SpamZine_________________
079
24 de setembro de 2002
curitiba   são paulo   rio de janeiro   goiânia

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n e s t a  e d i ç ã o:
 
algo diferente no ar
 
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editorial
ricardo sabbag  [email protected]

Esta é uma edição diferente do Spam Zine. Sem consultar os outros editores, resolvi modificar um pouco o formato do zine. Mas calma. Não é nenhum golpe; apenas uma experiência. Como os leitores mais assíduos podem ter notado, ultimamente o Spam, tanto no e-zine quanto no weblog, tem estado um tanto atrasado.
 
Os motivos desses atrasos e dasatualizações são os mais variados. Todos nós temos problemas particulares e afazeres que nos obrigam a privilegiar outras tarefas além da edição deste zine. A situação faz nascer cãs na cabeça do Inagaki e espanta alguns leitores mais exigentes. Com razão. Estabelecemos um projeto e precisamos ser fiéis a nossas próprias regras.
 
Portanto, com medo da pasmaceira e das teias de aranha, pensei em fazer algo um pouco diferente para esta edição. Ela está mais curta e recheada de textos (um pouco) mais curtos. Talvez você goste, talvez não. A tentativa é de deixar o zine mais ágil, menos tijoludo e com algum frescor. Isso não impediu o atraso, ainda. Mas quem sabe a situação se resolva em um futuro muito breve.
 
A repetição do modus operandi de se produzir o zine nos causa impressão, às vezes, de que tudo está muito estagnado. Talvez essa impressão seja verdadeira, talvez não. Como não somos uma empresa de comunicação séria (não há investimentos internacionais em jogo), nos damos ao luxo de executar os testes no ar. Os feedbacks que nos chegam são de fontes heterogêneas, o que também não nos permite ter certeza das vontades do público. A vontade a ser executada, portanto, é a do editor.
 
Sobre este assunto, poderia-se gastar mais tempo neste espaço. Mas não é isso a que esta edição se propõe. Para estimular a interação nos meios, daqui a pouco vou lá no nosso site (www.spamzine.net) postar algo a respeito e esperar a interferência dos leitores.
 
Atenciosamente e com os melhores votos de boaleiturança,
 
R.S.
   
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pequeninos
cristiane lisboa  [email protected]
 
agora mesmo, no exato momento em que o ponteiro grande do relógio branco da sala parou ao lado do número 3 e o médio no 12, eu sei onde tu estás. Tomando café e se deliciando com aquele chocolatinho que vem de brinde. Usando anéis só pra ficar brincando com eles enquanto ouve alguém falar sobre o último filme que viu. Sorrindo enquanto pede pra te acenderem um cigarro. Reclamando da falta de sol. Usando sapatos baixos. Dirigindo mal, rápido e com vidro arriado. Dando conselhos. Comendo ceasar salad só porque gosta do nome. Camisa branca e cabelo preso. Rezando pelo fim das guerras.  Achando que não tem mais idade para usar fivelinhas de cabelo e mesmo assim usando. Ficando magoada. Carregando um livro puído. Estudando fotografia. Lembrando que afinal, Deus não tem culpa de nada. Esquecendo de amar. Três regimes abandonados. Dois pensamentos assustadores e uma sensação de que não vai dar tempo.

 

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pequeno dicionário dos arquétipos de massa
fábio fernandes  [email protected]
 
Desvio para o Vermelho

Leandro começou com passarinhos. Pegava um pardal com uma arapuca, aninhava o bichinho entre os dedos com um carinho não muito distante do perverso e em seguida furava-lhe os olhos com uma agulha de costura roubada da mãe.

 

Uma coisa pode não ter a ver com a outra, mas daí a roubar dinheiro da mãe para comprar um trinta e oito foi um pulo. Primeiro puxou carros, depois pequenos furtos à noite, e finalmente os grandes assaltos a mão armada. Que culminaram com um seqüestro que virou manchete dos grandes jornais.

 

O que não impediu que ele fosse apanhado. Foi parar num presídio de segurança máxima. Apareceu muito na televisão, mas isso não estava nos planos dele. Pensaram até em fazer um filme sobre sua vida, mas ele não ligava muito para essas coisas. Só pensava em fugir para continuar seu caminho.

 

O caminho terminou dois meses depois, numa rebelião no presídio. Ao tentar fugir, teve sua saída barrada por dois detentos que lhe dispararam seis tiros à queima-roupa.

 

Leandro caiu ainda com vida. O sangue começou a formar poças pelas pernas, braços, tronco e rosto. Leandro sentiu a boca anestesiar, e os olhos foram lentamente perdendo o foco. Agora ele estava calmo. Sabia qual seria o seu destino.
 
 

Crimes Perfeitos

 

Júlio era o que se podia chamar de um rapaz empreendedor: com apenas vinte e quatro anos, montou seu próprio negócio. Ainda morando com os pais, um casal bonito, saudável e bem-estruturado de classe média, ele ampliou o próprio quarto, comprou um carro, saía nos fins-de-semana com os amigos. Júlio era um rapaz feliz.

 

Um dia, porém, a rua amanheceu com as sirenes da polícia. Durante a madrugada, Júlio matou os pais a golpes de barra de ferro e facadas. Pelo menos quarenta em cada corpo. O que restou foi queimado.

 

Nos primeiros dias, Júlio negou, chamou um advogado. A alegação da defesa era a de que ladrões haviam invadido a residência. Não havia uma prova que confirmasse isso.

 

Não adiantando mais, mudou-se a estratégia. Nova alegação: perda súbita da sanidade, motivada por violenta emoção. Para justificar isso, tudo foi aventado: os pais viviam brigando, o pai tinha uma amante, a mãe também, ele apanhava quando criança. Nenhuma dessas hipóteses foi confirmada.

 

Mas o advogado era bom. Júlio foi condenado, mas pôde cumprir a pena em liberdade por ser réu primário.

 

Hoje, Júlio é o que se pode chamar de homem de visão: seu pequeno negócio prosperou, ele é dono de uma grande cadeia de lojas e ainda encabeça uma ONG cujo objetivo é lutar contra a violência urbana. Júlio é um homem feliz.

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a arte de ser criança
(arlã()  [email protected]

Ludovico chegou e flutuou na beirada da cama.
Ludovico sempre se fazia assim de fantasma com os olhos grandes amendoados olhos do meu amigo Ludovico de doze anos.
Ludovico sempre se fazia assim de fantasma quando tinha alguma coisa para me mostrar então ele ficava tentando ser invisível o Ludovico nessas horas humilhava os fantasmas na sua competente arte de ser criança brincando de flutuar.

Com os olhos grandes amendoados olhos perfeitos para alguém que está exercendo um silêncio de fantasma de brincadeira querendo chamar atenção e por dentro dos olhos e do silêncio há uma briga ensurdecedora de criança uma algazarra dentro de um corpinho só lutando implorando para ser notado e ser questionado o quê que ocê tem aí?

Eu sabia eu deixava o Ludovico mais um pouquinho no seu jogo para ver se ele se desesperava se chutava a minha canela dizendo qué vê não é? pois tínhamos um amigo gorducho que sempre fazia isso o gordo não tinha paciência adequada a fantasmas.
Ludovico? Não. Desesperar? Não.
Ali eu sei que se nada eu falasse ali ele ficaria no seu jogo me olhando de soslaio sabendo que eu sabia que a sua pantomima me agradava e ria disfarçadamente aumentando a magia pois eis um fantasma que sorri.

Ali ele ficaria e talvez sofresse (?) uma morte imperceptível e flutuante - mas como não acreditamos que morte seja um empreendimento destinado às crianças (quando nos contam que uma morreu preferimos acreditar que ela virou um ser voante anjo ou luzes numa noite suave) - talvez ali meu amiguinho tenha se transformado num querubim claro com aqueles olhos amendoados de Ludovico olhando para mim me dando a certeza de estar vivendo a minha infância.

Hoje depois de tantos anos percebo que ele ficou lá mesmo naquele instante brincando e flutuando. O adulto que hoje passa pesadamente por mim vestindo o seu nome é apenas outro tipo de fantasma um espectro social aceitável e barbudo e desmemoriado de alguém que em momentos sublimes do tempo foi uma criança.

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paralelo 14

           há uma placa
indicando
 
  vontade
          de atlas
          de aerofoto
          de satélite
 
  no mapa do desejo
   vou beijando teu
                 
                   paralelo 15
                   paralelo 16
                   paralelo 17
 
no paralelo 14
     teu corpo treme
         minha geografia tua
 
               teu meridiano
 
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p e r g u n t a r   n ã o   o f e n d e
"Se você fosse candidato a deputado, qual seria o slogan de sua campanha?"
 
rodrigo líbera  [email protected]
daria uma de René Magritte e diria:
Ei, isto não é um candidato!!!

luis araujo  [email protected]
Como a história dos povos tem sido caracterizada por uma evolução sofisticante do absolutismo que nos levou a desembocar no representativismo por via da eleição dos tiranos democráticos a quem delegamos a soberania para fazerem o que quiserem enquanto o prazo do mandato estiver válido para consumo e como ninguém promove uma revolução para acabar com isso, o que significa que se revêem nessa situação, meu slogan seria: VOTEM NA LEALDADE. NÃO MUDAREI NADA.
 
renato cortez  [email protected]
Ladrão por ladrão, vote no Marcão!!

sérgio ricardo c. dos santos  [email protected]
Aqueles que conhecem minha mãe, sabem do meu caráter. Então: "Vote em mim para deputado, pois já nasci DE PUTA"
 
pergunta da próxima semana:
"Se você pudesse sabotar a Arca de Noé, qual bicho tiraria de lá?"
Mande seus tiros: [email protected].
 
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o piano
ione moraes [email protected]
 
Havia muito tempo que seu piano se recusava a tocar uma boa levada como as de
Chucho Valdéz. Ela não se lembrava de ter ficado tão aborrecida.
 
Nunca tinha ouvido falar em um piano tão cheio de vontades. Ela sempre tomava toda sorte de cuidados com ele. Saquinhos de pano sob os pedais, para que nenhum camundongo lhe incomodasse o sono; polimentos com flanela e cera perfumosa, dia sim, dia não; carinhos sobre os dentes de marfim. Vez em quando, abria-lhe o tampo, para que espiasse o mundo lá fora, mesmo que o mundo se resumisse àquele canto da parede, única visão possível dali onde ficava. Nesses dias, ele cantava mais alto.
 
Assim mesmo, suas vontade começaram a se manifestar. Ele se comportava como um estranho. Passou a tossir se o cigarro dela estivesse aceso por perto - e observar a fumaça enquanto tocava, era para ela um conforto. Noutros dias, simplesmente não balbuciava palavra, para depois reclamar da artrite e do vento encanado naquela sala. Ela se tinha desfeito do gato angorá, porque ele não podia com o bichano saltando-lhe sobre as costas, sem avisar. Passou, enfim, a escolher o próprio repertório. Ela queria polca, ele elegia uma marcha fúnebre. Ela dedilhava bossa nova, ele emendava um bolero. Ela pedia um Mozart, ele insistia em Erik Satie. Ele tinha se tornado um piano um tanto melancólico.
 
Um dia, ela acordou e tomou a decisão. Foi até a sala e declarou solenemente:
 
- Está tudo acabado entre nós.
 
Mandou que viessem buscá-lo, que o desmontassem, que o levassem escada abaixo. Ela chorou do alto da últimos degraus, ouvindo os ecos dos seus protestos fora do tom e de compasso:
 
- Não tinha se que ser assim.
 
Ela logo arrumou um bandoneón, com fama de mulherengo. Os vizinhos se espantaram com a rapidez com que ela deixara que outro entrasse em sua casa e tomasse o lugar do piano. Mas ela só conseguia tocar milongas tristes, pensando naquele amor tão infeliz.
 
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cozinha anarquista
ricardo ramos leite  [email protected]
 
Receita que aparece no livro de Mestre Enéias, "Cozinha Anarquista: Ofélia morreu protegendo esses segredos".
 
SOPA ANARQUISTA

Ingredientes:
1 galinha desossada
1 galinha desossada e morta
1 albatroz
1 lata de óleo de oliva
1 lata de óleo de girassol
1 lata de óleo de soja
1 lata de óleo diesel
1 lata de óleo de Lorenzo
1 lata de óleo de fígado de bacalhau
1 pedaço do muro de Berlim
1 CD "Bee Gee's Greatest Hits Collection"
1 cabeça do Maluf decentemente decapitada
1 pitada de areia (caso não tenha areia use sal e açúcar juntos, um anula o
outro e vira areia)
1 quilo de miolos de macaco recém-colhidos
1 cartucho Mario Party 2 N64
1 chocolate Lollo (não vale Milkybar, deve ser Lollo)
1 fita betamax com o episódio do Chaves em Acapulco
Pimenta a gosto
 
Modo de preparo:
1-Jogue tudo dentro do liquidificador.
2-Bata no liquidificador até formar uma gosma espessa.
3-Dê para seu sobrinho comer.
4-Ria enquanto ele implora para ser levado ao hospital.
5-Jogue o resto fora e faça uma sopa em pó.
 
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f a l a   q u e   e u   t e   e s c u t o
Nosso bolso pode estar com menos dinheiro, mas nossa paciência não diminuiu em nada. Chore suas pitangas no [email protected] ou visite www.spamzine.net e conte-nos a sua verdade sobre a vida.

----- Original Message -----
From: "lokena"
Sent: Wednesday, September 11, 2002 5:07 PM
Subject: ....

Olá para vocês!!! Meu nome é Lorena, tenho 15 anos e estou simplesmente VICIADA no spamzine... e por isso mesmo, tô escrevendo para pedir os números atrasados (66 até 73)... são os únicos que faltam para eu ler!!! Aproveitando, mando meu virundum... Sabe aquela música "Açaí"??? Minha vida inteira eu cantei
"Ao sair do avião
Rum de tesouro
Uma irmã
Grande é a fez da manhã"
Sendo que o certo é
"Açaí,
Guardião
Zum de besouro
Um imã
Branca é a tez da manhã"

sabbag responde: Querida Lorena, Spam pode ser bom, mas lembre-se de que tudo em exagero mata. Isso mesmo. Mata. Ou engorda. O que dá, rigorosamente, no mesmo, visto que engordando você entupirá suas artérias de colesterol e terá um enfarte fulminante aos 34 anos. Mas isso é só uma suposição, claro. O único mal que o vício em leitura pode te fazer é gastar dinheiro com as obras completas de Paulo Coelho.
 
A seção "Leia as edições anteriores", do site www.spamzine.net, foi recentemente atualizada por nossa querida Suzi Hong. Lá você pode encontrar desde a edição #1 até a edição #78, anterior a esta.
 
Quanto ao seu virundum, cabe um esclarecimento. Eles estão fora desta edição devido à mão-de-ferro do editor da vez. Ou seja, eu. Mas gostei do seu e prometo que eles voltarão em breve, fresquinhos e contentes. Beijocas do R.S.
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c r é d i t o s  f i n a i s
 
devedores
Ricardo Sabbag > [email protected]
Alexandre Inagaki > [email protected]
José Vicente > [email protected]
Orlando Tosetto Junior > [email protected]
 
credores
AL-Chaer > [email protected]
(arlã() > [email protected]
Cristiane Lisbôa > [email protected]
Fábio Fernandes > http://polis.blogspot.com
Ione Moraes > 
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Ricardo Ramos Leite > http://garotojucajr.blogspot.com

avalistas
Luis Araujo > [email protected]
Renato Cortez > [email protected]
Rodrigo Líbera > [email protected]
Sérgio Ricardo C. dos Santos > [email protected]
 
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p. s.
 
sabbag: incautos de plantão, visitai www.spamzine.net e discorrei sobre o futuro deste espaço. vossas opiniões serão sempre bem vindas e, mais ainda, valorizadas pelos nobres doutores que decidem sobre os sortilégios deste espaço. o povo unido jamais será vencido. ao vencedor, as batatas! saudações.