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085
22 de dezembro de 2002
mundo

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n e s t a  e d i ç ã o:
 
nenhum sentido
 
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editorial
ricardo sabbag  [email protected]
  
CENA 1 - NA FESTA
 
Me veja dois drinques, com a sua licença. Como assim licença, e precisa de licença para pedir drinques? Me refiro à licença para ver-se drinques, quer dizer, para que você forneça drinques a alguém é de se imaginar que precise de licença, ou seja, sem licença ver drinques seria uma coisa ilegal. Não tenho esse tipo de licença, mas acho que, depois do que você disse, vou pedir licença para conseguir licença para ver drinques. Mas deixe isso de lado, se você não tem licença, peço licença para que você me veja, por obséquio, dois drinques. Mas mesmo assim sem licença? É, sem licença, mas isso se você me der licença. Ok, licença concedida, então. Então você, com licença, poderia me ver dois drinques?
 
CENA 2 - NO AEROPORTO
 
Gostaria de uma passagem para o Kazaquistão, por gentileza. Sinto muito, senhor, não vendemos passagem para o Kazaquistão. Como assim, vocês têm algum tipo de preconceito em relação ao Kazaquistão? Absolutamente, senhor, apenas não vendemos passagem para o Kazaquistão. Certo, me veja uma para o Turcomenistão, então. Impossível, senhor, tampouco vendemos bilhetes para o Turcomenistão. Isso sim é uma vergonha, minha senhora, impedir as pessoas de irem até o Kazaquistão ou o Turcomenistão, isso é uma vergonha, está na constituição que deveríamos ir e vir ao Kazaquistão ou ao Turcomenistão, não que eu alguma vez tenha tido vontade de ir ao Afeganistão ou ao Paquistão, até porque veja a senhora como andam as coisas por lá, mas ir e vir ao Kazaquistão ou até mesmo o Turcomenistão nada mais é do que nosso direito conquistado, senhora. Mas, senhor, veja só, nossa companhia aérea não tem linhas que levem até o Kazaquistão ou ao Turcomenistão, o senhor deveria procurar outra empresa que possa satisfazer suas necessidades, quer o senhor queira ir ao Kazaquistão, ao Turcomenistão, ao Afeganistão ou ao Paquistão. Mas e vocês vendem passagens para onde, afinal de contas. Apenas para o Usbequistão, senhor. Ótimo, que seja, então.
 
CENA 3 - NO INCÊNDIO
 
Abram alas!, Abram alas!, Abram alas! Ô abre alas que eu quero passar, lerê lerê. Não brinca com isso, que a casa está pegando fogo! É verdade, quando casas pegam fogo a gente não deve brincar. É, em respeito às pessoas cuja casa está em chamas ou se queimaram ou ambos. Ambos?, não, isso é impossível. Não há nada de impossível nisso, pense bem: se sua casa pega fogo é provável que, primeiro, todos seus móveis sejam destruídos, e, segundo, que alguém se fira com as labaredas. Fira?, é engraçado, afinal, você sabia que, em inglês, fogo é fire? Mas é claro que eu sabia, mas o que diabos isso tem a ver com o incêndio? Ah, fogo, fire, fira, quem se fira, mesmo? Nada disso, quem se fere. Mas você falou fira, assim mesmo. Sim, mas eu disse "mesmo que alguém se fira", do verbo ferir. Mas o que isso tem a ver com o incêndio? Nada, só acho que não é adequado para esses momentos você ficar discutindo, fogo, fire ou fira. Que droga. Não reclame, estamos quase chegando. Mas já? É, falta pouco. Abram alas!, Abram alas!, Abram alas!. ô-ô, tudo pegou fogo.
 
CENA 4 - NO CAMPO DE BATALHA
 
.... Sargento, permita lhe falar. Sim, soldado? Esse silêncio... O que tem, soldado? Isso é normal? Absolutamente, soldado. Absolutamente sim ou não? Não. Foi o que imaginei. Não. Não? Não se deve imaginar esse tipo de coisa durante a guerra. Sim senhor. Ótimo. Sargento, permita lhe falar. Pois não? Por que não se pode imaginar essas coisas durante a guerra? Simplesmente porque faremos barulho e alertaremos o inimigo de nossa presença, soldado. Ah, sim, sargento. POW. Sargento... ... Sargento? Gmoweonfonornwoowoouuuu. Sargento, o que isso significa? AuuuuauuuuAuuuuuAuuuuUUUU. Não lhe compreendo, sargento. Ieieieieieieiuuuuuuu. Sargento, por que o senhor está falando assim se agora mesmo me disse sobre a importância de mantermos o silêncio senão o inimigo poderá descobrir o nosso parad... auauauueueuerofofofooiilululuUUU. EieieieiejojososksoksqwiwiwjjuuuuUUU.
    
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minha vida - parte CXXVIII
ricardo ramos leite   [email protected]
 
Ao completar 13 anos ganhei, como presente de meus pais, uma varinha mágica, cujos poderes, se bem utilizados, poderia salvar o mundo da destruição certa que seria causada pelo meteoro que se aproximava. Confesso que fui egoísta em deixar a salvação do mundo a cargo dos Super Gêmeos e do Capitão Carne-de-Salsicha-Enlatada, enquanto usava meu novo brinquedo mágico para assustar e colorir os lagartos falantes que tomavam banho de sol no clube perto de casa.

Alguns meses depois fui expulso da escola, pois usei minha varinha para transformar meu professor de esperanto em um esqueleto de cavalo voador capaz de lançar mísseis megatômicos. Era um terrível problema, ser expulso da escola, mas não há nada que viagens no tempo não resolvam. Exceto pelo problema de eu não ter uma máquina do tempo. Minha tristeza durou pouco, pois uma versão minha vinda do futuro apareceu-me durante a noite, e entregou-me um manual que explicava como se poderia construir uma máquina do tempo com coisas que eu encontrava em casa. O único pedido que me foi feito era que eu precisava construir a máquina do tempo, e antes de usá-la, voltar ao passado, e entregar esse manual a mim mesmo.

Não preciso dizer que fui novamente egoísta. Eu queria aquele manual só para mim, não queria entregá-lo a mais ninguém, nem mesmo a mim mesmo. Opa, cacofonia. De repente o universo começou a ruir, devido ao paradoxo temporal causado por mim mesmo, mesmo, mesmo. Tudo começou a tremer, e o teto caiu sobre mim, fazendo-me desmaiar. Quando acordei, estava num mundo frio, porém belo, governado por macacos alados dançantes, que misturam mentiras com verdades para causar caos e desordem. Perguntei aos macacos se eles poderiam me ajudar, e um deles olhou para mim e respondeu: "Quem sabe?"

Milhares de anos se passaram. Hoje moro em Londres, não tem braços nem pernas, e trabalho como domador de feras num escritório de advocacia chamado "Jackie Chan - Advogados em Kung-fu".
 
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always titleless
ione moraes  [email protected]
 
Andava pela rua para catar pedrinhas de gelo depois da chuva forte e dizia que era para regar as plantas quando fizesse muito calor. Era um carinho. Se um suco precisava de gelo, as flores também poderiam gostar, como a sua boca gostava. Abaixou-se, abriu um saquinho de suco e despejou o conteúdo no meio-fio. Pronto. A água ficou escura, cor de casca de jaboticabas. Dobrou um jornal que trazia dentro da bolsa, cuidadosamente. Primeiro, um chapéu. Para quando o sol viesse, de rachar coco. Depois, um avião. Um teco-teco, aviãozinho simples, com barulho. Gostava de barulho de avião.
 
Com ele, voaria rasante sobre as águas jaboticabosas. Até chegar num pote, somewhere over the rainbow. Desceria do avião, vestiria um macacão anti-fogo e entraria no caldeirão, mesmo que fosse pequenino, ela conseguiria entrar. Ao menos colocaria o pé para dentro.  Cheio de sundae. Droga, droga, droga, o sorvete conseguiu entrar macacão adentro.
 
Tira uma banana do bolso, mas joga fora. Dá ao macacão uma bexiga, que o macacão enche, feliz. Depois sai voando. Ainda dá tempo dela se segurar no dedo do pé do símio. Está tudo muito grande, lá em cima, visto pelo periscópio. Junta-se uma pequena multidão, que acena e grita: cuidado com o navio! O seu submarino vai bater! Perde a cabeça, alguém segura, com cuidado. Ri, até doer a barriga. Que gostoso é perder a cabeça. E de lá de cima, caem jaboticabas e bolinhas de gude que as crianças engolem, com igual prazer.
    
 
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uma história para incomodar muita gente
pedro vitiello  [email protected]
 
Sim, eu sou um elefante. Tenho duas trombas, 4 joelhos e uma excelente memória. Por causa disso (da boa memória, não dos quatro joelhos) fui contratado para ser bibliotecário aqui do zoológico, onde tenho papel e caneta à disposição. Sabe como é, a gente fica preso aqui e trabalhos deste tipo são uma espécie de serviço de reabilitação social. Um dia, se eu conseguisse ser solto por bom comportamento, teria na minha ficha que trabalhava aqui, o que podia me ajudar um pouco. Até hoje não consegui tirar carteira de trabalho por falta de foto (maldita cabine automática).
 
E você deve estar se perguntando o que um cara como eu fiz para merecer essa vida, sub-humana: há muito tempo atrás eu fui acusado injustamente de um crime que não cometi na cidade grande. Ainda tive de ouvir o engraçadissimo delegado dizer que não importava pois eu tinha "cara de trombadão" e me enjaulou assim, sem mais nem menos. O verdadeiro assaltante era pequeno, quadrado e verde, igual a um dropes de hortelã, mas eles por puro preconceito, procuraram a mim, mesmo. A acusação era ter roubado uma loja de conveniência (tinham achado umas pegadas na pizza).
 
Por razões óbvias, nós elefantes não somos lá muito bem recebidos na sociedade humana. Meu psicanalista sugeriu que fosse perseguição minha por causa de uma tal "inveja peniana", mas o fato é que aquela coisa que os humanos tem entre as pernas nem serve para pegar amendoim. Humpft! "Inveja Fálica" é o caralho!
 
De qualquer forma, após minha prisão fui obrigado a ouvir mais e mais gracinhas, enquanto me privavam de direitos, tal como "não precisa cartão, liga pro seu advogado de um orelhão" ou a ridícula tentativa de me intimidar ao não me deixarem vender meu fusca para pagar minha fiança (É um bom carro, cabendo eu e mais quatro de meus familiares dentro, se devidamente distribuídos, dois na frente e três atrás). Ia vender para uma colega girafa, que ia instalar um teto solar e tudo (ia ficar bacaninha), mas necas.
 
Às vezes acho que é para nos intimidar. Nós elefantes, como todos sabem, fomos criados à imagem do deus Ganesha, o único e verdadeiro, e há entre os humanos uma tentativa pífia de provar o contrário.
 
Falar nisso, já contei que vou fundar uma igreja? A "Mar-Fim dos Dias", uma igreja apocalíptica, centrada em questões como o grande êxodo que ocorrera de todos os elefantes no fim do mundo, e onde os puros elefantes de coração terão um paraíso regado a amendoim e água. Às vezes sinto que Deus é um escritor amador com idéias absurdas e bizarro senso de humor conosco, elefantes, mas este é um pensamento impuro e devo manter a minha fé.
 
Só estou escrevendo esta nota porque resolvi fugir hoje de noite. Agravaram minha pena e não tenho mais esperanças. O motivo é que me revoltei ao me imporem algo contra minhas crenças religiosas! Fui obrigado a usar um par de tênis...BRANCOS! E nós elefantes não usamos tênis branco PORQUE O MALDITO TÊNIS BRANCO SUJA MUITO FÁCIL!! E o diretor daqui, que enriqueceu às minhas custas? Sonhou comigo e jogou na borboleta, faturando uma bolada e nem para dividir! Mas não nos exaltemos mais.
 
Todas as providências foram tomadas para evitar minha fuga: Esmaltes vermelhos, que permitiriam uma ardilosa camuflagem em uma plantação de amoras foram proibidos. Todos os envelopes, com ou sem selo, são checados diariamente ao saírem (mesmo se tiver um selo), e, imaginem, até um nó em meu rabo foi dado, de modo a impedir minha passagem pela fechadura. Mas hoje iremos ao clube de recreação e me esconderei na piscina, debaixo da água.
 
Adeus!
 
- Nota em jornal dias depois:
 
Tentativa fantástica de fuga de Paquiderme fracassa
 
Elefante cumprindo pena por assalto foi pego tentando se esconder em piscina de clube de campo para detentos zoológicos. Ele permaneceu por horas com apenas a tromba fora d'água e só foi encontrado graças a um par de chinelos redondos encontrados na borda. O zelador afirma não ter notado imediatamenmte a tentativa de fuga pois o animal teria entrado sem derramar água (pela escada, bem devagarinho).
 
Pela tentativa de fuga o zoológico resolveu enforcar o meliante em um galho de salgueiro, o que resultou em uma árvore a menos na face da terra.
 
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esta edição está cheia de textos inúteis
josé vicente   [email protected]
 
Escrever um texto nonsense é inútil. E isto porque sentido há em tudo, mesmo e especialmente quando procuramos escondê-lo atrás de camadas e camadas de frases desconexas. A saída do texto nonsense é o humor. Se não for engraçado, nenhuma utilidade terá. Engraçado, já não é um texto nonsense, mas um conto ou uma crônica humorística.
 
O parágrafo anterior é apenas parcialmente verdadeiro. É que existe um uma intenção subterrânea em alguns dos melhores textos sem sentido. Querem dizer que o mundo às vezes perde seu fiapo de racionalidade e descamba para a pura eventualidade. Que as coisas repentinamente enlouquecem e nada se pode fazer. (Qual outro motivo para os koans? E há um texto do misticismo judaico cujo objetivo é causar uma pane nos laços da razoabilidade e abrir frestas no edifício da razão. Mas a razão é boa companheira. Afirmá-la relativa não a torna desnecessária ou nociva. O burocrata da razão e o demente da desrazão são duas extremidades da mesma viagem redonda.) O fato de a vida às vezes perder o sentido pode ser demonstrado, com excelente literatura, pela sua própria história pessoal. Se ela ainda não o fez, não se preocupe: amanhã ou depois o fará.

Contraditórios em si mesmos ou comprovando o que já se sabe desde quando se aprendeu na carne, textos nonsense importam pouco. Mal comum ao surrealismo, de quem o nonsense é filho dileto: possuindo valor artístico, já não é espontâneo; verdadeiramente espontâneo, se isso for possível (não é), torna-se murmúrio incognoscível de utilidade apenas terapêutica. Aliás, diga-se que a psicologia nunca dirá a verdade sobre a arte, porque é a arte que detém a verdade sobre a psicologia. Freud comentou sobre o empresário picareta Salvador Dali: "O que me interessa nele é sua intencionalidade."

E são por estas razões que os textos nonsense, conquanto inúteis, estão carregados de sentido.
 
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primeiro de novembro
natygirl  [email protected]
 
tudo muito cinza.

mãos nos bolsos da capa, que estava folgada porque ela tinha emagrecido horrores, guarda-chuva nenhum. o cabelo ia meio bagunçado e arrepiado, por causa da umidade, olhando para o chão. nunca conseguia ficar penteada, principalmente em dias de chuva. passos curtos. passou embaixo de uma árvore chorona, e um pingo caiu entre os seios, por dentro do decote. um dia já haviam pingado nas lentes dos óculos, e ela via o mundo divertidamente molhado.

a vida pesava mais que a bolsa. o corpo era novinho, mas as idéias já estavam dobrando o cabo da boa esperança. não que estivessem ficando antiquadas, mas a idade delas crescia 5 anos a cada aniversário. e isso não era bom. ela não queria tantas lembranças. na verdade, queria dormir de novo, atravessada sobre a barriga do pai, sonhando com coisas fofas, feito gatinhos e elefantes cor-de-rosa.

abriu a porta, entrou. uma volta na chave. parou em frente ao espelho e olhou o rastro molhado do pingo por dentro da blusa. fechou os olhos e desejou muito não ter mais seios. ficou assim um pouco, até sentir que a capa parecia maior ainda do que já era. abriu os olhos.

procurou as mãos dentro das mangas. de repente tinham ficado compridas demais. tirou aquele pano todo de cima de si, e descalçou os sapatos. achou o cabelo mais claro, e olhou de novo para os seios. desabotoou o resto da roupa, devagar, e viu que eles quase não estavam mais lá. o quadril estreitou, e ao sentar-se na cama os pés já não tocavam o chão. devia estar calçando 33 a essas alturas. tinha prova de matemática. foi até o banheiro e estava lourinha de novo, com aqueles cachos descabelados de quando estava no jardim de infância. media quase um metro de altura, ou cinco azulejos!

onde estava mesmo a boneca? as panelas em cima do fogão eram muito grandes para brincar de casinha, e já não conseguia mais entender aqueles rabiscos pretos nos livros. porque é que fazem livros sem figuras? queria tomar banho de chuva. achou que estava ouvindo sua caixinha de música, que tocava Brahms.

correu para a porta antes que não alcançasse mais a fechadura, e girou a chave. passos curtos. da varanda para a alameda no meio da vila. cadê minha avó? da alameda para o portão. engatinhou para a rua e sumiu, entre vagidos, no rumo das nuvens.

dia de todos os santos. tudo muito cinza...
     
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meu ursinho de pelúcia
soul jacker  www.cacofonia.com.br

A luz azul que vinha do fundo do túnel parecia não lhe despertar interesse nem sentimento algum. Era apenas uma luz. Ele, ali deitado, naquele chão de pedra úmido, que no entanto parecia-lhe tão confortável. Não se movia, apenas ouvia o gotejar que vinha de algum lugar distante. Ping, ping, ping. Havia essa voz, que ficava bem dentro de sua cabeça e que constantemente vinha lhe dizer coisas. À cada dia, a freqüência com que ela aparecia lhe deixava mais assustado. Ping, ping, ping. Ela lhe dizia para sair dali. Lhe dizia coisas que ele não queria ouvir. Ping, ping, ping. Lhe dizia parar andar até a luz. Que já não era certo ficar ali parado.Ping, ping, ping. Mas ele não queria. Não obedeceu. Ficou ali, deitado, abraçado ao seu pequeno urso de pelúcia, apertando-o contra o peito com toda sua força. Gostava do seu urso, ele era um bom amigo, sempre lhe dava bons conselhos. "Grrraau, grrraau", dizia o urso quando ele estava triste, e isso o fazia sorrir. "Grrraau, grrraau", grunhia o urso quando ele estava amargurado, e isso o acalmava. "Grrraau, grrraau" fazia o urso quando ele não tinha mais esperanças, e isso fazia florescer em seu peito um pomar de novos caminhos. E ele dormia tranqüilo, grudado em seu urso. E não sonhava.Ping, ping, ping. Mas um dia ele acordou e o urso não estava em seus braços. Ping, ping, ping. Tateou na escuridão, desesperado, e só encontrou espinhos e cacos de viro. Ping, ping, ping. Depois de horas, com as mãos sangrando, ele finalmente concluiu que seu urso tinha ido. O havia abandonado. Ping, ping, ping. Encolheu-se e abraçou a si mesmo. Chorou, porque sabia que agora estava sozinho. Ping, ping, ping. Chorou, porque sabia que a voz iria voltar e que não teria ninguém para lhe defender. Ninguém para lhe dar novas esperanças. Ninguém para lhe consolar. Ping, ping, ping. Chorou por dias, talvez meses. Ping, ping, ping. E durante todo esse tempo a voz veio, cada vez mais, até que um dia ela tornou-se insuportável e ele se moveu. Rastejou em direção à luz azul. O caminho era molhado, sujo e mal cheiroso. Seus joelhos se esfolaram até a carne viva. As palmas de suas mãos eram puro sangue. Suas unhas doíam. Ele suava. Ping, ping, ping. Aproximou-se da luz, e nela encontrou um livro. Um livro grande, de capa dura. Ao lado do livro havia uma caneta bic cor preta. Examinou o livro. Abriu. Folheou-o e não encontro sequer um rabisco, nada escrito. Todas as páginas em branco. Ping, ping, ping. Sentou-se no chão frio, apoiou o livro sobre as coxas nuas, pegou a caneta e começou a escrever ali o seu futuro.
 
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c r é d i t o s   f i n a i s
 
poeiras em alto mar
Ricardo Sabbag > [email protected]
Alexandre Inagaki > [email protected]
Orlando Tosetto Junior > [email protected]
José Vicente > [email protected]
Ione Moraes > [email protected]
   
a volta dos que não foram
Natygirl >  [email protected]
Pedro Vitiello > [email protected]
Ricardo Ramos Leite > [email protected]
Soul Jacker >   www.cacofonia.com.br
 
   
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p. s.
 
sabbag: não nos joguem a pá de cal na cara.