Maitê Proença - Fevereiro de 1987 - Hoje em dia é muito mais fácil para um jovem cercado de espinhas e dúvidas existenciais por todos os lados satisfazer suas curiosidades peladísticas. Basta fazer algumas rápidas pesquisas no Google e, voilá, terá acesso a milhares de fotos e vídeos de mulheres nuas, peladas, au naturel, sem roupa e do jeito que vieram ao mundo. Mas, na época em que a mítica Playboy com Maitê Proença na capa chegou às bancas, eu era apenas um moleque de 13 anos, bobo como todos os homens são nessa idade (na verdade, continuamos bobos; apenas adquirimos um pouco mais de know how ao longo dos anos).
Se ainda hoje sofro com minha irreversível timidez, imagine a minha situação naquele longínquo verão de 1987, louco para conferir com meus olhos e mãos a nudez daquela atriz por quem me apaixonara irremediavelmente ao assisti-la protagonizando Dona Beija, novela da finada Rede Manchete na qual Maitê exibiu generosamente seu corpo em cenas como a vez em que sua personagem cavalgou nua, tal qual Lady Godiva, pelas ruas de Araxá. Continue Lendo
Nos anos 50 e 60, Carlos Zéfiro “catequizou” diversas gerações de adolescentes que fizeram muita justiça com as próprias mãos ao ler seus quadrinhos pornográficos. A partir da década de 70, foi o cinema brasileiro o (ir)responsável pela (des)educação sexual de muita gente, através das pornochanchadas produzidas em sua vasta maioria pela Boca do Lixo paulistana, região localizada no Centro velho de São Paulo. Se por um lado filmes como “O Grande Gozador”, “Xavana - uma Ilha do Amor”, “Aventuras Amorosas de Um Padeiro” ou “Reformatório das Depravadas”, lançados durante os tempos da ditadura, são acusados de despolitização e alienação, por outro é inegável constatar que foram produções que refletiram o zeitgeist de uma época marcada pelo surgimento da pílula anticoncepcional, na efervescência sexual de tempos pós-hippies e pré-discotecas.
O apelo popular das pornochanchadas provém de vários elementos, sendo o mais óbvio de todos a exibição dos corpos de musas como Vera Fischer (na época atriz iniciante, ingressando na carreira artística após ter sido coroada Miss Brasil em 1969), Aldine Müller, Helena Ramos, Zélia Martins, Nicole Puzzi, Zaira Bueno e Matilde Mastrangi. Ao erotismo, os produtores acrescentavam doses generosas de comédia, com vasta utilização de personagens estereotipados que até hoje fazem sucesso em programas como A Praça é Nossa ou Zorra Total. Por exemplo: o garanhão cafajeste, o velho tarado, a frígida gostosa, a moça “liberada”, o marido traído, a bicha histriônica, o safado engravatado e a empregada boazuda (sobre o assunto, confira o artigo A rica fauna da pornochanchada, de Ruy Gardnier).
Se nos primeiros anos as pornochanchadas não passavam de comédias de costume com uma e outra cena mais caliente (vide os sucessos de bilheteria “Como Era Boa a nossa Empregada” e “A Viúva Virgem”, ambos com mais de 2 milhões de ingressos vendidos), ao longo dos anos os filmes foram ficando mais apimentados. Um marco dessa virada foi a produção de 1977 “O Bem Dotado, o Homem de Itu“. Dirigido por José Miziara, definitivamente não pode ser considerado um filme para toda a família. Sua singela trama apresenta a história de um caipira chamado Lírio (Nuno Leal Maia) que é trazido para a cidade grande por senhoras da alta sociedade atraídas por sua “peculiar” anatomia. Eis o texto da sinopse original do filme: “Ao chegar em São Paulo Lírio conhece Julinha (Helena Ramos) e, pela primeira vez, sente o clamor do sexo. O ímpeto é tão forte que suas calças rasgam“.
Deste cRássico, guardo na memória as cenas de Nuno Leal Maia deixando todas as mulheres mancas após transarem com ele, assim como a inolvidável sonoplastia (o tóóóóóóóóóiiiim ouvido a cada ereção do personagem é simplesmente antológico). Eram tempos nos quais as produções não exibiam sexo explícito nem pêlos pubianos; em compensação, viam-se peitos e bundas em generosa profusão. Ou seja, exatamente o perfil dos longas-metragens exibidos na Sala Especial, sessão de filmes que a TV Record apresentava todas as sextas-feiras, às 23 horas, em meados dos anos 80.
Foi por intermédio da Sala Especial que vi pela primeira vez coxas, peitos e bundas, antes mesmo de começar a me interessar pelo sexo oposto. Assisti a muitos filmes toscos como “A Ilha das Cangaceiras Virgens”, “Histórias que Nossas Babás Não Contavam”, “Os Bons Tempos Voltaram - Vamos Gozar Outra Vez” escondido de meus pais, protegido pela penumbra da sala, com o volume no mínimo e a excitação que só as coisas proibidas podem nos trazer.
Em 1982, surgiu o primeiro filme de sexo explícito made in Brazil: “Coisas Eróticas”, de Rafaelli Rossi. A novidade teve repercussão imediata nas bilheterias: 4.525.401 brasileiros pagaram ingressos para assisti-lo nas salas de cinema. Foi o ápice de público, e ao mesmo tempo o começo da derrocada da Boca do Lixo paulistana. A recessão econômica e a popularização dos videocassetes, em sua maior parte abastecidos por títulos estrangeiros, foram as principais causas do fim das pornochanchadas. Hoje, com a popularização da Internet, que traz diretamente para as casas de adolescentes repletos de espinhas no rosto e hormônios no sangue vídeos pirateados por aí, falar em pornochanchadas é como recordar os tempos em que Papai Noel tinha barba preta. Mas foi bom enquanto duro.
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P.S.: Os pôsteres de cinema que ilustram este post foram criados por José Luiz Benício. De seu site, tomo emprestadas estas palavras: “Durante mais de 30 anos, Benício foi o responsável por mais de 300 cartazes do cinema nacional obtendo diversas premiações. Benício também ficou conhecido pela exaltação às formas femininas em suas obras no período das pornochanchadas”.
Nós, brasileiros, estamos tão acostumados em ver mamilos expostos na TV que até estranhamos quando a mulata Globeleza aparece com os seios cobertos. De memória, posso citar diversos outros momentos em que mulheres exibiram suas partes mais pudendas em horário nobre. Por exemplo, os diversos banhos que Juma Marruá e a Mudinha tomavam na novela “Pantanal” da finada TV Manchete, ao lado dos tuiuiús e do Velho do Rio. Ou os stripteases pra lá de fajutos que as garotas Tutti-Frutti faziam em “Cocktail”, programa pra lá de tosco capitaneado por Miéle todas as quartas-feiras no SBT? E o que dizer da campanha de prevenção do câncer de mama estrelado por Cássia Kiss na qual a atriz fazia exame de toque nos próprios seios, encampada por ninguém menos que o Ministério da Saúde?
Diante dos, hmm, permissíveis padrões tupiniquins, o que dizer de toda a celeuma causada pela exibição do seio de Janet Jackson durante uma apresentação no intervalo do Superbowl? Ainda se fossem os mamilos da Naomi Watts… Mas tergiverso, tergiverso. E o fato é que não é preciso ser um expert em Estados Unidos para discorrer sobre o puritanismo W.A.S.P. e toda a dificuldade histórica que a terra do Mickey possui em falar sobre Sexo, esse tema-tabu da mesma sociedade que abriga a maior indústria de filmes e artigos pornográficos do planeta. Continue Lendo