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5 de setembro de 2002
são paulo  rio de janeiro  goiânia  juiz de fora  porto alegre  são josé dos campos

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n e s t a  e d i ç ã o:
 
pulando o tubarão - ingrid e a vida - as palavras respiram - letras do djavan - mais arquétipos - curriculum vitae - pônei pornô - poemas da chapada - perguntar não ofende - priscila e o furador - pão com chimia - traições ludopédicas
 
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editorial
alexandre inagaki  [email protected]
 
"Jump the shark" é uma expressão criada para denominar o começo do fim de uma série de TV. É o momento em que o telespectador percebe que ela atingiu seu pico, e, ao mesmo tempo, o início de sua decadência. É o instante em que um programa chega a um momento irreversível de sua existência. Exemplos? O beijo de David e Maddie em A Gata e o Rato. Kevin Arnold chegando à puberdade em Anos Incríveis. Boy George fazendo uma participação especial em Esquadrão Classe A. A revelação de quem matou Laura Palmer. Ross e Rachel se atracando em Friends. A primeira aparição da "Turma do Bacana" em Armação Ilimitada. A entrada de Pedro Paulo Rangel no elenco da TV Pirata.
 
O termo surgiu em uma conversa entre dois colegas de faculdade, Sean Connolly e Jon Hein, criador do site Jump the Shark (http://www.jumptheshark.com), e origina-se de uma cena do clássico seriado Happy Days (citado pela banda Weezer no videoclipe da música "Buddy Holly"). Segundo análise dos dois amigos, Happy Days começou a decair a partir de um episódio no qual o personagem Fonzie aparece pulando em cima de alguns tubarões em um salto de esqui aquático. A cena foi tão ridícula que marcou, fulminantemente, o início do processo de derrocada do seriado.
 
O site, de visita obrigatória a qualquer internauta interessado em cultura pop, possui um espaço aberto para a partipação dos telespectadores, que votam nos momentos em que suas séries prediletas começaram a subir no telhado, classificados por categorias como "Mesmo Personagem, Ator Diferente" (exemplo clássico: a mudança do ator que interpretava o marido da Feiticeira), "Novo Garoto na Cidade" (como Scooby-Loo, o sobrinho pentelho do Scooby-Doo) ou "Nascimento" (vide Mabel em Mad About You, ou Pedrita e Bam-Bam em Flinstones).
 
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Lembrei dessa expressão após assistir, semana passada, ao último episódio de Arquivo X, um seriado que não acompanhava há tempos. Para ser mais exato, desde 1998, quando considero que ele "pulou o tubarão".
 
Quando Arquivo X surgiu, em 1993, o seriado causou sensação imediata. Seus roteiros abordavam temas que tangenciavam o ridículo: alienígenas, conspirações governamentais, monstros folclóricos. Contudo, trabalhavam tais assuntos com inteligência e criatividade. Insinuavam respostas sem mastigar explicações redutoras, incitavam a imaginação dos espectadores e, principalmente, traduziam de forma criativa o zeitgeist de uma época pós-utópica, marcada pela descrença generalizada nas instituições, e pela busca, no final do século, de respostas místicas a mistérios que as religiões já não nos respondiam satisfatoriamente. De quebra, os X-Files trouxeram um inovador casal de protagonistas: Fox Mulder e Dana Scully. Dois agentes do FBI que, ao decorrer dos anos, consolidaram um relacionamento baseado na extrema confiança que nutriam um pelo outro. Uma relação mantida à base da estrita amizade e nada mais do que isso, provando aos telespectadores que nem toda relação homem/mulher necessitava culminar em sexo.
 
Infelizmente, os produtores do seriado não souberam a hora de parar. A galinha dos ovos de ouro foi artificialmente mantida viva até que expelisse seu último e melancólico traque dourado. Nove anos depois, com os índices de audiência arrefecendo à medida que as virtudes iniciais descambavam para ao ridículo, a série finalmente chegou ao seu fim. De quebra, amarguei ver, no último episódio, um beijo apaixonado entre Mulder e Scully: a prova inconteste de que o mais interessante dos relacionamentos platônicos soçobrou à sanha dos clichês televisivos. Foi uma piscadela cúmplice ao grande público, mas também um golpe dispensável aos antigos fãs da série, que admiravam ver como os roteiristas de Arquivo X driblavam as convenções clássicas dos casais televisivos.
 
Depois de assistir ao capítulo final, assimilei definitivamente a lição: não confie em ninguém, muito menos em produtores de Hollywood.
 
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Mas, muito antes do beijo apaixonado entre Mulder e Scully, Arquivo X já havia "pulado o tubarão". O começo do fim veio com a produção de um ridículo filme para o cinema, em 1998, no intervalo entre a quinta e a sexta temporada. Com o longa-metragem, vieram revelações bombásticas e respostas nada convincentes aos mistérios propostos pelos roteiristas. Daí pra frente, o processo de decadência foi inevitável: é o mal de se banalizar os enigmas. Citando as sábias palavras de Federico Garcia Lorca: "só o mistério nos faz viver".
 
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A expressão é tão boa que transcende os limites televisivos para invadir outras áreas. Cinema, por exemplo: A Lista de Schindler, o filme de Spielberg, resvala na categoria de obra-prima até a cena em que Oskar Schindler, ao se despedir dos judeus de sua fábrica, começa a chorar copiosamente dizendo: "mas se eu tivesse vendido este anel, teria salvo mais cinco judeus", e blá blá blá. A partir desta seqüência desnecessariamente explicativa, você já sabe: o filme pulou o tubarão.
 
Esportes: Ronaldinho pulou um baita dum tubarão na fatífica final da Copa da França de 1998. Mas, caso raro, conseguiu nadar contra a corrente e dar a volta por cima com a ajuda valiosa da Família Felipão neste ano.
 
Música: para mim, o Pink Floyd pulou o tubarão quando Syd Barrett não voltou de sua viagem de L.S.D., embora a maioria dos fãs pense que o tubarão só foi transposto com a saída de Roger Waters da banda. Quanto aos Beatles, quantos hão de discordar que o encontro de John Lennon com Yoko Ono foi o esqui aquático dos Fab Four? E Caetano Veloso? Há quem diga que o baiano já nasceu montado na garupa do bichinho: ô povinho maldoso...
 
Vida pessoal. Você descobre que seu relacionamento pulou o tubarão a partir do momento em que sua parceira o chama para conversar, dizendo aquela tenebrosa frase:
 
- Precisamos discutir nossa relação.
 
Não se esqueça de levar bóias e colete salva-vidas.
 
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Na edição atrasadíssima desta semana, uma estréia pra lá de especial: Meg Guimarães, com uma bela exposição sobre a natureza inquieta das palavras. Há o retorno de uma filha pródiga: Heleine Fernandes, carioca CB; mais arquétipos do irmão em armas Fábio Fernandes, o curriculum vitae de Marcelo Barbão, as elucubrações nonsense de Ricardo Ramos Leite (transcritas ipsis litteris), a avant-première da série de poemas da Chapada do mineiro-goiano AL-Chaer (amigo virtual de longa data a quem tive o prazer de conhecer pessoalmente há pouco tempo), as estréias impactantes de SoulJacker e Alessandro Garcia e mais uma volta: Tiago Soares, nosso homem no Vale do Paraíba.
     
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ingrid e a vida
heleine fernandes  [email protected]
  
- Me mostra.
- Não, não tem nada.
- Me mostra.
- Eu não fiz nada.
- Olha que eu posso te levar...
- Não, não ... eu juro que não tem nada.
- Se eu voltar ... te levo.
- Pelo amor de Deus...
- Eu te marquei ... quantos você tem?
- Dezenove.
- Você já tem idade... Se volto te levo.
- Não, não, eu já vou, brigadão.
 
Ingrid saiu com o coração batendo até quase parar no peito, amargando salmoura na boca e retornando à beira, onde só havia espuma e era mais seguro.
 
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a respiração das palavras
  
Há tempos, em sobressalto despertei e, na cama, falei como se sonhasse mas não sonhava:
    
              as palavras respiram
 
Foi o que eu disse. Respiram. Algumas ofegantemente respiram. Latejam. Com a polpa dos dedos passei a premir uma a uma as palavras, a experimentar-lhes a textura, avaliando-lhes a pulsação: em cada uma delas se mexe um ar preso que quer se livrar da capa mas não se livra. Esse ar impele o corpo da palavra, tangível força que meus dedos circundam como a um ser compacto.
 
O que uma palavra enuncia nem sempre é o que ela fracamente exala, fios pouquíssimos de ar que entretanto são sugados e reassimilam-se ao corpo que lateja. Há um organismo movimentando-se nas entranhas das palavras. Raros os que podem pensar esse organismo, capturá-lo e trazê-lo para si para a cumplicidade de uns momentos. É um tomar sim, mas um dar também, uma troca viva e tensa, quero dizer. Todas as palavras pulsam como os seres mais inquietos. Não são plácidas e saciadas na maturação mais acabada.
 
Uma vez pensei em construir um dicionário longo, abarcando esses todos latejamentos, a palavra não lida e não escrita, mas cavamente recheada e ressoada. São largos, são vastos sons, moderatos, sustentados. Esses latejamentos, essas pulsações, essas crispações, em que pautas registrá-las?

Num código que ressoasse como os atabaques ressoam, a ressonância, por exemplo, das pedras, a exasperação da luz e a febre que subjaz, mínima ação de caules fartos, impaciências grávidas que erram na linha de certos ventos ventos.
 
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v i r u n d u n s
Errar é humano; rir com os erros alheios, mais ainda. Virundeie você também: [email protected].
   
adilson fuzo  [email protected]
Puxa, esses virunduns estão rendendo, hein...
 
Eu tenho uma extensa coleção deles. O mais terrível, sem dúvida, vem daquele clássico do grande Camisa de Vênus em que eu cantei por muitos anos "Acabaram com Ursinho Caxambó". Pobre Simca Chambord! Hoje eu sei o pecado que cometi...
 
rodrigo manhães  [email protected]
Ei-lo: quando eu tinha uns onze anos, a música "Babilônia Maravilhosa" (acho que era esse o nome), do Evandro Mesquita fazia parte de trilha de novela, e tocava um bocado. Pra quem não lembra, a letra era mais ou menos assim: "hoje acordei, nem li o jornal, MY BROTHER /(...)/ já é verão e a cidade ferve, MY BROTHER". O "my brother" era repetido várias vezes no decorrer da música. Pois bem. O "my brother" para mim era "na broadway". E eu me perguntava o que aqueles musicais pé-no-saco tinham a ver com o Rio de Janeiro...

E tem mais. Na mesma música, o refrão "falida, ferida cidade, babilônia maravilhosa" eu cantava "a minha querida cidade". Pelo menos faz mais sentido que o outro...
 
Na boa! Posso me considerar a rainha dos virunduns, já que todos os dias descubro que cantava uma música de forma, digamos, equivocada. Só euzinha consigo colocar, inocentemente, um virundum em todas as músicas que canto. Estava agora mesmo, visitando um site de letras de música, Arena Musical, http://www.arenamusical.hpg.com.br, e descubro mais um case. Tem uma música do Djavan que eu adoro, "Nem Um Dia", que eu sempre cantei assim: "E tudo nascerá mais belo/ O verde faz do azul com amarelo/ O elo com todas as cores/ Pra enfeitar ÁRVORES E RIOS" (o certo é "Pra enfeitar amores gris"). As músicas em inglês, então... é um festival. Não que meu inglês seja ruim, mas não tem uma que eu acerte toda. Quem se lembra daquela música, "We Are The World", que vários artistas cantavam juntos? Eu, simplesmente, cantava (e ainda canto) o refrão assim: "We are the world/ We are the children/ We are the WORLD who make a PARADE/ So let's SAID giving". Ninguém merece me ouvir cantando!
 
luciana dantas teixeira  [email protected]
Foi quando eu comecei a descobrir Djavan. A música era "Açaí" (Açaí/ guardiã/ zum de besouro um imã/branca é tez da manhã). Eu ostentava toda feliz aquela poesia curiosa, no meu vocabulário de primeiro grau:
 
A sair
guardiã
Zumdibizum
Um limão
branca é às
Três-da-ma-nhã 
 
Ah, eu gostava do zumdibizum. Devia ser alguma coisa como uni-duni-dunitê, salamê-minguê.
 
E tem a clássica, a campeã de virunduns: "Alagados, Flinstones!". Eu imaginava - que loucura - o Fred na beira da maré.
 
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da série: "pequeno dicionário dos arquétipos de massa"
fábio fernandes  [email protected]

 

mutantes

 
Patrícia namora Rafael há três anos. Se é verdade o que dizem, que muita água passa por baixo da ponte num período tão longo de tempo, então para ela é como se um oceano inteiro tivesse rolado pelo canal estreito de seus vinte e cinco anos e derrubado todas as pontes que encontrasse pelo caminho. Nesses três anos Rafael deixou o cabelo crescer até as costas, raspou tudo, furou orelhas e nariz, usou malha canelada, camisa larga de mangas compridas, ouviu rap, reggae, techno, jungle, drum’n’bass. Rafael não é uma pessoa volúvel, ao contrário: é apenas um típico habitante de seu tempo: inconstante, veloz, não acompanhando as mudanças, mas fazendo parte delas. Há um preço a pagar por isso, mas Rafael não tem tempo de perguntar qual seja ele.
 
Patrícia também é uma típica moradora da virada do século, mas do outro lado do espectro: prepara sua tese de mestrado, trabalha, junta dinheiro para realizar seus sonhos e desejos. Patrícia precisa de um alicerce sólido e seguro em que fundamentar suas ações. Ela suporta a escuridão do túnel porque sabe que existe uma luz ao final. Patrícia também sabe que Rafael é seu oposto: ele não vê o fim do túnel, simplesmente porque não está preocupado com isso. Prefere juntar o que encontra pelo caminho e acender velas, que iluminam precariamente mas lhe fornecem toda a luz de que precisa. Para Patrícia, Rafael é um mutante. E Patrícia tem medo de mutantes.
 
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enterrado vivo

 

Teve um enfarte dentro da sala escura, na última sessão. Só havia um casal de namorados ao fundo, que, ao contrário do clichê, não só não estava aos beijos e abraços como também estava prestando bastante atenção ao filme, veja lá se iam ficar interessados no homem na terceira fileira.

 

No começo era apenas uma dormência no braço esquerdo, mas o homem trocou de posição. É preciso observar que o cinema era antigo, as poltronas não eram confortáveis. Mais alguns minutos e o homem começou a sentir um suor frio e uma ligeira pressão na região do tórax. Ainda pensou que fossem gases, mas a pressão no peito aumentou.

 

Teve vontade de se levantar; não conseguiu. Pensou em se virar para acenar para o projecionista ou para quem estivesse atrás, mas não sentia mais o braço. Tentou abrir a boca. Nada saiu.

 

Útero materno o cacete, pensou ao se lembrar de uma das metáforas famosas para a sala escura do cinema. Quando o coração estourou, a última palavra que lhe veio à mente foi túmulo.

 

E ele estava achando o filme uma merda.
 
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currículo
marcelo barbão  [email protected]
 
Eu me rendo às torturas capitalistas e às tradições protestantes que abundam nesta era capitalista e reconheço: eu não gosto de trabalhar. Não tiro o menor prazer de exercer qualquer tipo de profissão. Odeio horários, tarefas, etc. E não pensem vocês que isto acontece por causa de empregos burocráticos ou pouco criativos. Pelo contrário, como jornalista e editor, tenho toda a liberdade de criar. Mas continuo achando um tremendo saco. Sim, eu gosto de escrever, mas quando estou a fim e sobre o que quiser. Essa história de ficar escrevendo sobre as últimas notícias, sobre as mudanças no mundo, ensinando as pessoas a fazerem alguma coisa, dando dicas de negócios, de compras, de sexo. Algo sacal. Se, pelo menos eu pudesse escrever de uma forma literária sobre os crimes que acontecem na periferia. Queria descrever o rosto vincado das mães chorando pela morte dos filhos envolvidos com a droga. Queria poder colocar estes crimes num contexto, mostrando como vivem e sobrevivem os pobres periféricos deste país. Mas o jornalismo não tem espaço para essas coisas. Então, busco refúgio na literatura. E odeio trabalhar. A ponto de não gostar de ficar colocando horários para escrever, como fazem os escritores profissionais. Não, nada disso. O dia em que o ato de escrever vira uma profissão, o escritor criativo começa a ser assassinado. E todo esse ódio pelo trabalho leva a um sério problema: não sei como ter dinheiro para pagar minhas contas. Portanto, se alguém precisar de um escritor neste estilo, pode entrar em contato que eu envio meu currículo.
 
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o mundo anárquico do garoto juca jr.
ricardo ramos leite  [email protected]
 
Eu admito. Eu admito. Eu sou uma pessoa de segunda classe. Eu sou uma daquelas pessoas que você odeia ver na fila do cinema, sentado ao seu lado no ônibus, ou em qualquer lugar que seja. Saiba agora se você é uma pessoa de segunda classe: se você responder "sim" a qualquer dessas perguntas, você é uma dessas pessoas.

. Você assistiria um filme pornô que tenha a palavra "pônei" no título?
. Você se recusa a desligar seu celular no cinema?
. Você já mentiu para alguém dizendo que a filha dessa pessoa estava morta?
. Você constantemente usa a frase "que time é teu" para seus superiores no trabalho?
. Você riu quando seus peixinhos dourados morreram?
. Você já saiu de algum restaurante sem pagar?
. Você sempre votou em branco ou em nulo?
. Você consegue formar uma frase coerente usando as palavras "pênis" e "sanduíche" nessa mesma frase?
. Seu meio de transporte favorito é o teleférico?
. Seu ambiente de trabalho diário envolve lama ou vômito?
. Você se coça com a chave do carro constantemente?
. Alguém de sua família morreu no dia que você considera ser o melhor de sua vida?
. Você usa o triplo de detergente do que as outras pessoas?
. Você considera aqueles quadros de macacos vestidos como pessoas como sendo arte moderna?
. Você já falou para alguma criança desconhecida que Papai Noel não existe?

Não se sinta mal se você for uma dessas pessoas, saiba que você não está sozinho. Existem várias pessoas famosas que pertencem ao grupo de pessoas de segunda categoria: George W. Bush, Chico Anysio, Fernando Collor, Cher, o Guga, Fausto Silva, João Kleber, Paul Newman, Eddie Murphy, Michael Jackson... A lista não tem fim... Até a próxima!
   
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r á p i d a s   r a s t e i r a s
 
"Essa coisa do tesão só pelo tesão não me dá tesão".
(Ana Paula Arósio, em fase epistemológica, elucubrando à toa porque anda sem namorado. Ok, façamos um desconto às palavras da mocinha - e sem usar o 21.)
 
"Ela é igual a Brasília. Também está esperando um garotinho".
(pérola desferida por Anthony Garotinho ao cumprimentar uma gestante no Rio. Felizmente, a julgar pelas pesquisas eleitorais, Brasília não precisará fazer um aborto.)
 
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poemas da chapada
 
t r i l h a
 
sigo
     as minhas mãos
           instinto
  dos teus caminhos
 
não preciso de bússola
    nem de sol
    nem de estrelas
    ou rios ou montanhas
    nesta rota
               de te farejar
 
 te amanhecer
 te entardecer
 te anoitecer
 
               me guia
 
c a c h o e i r a

um curso d’água
    e uma queda
 
foi o suficiente
 
      para eu tentar
              parar o tempo
           em contemplação
 
o que eu já fazia
 
            esquecendo do tempo
      ao me escorrer
            tuas águas
 
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p e r g u n t a r   n ã o   o f e n d e
 
A pedido de vários leitores, esta seção retorna com uma pergunta enviada pelo meu amigo Niqui Lang:
"Por que uma menina, no domingo, diz que te ama, que tu és o amor da vida dela, que ela te quer pra sempre, que sem você ela não vive; e na segunda vez, diz que é melhor vocês se separarem??? Cara, pelamordeDeus, me ajuda!!! Tô pirando!!!"
 
Niqui Lang pede a ajuda das placas, das cartas e dos universitários que lêem o Spam Zine a fim de iluminar sua cabeça. Escrevam: [email protected]. Vejam lá o que vão mandar: attachs edificantes de Power Point, nem pensar. As melhores respostas serão publicadas aqui.
 
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priscila
souljacker  [email protected]
 
Priscila nunca gostou daquele som.

Aquilo na verdade a irritava.

Levantou-se, pela janela entrava a luz roxa do dia.

Era verão em Pasárgada.

Foi até a cozinha e pegou seu furador de gelo predileto, aquele que havia ganhado do pequeno Salomão durante a temporada de caça aos suricates.

Voltou para o quarto, e no caminho observou pelo espelho sua bunda se mexendo a cada passo que dava. Gostava daquilo, achava sexy, e de repente sentiu tesão por si mesma. Desejou mais que tudo ser o homem que estava dormindo na sua cama agora. Desejou poder segurar e morder aquela bunda tão linda.

Sentou-se na cama.

Ele continuava emitindo aquele barulho detestável.

Até que era bonito. Queixo largo, cabelo desgrenhando, uma pequena barriga - dizia que era de chope. E trepava bem, e se trepava. Essa noite aquela sua bunda linda havia sido dele.

Cole Porter continuava tocando na vitrola.

O lençol vermelho, ficou ainda mais vermelho, quando ela meteu-lhe o furador de gelo no pescoço.

Ela já sabia, mas nunca tinha visto a pressão com que o sangue espirrava da aorta.

Agora seus seios também estavam tingidos pelo sangue dele.

Priscila se deitou ao seu lado na cama e se masturbou. Ai como queria poder - como ele o havia feito - beijar e morder sua própria bunda.
 
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domingo
alessandro garcia  [email protected]
 
Comprou uma daquelas calças de moletom que sempre deixavam o saco parecendo incrivelmente volumoso, por mais que o tamanho das calças fosse grande, ou por mais que puxasse as calças para baixo. Acostumado a usar calças jeans, resolveu de uma hora para outra que começaria a usar moletons, ao menos aos domingos, quando saia para comprar pão naquela padaria da atendente gostosinha. Moletons combinavam com tardes deprimentes de domingo. E meias soquetes brancas socadas pelos chinelos de dedo no meio dos dedos eram outro acessório que faria parte de seus hábitos dominicais. Não sabia se era mania ou se somente queria estar confortável aos domingos, mais do que em quaisquer outros dias.
 
Comia pão com chimia rindo com a boca aberta dos programas imbecis de domingo e pensava na guria gostosinha da padaria encostada no balcão, sem televisão (ao menos não tinha que ver os programas imbecis!), vendendo pão e chimia para os tradicionais fregueses de domingo e olhando o escasso movimento em frente à padaria. Pensou em levar um pedaço para a guria, mas provavelmente ela o acharia louco, ou alguma espécie de imbecil. Viu que ela notou que ele passou a ir à padaria com aquela calça de moletom que deixava ele boludo. Por mais nova que a calça fosse, parecia sempre uma calça podre de dormir ou de ficar em casa comendo pão com chimia rindo com a boca aberta dos programas imbecis de domingo. Será que ela se impressionava com o tamanho de suas bolas sacudindo no meio daquelas calças de moletom? Ela fugiu com o olhar e perguntou se ele queria mais alguma coisa, ele disse que não, obrigado, e ele notou que antes de se virar para atender o outro freguês, ela ainda deu uma olhadinha para as calças de moletom dele.
 
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traição
tiago soares  [email protected]

Algumas traições são involuntárias.

Grandes homens admitem erros e ocasionais traições propositais. Não, não, melhor. Grandes homens não traem. Eles são retos e justos e ajudam velhinhas a atravessar a rua, e essas coisas todas. E eu não sou tão grande homem assim, seja para não praticar traições diversas, seja para admitir traições vergonhosas nas quais tenha me metido com algum entusiasmo. Mas juro que aquela traição foi involuntária. Eu era muito jovem para entender qualquer coisa e criar juízos sensatos acerca de que assunto fosse. E, juro, a minha expressão alegre na fotografia não refletia de modo algum qualquer sentimento de completude - ou seja lá o que for que as pessoas que se metem em traições sintam que não seja remorso - relacionado à empreitada. Eu poderia mentir, e inventar histórias, ou sair correndo com as mãos cobrindo meus ouvidos, e negar tudo. Mas seria inútil, porque a foto está lá, e eu estou sorridente, com o jardim ensolarado ao fundo, seminu da cintura pra baixo. E, bem, a pessoa que estaria, não menos sorridente, te mostrando a foto e, muito provavelmente, fazendo comentários graciosos acerca de minha nudez parcial, seria minha mãe. E a palavra dela sempre foi, para todos os efeitos, mais respeitável e confiável que a minha. Então eu me dou por vencido, e digo que, sim, sou eu mesmo na foto, e que, sim, aquele é o meu pinto, e que, sim, eu pareço fofo com o meu pinto de fora naquela foto, obrigado.

A minha inconseqüência à época em que a foto foi tirada deveria valer alguma coisa, de qualquer maneira. Se não para me redimir de meus pecados, para que todos pelo menos concordássemos que eu não era exatamente brilhante naquele tempo, e que atos de bom senso ou expressões ocasionais de sensatez não deveriam ser esperados, ou cobrados. E, bem, aqueles tempos são idos, e as pessoas mudam, talvez os mais de vinte anos passados desde aquela tarde alegre no jardim de minha avó tenham me moldado num homem melhor. Mas eu sei que é inútil me debater e tentar convencer os outros de qualquer coisa que seja. A prova está lá, naquela imagem sorridente vinte anos mais nova.

Certo, eu sei que pareço feliz, e alheio ao meu grande erro, mas juro, eu juro, isto é só porque eu não sabia, eu não tinha idéia do que se passava. E meu pai se aproveitou disto, e me vestiu com aquela camisa. Foi só por isso que não reagi. Hoje eu sei, foi errado. E meu pai nem torce mais pra eles. Ele deixou de acompanhar futebol faz um tempo já. O fato de ser aquele o meu primeiro registro fotográfico com algum caráter futebolístico é, portanto, apenas o nefando resultado de uma infeliz conjunção de fatores que me fugiam, todos, do controle. Eu sei que homens de verdade devem ser para sempre fiéis ao seu primeiro time, e tudo, mas aquilo foi um ardil, uma armadilha para a qual fui astuciosamente atraído. Nada disto importa, porém.

A camisa do São Paulo, ainda que uma única vez, num ato insensato próprio de garotos de um ano de idade, foi a primeira que vesti na vida, e minha devoção ao Palmeiras é apenas uma expressão menor de lealdade, a alegoria da pequena alma de um homem que não parece muito arrependido ao virar as costas para suas origens.

Mas, vejam só, eu tenho uma outra foto parecida com aquela. Talvez ela pudesse servir como prova da minha antiga e involuntária insensatez, e total falta de critérios. Nela eu estou seminu também, e aparentemente alegre, mas com a camisa do Cosmos. É, do Cosmos. New York Cosmos. Isto deveria ser considerado como mais grave. Afinal, pô, eles jogavam "soccer".

Soccer! Eu sei que o Pelé jogou lá, e tudo, mas, bem, ninguém nunca levou isso a sério. E eu estou lá, sorridente, com a camisa do Cosmos, a prova última de minha jovem inaptidão futebolística, mas ninguém liga. Vejam, eu ficava sorridente vestindo uma camisa do Cosmos também, eu não entendia nada de nada de futebol. Pra falar a verdade, eu não sabia nem me vestir sozinho, acho que foi a minha mãe que me vestiu naquele dia. Mas isto conta? Seria isto talvez prova válida de minha alienação às coisas importantes do mundo naquela época? Não, não senhores. Porque traições, involuntárias ou não, serão sempre traições.

E a mim resta apenas a resignação dos traidores.
 
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f a l a   q u e   e u   t e   e s c u t o
Agora também na versão BLOG. Escreva para [email protected], ou deixe seus comentários no weblog do nosso site: http://www.spamzine.net. Servimos melhor para servir sempre.
 
----- Original Message -----
From: Quésia 
Subject: Lê ae!!!

"Ae, a net está infestada de lixos hein. pra não dizer outra coisa (ih, nem precisava dizer, eu sei). Por isso eu fico feliz (hehe) qd encontro uma HP do tipo do SZ. Sabem aproveitar bem o 'Ciberespaço'. É isso ae galera, usar a própria tecnologia contra toda essa corrente que visa transformar o mundo em bits comestíveis, vestíveis, habitáveis. Bit sabor morango radioativo. Ih!! parei. Não liguem não, é que eu andei lendo uns textos do tipo: 'Era da Informação', 'A Vida Digital' (...). Uma coisa que eu queria destacar é o fato de vocês falarem de coisa séria (nem sempre, é verdade) com humor. Pessoas felizes pelo que parece. Isso é muito bom. Leio sempre que posso. Não há muito tempo, mas todo mundo diz a mesma coisa (...). Pretendo começar fundando uma Igreja que se chamará: Igreja Santificada dos Feriados de Todos os Dias... Do jeito que está não dá não.

Uma relação proporcional muito estranha: quanto mais se desenvolve tecnologias, mais rápido podemos fazer as coisas e no entanto cada vez temos menos tempo. Está tudo indo rápido demais: hoje me assustei quando lembrei do tal 11 de setembro. Meu, isso foi há quase um ano, e no entanto parece que foi semana passada... Isso me assusta muito! Não era para ser assim; na época dos nossos avós, o tempo era mais lento, as pessoas eram mais lentas... não como fast-food, faz mal ao meu estômago.

Moro em Campos dos Goytacazes e conheci o SZ através da... (ih nem me lembro qual foi a primeira HP. há links para o SZ em quase todas as págs que entro...) e gostaria de receber o SZ no formato que for menor".

inagaki responde: Ms. Quésia, obrigado por ter apreciado nossos bits maionésicos. Embora, à primeira vista, possa parecer que nossos bits sejam de fácil digestão, o fato é que o Spam Zine busca trazer a seus assinantes literatura repleta daquelas entrelinhas embaralháveis no cérebro dos leitores mais incautos. Sacumé: ler em monitor é cansativo, e a gente sempre procura armar umas arapucas (p. ex., virunduns) para prender os leitores dessa tal era digital. Legal saber que cooptamos mais uma leitora de Campos dos Goytacazes; como diria meu camarada Jorge Rocha, "o império se expande". Quanto aos acontecimentos de 11 de setembro passado, não perca o próximo SZ, a cargo de nosso enfant terrible José Vicente: encarreguei-o pessoalmente de tecer um editorial sobre o dia em que o american way of life soçobrou. Beijim e juízo (ma non troppo)!
 
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----- Original Message -----
From: Sérgio Ricardo C. dos Santos
Subject: Envio de Textos


"Olá. Dentro daquela linha literária de que alguns cronistas se valem, falando sobre a falta do que falar (ou escrever), venho aqui prenunciar meu pedido explicando o tempo que gastei bolando mirabolantes argumentos que viessem justificar o porquê da necessidade que vocês têm de publicar algo dos textos que humildemente venho oferecer-lhes. (...)

Não me julguem pretensioso. Não acredito estar a altura de outros colaboradores que temos no Spamzine, apenas me valho desta democracia trazida pela internet para mostrar um pouco do que fiz em minha vida (14 páginas... hã, puxa, que vida agitada a minha, não?). Bom, é isso. Espero não ter incomodado.
p.s.: Eu já havia mandado um texto (o primeiro desta coletânea) em formato .doc (word), então, mando agora em .pdf (acrobat) para ver se é prático. Se não for, pleeeease, avisem-me que procedo com o re-envio (ou mesmo avisem se não puderem publicar nada, de qualquer forma)".
 
inagaki responde: caro Sérgio, aproveito a sua mensagem para fazer um pedido a todos aqueles que desejam enviar colaborações ao Spam Zine: por favor, JAMAIS encaminhem seus textos em arquivos atachados. Mandem textos no próprio corpo do e-mail, please: vocês economizam bytes, e eu, tempo de conexão na hora de baixar as mensagens. Quanto à publicação, não se avexe em encaminhar suas colaborações pra gente. Mas é aquela coisa, Sérgio: não dá pra afirmar quando e se tais textos serão efetivamente aproveitados. Pra cada edição do SZ, há pelo menos 40 outros em nossa gaveta que não foram publicados, mas que ficam à espreita, como aquele jogador reserva que só aguarda uma oportunidade para entrar na equipe e não sair mais do time. Obrigado pelo interesse, e boa sorte!
  
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inagaki: semana que vem o Spam Zine vai sair na quarta-feira, dia 11 de setembro. Isto é, salvo imprevistos. Sacumé.