SpamZine_________________
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25 de novembro de 2002
são paulo  rio de janeiro  florianópolis  pasárgada  sítio do pica-pau amarelo  shangri-lá

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n e s t a  e d i ç ã o:
 
holerite, tcc e finitude - nova promoção conrad - mais minicontos - apocalípticos desintegrados - a prancha possuída - sorrisos de ontem - ars insana - garoto juca jr. além do infinito - spam cine strikes back - festa enloucrescendo
 
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editorial
alexandre inagaki  http://inagaki.blogger.com.br
 
Antes de mais nada, preciso informá-los que eu não deveria estar aqui. Na condição de editor-tampão, cá estou ocupando a vaga de monsieur Sabbag, que devido a compromissos profissionais teve que declinar do comando desta edição. Vou ter que descontar o dia de hoje do seu contracheque, mizifio.
 
A propósito, o que em alguns estados é chamado de "contracheque" (ou seja, aquele demonstrativo de todos os créditos, bônus e descontos do seu salário, que faz você cair em depressão logo depois de abri-lo), é chamado aqui em São Paulo de "holerite". Na época em que trabalhava como gerente na Blockbuster, lembro da ocasião em que treinei alguns funcionários para a loja que seria inaugurada em Ipanema. Quando perguntei a um dos cariocas se ele tinha recebido o holerite, ele me respondeu:
 
- Ainda não, meus olhos tão legais. Ih, a galera andou pegando conjuntivite?
 
Ah, esses dialetos regionais.
 
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Até que seria bom se eu tivesse o que descontar do Sabbag. Mas o fato é que o Spam Zine é um projeto levado à base de idealismo e camaradagem. Fora alguns livros e revistas, nunca ganhei nada com o SZ. Ao contrário, gasto dinheiro com a manutenção do domínio e eventuais despesas com correio e telefone. Mas tá tudo zen. Nestes dois anos e nove meses de circulação do Spam, todos os feedbacks, e-mails recebidos e pessoas que conheci graças ao Zildo compensam nosso trabalho. Especialmente quando recebo mensagens como a do leitor Luis Gustavo Meneghim, que arregimentou 20 novos assinantes para o Spam Zine só nesta semana (taí um bom exemplo a ser seguido, he he).
 
Outro retorno pra lá de bacana chegou à nossa caixa postal esta semana, por conta da Mônica Borges Klafke, webwriter da Unisinos de São Leopoldo, RS, que nos enviou cópia de seu trabalho de conclusão do curso de Jornalismo, intitulado "Spam Zine: Estudo de Caso do Processo de Comunicação de um E-zine". Quem poderia dizer que um dia um projeto descompromissado como o SZ viraria objeto de estudo em uma universidade? Valeu pelo interesse, Mônica. :)
    
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Enquanto eu selecionava, meio às pressas, os textos a serem publicados na edição de hoje, me deparei com uma colaboração da Fernanda Luft, de Florianópolis, que há pouco mais de um ano editava, ao lado do Denis Altieri (por onde anda esse cara, um estudante de Estatística de Canoas, RS, de quem não tenho mais o e-mail?), um e-zine bem legal intitulado Aquário. Infelizmente o zine durou apenas dez edições. No número de despedida, Denis escreveu o seguinte parágrafo:
 
"A homepage do fanzine será apagada e as edições passadas não serão publicadas na web, apagaremos tudo e o Aquário Zine será apenas uma lembrança que logo se dissipará, uma lição de impermanência, de que nada dura para sempre".
 
Não sei se posso concordar ipsis litteris com essas palavras. Bem ou mal, ainda tenho as edições do Aquário guardadas em meu winchester, da mesma maneira que alimento, talvez ingenuamente, a ilusão de que alguma das edições que o Spam Zine publicou até hoje perdure, de alguma maneira, nas lembranças de algum incauto leitor num futuro empoeirado por aí. Do mesmo modo que ainda guardo em meu mailbox cópias de tantos e-zines extintos: o Tijolão, o CardosOnline, o MOL, o Alfinete, o Acompa, o Insonnia, o Sábado 14, o Fora de Órbita, o Bigornas Lisérgicas, o TV EYE, o Ogden, o D-Zine...
  
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Ôpa, antes que eu me esqueça: tem NOVA PROMOÇÃO CONRAD no pedaço. Cumpadi Alexandre Linares me encaminhou dez exemplares das Teses Sobre Feuerbach escritas por Karl Marx, publicadas dentro da coleção Baderna (http://www.baderna.org). Pôsteres com estas mesmas teses foram pregadas nos muros de Paris, quando do movimento estudantil que agitou a França em maio de 1968. Vale a pena conhecê-las, principalmente agora que teremos um presidente oriundo das hostes esquerdistas, a fim de procurar compreender melhor este momento histórico. Para concorrer a um dos dez exemplares das Teses Sobre Feuerbach, basta escrever uma mensagem para [email protected] com o subject "Eu Também Sou Luther Blissett". Os dez primeiros e-mails recebidos serão contemplados com mais esta mamata Conrad/Spam Zine.
 
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E semana que vem Ricardo Sabbag promete estar de volta, comandando o Spam Zine - especial Nonsense. É isso mesmo: textos surreais, desprovidos de qualquer sentido (ou não), oriundos do inconsciente e repletos de briquebraques, trocadilhos sub-reptícios, mensagens subliminares, orelhas de pintores, teorias sobre fuscas verdazulados, gatos ronronando cantigas de Strauss em noites de lua minguante, marionetes que manipulam pessoas e o sorriso do gato de Alice. Sabbag manda avisar que colaborações devem ser encaminhadas para [email protected]. Dúvidas, carinhos e afagos também podem ser enviados por esse endereço.
 
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Os destaques da edição de hoje são: três novos minicontos cunhados pelo graaaande André Machado; a estréia de Adriana Terra, minha incauta colega de Jornalismo; as confissões da neófita em surf Indigo Girl; as elucubrações sobre arte de mais um estreante de SZ, o carioca Fernando Paiva; Ricardo Ramos Leite, naquela que pode ser a última aparição do lendário Garoto Juca Jr.; e a supracitada Fernanda Luft, discorrendo sobre cinema.
 
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Spam Zine: que seja eterno enquanto dure.
 
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minicontos do desconforto
 
- 19 -
 
Na entrada da roda-gigante, a moça perguntou: cabine balouçante ou não? Ele escolheu a primeira opção, parecia mais emocionante. Quando a trajetória da roda chegava perto do ápice, a cabine deslizava por barras de ferro estrategicamente dispostas dentro da estrutura, balançando às vezes suavemente, às vezes com violência.
 
Olhando a paisagem iluminada de cima, exposto ao vento primaveril e ao sol moribundo, recordou sua infância, em que costumava balançar-se sozinho na cama, cantarolando para pegar no sono. Eram momentos em que perdia contato com o mundo externo e se encontrava de bom grado com sua alma, embora não pudesse enxergá-la nem entender seu sorriso complacente.
 
Aconteceu a mesma coisa ali: não mais que de repente as luzes do parque sumiram e foram substituídas pelo reflexo da lua minguante no lago artificial, acompanhada de uma bela entourage de estrelas que piscavam para ele, desinibidas. Deixou-se levar e a paisagem mudou de novo. Sua alma, bem mais velha do que ele, surgiu num galeão voador e estendeu-lhe a mão. Como recusar o pedido da capitã que o comandara nas piores borrascas da existência? Tomou-lhe a mão.
 
-- Não havia um homem nesta cabine? -- perguntou a moça à colega quando a roda parou.
 
Àquela altura ele já estava no aclive inicial de uma nova montanha-russa, num parque diferente, num mundo diferente. E sua alma era jovem de novo.
 
- 20 -
 
Era outono, a melhor estação para se estar no Rio de Janeiro. Ele acordou com um raio de sol batendo em seu camisolão ensebado. Num dia como aquele, cavalgaria por quilômetros e quilômetros sem se cansar, aspirando o ar livre de umidade e recebendo na farda os generosos raios de um sol temperado, jamais furioso como entre janeiro e março.
 
"Bom, hoje não vai ser possível cavalgar", pensou. "Mas darei uma caminhada pelo centro da cidade."

Antecipava o prazer da jornada a pé quando entrou o barbeiro. Em sua mente, imaginou-se prestes a ir a um sarau, vestindo gala. Para isso, era preciso livrar-se daquele penteado demodê. Riu consigo mesmo enquanto o outro pegava a bacia e a navalha. O barbeiro não quis conversar naquela manhã. Estava com uma cara triste. Ele respeitou seu silêncio. Mesmo assim, o ágil profissional pareceu ler sua mente e raspou-lhe barba e cabeleira sem pestanejar.
 
Sentiu-se renovado. Banhou-se e vestiu-se de branco. Sorriu ao sair para o sol. Os homens o aguardavam. Postou-se diante deles e deu o primeiro passo.
 
Percebeu que ficara famoso. As ruas estavam cheias. Todos queriam vê-lo. Mas ninguém acenava. Ninguém apreciava as carícias solares como ele. Bem, fazer o quê? Seguiu adiante, admirando a beleza carioca.
 
Eles não sabiam, mas ele logo seria um homem livre, como sempre sonhara, desde os tempos de menino.
  
Muitos anos depois, nas tavernas da capital, onde se celebrava a proclamação da independência, os mais velhos lembraram o enigmático sorriso do alferes Joaquim José naquela manhã de abril de 1792.
 
- 21 -
 
Ela cutucou seu ombro de leve, olhou para ele e sorriu durante a música, dando a entender que endossava o trecho que a cantora desfiava, lânguida -- e o endossava em relação a ele, ao relacionamento distante mas íntimo que ambos levavam. Ele baixou os olhos e, se a luz permitisse, ela o teria visto enrubescer. Ele se sentiu aquecido e gratificado e quis tocar a mão da companheira, mas ela estava tão radiante que preferiu apenas olhá-la e guardar aquele momento para sempre.
 
Satisfeita, a Felicidade deixou os dois sossegados na mesa e passou para a próxima.
 
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poças de dentro (ou quando adorno olhou melhor para benjamin)
adriana terra  [email protected]
 
Andava baratinada com um monte de coisa. Tenho que falar com esse cara, e aquele, e aquele. Maldita profissão, raios. Continuava chovendo, e chovia aos colhões dos que já estavam passados - cansados. Meu entrevistado... ah!, sim, amanhã de manhã. Preciso agora estudar, aqueles frankfurtianos, ó, céus! Legais, mas peraí que eles me fazem pensar muito, e não estou com tempo pra isso atualmente.

Atualmente... atualmente lembrava do menino. O menino que gostava da minha saia, enorme, parecia ter sumido. Parecia nada, sumiu, e eu sabia. Correu atrás de mim, falou que saia linda, sorriu. Sorri de volta e, de uma forma ou de outra, disse que sim. Certa noite estavámos juntos, no outro dia eu já o chamava pela primeira sílaba do nome.

Ouvia Lou Reed, cantava no banheiro em voz alta, usava cueca preta ou vinho, fumava o cigarro que nem o Belmondo, me ria uma risada gostosa que nem parecia vinda de alguém que escrevia coisas tão tristes. Falava pouco, mas com o tempo eu conseguia entender o que se escondia no não dito que ele fazia questão de me esclarecer quando a gente se beijava, se entrelaçava e respirava tudo junto. Lia os livros mais difíceis e vestia um cachecol azul-bebê, tão estranho quanto sua cara de bobo que não sabe fazer direito. Mas eu não ligava, era daquilo que eu precisava no momento. Nunca vi cara de bobo igual. Trocamos meias palavras e lençóis no primeiro dos últimos domingos. Chorei alguma lágrima que não teve muita força para cair e acabou deixando pra uma próxima. Ele me deu um carinho, eu lhe dei uma metonímia. Passou rápido, como aquele metrô que a gente perde quando está atrasado para alguma coisa que nem sabe.

Era hora da entrevista. Os colhões continuavam a chover, e agora eu podia reconhecer - eram meus. Não deu. Ele era apocalíptico demais, não suportou apenas mais uma integrada crítica.
    
 
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confissões de uma surfadora: sobre a prancha possuída
indigo girl  http://www.jhendrix.net/indigo
 
Pranchas de surfe, assim como os potros indomados, precisam aprender quem está no comando. Este é o primeiro desafio: mantenha o controle. Não se deixe levar pelas melodias de Lulu Santos. A relação homem - prancha não é tão poética quanto pensamos. De início, a prancha irá se rebelar e você deve estar pronto para a luta. Provavelmente ela será maior que você, mais rápida, ágil e feroz. Ela possui quilhas afiadas, você, na melhor das hipóteses, unhas. Ela está parafinada e pode escapar. As chances estão contra você, mas tenha coragem.
 
A luta é sinistra pelo disparate do primeiro golpe. No meu caso, estávamos deixando o mar: água na canela. Eu a carregava debaixo do braço, bastante satisfeita com nossa performance. Caminhava despreocupada, a água tranqüila. Calculei que podia desfazer-me do lash ali mesmo. A prancha em questão era Lâmina Animal. Reconheço que não é comum dar nome às pranchas, mas como disse anteriormente, eu cultivava uma relação especial com este objeto. Quando criança eu também dava lindos nomes aos bezerros que nasciam na fazenda.
 
Repousei a prancha sobre a água e dobrei minha perna direita (minha base). Nesta época a operação de desgrudar o velcro do lash exigia que eu usasse as duas mãos. Hoje eu posso soltá-lo com dois dedos, num movimento discreto e ágil.
 
Foi neste intervalo insignificante que a prancha se rebelou. Como eu disse, eu me encontrava num estado muito sereno, de modo que mirava uma formação de nuvens. Era um fim de tarde e o céu estava pintado de um tom bonito de laranja e cor de rosa. Assim, imagine meu espanto ao me virar para retirar Lâmina da água e encontrá-la suspensa no ar: de bote armado. Lâmina mirava em direção à minha testa. Eu hesitei. Ouvira falar do primeiro duelo, mas não acreditei que fosse acontecer ali, no rasinho. Lâmina Animal estava determinada. Recuou meio metro, para pegar impulso e como uma lança, atirou-se em direção ao fundo do meu cérebro. Atirei-me ao chão e protegi a cabeça com as mãos. Dobrei os joelhos e preparei um contra-ataque. Não foi necessário. Eu não sabia, mas ela já estava longe. Enquanto eu estrebuchava de olhos fechados ela boiou até a praia. Pensei em deixá-la ali e ir embora. Chutei-a de levinho. Talvez ela pulasse, como os mortos de hollywood. Mas Lâmina não reagiu, como todo bom objeto inanimado. Coloquei-a debaixo do braço e caminhamos em silêncio até a casa.
  
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p e r g u n t a r   n ã o   o f e n d e
"Você já sorriu ontem?"
 
ana carolina  [email protected]
Sim, eu já sorri ontem. E ante-ontem, e ante-ante-ontem, e ante-ante-ante-ontem. Por que, vocês sabem... é muito mais fácil sorrir ontem do que sorrir amanhã, e é ainda mais, muito mais, fácil sorrir ontem do que sorrir hoje. É que vivemos (há tempos) tempos de insatisfação. Culpa daquela frase maldita, cultuada através dos anos: "Eu era feliz e não sabia".
 
roger da silva joão  [email protected]
Já, mas foi um sorriso falso.
 
clarisse rinaldi  [email protected]
Por certo dei alguns sorrisos ontem, nem que tenha sido apenas com os comerciais engraçadinhos da tv (incrível o tal poder da mídia, os comerciais realmente estão se tornando mais inteligentes que os programas de tv...).

E sorri ao ler a pergunta, mas isso foi depois de ter franzido a testa, naquela reação: o quê?? ah! entendi...

De qualquer forma, se algum de vocês, escritores e editores deste zine virtual que eu tanto adoro, ler essa mensagem amanhã (o que é possível já que hoje é feriado no Rio e nem todos devem ficar na frente do computador), eu já terei sorrido ontem...
 
alessandra mascarenhas  [email protected]
Sorri ontem quando eu sentava sentada num banco de shopping, lendo um livro, esperando minha mãe sair de uma loja e um menino lindo, de cabelos compridos, bata indiana, e enormes olhos azuis, veio andando largadamente na minha direção, abriu um sorriso gigantesco, me olhou com os maiores e mais doces olhos do mundo, abaixou-se, juntou minhas mãos,  depositou entre elas uma rosa vermelha e recitou um poema maravilhoso de Fernando Pessoa. Acabou de recitar, beijou minhas mãos, a ponta do meu nariz e foi embora não sem antes olhar para trás me jogando mais um beijo. Fiquei parada incrédula. Algumas pessoas que viram a cena também.
 
Então meus olhos se encheram de lágrimas e eu sorri. Com os lábios, mas muito mais com a alma, agradecendo a todos os deuses por ainda existir nesse mundo tão feio onde quase tudo é de concreto, pessoas de luz, feitas de magia, que trazem poesia com flores aos mortais.
 
mário r. mendes júnior  [email protected]
"Sorrir
 quando a dor te torturar..."

Se vocês querem saber se eu sorri ontem, a resposta é sim. Aquele sorriso amarelo de quem já entendeu que não adianta chorar. A propósito, o "Já" da frase sugere que ainda posso sorrir ontem. Então, estou aguardando que em algum momento de ontem eu ainda possa sorrir. Xiii... melhor parar por aqui, senão vou acabar concluindo que quem inventou a relatividade do tempo tinha razão.

pergunta da próxima semana:
"Sonhos sonhos são?"
Tomamos emprestado o título da canção de Chico Buarque para que vocês se manifestem:
[email protected].
 
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arte, essa insana que me seduzia nas noites de quarta-feira
fernando paiva  [email protected]
 
Arte era seu nome. Chegava em minha casa trôpega, sempre bambaleando seus pés enfurnados em sapatos apertados. Costumava aparecer às quartas-feiras à noite, em torno das vinte e duas horas.
 
Não era de seu feitio bater na porta. Ela preferia assoviar. Um assovio fino e trêmulo inconfundível. Estava sempre com seus longos e cacheados cabelos castanhos soltos. Ela sabia muito bem que nas quintas-feiras eu acordava cedo e que às vinte e duas horas de quarta já estaria de pijama, pronto para dormir. Mas ela tinha prazer em me pegar desprevenido. Eu, por outro lado, sabia muito bem que ela viria, mas fazia questão de vestir meu pijama e aguardar pacientemente na cama, antes de me levantar, atender a
porta e fazer um teatro, como se ela houvesse chegado na hora errada. Eu tinha prazer em vê-la saboreando a inconveniência de sua chegada.
 
Ao entrar, ela iniciava o ritual beijando-me loucamente, ainda com a porta aberta. Lábios, línguas, saliva, muita saliva, o toque da carne, a carne em toque. Aquele primeiro beijo era sempre um momento sublime, durante o qual eu esquecia que estava vivo e imaginava que estava morto, em outro lugar, outra dimensão talvez... ou no corpo de outra pessoa?
 
Arte se postava como se a casa fosse sua. Depois do beijo, sem pedir permissão, trocava as coisas do lugar, empurrava o sofá para o lado, entortava o tapete, espalhava papéis por todos os lados e ia largando peça por peça de sua roupa pela sala, pelo corredor e pelo quarto. Mal sabia ela que a casa passava o resto da semana naquela mesma bagunça que ela deixava ao se retirar. Eu só arrumava as coisas na quarta à tarde, para dar-lhe o prazer de mais uma vez realizar aquela etapa do ritual.
 
Deitada, na cama, Arte chamava meu nome. Gritava com sofreguidão, pedia por mim. Pedia que eu viesse, por favor, que eu viesse logo, que a satisfizesse o quanto antes. As pernas abertas, os olhos fechados, as mãos acariciando os próprios seios, Arte parecia eternamente em transe, enquanto aguardava por mim.
 
As noites que passávamos juntos eram inesquecíveis e pareciam diferenciar-se mais à medida que se repetiam. Cada noite era uma noite, por mais que o ritual fosse o mesmo. Mas não era o mesmo. Eu sei que não era o mesmo. Por mais que da unha do pé até o mais alto fio de cabelo a Arte estivesse sempre igual, eu enxergava a cada vez um encanto a mais, solícito em dar-me prazer por sua mera existência.
 
Não foram duas, nem três, nem quatro, nem vinte vezes que nos encontramos. Depois do primeiro ano, cansei-me de contar. Eu e Arte fazíamos um par e tanto. Foi com profundo pesar que soube de sua morte, numa esquina de Copacabana, três meses atrás. Nua, desfigurada por profundos cortes, ela ainda exibia os lábios carnudos e os cabelos que eu gostava de afagar. Ai, Arte, onde quer que esteja, lembre-se de quem sempre lhe deu prazer.
    
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a última (?) do garoto juca jr.

Olá, cambada inteligente do Spamzine. Garoto Juca Jr. aqui, em uma de suas últimas aparições. Sim, meus caros amiguinhos, eu vou sumir por uns tempos. Pensando bem... Troque a frase “por uns tempos” pela frase “para sempre”. E troque a frase “meus caros amiguinhos” pela frase “bando de otários”.

É horrível ter duas crianças super-ativas em casa. Eu tenho dois sobrinhos que ficam o dia todo correndo, brincando, jogando Counter Strike, e fazendo coisas que crianças idiotas fazem. O que fazer quando crianças super-ativas fazem muita bagunça e barulho, especialmente naqueles dias em que você está com uma ressaca enorme causada por uma banheira cheia de vodka? Basta realizar o experimento anárquico sugerido por Mestre Enéias no livro “Espanque seus filhos antes que eles espanquem você – Volume III”.

Primeiro, eu precisava de um laxante. Um poderoso. Muito poderoso. Após muito pesquisar, consegui encontrar um que fosse poderoso suficiente: o Empalador 2000. É tão forte que foi proibido em aviões depois do 11 de setembro. Depois, fiz duas xícaras de chocolate quente, coloquei metade do vidro do Empalador 2000 em cada xícara, e servi para os dois elétricos garotos. O efeito do laxante foi fulminante, quase assassino. E o engraçado é que aqui em casa só tem um assento sanitário. Os dois ficaram fazendo um bizarro revezamento, uma espécie de dança das cadeiras nojenta. Consegui ter seis horas de paz e sossego... Depois quero ver quem vai limpar aquela bagunça!

Bem, pessoal, por enquanto é só. Pensando bem, por enquanto não... Para sempre. Garoto Juca Jr. segue agora para Júpiter e além do infinito! Adeus! 
  
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s p a m   c i n e
espaço reservado para elucubrações, tergiversações e pitacos cinematográficos. mande a sua resenha: [email protected].
  
duas vidas (ou nossas vidas?)
fernanda luft  [email protected]


Eu assisti ao filme "Duas Vidas" ("The Kid", Disney, 2000) há pouco tempo para fazer uma resenha crítica utilizando alguns escritos de Jean-Paul Sartre. Isso tudo para o trabalho final de uma disciplina que eu fiz. Pareceu difícil à primeira vista, mas o filme realmente me fez pensar. Não só na teoria sartriana mas na minha vida, de tudo que eu era quando bebê, do que fui me tornando aos poucos e de como eu sou hoje; do que eu me tornarei amanhã.
 
O filme começa mostrando um personagem na sua vida atual, completamente esquecido do seu passado, infeliz. Aos poucos, vai surgindo uma criança que o lembra das coisas da sua infância e de como ele se desviou dos seus sonhos passados. Essa criança: ele mesmo aos 8 anos de idade.
 
Sartre fala que nós humanos nascemos apenas corpo e consciência e vamos nos construindo nas nossas relações interpessoais. Assim, nós nos lançamos em direção a um projeto, que é mutável. No filme, o projeto infantil da personagem era ter um cachorro chamado Chester, uma família e ser piloto de avião. O que ele se tornou quando adulto: um consultor de imagens solteiro e mal-humorado.
 
Esse filme e essas teorias me fizeram pensar se eu me desviei do que queria quando era criança. Aos seis anos de idade, os meus planos eram ser médica, casar, ter um filho, divorciar e casar de novo. E claro, nunca ter cachorros, eu odiava. Aos dezenove anos eu queria trancar a universidade, morar no exterior uns tempos, trabalhar e ir viajando pelo mundo.
 
Hoje, aos vinte e um, eu estou quase terminando o curso de Psicologia, trabalho período integral numa central de estágios, não pretendo me casar e muito menos ter filhos. Tenho uma cachorra chamada Pupi, que é a coisa mais linda do mundo. Até penso em morar fora, mas apenas depois de formada e com algum objetivo, como pós-graduação ou alguma oportunidade de trabalho.
 
Você já parou pra pensar nas mudanças que ocorreram na sua vida? Eu sei que eu sou jovem, e que daqui a dez anos talvez eu seja médica mesmo e esteja casada com um filho, e sem cachorro.
 
Foi assim que aconteceu com a personagem do Bruce Willis no filme, o garotinho o ajudou a superar os traumas da infância e redirecionar o seu projeto para o que ele queria de verdade. O cachorro, a família e o avião, que nos é mostrado por um terceiro personagem, já aos sessenta anos de idade.
 
Então, aquela frase famosa do Sartre, "não importa o que fizeram de você mas sim o que você faz com o que fizeram de você", pôde ser bem exemplificada neste filme. E às vezes a gente acaba esquecendo disso e coloca a culpa dos nossos planos darem errado nas outras pessoas. Elas só estão fazendo o papel delas, o protagonista da sua vida é você. E não adianta reclamar com o diretor, pois ele é você alguns anos mais jovem.
 
Se eu encontrasse aquela Fernanda de seis anos hoje, eu imagino que ela diria que eu me tornei uma pessoa cínica e irônica, talvez mais conformada com o mundo e um pouco fria às vezes; e eu falaria pra ela que sim, eu me tornei tudo isso, mas não perdi o entusiasmo dela e que no fundo dos meus olhos ela ainda encontraria aquela pontinha de revolta com o mundo.
 
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f a l a   q u e   e u   t e   e s c u t o
Participe você também desta seção de cartas mais animada que as torcidas de Botafogo e Palmeiras juntas. Escreva
[email protected].
 
----- Original Message -----
From: "Tarsis Schwald" <[email protected]>
Sent: Monday, November 25, 2002 4:52 PM
Subject: Hey !!!

"Amigos, como vcs estão? Eu dei uma sumida, e agora retorno pedindo uma ajudinha(ona). Bom, para não dizer que nada de bom aconteceu, eu tenho três novidades boas (para contrastar com todas as tragédias cotidianas):

1 - Mudei pra Salto, pertinho de Itu e Campinas (viu, Inagaki traíra?) Agora além de caipira gaúcho sou um legítimo caipíra paulista.

2 - (O motivo deste email) Montei uma banda Pop e estou pedindo (implorando) ajuda para divulgar meu cantar vagabundo. A pseudo-banda se chama * - O DIA ETERNO - *. A primeira música da demo está disponível na revista virtual obscura, carcasse, neste endereço aqui:
 
www.carcasse.com/mp3
(banda) O Dia Eterno (música) 'Gerdien Van Der Linden'

Peço aos amigos que: - baixem a música, divulguem, façam comentários e aproveitem esse momento (antes de eu me tornar mais rico e famoso que o Dinho Ouro Preto). Agradeço desde já. Se der pra divulgar no Spawn Zine... Forte abraço do amigo Társis"
 
inagaki responde: cumpadi Társis, taí o que você queria. Em troca, nós do Spam Zine só pedimos 15% de seus royalties do seu futuro álbum "Acústico MTV - Live In Salto". A propósito: que história é essa de traíra, mermão? Só porque eu mantenho meus ideais (de ficar rico e xarope) enquanto você resolveu se entregar ao establishment pra fazer um som pop? Tsc, tsc. :) Boa sorte pro teu Grêmio, e um forte amplexo pra ti!
 

----- Original Message -----
From: "marcelo" <[email protected]>
Sent: Saturday, November 23, 2002 10:47 PM
Subject: guaraná de maçã.

"olá spamzine,
estou escrevendo para dizer que adorei o guaraná de maçã e a empada da Ione Moraes (no bom sentido, porque eu devo ter uns 8 anos a menos que ela) e queria saber: 'ela escreve sempre aqui?'
bom, aqui fica meu apelo para ela escrever sempre, porque eu adorei ela e quem sabe rola alguma coisa entre nós (quem sabe ela gosta de pegar pra criar?)
abraços".
 
inagaki responde: olá Marcelo, a Ione atende sempre em [email protected] ou em seu blog pessoal, em http://www.didentro.he.com.br. Portanto, devo lhe alertar que propostas (in)decentes, declarações de amor & afins devem ser diretamente encaminhados ao e-mail dela. Quanto à sua pergunta, teje tranqüilo: Ione Moraes já é da casa e também pode ser encontrada em nosso recanto virtual, localizado em http://www.spamzine.net, sempre à vontade (ela é a mocinha de bobes na cabeça e chinelinho do Garfield). Passa lá pra tomar um cafezinho, cumpadi. Mas veja lá: respeito com a nossa amiguinha, huh? Aquele abraço!
 
 
----- Original Message -----
From: "Rick" <[email protected]>
Sent: Thursday, November 21, 2002 5:30 AM
Subject: Bom dia!!

"Desculpem-me por incomodar a essa hora da manhã (como se fizesse diferença), mas, me inscrevi a horas atrás e desde então estive lendo e relendo autobiografias e que trasformavam colocaboradores em DIGIMONS e questões sociais em PARADIGMAS... No entanto, no meio de tantos autos e baixos, tantos textos e poesias, notei que não tem muito sobre questões filosóficas, metafísicas, em fim, outros PARADIGMAS que no mundinho de cá são valiosos por pofessores e outros mestres com auxílios de alguns alunos lunáticos (meu caso) e outros drogados inconformados com a vida... rs

Bom, por essa e por outras, me pergunto como se repercutiria um texto mais filosófico, englobando em partes o científico e explorando questões que por vários motivos, são muitas vezes invisiveis aos nossos olhos!? Então, você destacariam um artigo fajuto dessa natureza??"

inagaki responde: caro Rick, a edição NONSENSE da semana que vem veio a calhar para seus propósitos filosofo-anarco-paradigma-digimônicos. Veja as instruções para envio de colaborações no editorial alguns scrolls acima.
 
 
----- Original Message -----
From: "Denis M M Martins" <[email protected]>
Sent: Sunday, November 24, 2002 2:08 AM
Subject: Opa!

"Alô, rapaziada (e mulherada também).

Faço uso deste humilde espaço para fazer uma propaganda barata do mais novo zine literário que ninguém nunca viu da praça, O Arauto (
http://www.oarauto.cjb.net). Literatura subversiva, melosa, emplogante, conforme o espírito aprouver. Dá para vocês divulgarem de algum jeito?, assim, mostrando pros leitores, pondo um link na página, sei lá, pensem aí num jeitinho, pode ser?

'gradecido,
Denis"
 
inagaki responde: pô, vou começar a cobrar por essas propagandas. :)
   
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c r é d i t o s   f i n a i s

estrelas cadentes
Alexandre Inagaki > [email protected]
Ricardo Sabbag > [email protected]
Orlando Tosetto Junior > [email protected]
José Vicente > [email protected]
Ione Moraes > [email protected]
  
rabiscos de giz
Adriana Terra > [email protected]
André Machado > http://amachado.blogspot.com
Fernanda Luft > [email protected]
Fernando Paiva > http://www.luisamandouumbeijo.8k.com
Indigo Girl > [email protected]
Ricardo Ramos Leite > [email protected]
 
pegadas na areia
Alessandra Mascarenhas > [email protected]
Ana Carolina > http://www.circulovicioso.blogger.com.br
Clarisse Rinaldi > [email protected]
Franklin da Silva > [email protected]
Mário R. Mendes Júnior > [email protected]
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p. s.
 
ione: ERRATA do SZ 083 - O título da colaboração do Luciano Amaral saiu errado, na edição anterior. Onde se lê Tabatinga (eta lapso), deve-se ler Taguatinga. Ops.
 
franklin da silva: a resignação é um suicídio cotidiano.
 
inagaki: Você, jovem paulistano, já tem compromisso para o dia 29 de novembro? Necas de pitibiriba? Então compareça à FESTA DO PROJETO ENLOUCRESCENDO, no Brit Bar (Rua Cardeal Arcoverde, 1875, Vila Madalena - quase na esquina com a Mourato Coelho). Eu e cumpadi Ian Black estaremos discotecando, e a banda Day After fará um show por lá. O preço é merreca: R$ 3,00 de entrada e mais R$ 2,00 de consumação. Mas, segundo o Ian, blogueiros terão um desconto extra: escrevam para [email protected] e acertem isso diretamente com ele. :)