SpamZine_________________
049
28 de janeiro de 2002
curitiba  são paulo  rio de janeiro  goiânia  miami beach  londrina  lisboa  joão pessoa
 
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n e s t a   e d i ç ã o:
 
pensamentos publicitários  porcos notívagos  nick cave  traições  gestação lúdica  crônicas e crônicas  tolkien e o pó  domingos incertos  poefísica
 
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editorial
ricardo sabbag  [email protected]
 
Não sei o que deu na cabeça dos publicitários. Talvez façam isso por pressões (ou vontades) dos clientes. Talvez tenham achado a fórmula do sucesso (sempre acham). Não sei. Mas você já reparou como, hoje, todas as campanhas publicitárias de cerveja preferem vender sexo à bebida?
 
A propaganda sempre foi recheada de subliminaridades que envolveram o consumidor a fim de que ele comprasse o produto. O caso clássico é do cigarro Marlboro. Em nenhum momento se exalta simplesmente o prazer de se fumar um careto vermelho, mas sim a virilidade, a masculinidade e o espírito de aventura que se adquire detonando o bastonete nicotinoso da Philip Morris. Você, seu chapéu, seu cavalo e o maravilhoso mundo de Marlboro.
 
Ironicamente, há pouco tempo morreu o ator que fazia o cowboy dos filmes. Câncer, se não me engano.
 
Enfim, hoje todas as marcas de cerveja brasileiras vendem seus produtos apostando em vender o sexo junto. A Brahma botou siris e as tartarugas amalucados para contracenar com gostosas. A Antarctica, num sinal absurdo de genialidade publicitária, quer vender cerveja dizendo que a bebida é boa porque o lúpulo é uma planta da família das trepadeiras. A Skol faz troça do desempenho sexual do macho sarado brasileiro. E até a Kaiser aposentou o baixinho e pôs globais para babar em frente a uma mulher que parece ter sido esculpida por Deus Ele próprio.
 
São, sem dúvida, mulheres belíssimas, dignas de que se exponham seus atributos. Mas me parece que esse frenesi sexual está servindo mais para criar um clima de mal-estar do que campanhas bem sucedidas.
 
Cerveja sempre vendeu bem no Brasil. Normalmente, cada região tem suas preferências. Brahma é muito vendida no Rio, por exemplo, enquanto aqui no sul é difícil achar para vender. Até a Schincariol agrada em determinados lugares. E o incrível é que os consumidores de cerveja bebem MUITA cerveja, sempre. É um negócio que não tem como dar errado. Ao menos para as marcas tradicionais.
 
Mesmo a Coca-Cola, que também tem sua fatia de mercado assegurada para milênios à frente, procura realizar campanhas inovadoras de quando em quando. Nunca (quero crer) apostará em uma propaganda sexista, porque seu produto se destina a públicos diferentes do da cerveja. A campanha publicitária, nesse caso, serve mais para assegurar a marca, seu bom gosto, sua contemporaneidade, como queiram.
 
Então por que os publicitários, como se agissem tal qual um cartel, resolvem desenvolver suas campanhas promovendo o sexo barato e despropositado?
 
Eles devem responder dizendo que baseiam suas campanhas em apuradas pesquisas que descobrem exatamente qual o anseio do consumidor para aquele momento. "O brasileiro quer ver mulher seminua na TV. É isso que daremos a ele".
 
Mas ninguém tem bom senso nessa hora? Vale qualquer coisa?
 
Pode parecer excessivamente moralista, mas na hora em que passam esses filmes publicitários, eu sempre imagino qual a reação do meu irmão de 8 anos ao se deparar com essas imagens. O que ele, em sua inocência infantil, depreende dessas propagandas?
 
Assim como milhões, ele está sendo submetido à sexualização precoce. Aprenderá que o sexo é algo que devemos buscar o quanto antes, ansiosamente, e sempre procurando a perfeição.
 
Afinal de contas, o descompromisso que atingiu nossa geração gerou um slogan que afirma que todas nossas ações são auto-justificáveis. Eu bebo cerveja porque sim. Eu faço sexo porque sim. Eu fumo maconha porque sim. Eu durmo até tarde porque sim. Porque eu gosto. E porque ninguém tem nada com isso.
 
Pode até soar como liberdade. Mas soa, também, como se estivéssemos perdendo todo e qualquer referencial conquistado por nossas gerações anteriores.
 
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Nesta edição em que retorno de uma pesada virulência, depois de uma semana de tensão aguardando a possibilidade do desemprego, saiba, nobre leitor, que todos os textos abaixo foram cuidadosamente selecionados. O Spam Zine recebeu várias belas colaborações. Nem todas as que mereceriam estar nesse espaço acabarão sendo publicadas. Entretanto, espero que continuem se lembrando de nós. Ainda temos um longo caminho pela frente.
 
Saravá.
 
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os porcos da noite
heleine fernandes  [email protected] 
 
A vida ia bem
meio a espigas e lavagem
até o dia em que o bom senhor
nada mais tinha para do seu estômago calar a dor.
 
A fartura das refeições tinha razão específica:
atrofiar o fígado, inchar o bucho,
crescer do facão o olho
e obter o acompanhamento da farofa.
 
Os porcos perceberam o plano maquiavélico
por trás do bom trato
e se reuniram em assembléia extraordinária
para combinar a rebelia.
 
Por fim, se deram conta de que eram mewros suínos
e, como tais, não poderiam lutar contra os humanos.
O abatimento seria ao raiar do dia seguinte.
Tudo estava perdido até o soar de uma idéia brilhante:
 
"Se não houver aurora
não haverá carnificina!
Contra o sol façamos uma barreira
no topo da mais alta montanha."
 
Os grunhidos de esperança e euforia infectaram
todo o curral.
Logo se alistaram
na marcha em caminho daquela missão vital.
 
Com sucesso, ávidos por vida,
os porcos se empilharam na montanha.
A protuberante aberração
mostrou o efêmero sucesso de uma ilusão.
 
Ao levantar do dia
a muralha suína não suportara.
Um a um despencaram do precipício
tendo o destino realizado o seu vil capricho.
 
Pois aí está o vermelho da aurora,
rubro sudário dessa triste desgraça!

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aquela música do nick cave...
jorge rocha  [email protected]

>>>PLAY
[despair and deception, love´s ugly little twins
come a-knocking in my door, i let them in]

 
Estou tentando ser o mais claro que consigo. Penso em socar seu estômago. Uma. Duas. Três vezes. E me basta. Até que sua imagem, em minhas memórias, justo aquilo que me faz lembrar você, por onde quer que eu passe, fique estirada, prostrada bem à minha frente, no chão. Nada de hematomas, apenas força de esquecimento. E agora, um rasgo, um corte cirúrgico asséptico, uma recomendação médica – talvez eu tenha buscado a opinião de profissionais do ramo. Santa sangre: todas estas recordações que fazem acumular pus na memória, apenas estas, sendo retiradas à fórceps. Bom, talvez nem todas.
 
[a life-sentence sweeping confetti from the floor of a concrete hole]
 
Eu tenho a tarefa de escrever, para hoje, três letras. Para que virem música, para que alguém cisme em cantá-las, para que leiam o encarte enquanto uma cadência melancólica martela os tímpanos, para que ... Para que?  Não tenho aditivos e estou esperando que chova. Quente demais e eu tenho que fazer estes malabarismos sem direito a rede de proteção. E não dá para polir cicatrizes, tampouco passar um verniz. Pode ser que chova a qualquer momento. E esse gosto de bebida em minha boca recende à tardes, noites e madrugadas que não passam. Esticadas. Tanto quanto aquele fio de lembrança de imagens diante de um espelho. Em momentos assim, instintivamente, afago e enrolo fios do meu cavanhaque.
 
[well, i´ve been bound and gagged and i´ve been terrorized
and i´ve been castrated and i´ve been lobotomized
but never has my tormenter come in such a cunning disguise]

Já tive lá meus momentos de dúvidas cruéis. Se cortava os pulsos embaixo da mesa do escritório do meu pai ou simplesmente batucava um sambinha no telefone, independente do que estivesse ouvindo no momento. Também já pensei em decapitação – num estágio mais racional, cortar esta ou aquela passagem pela raiz. Mas optei por um método mais lento: bastar-me. Novamente não mais alimentar grandes expectativas. Talvez faça parte do processo evolutivo. Neanderthal rules again.
 
[where are my friends ?
my friends are gone]
 
Acabei de me lembrar que sempre esbarro em um ou outro yuppie. Crônica de alergias anunciadas: deve haver um que não suporto, em especial. Meu estômago não mais socado imediatamente levanta os punhos e ensaia uns jabs, esmurrando o ar. Até determinado momento, cego, eu não sabia que os yuppies ainda existiam, que haviam sobrevivido ao grande cataclisma ... Modelitos mudados aqui e acolá, mas ainda é fácil detectar, principalmente quando se trata de yuppies de espírito, pose condimentada que é para não dar tanta bandeira, certificando propriedade e escondendo-se em monossílabos grunhidos ao encarar olho no olho.

[well, buddy, you´ve been worned
for worse to be love´s lover than the lover that love has scorned]
 
 
Morte aos cabeludos ! Morte aos carecas ! Morte à falta de barba ! E morte ao excesso de barba também ! Viva as costeletas ! Hip ! Hip ! Hurra ! Que sejamos acometidos de exorcismo. Expurgar, expurgar, expurgar. É bom que se diga: à tapa. Lixo do mundo. A raiva vai nos salvar. É isso que nos mantém vivos. Puta frustração. Lembra sobre o que estávamos falando mesmo?
 
PAUSE<<<
 
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p e r g u n t a r  n ã o  o f e n d e
"Qual a mais memorável chifrada que você já deu (ou levou)?"
 
marcelo zoyd  [email protected]
"Tomei e dei a maior chifrada da minha vida no mesmo dia. Na verdade, com um intervalo de poucas horas. Nos tempos em que eu trabalhava na Folha, tava com uma mania de solitário de entrar em chats diariamente. Nessa época, namorava uma mina da minha cidade, Santos, a Adriana, uma veterinária maluca, que estudava psicologia, e tinha feito cursinho no Bijou comigo, sete ou oito anos antes e que reencontrei por acaso. Ela era uma garota que me deixava maluco e sumia de vez em quando e não tinha resolvido totalmente, na cabeça dela, pelo menos, sua relação com o pai do filho dela, o grande George. Eis que, num fim-de-semana que ela sumiu, eu entrei no chat e descolei uma mina. Encontrava a Tatiana todos os dias, ela era gordinha, mas muito bonita, olhos azuis, uma doçurinha. Num sábado, a Adriana havia sumido e eu nem fui atrás dela. À noite, tinha armado o bote todo com a Tati. Vinhozinho, sexo. Até que valeu a pena e matei a curiosidade de transar com uma gorda. No meio da transa, entre a primeira e a segunda, a Dri ligou. Disse que a tia dela tinha morrido e que queria me ver. Falei que no finde que ela sumiu, eu também queria tê-la visto, que também tava carente (e como) e desliguei, antes dizendo que no dia seguinte a gente se falava.

Descemos juntos para a Baixada no dia seguinte, no macio e gostoso Honda Civic dela. Ela me apertou e confessei. E ela também: 'Tô muito puta contigo, mas também caguei. Transei com o meu ex'. Eu ri, de tão ridícula que era a situação. Em seguida ela propôs: 'eu não sei o que quero, mas vamos ser só fuckin' friends?'. Eu falei: great. E assim ficamos mais um mês, mais amigos do que 'fuckin', mas tudo bem."

pergunta da próxima semana:
"Se você fosse obrigado(a) a vender sua alma ao Diabo, o que pediria em troca?".
Ajude-nos a montar nosso perfil de assinantes em [email protected].
 
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gravidez
carlãO  [email protected] 
 
pulsa um coração disritmado
dentro da minha depressão
e nas altas horas da noite
eu abafo o grito desesperado
ao tentar imaginar qual tipo de ser
em mim pode estar sendo gerado
 
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da crônica ao metajornalismo
nemo nox  [email protected] 
 
Alguns dos maiores jornais do Brasil já começaram a publicar colunas específicas sobre weblogs. O que antes era mera curiosidade e recebia tratamento de moda passageira agora começa a ser encarado com seriedade pela grande mídia. E já são muitos os jornalistas que também começaram seus próprios weblogs. No meio desta efervescência, fica a pergunta: weblog é jornalismo?

O problema em abordar essa questão de forma global é a enorme diversidade de modelos adotada pelos blogueiros. Temos de narrativas românticas a desabafos profissionais, de mini-contos a relatos de viagem, de comentários do dia-a-dia a ensaios de marketing, a lista é infindável. Dentro desse caleidoscópio temático, somos tentados a comparar os weblogs às colunas de crônica tão comuns em jornais de ontem e de hoje, sendo também um formato adotado por algumas emissoras de televisão. Nos weblogs, em vez da coluninha semanal onde tudo pode ser assunto, até a falta de assunto, temos os posts diários onde tudo pode ser assunto, até para quem não tem assunto.

Mas podemos buscar outra relação entre weblogs e jornalismo, mesmo excluindo os exemplos óbvios e raros onde o blogueiro está efetivamente usando seu espaço como repórter e fazendo cobertura de eventos. Há um elemento comum, além da estrutura linear-vertical de posts com data, unindo quase todos os weblogs: a grande quantidade de links oferecidos para outros sites, freqüentemente para sites da grande mídia. Neste sentido, o weblog pode ser considerado uma espécie de metajornalismo, um filtro personalizado e muitas vezes comentado, com liberdade inclusive para alinhavar fontes distintas num só post, citando e confrontando veículos concorrentes ou pontos de vista conflitantes.

O link é talvez o elemento que mais caracterize a experiência da world wide web, e nos weblogs encontrou terreno fértil para uma explosão hipertextual. Jornais, revistas, programas de rádio e televisão, e até mesmo outros sites de notícias, passam pela análise diária de um exército de blogueiros que elogia, critica, acrescenta, desmente, analisa, retruca, questiona, e dá a sua própria versão dos fatos. O caminho é de mão dupla, com grandes veículos oferecendo matéria-prima aos nanicos, que por sua vez a retrabalham e remetem seus públicos pequenos porém segmentados de volta à origem, mas agora com um verniz crítico diferenciado. A simbiose é inescapável, e é a isso que começam a se render agora os gigantes da mídia, ao menos os mais ágeis.

obs: texto publicado originalmente no site Burburinho (http://www.burburinho.com).
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s p a m   c i n e
Viu filme e quer comentar? Baixou uma Pauline Kael, um Inácio Araújo aí na sua cacunda? Pues, envie o seu comentário crítico, o seu pitaco pelicular para [email protected]. Os melhores e mais desaforados sempre têm vez.
 
senhor dos anéis, uma história sobre drogas
mateus potumati  [email protected]
 
(para ser lida usando runners stand still, e night dancing, do TRANS AM. se não tiver para ouvir, mete ficha no audiogalaxy que eu espero)

finalmente consegui ingresso pro senhor dos anéis. isso já faz duas semanas, mas esperei conseguir assistir ao filme duas vezes para poder escrever. meu objetivo aqui não é especificamente fazer uma resenha, mas não vou resistir a falar pelo menos um pouco a respeito. o filme é espetacular, quem ainda não se decidiu a ir não perca tempo, que a diversão é garantidíssima. são três horas que passam voando, e durante esse  tempo todo ninguém vira para o lado nem dá um pio (exceto eu, que não dei um pio mas virei para o lado para ver e alguém virava para o lado ou dava algum pio). nas duas vezes que eu fui, porém, rolaram algumas coisas muito nada a ver. na primeira, a administração do cinema marcou feio na hora do intervalo. deram sinal para sair, mas não para entrar. na verdade, recomeçaram o filme com as luzes ainda acesas. como resultado, umas 50 pessoas perderam o início da segunda parte. se eu estivesse entre os 50, a sessão teria parado, ah teria.
 
na segunda vez, em outro cinema, já de cara peguei mal com o público: cadeiras lotadas de casaizinhos-shopping. ora, vocês sabem como eles são. moças com cabelos claros (me parece que a loirice absoluta vem saindo de moda, mas permanece como referência), bolsas de grife, calças apertadas no rego, sapatos de salto, perfumes irradiando a 30 metros. acompanhadas de carinhas de camisa, cabelinho penteado, nem quero definir muito porque me dá asco. engomadinhos modernos, enfim. urbanidade média, sonhos de consumo, amenidades e família. eles eram muitos, e aquela mistureira de perfume por si só já é um pé no saco. por que as pessoas não sabem usar perfume?
 
bom, e isto nem foi o pior. um paralisado cerebral do meu lado simplesmente ATENDEU AO TELEFONE CELULAR no meio do filme. 'fala moisés. moisés, pode falar!'. o cara do outro lado deve ter se ligado que não era um momento bom, mas o lobotomizado continuava, 'FALA!'. gritando, literalmente. eu me virei para o lado e fiquei olhando a pessoa com uma expressão de estarrecimento que nem sei se consigo reproduzir. minha vontade era pegar o colarinho do filho da puta e jogar o maldito telefone na tela do cinema. o cara era tão tapado que nem percebeu a minha reação. só desligou o telefone porque a namorada percebeu minha cólera e pediu a ele que desligasse.
 
o filme, enfim. tudo é extremamente bem feito. o roteiro te prende na cadeira, os diálogos não te tomam por retardado, os efeitos especiais são uma aula de bom gosto, a música é excelente, as locações parecem ter saltado do livro, etc. o que mais me impressionou foi o detalhismo. desde a nota tensa que sempre aparece até nos temas musicais dos lugares amenos, criando o clima de iminência constante, até o queijo em cima da mesa do hobbit bolseiro, tudo transparece esmero e trabalho dedicado. o resultado é que as salas de cinema daqui de Londrina estão fazendo sessões extra, à meia-noite. lotadas. o povo sai às 3 e meia da manhã. eu chuto que vai ser o maior blockbuster da história do cinema, e com uma dignidade que há muito não se via. o único senão do filme é que eles deixam de explicar que o final não é final, mas apenas um corte mais ou menos coerente em um filme de 9 horas. o infeliz do celular saiu bufando, 'ah, mas termina ssim?!?'. não que a opinião dele conte, mas o fato é que muita gente não conhece a história nem o conceito do filme, então há decepções com o final. não custaria nada um TO BE CONTINUED ou algo.
 
mas ainda não é sobre isso que quero falar. meu objetivo com a coluna de hoje é chamar a atenção para o subtexto do filme. toda essa aventura fantástica de elfos (e, ah, elfas), guerreiros, demônios e afins, tem um sentido menos claro, mas totalmente coerente. senhor dos anéis, meus caros, é uma fábula sobre cocaína. isso mesmo, a droga maldita, a dama branca, uma das mercadorias mais lucrativas do mundo.
 
pra quem ainda não conhece a história do Tolkien, deixa eu explicar. em eras longínquas, anéis de poder foram dados a representantes de vários povos, como forma de dividir este poder. mas Sauron, um cara realmente mau, criou na miúda um anel sobressalente, enfeitiçado para ser o mais poderoso. o 'um anel', como foi chamado, confere ao usuário poderes absolutos, inclusive sobre todos os outros anéis, e tem vontade própria. mas obedece apenas a seu senhor, Sauron. Sauron, no entanto, o perdeu durante uma guerra, após a qual foi dado como morto, e daí para a frente o anel passou por várias mãos. depois de colocado no dedo de seu portador, passa a dominá-lo para propósitos maléficos. daí para a frente, o infeliz passa a viver em trevas, destinado a causar o mal aos outros e a si próprio, até que o anel o trai e leva à morte. um preço deveras alto a se pagar por um sonho de poder inigualável.
 
ok, se você não conhece a história e pretende ver o filme em breve, talvez seja prudente não ler daqui para a frente. vá ver o Senhor dos Anéis - a Sociedade do Anel, e volte para ver como eu tenho a mais completa razão.
 
o primeiro filme da série (todos os três já foram filmados, e não deve demorar muito até lançarem um 'Rocco - o Senhor de Todos os Anéis') conta a história de como o anel chegou ao poder de Frodo Bolseiro, um hobbit adolescente, singelo e fofinho como todos os outros. a propósito, achei muito fino que tenham traduzido alguns nomes e quase todos os sobrenomes da fábula. depois que chega a Frodo, há todo um esforço do lado branco (sem trocadilho) da força para se desfazer dele, o que se revela uma tarefa complicadíssima. além da dificuldade, digamos, logística - a única maneira é jogá-lo dentro do próprio vulcão onde foi forjado - outro problema maior surge: o espírito de Sauron volta para recuperá-lo e prosseguir com seu plano de destruição, ódio e horror.
 
e o que isso tudo tem a ver com cocaína? tudo, meus caros. o Senhor dos Anéis é uma fábula sobre as seduções e tragédias do pó, e também sobre um esforço de superação do vício e desmonte do tráfico.
 
vejamos alguns elementos:
 
1. o anel, claro, representa a cocaína. como a droga, seduz pelo desejo de poder, de super realização. cocaína é a droga do poder, não há outra droga que represente mais o poder do que ela. como a droga, o anel retro-estimula o seu uso. quanto mais se usa, mais se quer/precisa usar. e à medida que se vai usando, se perde o senso de diferença entre querer e precisar. nas primeiras vezes que cheira, o usuário o faz normalmente pela vontade de experimentar aquele estado de segurança e euforia controlada típicas do efeito da droga. quando se vicia, o viciado em cocaína passa a simplesmente usá-la, não fazendo diferença entre o querer e o precisar. o Maradona disse que não conseguia nem vestir a camisa da seleção argentina sem dar um tiro. sentia dor simplesmente pelo contato físico com o tecido sem estar sob o efeito da droga. é semelhante ao que acontece com Boromir, um dos membros da Sociedade do Anel: em vez de destruir, ele imagina poder controlá-lo para o bem. quando percebe, está a ponto de pôr tudo a perder pela sedução do poder. só encontra a paz de espírito na morte, a redenção final. resultado de uma parte dos viciados, a ala Cássia Eller.
 
2. Sauron. o maior patrão do pó no mundo inteiro. tão poderoso e anônimo que a última vez que alguém o viu foi 3 mil anos antes da história começar. consta a história que morreu, mas todo mundo sabe que ele ainda está vivo.
 
3. a Sociedade do Anel. composto por valorosos representantes de cada povo da Meia-Terra, o grupo tem a função de acompanhar e proteger Frodo até o local onde finalmente o anel será destruído, o que simboliza tanto a superação do vício quanto a queda de Sauron, o maior trafica do pedaço. todos são constantemente expostos à tentação de provar a droga, e seu fardo é resistir a isso para poder destruí-la. 
 
4. os Cavaleiros Negros. são os maiores noiados da história. sua obsessão pelo anel/pela cocaína é tão grande que eles vivem apenas em função de localizá-lo(a). no mundo real, equivalem aos boyzinhos/patyzinhas que de tanto meter o narigão acabam tendo que trabalhar pro traficante só pra sustentar o vício, enquanto o cabeça lucra fábulas. a cena é muito bem sintetizada naquela música dos Racionais, que tem um trecho assim: 'a mina era virgem, e ainda era menó. agora faz chupeta em troca de pó'.
 
5. a erva dos hobbits. sim, quem não reparou nela? a erva é imediatamente relacionada à paz de espírito, à vida pacata e despreocupada. só é usada pelos bonzinhos da história. na vida real, o símbolo é óbvio: maconha. a maconha é o inverso do pó, e não raro maconheiros não curtem cheiradores e vice-versa. isso inclusive é lembrado no filme, quando Gandalf discute com Saruman, seu chefe na ordem dos magos. Saruman lhe diz claramente que 'o gosto pela erva dos hobbits afetou-lhe o raciocínio'. e quando Gandalf descobre que Saruman é um traidor, ou seja, passou não só a cheirar como a trabalhar para o Cartel de Sauron, lhe pergunta, 'quando é que Saruman, o sábio, trocou a razão (fumar maconha) pela insensatez (cheirar pó que nem um crianção)?'.

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há ainda diversos outros elementos que esclarecem o verdadeiro sentido da trama, como a origem e a psiquê dos Orcs, os lugares por onde nossos heróis passam, os demônios que surgem, etc. mas eu deixo o exercício para vocês.

                          *
 
por hoje é só. cuidado onde metem o narizinho, crianças. cocaína é um negócio com alto poder de 'apagamento espiritual'. como dizia o Soundgarden, first steals your mind and then steals your soul. mas não vão achar que maconha é melhor do que cocaína só porque o filme diz isso. maconha também pode ser ruim. açúcar também pode ser ruim. leitura também. vá transar, que é melhor.

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aos domingos a noite é sempre pior
joão verde  [email protected] 
 
Descobri que tenho pedras de ácido úrico, destinado ao Alopurinol por uma vida inteira. A gripe veio visitar-me e o intestino continua irritável como sempre. Sexo não acontece todos os dias, a televisão está aborrecida sem nada que interesse ver, as eleições legislativas estão perto e o amor é coisa que ainda não recuperei por completo. Tenho uma ex-namorada que perdeu os pirolitos e está com deficit de sanidade, uma namorada viciada em rebuçados de mentol e uma colega de trabalho com problemas nos ossos. Levantei-me tarde e estive sempre em casa, andei a pingar do nariz, tive uma febre passageira atacada com paracetamol. Vi durante a tarde, pela enésima vez, um dos capítulos mais recentes do James Bond, continuo a achar a Denise Richards boa como o milho e sempre me interrogo porque razão ainda não esteve na minha cama nenhuma mulher assim. É a produção, bem sei, ela nem é assim tão interessante quando acorda de manhã.
 
O trabalho que faço todos os dias é interessante, mas as pessoas que o discutem não são. Com raras excepções não percebem nada mas opinam de qualquer maneira. Ando desconfiado da suspensão do meu carro, acho que está a inclinar-se demasiado nas curvas. Mas pode ser mania minha. Tenho muitas. Ainda não paguei a Segurança Social nem os impostos, adorava pagar tudo isso de uma vez para me orientar. Tenho dois convites para duas pessoas para jantar em restaurantes da capital, talvez vá em Fevereiro. Mas já paguei o seguro automóvel para este ano e fiquei satisfeito porque foi relativamente pouco. Não aprecio as notas nem as moedas de euro. Não tenho qualquer nostalgia do escudo, mas não aprovo o euro para além do facto de o considerar mais prático. Mas as moedas são feias e as notas parecem de brinquedo. Fui verificar o correio electrónico e só chegou um tal de Spamzine. Foi então que me lembrei que era interessante escrever qualquer coisa para enviar para o Spam e tudo quanto saiu neste dia de gripe foi esta borrada. Bom, resta o consolo de pensar que pior não podia ser, logo sempre foi qualquer coisa. E amanhã é segunda-feira. A gripe justifica a gazeta, amanhã sempre fico em casa a curtir a cama, mas mesmo assim a noite de Domingo é das coisas mais deslavadas que há.
 
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n a v e g a r   i m p r e c i s o
 
Falaê!
http://www.falae.com.br
Cumpadi Augusto Sales manda avisar: Falaê! pede passagem e retoma o seu posto de melhor portal alternativo da Web tupiniquim: contos, crônicas, resenhas, tendências e comportamento. A conferir também: a matéria publicada em O Globo saudando a volta do Falaê!
 
Latido
http://www.terra.com.ar/canales/latido
Para uma incursão cheia de prazer pela língua de Cervantes. É o site de um Zine argentino onde poetas, jornalistas e escritores escrevem delícias sobre temas específicos. Alegría, Juegos (Brincadeiras), Soledad (solidão), La Verguenza (A vergonha), Amigos, Infidelidad, etc... Embora infelizmente só estejam digitalizados os números a partir do nº. 17, sugiro em "La Alegría" ler a crônica da jornalista e poeta Raquel Garzón: Libre Como un Pez. Depois, divirtam-se! Mesmo se você não conhece a língua, vale a pena arriscar a leitura do castelhano assim!
 
(dica da leitora Rachel Gusmão - [email protected])
 
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ploft
lau siqueira  [email protected]
 
escrever poesia
algumas vezes
é como jogar pedra
               em açude
 as ondas se formam
e a gente conclui que
aquilo não é
                poesia
                     é física
 
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f a l a  q u e  e u  t e  e s c u t o
o único serviço de atendimento em que você não ouve frases feitas ao atender e desligar o telefone. só desejamos, de coração, que você tenha um bom dia. o spam zine agradece sua mensagem e lhe deseja, er... um bom dia. [email protected]

"Muito bom, mas muito bom mesmo a estréia do Spam Cine. Eu que há muito tempo vinha pedindo essa seção dedicada ao cinema, fico muito feliz. Ainda não li, mas tudo bem, hehe. Já vale uns kb a mais de entretenimento útil, inútil, sei lá.
Aquele abraço macacada!"
Marlus Augusto

sabbag responde:
Marlus, o Spam Cine foi uma das seções mais comentadas pelos nossos leitores. Ficamos felizes de ter acertado na escolha. Méritos aos co-editores Orlando Tosetto e Alexandre Inagaki, que conforme sugestão do leitor Marcelo Sawasato implantaram a seção enquanto eu estava de cama. E caso ainda não tenha lido, aproveite para dar uma olhada na pérola (no bom sentido) dessa semana desfilada pelo nosso colega Potumas. É típica das melhores conspirações. Abraço tenro.
 
"CONSELHO À ATRIZ C.N.
Refresca-te, irmã, na água
Da pequena tigela de cobre com pedacinhos de gelo
Abre os olhos sob a água, lava-os
Enxuga-te com a toalha áspera e lança
Um olhar num livro que amas
Começa assim
Um dia belo e útil.

BERTOLT BRECHT
POEMAS DE 1913-1956
ED.34"
Dani Sigaud
 
sabbag responde: essa foi uma das mensagens de melhoras que eu recebi dos leitores enquanto estava na cama com a varicela. infelizmente, não foram momentos de amor livre e gostosinho, mas sim de pruridos incessantes que vão resultar em buraquinhos na minha pele jovial. adorei, no entanto, as lembranças. quero ver se pego sarampo ou caxumba agora. beijos a todos.
 
"bem bonitinho esse site aí!
já me cadastrei.
ps: o que é alea jacta est?
eu to curioso pra saber, pq é o nome de um disco Royalle With Cheese: aliás, muito melhor do que a idéia do livro das pessoas que se conheceram via internet, seria uma edição encadernada de luxo com todas as edições do spamzine.
não que a ideia anterior seja muito ruim, mas falta um tchan"
Pedro Gonzalez
 
sabbag responde: Pedro, alea jacta est e uma expressão latina que significa "a sorte está lançada". Coincidentemente, lembrei-me muito dela durante essa semana que passou. Royale with Cheese eu só ouvi em 'Pulp Fiction', no famoso diálogo em que o John Travolta conta ao Samuel L. Jackson como são os nomes dos sanduíches do McDonald's na Europa. Royale é o Quarterão com Queijo. Quando à edição encadernada, tenha certeza de que no dia em que ganharmos quantias assombrosas de dinheiro com o Spam, produziremos a enviaremos a edição a todos nossos assinantes. De grátis. Abraço.
 
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fernando busian: E lá vai, o prefeito leva oito balaços. Puta que o pariu, ninguém sabe ninguém viu. Até guerrilha assume a execução. Calma, o melhor ainda está por vir. A emissora de TV manda todos se moverem, vestir branco e pedirem paz e um “basta na violência”. Mandam você levar aquele 38 herdado do avô para a praça, lá tem um rolo compressor. Ei! Antes avisem os americanos, os israelenses e os franceses. Eles armam todo o Terceiro Mundo, desde o Al Qaeda e até o CV e o TC. Ah, mas quem morreu mesmo? Apagaram tudo. Calma! Logo teremos usinas termonucleares de última geração que nos trarão luz.