Leonel (e Neusinha) Brizola
Por Alexandre Inagaki ≈ quarta-feira, 23 de junho de 2004
A morte de Leonel Brizola pouco repercutiu na blogosfera. Pudera: falecido aos 82 anos de idade, Brizola ainda brandia para si, em pleno século XXI, o espólio do Getulismo (daqui do meu computador pressinto um de meus leitores balbuciar um “ahn?”), corrente política oriunda dos tempos em que Papai Noel ainda tinha barba preta. E no entanto, é um tanto quanto desconcertante ver ignorada tão solenemente a história de alguém que foi Governador do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro, liderou um movimento civil em prol da posse de João Goulart (seu cunhado) quando da renúncia de Jânio Quadros, foi exilado por 15 anos e, ao voltar do exílio em 1979, fundou o PDT (após perder os direitos da legenda PTB para Ivete Vargas, sobrinha-neta de Getúlio).
Brizola morreu mergulhado em relativo ostracismo político, ocasionado pelo raquítico desempenho em seus mandatos como Governador do Rio e pela infame herança deixada pelos nomes que seu PDT lançou na política nacional, como Anthony Garotinho, Marcello Alencar, cacique Mário Juruna, Agnaldo Timóteo ou César Maia. Triste legado que acabou por ofuscar suas ações em defesa da democracia (seja no episódio da posse de Jango ou nos comícios pelas Diretas Já em 1984) e a coerência que o levou, ao longo de toda a sua atividade política, a defender passionalmente um Estado centralizado e nacionalista. Quem votava em Brizola não votava em uma plataforma administrativa ou um projeto ideológico: movido pelo indiscutível carisma do último dos caudilhos, dava, sim, um cheque em branco ao Brizolismo, peculiaríssima corrente política também conhecida pela alcunha exótica de Socialismo Moreno, movida à base da construção de CIEPs, bravatas contra o “imperialismo ianque” e as Organizações Globo e alianças com figuras tão díspares quanto Fernando Collor, o ex-presidente João Figueiredo e o “sapo barbudo” Luís Inácio Lula da Silva.
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Sim, Leonel Brizola foi uma figura sui generis da política tupiniquim. Mas, deixando de lado os méritos e fracassos do homem público, não posso deixar de citar algumas lembranças mais pop que tenho desta figura, como o comercial que estrelou para os sapatos 752 da Vulcabrás (em uma campanha que também teve como garotos-propaganda Paulo Maluf, Vicente Matheus e Tony Carrado) ou os episódios envolvendo sua filha rebelde, Neusinha Brizola. Acredite se quiser: em 1983 a filha do caudilho estourou nas FMs de todo o país com a música “Mintchura”, produzida por ninguém menos que Paulo Coelho. Típico caso de “one-hit wonder”, a canção gerou pelo menos dois subprodutos. Um deles, gravado pela própria Neusinha, foi a música “Diretchas”, composta por ocasião dos comícios pelas Diretas Já em 1984, com versos como “Eu só menti/Me corrompi/Eu me vendi/Pro FMI”. O outro foi uma sátira escrita pelo humorista e locutor de FM Serginho Leite, que criou a personagem Creuzinha Montoro, intérprete da sátira “Verdchura”, cuja letra narrava a história de uma socialite apaixonada por um vendedor de hortifrutigranjeiros do Ceasa.
Pois bem: Neusinha, hoje com 49 anos de idade, protagonizaria ainda dois imbróglios. Um deles foi a sumária proibição, decretada pelo velho Leonel, da publicação das fotos que havia feito para a revista Playboy. O outro foi a sua prisão, por porte de cocaína, em 1993. Hoje em dia Neusinha é avó de três netos e se diz caseira e sossegada (apesar dos braços ainda cobertos de tatuagens).
Alexandre Inagaki
Alexandre Inagaki é jornalista, consultor de projetos de comunicação digital, japaraguaio, cínico cênico, poeta bissexto, air drummer, fã de Cortázar, Cabral, Mizoguchi, Gaiman e Hitchcock, torcedor do Guarani Futebol Clube, leonino e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos, não necessariamente nesta ordem.
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