Uma das melhores obras produzidas pelo cinema hollywoodiano nos últimos anos foi Lost in Translation, roteirizado e dirigido por Sofia Coppola em 2003. O filme é protagonizado por um homem e uma mulher que passam alguns dias no Japão, e acabam se encontrando por acaso no hotel em que estão hospedados. Um deles é Bob Harris (Bill Murray), ator cuja carreira está em decadência, e que se encontra no Oriente a fim de gravar um comercial de uísque. A mulher é Charlotte (Scarlett Johansson), uma jovem graduada em Filosofia que acaba parando no Japão para acompanhar o marido, um fútil fotógrafo de celebridades.
Tal qual Mersault, personagem do famoso livro de Albert Camus, Bob e Charlotte são estrangeiros não apenas por causa do deslocamento espacial, mas também por suas próprias vidas: sentem-se desconfortáveis em seus respectivos casamentos, padecem com a falta de perspectivas profissionais e, especialmente, a dificuldade em expressar sentimentos. Após uma noite insone na qual encontram-se no bar do hotel e começam a conversar, os personagens de Bill e Scarlett tornam-se amigos e passam a compartilhar uma série de situações aparentemente banais, como jantar em um restaurante japonês, cantar desafinadamente num karaokê ou simplesmente caminhar pelas ruas infestadas de neons da capital nipônica.
E no entanto, são essas cenas o ponto forte de Lost in Translation, um título perfeito para um filme que, infelizmente, não ganhou traduções à altura (enquanto no Brasil o conhecemos pela alcunha de Encontros e Desencontros, em Portugal o filme ganhou um título mais infeliz ainda: O Amor é um Lugar Estranho). Porque essas seqüências que relatam situações cotidianas apresentam diálogos entremeados por aqueles momentos de silêncio que de quando em quando pairam entre duas pessoas. Você percebe o quanto se sente bem com alguém quando é capaz de permanecer calado sem o incômodo dos silêncios desconfortáveis, e o filme de Sofia Coppola traduz com felicidade esses iluminados instantes. E assim, paulatinamente o espectador de Lost in Translation testemunha a evolução do relacionamento entre duas pessoas que, apesar da distância de idades e interesses, transforma-se em algo além de uma amizade passageira, sem que seja preciso explicitar esse momento por meio de diálogos pueris ou declarações arrebatadas. Continue Lendo
Ao vivo, o trio formado por Sting, Stewart Copeland e Andy Summers impressiona pela competência técnica e por um entrosamento surpreendente para uma banda que esteve separada por mais de vinte anos. Além disso, são impecavelmente profissionais. Pouco depois dos alto-falantes do estádio tocarem “Get Up, Stand Up”, de Bob Marley, atiçando os mais de 70 mil incautos que muvucaram o Maracanã, o Police entrou no palco às 21:30, exatamente na hora marcada. Sem KY, arregaçaram logo na entrada com a clássica “Message In a Bottle”, botando a galera pra pular alucinadamente feito pipoca na panela.
Foi só a partir da segunda música, “Synchonicity II”, que os telões de alta definição espalhados pelo gramado deram o ar de sua graça, fazendo com que a multidão espremida feito shortinho de dançarina de axé (inclusos eu e minha namorada) finalmente pudesse ver os três ingleses saltitando lá no palco. Aliás, “conforto” foi um conceito pra lá de abstrato para quem sentiu in loco a opressão da sociedade na noite de sábado. No meio da muvuca no gramado do Maracanã, senti saudades dos shows dos Rolling Stones no Pacaembu, do R.E.M. no Rock in Rio III e do U2 no Morumbi, porque neles havia espaço pra poder pular e dançar, ao contrário da lata de sardinha humana que foi armada pelos (des)organizadores do show do Police.
Pessoas atravancando as ruas com suas sacolas de compras, cumprimentos de gente que mal se importa com você, ou falando em fraternidade e solidariedade em um único e solitário dia do ano. Gostaria de reencontrar minhas crenças no tal Espírito Natalino, que acabou sendo relegado ao fundo do fundo do fundo do saco de um Papai Noel hipotético no qual jamais acreditei de verdade. Mas é difícil ressuscitar crenças enterradas, ainda mais sendo soterrado por propagandas que incitam ao consumismo estéril.
O fato é que o Natal se tornou uma comemoração desenraizada das suas origens. A maioria das pessoas sabe apenas en passant que a data surgiu por causa do nascimento de Jesus Cristo. E se alguém vier me dizer que esta é uma época em que a bondade brota subitamente dos corações humanos, depois de testemunhar in loco 364 dias de esmolas recusadas e vidros fechados nas esquinas das metrópoles, provavelmente serei obrigado a refrear meu sorriso irônico.
Sinto falta dos tempos em que eu via na TVS (atual SBT) o desenho da Rena do Nariz Vermelho, e via o Natal com olhos mais ingênuos e generosos. E detestaria ver as crianças de hoje perderem essa visão mais esperançosa sobre o mundo e a humanidade.
Quando fui convidado pelo Jacaré Banguela para ajudar na divulgação da campanha Papai Noel dos Correios, fiquei realmente comovido com o projeto. Para quem não sabe a que me refiro, é o seguinte: todos os anos os Correios recebem inúmeras cartas endereçadas a Papai Noel. A proposta desse projeto é a seguinte: você vai até uma agência, “adota” uma dessas cartas e compra o presente pedido pela criança. Depois, é só retornar ao correio, que se responsabilizará pela entrega. Você pode ler as cartinhas disponíveis na agência (importante: nem todas as agências participam desse projeto, clique aqui para informar-se sobre qual é a mais próxima da sua região), a fim de escolher qual presente dará. Ou seja: se seu décimo-terceiro salário já foi pras cucuias, você pode optar por escolher uma carta com um presente menos oneroso.
Na agência em que fui encontrei várias cartas comoventes, de crianças solicitando cadernos e lápis para usá-los como material escolar, ou cestas básicas para ajudar a família. Foi com prazer, pois, que topei o pedido do Fred e do Rodrigo do JB. Só esses caras mesmo pra conseguirem me convencer a exibir meu rostinho japaraguaio.
Fica aqui a minha recomendação: participe dessa campanha. Mas não porque você quer deixar sua consciência mais leve ou acredita que o Natal é uma, hmm, época “mágica”. Penso que adotar uma dessas cartas é como dar um voto de fé na humanidade. Em tempos nos quais é cada vez mais comum ver jovens depredando escolas ou alienando-se do resto do mundo, creio que ajudar uma criança a sonhar, sorrir e acreditar que coisas boas acontecem cotidianamente neste planeta é uma das ações mais importantes que você pode fazer pelo bem do lugar onde você mora.
A seguir, um post dedicado a você que está cansado de dançar na conotação mais negativa da palavra. Esta é uma breve compilação das coreografias mais toscas que já vi na vida, e que farão com que você se anime a buscar seu Fred Astaire (ou Ginger Rogers) interior.
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8. Talvez a melhor cena de Hitch - Conselheiro Amoroso, comédia romântica dirigida por Andy Tennant em 2005, seja a seqüência em que o encalhado gordinho interpretado por Kevin James prova para o personagem de Will Smith que brancos definitivamente não sabem dançar. A performance de Kevin gingando ao som de “Yeah!”, de Usher, descrevendo movimentos como “acendendo a fogueira” ou “fazendo a pizza”, é impagável.
TV digital com a mesma programação medíocre de sempre? Essa história toda me fez lembrar de um tio que se recusava a usar óculos recorrendo ao seguinte argumento: “Por que desejaria enxergar melhor esse mundo horroroso lá fora?”.
Michel Gondry é conhecido por muitos como o diretor de Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças, mas o fato é que ele também é o maior diretor de clipes de todos os tempos. O vídeo de “Sugar Water”, do Cibo Matto, uma tour de force composto por dois planos-seqüência sem cortes que se entrecruzam no meio da narrativa, é uma prova bem convincente do que afirmo.
Há uma semana estou fazendo a tal dieta dos carboidratos, que, diga-se de passagem, não recomendo a absolutamente ninguém. Após sete dias sem comer arroz, feijão, batata, pães e massas, eis o saldo: perdi três quilos e a minha alegria de viver.
Ainda sobre o tal regime, outro dia a Aninha me perguntou: “essa dieta não te dá fome?”. Respondi: “Não. Só desgosto”.
Você conhece a obra de José Luiz Benício, artista gráfico que ilustrou os cartazes de 31 filmes dos Trapalhões, diversas pornochanchadas (dentre elas O Bem Dotado - o Homem de Itu, Histórias que Nossas Babás Não Contavam e Os Garotos Virgens de Ipanema) e outros filmes renomados como Dona Flor e Seus Dois Maridos e Independência ou Morte? Se a resposta for negativa, recomendo fortemente que você confira meu texto no Nokia Trends. ;)
Devo um agradecimento a Nelson Moraes. Ou melhor, dois. O primeiro, por ter me indicado um artigo no Overmundo que me inspirou a escrever sobre J.L. Benício, o Norman Rockwell brasileiro. E o segundo, por ter publicado em seu blog “Sax, Flauta e Cavaquinho”, um conto ge-ni-al que integra o livro Blog de Papel, do qual participei com o texto “Bons Amigos”.
Você já conhece o BlogAID, iniciativa de André Luis Suaide que no dia 22 de dezembro irá ao Centro Comunitário e Creche Sinhazinha Meirelles doar alimentos não perecíveis e brinquedos às crianças do local? Se está naquela fase complicada de escolher os presentes de Natal para amigos e parentes, que tal conferir as belas opções do Papel de Pão, blog do fotógrafo Sergio Fonseca? Já viu o Curitibocas, blog do livro que será lançado no dia 7 de dezembro, reunindo personalidades e figuras folclóricas da cidade de Curitiba?
Gostaria de sofrer de uma amnésia controlada, que me fizesse esquecer de certos livros e filmes. Algum artifício prodigioso, que me permitisse assistir a Casablanca sem saber o que vai acontecer no final. Ou ler Cem Anos de Solidão e me deslumbrar da mesma maneira que da primeira vez. Ou gargalhar com uma gag dos Irmãos Marx ou de Woody Allen com prazer sempre renovado. Ou ser surpreendido, punch no estômago, com o assassinato no chuveiro de Psicose, a revelação da identidade de Keyser Soze em Os Suspeitos, o turning point em Um Corpo que Cai. Que me permitisse sentir novamente o orgasmo literário de quando li pela primeira vez O Jogo da Amarelinha de Cortázar, romance que me obrigou a soltar um impropério escandaloso no meio da biblioteca do Bandeirantes: “- Porra, quero escrever que nem esse filho da puta!“.
Qualquer torcedor sofredor (expressão pleonástica) sabe que futebol é uma caixinha de Pandora. Já está, portanto, acostumado a desdobrar cada fibra cardíaca até os 46 minutos do segundo tempo. Está calejado a ouvir as gozações das torcidas adversárias e de amar incondicionalmente o seu time, apesar de nem sempre esse sentimento ser devidamente correspondido. A expressão “amar é sofrer” nunca faz tanto sentido como quando é utilizada no contexto ludopédico.
O Sport Club Corinthians Paulista já amargou 22 anos e oito meses sem um título sequer, de 1954 a 1977. Já foi apelidado, em 1961, de “Faz-Me Rir”, nome de um bolero gravado por Edith Veiga, devido à péssima campanha no Campeonato Paulista daquele ano. Foi o último colocado da Copa União de 1987, quando só não foi rebaixado porque não houve rebaixamento naquele ano, ganhando o apelido de “Ultimão”. Já teve no elenco jogadores do naipe de Embu (mais lembrado pelas constantes homenagens que a Fiel lhe prestou, em coros com rimas óbvias), Baré, Guinei, Dema e Jacenir, sendo que em 1996 seus atacantes foram Alcindo, Alex Rossi, Marcus Alemão, Caju e o sul-africano Mark Williams. Ou seja, quando torcedores corintianos se autodenominam como “maloqueiros e sofredores”, eles afirmam isso com conhecimento de causa. Ainda assim, creio que ninguém estava preparado para o baque da tarde de domingo.
Em um ano no qual o Corinthians apareceu nos noticiários policiais quase tanto quanto nos cadernos de esportes, graças aos escândalos protagonizados por Alberto Dualib, Boris Berezovski, Kia Joorabchian, Nesi Curi e outros craques da maracutaia extracampo, não diria que o rebaixamento para a Segunda Divisão é o mais amargo capítulo de toda a sua história. Outros grandes times do futebol brasileiro como Palmeiras, Grêmio, Atlético Mineiro e Botafogo do Rio já passaram por esse perrengue. Do mesmo modo, grandes equipes do futebol europeu como Atlético de Madri e Juventus foram rebaixadas nos últimos anos e sobreviveram ao calvário da Série B. Nada mais natural: em tempos nos quais os campeonatos são cada vez mais competitivos e as equipes mais niveladas, nenhum torcedor pode imaginar que seu time jamais passará por um rebaixamento.
Eu me solidarizo com o sofrimento vivido pelos corintianos (e também pelos torcedores do Paraná, Juventude e América de Natal) porque sei bem, muito mais do que gostaria, o que é penar por causa de futebol. Em novembro de 2006, escrevi um texto intitulado Masoquista Ludopedico (des)motivado por mais um golpe no coração desferido pelo meu time, o Guarani Futebol Clube. Para aqueles que não ligam para o esporte bretão ou não entendem o porquê de tanta comoção, deixo aqui a famosa frase cunhada por Bill Shankly, ex-treinador do Liverpool, que sintetiza bem a natureza do amor nem sempre correspondido dos torcedores por seus times: “Futebol não é uma questão de vida ou de morte. É muito mais importante que isso”.
Alexandre Inagaki é jornalista e consultor de comunicação em mídias digitais. É japaraguaio, cínico cênico. torcedor do Guarani Futebol Clube e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos. Já plantou semente de feijão em algodão, criou um tamagotchi (que acabou morrendo de fome) e mantém este blog. Luta para ser considerado mais do que um rosto bonitinho e não leva a sério pessoas que falam de si mesmas na terceira pessoa.