fosse transportado para lá.
Já revelo que um dos motivos para não ganhar é minha possível desclassificação por que o livro que me marcou emocionalmente não está na minha infância propriamente dita, mas aos 14 anos, ou seja, já era adolescente, mas contarei minha história de qualquer jeito.
Eu vinha de diversos livros da Coleção Vagalume e era um melhor do que o outro. Lembro que em 1 de Janeiro de 2000 foi lançado Harry Potter junto com um grande barulho na imprensa mas eu não dava tanta atenção para o fato. Na verdade estava começando a ler os clássico, então entrei naquele cliché de esnobar as obras contemporâneas, “best-seller” era heresia. Prontamente ignorei “Harry Potter e a Pedra Filosofal”. Foi mais ou menos nessa época que comecei a notar realmente as garotas vendo-as como alguma coisa mais concreta do que simples devaneios.
Nesse ano eu me mudei de escola e eu sou muito difícil de adaptar a qualquer lugar. As aulas de “Educação Física” eram particularmente difíceis, sempre tive uma saúde frágil. Mesmo tendo a licença médica e a aprovação do professor para não tomar parte nas atividades eu me sentia como se estivesse cometendo alguma espécie de infração. Havia um tabuleiro de xadrez que supostamente eu deveria jogar com alguém. Meu professor tentava, mas sempre passava mais tempo vendo o time de vôlei e ode futebol que eu tinha um jogo monótono e chato. Poucas semanas mais tarde entra uma nova garota na minha classe. Ela tem asma e não pode fazer exercícios. Só que ao invés de ir jogar xadrez comigo, ela se isola bem longe e lê “Harry Potter”. Meu professor simplesmente pegou o tabuleiro e disse: “Vai lá e joga com ela”.
“Claro,” pensei. “Como se fosse fácil”.
Todo nervoso e tropeçando nas palavras transmiti a mensagem do professor como se fosse apenas um mensageiro, queria deixar aquilo o mais longe possível de mim.
“Você quer jogar?”, ela perguntou, tornando a coisa pessoal. Disse que não sabia. Então perguntei sobre o livro. E ela falou muito bem. Começamos a falar dos livros da Coleção Vagalume e inúmeros outros. Com 14 anos foi a primeira vez que conversei com um “igual”. Naquele mesmo dia, sem ter terminado o livro, ela me ofereceu para ler, já que eu havia dito no meio de uma conversa que lia muito rápido. Ela disse que lia devagar. Achei estranho, ela confiar assim em mim, do nada. Me senti bem. Foi ali que começou uma das maiores, senão a maior amizade de toda a minha vida.
Anos mais tarde ela me daria “Harry Potter e a Pedra Filosofal” de aniversário. Sempre que pego o volume me lembro daquele tempo. Hoje nós nem nos falamos mais, mas eu ainda me lembro daquele ano com um sorriso no rosto.
Mariana Ferreira
É engraçado, mas no momento em que eu li “dizendo qual é o livro que marcou sua infância”, pensei automaticamente em um livro sobre o qual há muito eu não pensava, e para ser sincera, sobre o qual eu não me lembro muita coisa. No entanto, se minha resposta foi assim tão instantânea, esse deve ser mesmo o livro que mais marcou a minha infância.
Bem, eu fui uma leitora voraz quando criança (vamos considerar até os 12 anos), a ponto de a minha mãe me proibir de ler. Ela escondia os livros pra que eu saísse um pouco de casa, comesse, dormisse, essas coisas de pessoas fracas.. rs.. Eu lia em média 02 livros por dia, e cheguei a esgotar a biblioteca de duas escolas em que eu estudei. E o livro que mais marcou a minha infância, foi, não me falhe a memória, o primeiro livro de biblioteca que li: “O Menino do Dedo Verde”.
Parada agora, tentando me lembrar da história, eu fecho os olhos e vejo figuras, mas não me lembro se ele tinha figuras realmente, ou se são imagens que minha mente criou. Lembro de um canhão com flores e de uma escada de trepadeiras que ia até o céu, mas me lembro muito confusamente do que essas imagens significavam para a história.
O fato de ser o primeiro livro que eu peguei emprestado numa biblioteca já é, por si só, um bom motivo para que eu o considere marcante, já que ele abriu o caminho para um ambiente que é ainda fundamental na minha vida: bibliotecas. Foi o início de um grande amor.
Ao mesmo tempo eu acredito que se a história não tivesse me marcado de alguma forma eu não me lembraria qual seria o primeiro. Então paro novamente e tento me lembrar. Eu me lembro de querer ter o dedo verde. Eu Me lembro de ter ficado muito triste. Eu Me lembro de adotar um pedaço do jardim. Eu Me lembro de ficar muito satisfeita em ter uma parreira fazendo sombra a minha janela. EU Me lembro de perguntar a minha mãe se as pessoas viram anjos quando morrem e de ela responder que só as crianças. Eu Me lembro de admirar ainda mais meu pai e de tentar ajudá-lo na saga de plantar Ipês Amarelos pela cidade. Eu ME lembro de minha mãe dizer que minha avó tinha o dedo verde, e de ficar confusa com essa constatação. Afinal, eu acho que me lembro de bastante coisa, menos da história do que dos reflexos que ela causou.
Fui ao oráculo: as coisas de que me lembro fazem sentido. Na França, o filme virou desenho! Agora, por que eu fiquei triste? Tenho a impressão que o final não é feliz. A história parece ser linda mesmo e atual, mesmo tendo sido escrita em 1957.
Enfim, como não sei escrever sem dar voltas (o que sempre me causa muitos problemas), considerarei exposta acima minha justificativa. O livro causou reflexos indeléveis na minha vida.
Alexandre Inagaki
Alexandre Inagaki é jornalista, consultor de projetos de comunicação digital, japaraguaio, cínico cênico, poeta bissexto, air drummer, fã de Cortázar, Cabral, Mizoguchi, Gaiman e Hitchcock, torcedor do Guarani Futebol Clube, leonino e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos, não necessariamente nesta ordem.
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