Trilha sonora para 1 minuto de silêncio
Por Alexandre Inagaki ≈ quinta-feira, 16 de agosto de 2007
O polêmico movimento “Cansei” programou para amanhã, dia 17 de agosto, o grande marco de seu protesto. Um minuto de silêncio pelo Brasil, em frente a dois locais: a Catedral da Sé, em São Paulo, e o Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, às 13 horas. Embora o movimento tenha sido encampado por associações como OAB e FIESP, acusações de uso político minaram a credibilidade do ato, prejudicada também pela declaração dada por um dos principais apoiadores do “Cansei”: Paulo Zottolo, presidente da Philips na América Latina. Afirmou o empresário, ao melhor estilo Mr. Manson: “Não se pode pensar que o país é um Piauí, no sentido de que tanto faz quanto tanto fez. Se o Piauí deixar de existir ninguém vai ficar chateado”. Haja gerenciamento de crise para o setor de relações públicas da Philips em Teresina…
Mas enfim: tergiverso, tergiverso. O motivo deste post, na verdade, é aproveitar o minuto de silêncio desta sexta-feira para falar de uma composição musical que seria a trilha sonora ideal deste movimento de protesto: 4’33″, de John Cage. Uma peça composta para qualquer instrumento, com um singelo detalhe: o músico não deve executar absolutamente nenhuma nota durante toda a apresentação. Veja (e ouça) para crer.
Os aplausos entusiasmados da platéia após apreciar 4 minutos e 33 segundos vendo uma orquestra inteira de braços cruzados são, no mínimo, inusitados. O apresentador do programa, Tommy Pearson, não deixa por menos, definindo a performance da Orquestra Sinfônica da BBC como uma das mais extraordinárias que ele já testemunhou em toda a sua vida. Nada mal, huh?
Porém, equivoca-se quem pensa que a peça resume-se a silêncio: segundo a concepção de John Cage, 4’33” é uma composição dividida em três movimentos que engloba todos os ruídos casuais provocados por músicos e espectadores: tosses, rangidos de cadeiras, sussurros, o ruído do papel das partituras sendo folheado. 4’33” é, portanto, uma peça única. Afinal de contas, a cada vez que é executada, os sons ambientes fazem daquela execução uma “música” diferente. Portanto, se você não ouviu nada durante a interpretação da Orquestra Sinfônica da BBC, saiba que seu ouvido musical não é nada refinado!
Vale lembrar também do caso de plágio envolvendo esta composição de John Cage. Em 2002 o músico Mike Batt gravou, em um álbum de sua banda The Planets, uma canção intitulada “A One Minute Silence”. Que, conforme explica seu nome, é totalmente silenciosa. Os administradores dos direitos autorais de John Cage, falecido em 1992, processaram Mike, que acabou concordando em pagar uma soma de aproximadamente 100 mil libras esterlinas pelo plágio de 4’33”. No entanto, Mike Batt tratou de defender a sua obra: “Minha peça de silêncio é muito melhor. Fui capaz de dizer em apenas um minuto o que Cage teve de expressar em quatro minutos e 33 segundos“.
P.S. 1: Outra composição de John Cage que vale a pena ser conhecida (ou não) é “As Slow As Possible” (“Tão Lento Quanto Possível”). Originalmente concebida como uma peça para piano com 20 minutos de duração, “As Slow As Possible” está sendo executada desde o dia 5 de setembro de 2001 em um órgão em uma igreja em Halberstadt, Alemanha. A intenção dos organizadores desta singela performance é de que essa interpretação dure exatos… 639 anos. :crazy: Portanto, se você perdeu o começo do espetáculo, ainda terá um tempinho para poder acompanhar o resto da performance…
P.S. 2: O controvertido blog Tô Cansadinho declarou apoio ao Estadão em sua polêmica campanha publicitária. Que acabou repercutindo até no exterior, vide estes posts do Global Voices Online e Boing Boing. Brasil-il-il!
P.S. 3: Gostou do widget de vídeos do WeShow que este blog passa a estampar a partir de hoje? Então pegue o seu aqui.
Alexandre Inagaki
Alexandre Inagaki é jornalista, consultor de projetos de comunicação digital, japaraguaio, cínico cênico, poeta bissexto, air drummer, fã de Cortázar, Cabral, Mizoguchi, Gaiman e Hitchcock, torcedor do Guarani Futebol Clube, leonino e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos, não necessariamente nesta ordem.
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