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041
04 de dezembro de 2001
curitiba  são paulo  são josé dos campos  são carlos  goiânia

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n e s t a   e d i ç ã o:
 

gato bíblico  matemática poética  perdão sensual  epitáfios preferidos  andré, este casadoiro  tratado da burrice  eu vi a paz  pecados ruivos  caixa de besouro

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editorial
ricardo sabbag  [email protected]
 
Fiz um pacto com um amigo: durante dezembro, obrigar-nos-emos a ver toda espécie de porcaria que está passando no cinema. Começamos bem, com Legalmente Loira, e temos pela frente nada menos que um Harry Potter, Capitão Corelli e Animal, com o Rob Schneider. É uma maratona e tanto.

Antes que se pense bobagem, é bom explicar que não se trata de masoquismo gratuito. Acontece que eu, por uma dessas oportunidades da vida, ganhei, certa vez, um cartão que dá direito a dois ingressos gratuitos para assistir qualquer filme que está em exibição. E o prazo de validade do cartão está chegando ao fim. Temos pouco menos de um mês. Estabelecemos, então, uma média de três filmes por semana para analisar como Hollywood consegue se superar na produção das mais fétidas merdas cinematográficas.

Mas, ora essa, não é novidade que a maior parte das coisas em exibição no cinema sejam desprezíveis. O que eu lamento é como a "média" do que se exibe caiu. Já não consigo pensar em três grandes filmes que assisti esse ano. E olha que nem me considero chato para curtir filmes. Assisto mais o cinema americano (por motivos óbvios) do que o europeu.

No caso de se viver em Curitiba há, ainda, o problema dos exibidores. Ainda que a maior rede de cinemas tenha sido extremamente gentil comigo me oferecendo o cartão para ver filmes de graça (o que me poupa de um ódio ainda maior a se ver coisas como Hannibal), a maioria do que se exibe é totalmente circuitão. Mesmo quando um outsider faz sucesso, demora a vir pra cá, com raras exceções.

Isso, infelizmente, estraga o humor de um sujeito apaixonado pelo cinema como eu. Bons filmes - bons mesmo - estão raríssimos de se encontrar por aí. E acho que o problema é com o cinema, mesmo. Porque não vejo semelhança na literatura ou na música, ambientes em que é possível encontrar um número muito interessante de bons novos autores.

Mas o que mais me preocupa é a falta de referências que o espectador acaba tendo ao se deparar apenas com porcarias como as que estão em exibição. Na falta de um exemplo, passa-se a achar que Gladiador é coisa grande.
 
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PARA GEORGE

George Harrison se foi. Deixou uma legião de fãs e pelo menos uma das mais belas canções que a humanidade jamais ouviu, Something.

Não valem muito a pena os milhares de rituais de homenagem ao músico; flores no jardim; estátuas erguidas. Ele se foi para nunca mais voltar. O resto é fanfarronice.

Mas fica a memória. E nela se perpetua o gênio, o mestre e o poeta. George pode não ter sido o mais emblemático dos músicos, mas certamente sua partida tira da vida um pouco do ínfimo que ela nos dá de alegria.

Descansa em paz, George.
 
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a turba e o gato
marco aurélio brasil  [email protected]

"Mas o fruto do espírito é: ... a benignidade..."
Gálatas 5:22

O gato piscou duas vezes antes de decidir dar aquele salto. Caiu sobre o muro e sem ligar para a algazarra que vinha do outro lado, passou algum tempo lambendo suas patas, deliciado com o sol que batia.

Desceu do muro pelo outro lado e fez nova parada para novas lambeções. Quando deu por si, já estava nas mãos do menino.

- Peguei! Peguei! - gritou o moleque sardento com uniforme azul e branco e uma ovação de entusiasmo dos colegas acompanhou seu brado de triunfo.

Para o gato era tudo muito nonsense. Quem poderia querer correr daquele jeito numa hora da tarde como aquela, onde o silêncio da cidade e aquele solzinho benfazejo só faziam convidar à prostração, ao estado de imobilidade absoluta?

Agora ali estava ele. Sendo rodopiado pelo rabo como se fosse um iô-iô. Sendo jogado pra cima como se fosse um saco. Eles haviam feito um círculo ao seu redor, para que não fugisse. Assustado, quando caía no chão ele andava atordoado buscando desesperadamente uma brecha. De repente um chute por trás o fazia ver estrelas. Novo puxão pelo rabo. Mais um salto nas alturas.

Filipe estava na roda de bobinho quando Marlom exclamou "olha o gato ali, perto do muro!" e, como tudo mundo, correu até o bicho, deixando a bola esquecida no meio do pátio. Como todo mundo, ele vibrou quando Marlom gritou "peguei, peguei!" Mas daí pra diante ele não conseguiu acompanhar mais todo mundo. Ficou um pouco de fora da roda. É que subia um negócio ruim pela sua garganta.

Tocou a campainha.

- O recreio acabou! gritou um Que vamos fazer com ele? outro perguntou Que tal botar num saco e jogar no lixo? alguém sugeriu Ou pendurar na árvore e depois da aula pegar ele de novo? foi a idéia da outro.

- Não. (Marlom:) Vamos jogar ele no laguinho. e uma exclamação de excitação acompanhou aquelas sábias palavras.

A turba atravessou o pátio atropelando algumas meninas, que já se aprumavam na fila. O negócio ruim ficou maior na garganta de Filipe. Antes que Marlom consumasse sua brilhante idéia, ele se adiantou e falou com voz firme:

- Assim não!

Marlom interrompeu o movimento de lançamento no meio. À sua frente, o profundo e escuro laguinho parecia esperar placidamente, de molhados braços abertos. Os meninos acharam que Filipe conhecia uma técnica melhor de atirar gatos em laguinhos, então Marlom entregou o bichano em suas mãos. Era justo. Filipe fora o único que não se divertira lá atrás.

Ele o pegou não pelo rabo, mas pelas costelas, com cuidado. Permaneceu um curto mas intenso instante com ele assim, entre as mãos. Sentiu o coraçãozinho acelerado do bicho batendo. Viu seus olhos assustados. Então, sem olhar os colegas, num rápido movimento, virou-se de costas e atirou o gato por cima do muro.

Pela sua cabeça passava a pergunta: "será que era muito alto pra ele?" e a resposta: "acho que não, nesse ponto do muro tem o morrinho do quintal da Zuza..."

Ele sentiu que não tinha mais a coisa ruim na garganta. Mas em seguida percebeu que agora tinha uma coisa ruim nas costas, onde recebeu a pancada que o atirou no chão.

Do lado de lá, o gato olhava com arregaladíssimos olhos para aquele muro. Chacoalhou a cabeça, piscou duas vezes e seguiu seu rumo.
 
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íntimo logaritmo
marcel novaes  [email protected]

Diferencio em silêncio
Covardemente covariante
Preso na raiz quadrada
Triste, seno hiperbólico,
Piso em falso na integral
E diagonalizo
 
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pardon!
sara fazib  [email protected]

Umas taças de Moët et Chandon,
pro inferno a politess
— diz a boca lambuzada.

Entre os dedos da dama escorre
o sumo da manga espada.
 
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p e r g u n t a r   n ã o   o f e n d e
"Qual será o seu epitáfio?"

fred leal  [email protected]
Meu epitáfio, se eu for enterrado (prefiro ser cremado), deverá ser:
"Aqui jaz Fred Leal
1982 - 20XX
www.fredleal.com
(este site não será mais atualizado)"

gabriel pancera  [email protected]
"Até mais ver!"

társis schwald  [email protected]
"Melhor ter um fim miserável do que uma miséria infindável!"

eduardo makoto  [email protected]
"Antes que vc comece... não tenho dente de ouro seu filho da puta! Deixe-me em paz!!!!"

flaviane lopes  [email protected]
"Não nasci amarrada. Saltei, pulei e me dissolvi"

edney soares de souza  [email protected]
"Clique aqui para me enviar uma mensagem no além: [email protected] ;)"

naira marcatto  [email protected]
"Aqui jaz aquela que gozou da vida com sexo, drogas e rock'n'roll: faça o mesmo e junte-se a ela! (Ou você vai preferir chegar lá sem ter aproveitado nada, pô!)"

paula pimenta  [email protected]
O epitáfio não importa, mas no enterro vai ter que tocar aquela musiquinha "Já está chegando a hora de ir, venho aqui me despedir e dizer, que em qualquer lugar por onde eu andar, vou lembrar de você, só me resta agora dizer adeus e depois o meu caminho seguir, o meu coração aqui vou deixar, não ligue se acaso eu chorar, mas agora, adeus"... É pra todo mundo chorar mesmo.

noah mera  [email protected]
"Ao menos ele se divertiu."

luiz andrioli  [email protected]
"Enfim dentro de um buraco apertadinho"

joão verde  [email protected]
"Veio-se, viu-se e foi-se."

pergunta da próxima semana:
"Quem seriam as dez pessoas que você colocaria na Casa dos Artistas?"
Escreva: [email protected]. As respostas mais cínicas, originais e autodepreciativas serão publicadas na próxima edição.
 
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como casar com andré martins
indigo girl  [email protected]

Estava no mundo há catorze anos, e o mundo, ou minha mãe, queria saber para que eu servia. Encontrei o bilhete de convocação sobre minha escrivaninha. Teste Vocacional. Trazia o dia, horário e endereço. Num post-it, uma observação: "Já está pago. A psicóloga é minha amiga. Custou caro. Responda direito".

Muito cedo meu irmão deu sinais de propensão à engenharia. Seu quarto era um amontoado de coisas que ele desmontou ao longo dos anos. Garantiu seu futuro numa copa do mundo, quando programou o vídeo cassete para gravar jogos no horário exato em que eles começavam, mesmo não tendo ninguém em casa. Esse tinha emprego garantido. Minha irmã mais nova, afortunada pelo rendimento do comércio de rifas, comprou seu primeiro walk-man aos nove anos de idade. Aos doze tinha um negócio próprio, fabricava uma pulseirinha de barbante que virou a coqueluche da escola.

Eu era criativa. Era o máximo que podia se dizer a meu respeito, e que iria me casar com André Martins.

André Martins precisava de uma mulher de sucesso, pois ele teria um futuro glorioso pela frente. Estava escrito nas notas do seu boletim escolar. E esta mulher, por mais que algumas colegas achassem impossível, era eu. No dia do teste vocacional vesti uma calça jeans sem furos e fui ao local do encontro. Psicólogas nunca me passaram confiança, e esta, por ser amiga da minha mãe, muito menos. Forjaria as respostas se fosse necessário. Eu sairia dali como advogada. Com um pouco de sorte, juíza. Disputava com Débora Andrade e Silvana Brandão, que também tremulavam por André Martins. Não me preocupava muito com Silvana, que exibia tendências artísticas, mas Débora podia se revelar uma médica, engenheira, ou coisa do tipo.

Depois do teste a classe nunca mais foi a mesma. Revelada a verdade sobre cada um, nos dividimos por vocação. André Martins caiu na turma dos médicos, não que ele viesse a ser médico, de fato. Ele seria dentista, o que me decepcionou, mas não mudou em nada meus planos. É uma profissão decente, essa de dentista. Além do mais, o que importa é o amor. Débora seria agrônoma, mas por falta de companheiros similares, juntou-se à turma dos cientistas. Esta associação lhe rendeu um prestígio que uma mera agrônoma jamais alcançaria. Agora Débora levava uma vantagem considerável.

Com Silvana eu não me preocupava mais. Caiu fora da concorrência no minuto em que a psicóloga anunciou que ela seria professora de educação artística. Os professores, independente da disciplina, eram desmerecidos como categoria. Abaixo deles vinha o trio dos indefinidos, que ganhou "alternativas profissionais", e mesmo assim, só depois de uma segunda rodada de testes. Neste gueto havia um padre, um ator de teatro, e eu, como publicitária.

Nunca esquecerei o olhar de decepção de André Martins, quase lamentando o meu destino.. Ele não podia assumir compromisso com uma pessoa que tivesse sua subsistência baseada em idéias criativas. Eu compreendi seu ponto de vista e não insisti. Não tive como argumentar. Tampouco acreditei que fosse possível viver dignamente criando slogans. Soava-me como uma grande picaretagem.

O ator de teatro e o padre se revelaram bons amigos. Ao nosso trio, no segundo semestre, juntou-se uma bailarina, que até então se unira aos professores por falta de opção. Terminamos o ano unidos como uma trupe circense. Nunca levamos aquelas profissões a sério. O padre arrumou uma namorada. A bailarina começou a usar óculos, o ator de teatro se revelou o melhor jogador de futebol da escola, e eu comecei um diário. Temia estar mesmo fadada a viver de idéias, e neste caso, era melhor colocá-las no papel o quanto antes.

Dezessete anos depois...

Recentemente soube que André Martins já não possui cabelos. Apenas um chumaço que ele amarra num rabinho frágil. Isto bastou. Não quis saber o que veio a ser do resto dele, profissionalmente.
 
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n a v e g a r   i m p r e c i s o

Logopeia.
http://www.ignoremode.org/logopeia
Estou legislando em causa própria, é verdade, mas quero aproveitar o ensejo para convidar todos a visitar o weblog coletivo em que aparecem Alexandre Inagaki, Suzi Hong, Ian Black, Kazi, Luciana Naomi, sweethell, e, eventualmente, Ricardo Sabbag. Obrigado pela atenção dispensada e boa viagem.
 
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sobre a burrice
daniela abade  
[email protected]

A ignorância apareceu de uma forma clara na minha frente. Minto, não foi a ignorância: foi a burrice - ignorante é quem não tem acesso às informações, burro é que tem esse acesso e prefere se manter ignorante.

Pois então, a burrice apareceu de uma forma clara na minha frente.

Minha primeira reação foi informar. Mostrar outros pontos de vista, dizer que o mundo não se resume a um retângulo com um abismo no final. Ingenuidade a minha: a burrice não aceita informações. Nunca. Tentei arrumar outra saída e a única que me pareceu possível na hora foi ignorar a burrice (irônico, não?). Não queria ver, não queria ler, não queria saber, não queria ouvir nada que viesse dela. Admito que me senti aliviada. Estava numa posição distante e confortável.

Mas o que eu não sabia é que a burrice era insistente. Em pouco tempo ela voltou a me cutucar. A entrar nos círculos que eu freqüentava. A mostrar sua cara feia e mal-acabada. A levantar a sua voz para dizer nada. Tudo isso para simplesmente reafirmar sua existência.

Fiz força para continuar ignorando, mas eu tenho o mal-hábito de não conseguir me mostrar ignorante. Foi aí que apareceu a raiva. E não foi na minha frente. Foi dentro de mim. Com uma força que eu nunca imaginava que ela pudesse ter. Com uma força que eu não pude de maneira alguma controlar.

Bati, pisei e humilhei a  burrice. E ela não morria. Nem ao menos se retraia. Tirei sangue. Cuspi. Gritei. Chutei. Ela caia e parecia se levantar cada vez com mais força. Cada vez maior. Minha raiva também aumentava e, cega, acabei usando todas as minhas armas para não ouvir mais aquela voz.

Ela não se abateu. Ela nunca iria deixar de existir.

Foi então que chorei. Não pela derrota. Não pela decepção. Foi por ter percebido que ela conseguiu exatamente o que queria de mim - que naquele momento eu fui o que ela sempre quis que eu fosse. Burra.
 
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m e n i n o s  e u  v i
 
parada da paz - parque do ibirapuera, são paulo - 25/11/2001
esdras passos 
[email protected]

Os beijos eu não dei, pelo menos não na parada. Mas, coisas estranhas a gente vive na vida, não?

Paz, com certeza tinha, mas de jeito nenhum era uma paz parada, ao contrário era uma paz muito da agitada. Também com esta música eletrônica e hipnótica... difícil era ficar parado.

O tempo que fiquei não foi suficiente para distinguir as músicas. Sabia que não era a mesma pela grito da garotada toda vez que vinha um pequeno intervalo antes de começar aquele batuque alucinado de novo. Fiquei até curioso para entender como que era possível as pessoas cantarem juntas com a música. Pois é, em alguns intervalos daquela interminável música, podia se ouvir um coro ininteligível.

As tribos estavam todas lá. Sim, há diferenças sutis. Uns eram skatistas,outros de tecno, trance, hip hop, cybermanos, clubers, punks, drum´s bass, sei lá. Eu sou fã de MPB, entendem a minha dificuldade?

Todos com menos de 20. Exceto as barbies, estas querendo ter muito menos dos 30 (bonzinho eu) que tinham.

As meninas tinham roupas de boneca (quem se lembra das bonecas de papel, que a gente (ops) nossas irmãs, primas, amiguinhas, vestiam com a aquelas roupinhas destacáveis)? Eram muitas fitinhas, marias-chiquinhas, sainhas de uniforme de escola, meias 3/4, sapatinhos anabela.

Os meninos eram mais esquisitos. Cabelos espetados, tal qual a estátua da liberdade e com gargantilhas de contas de plástico multicoloridas. Eles eram a própria liberdade. Até saias usavam. Quase todos magricelos e sem camisas. Bom de ver, mesmo assim. Principalmente pela alegria de pularem/dançarem sem parar.

Esta é a parte mais legal. Eram indefinidos. Há 20 anos, seriam todos gays, pela aparência provocativa e andrógina. Hoje, tanto faz se estão de baton e muitos brincos, tanto podem estar beijando uma garota como um garoto, na maior naturalidade. Vi um futuro promissor, nesta hora eu achei muito apropriado o nome do evento, era mesmo uma "parada da paz", considerando-se o sentido do troglodita alexandre frota.

A música, quando se está perto das caixas, era insurdecedora. Um pouco mais de tempo ouvindo, descubro que a batida não é muito diferente do som do Sylvester, aquela bicha do tempo da discoteca (you make me feel).

Não pude ficar mais tempo, já até estava ficando mais à vontade com uma tribo de cybermanos, claro que eu era um tiozinho no meio da garotada, mas eram eles que iriam me iniciar naquele mundo tão louco.

Só vi o começo do inusitado show de axé-tronic da Daniela Mercury, logo depois do pronunciamento da prefeita.

Fui consertar meus ouvidos num concerto na Sala São Paulo. Não que entendesse mais, mas, para quem me conhece mais, ao menos pude semi-dormir sossegado ouvindo um coral cantando.

No ano que vem terá mais. E, mesmo com todas as críticas possíveis, quanto ao apelo marketeiro da parada, a gente precisa ver, presenciar, sentir. O mundo está mudando e aqueles jovens me fazem acreditar que teremos mais tolerância no futuro. Serei eu um romântico irrecuperável?

Paz e amor.
 
nota da direção: viu mostra performática, teatro infantil, filme cubano, reunião da amway, passarinho verde? mande seu relato para [email protected].
 
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p e c a d o s
mariana fazzini  [email protected]

Era uma paixão daquelas avassaladoras, arrebatadoras, de querer cortar os pulsos com a corda no pescoço... pra garantir... Que não tinha hora, nem lugar, nem sentimento que contesse, as trocas de olhares significativas que fazia querer mais, amar mais, sofrer mais, odiar muito... A negação dos defeitos e a partilha de uma sensação de não ter mais nada nesta vida que ainda tenha que acontecer porque você sabe que só se ama assim uma vez... Até que um dia o instinto de sobrevivência foi maior e a insuportável separação se tornou a única saída. A dor foi dando lugar à uma frustração tamanha só comparável às noites frias e à cama vazia, com a marca daquele corpo tão conhecido ainda nos lençóis...

E a vida passou, e o sofrimento se transformou em consolo amparado de lembranças e uma nova condição de amor surgiu, acalmando, acalentando. Amuderecer no amor é uma porra...

Mas um dia, de mãos dadas com o novo amor, o encontro adiado por tantos anos finalmente se deu. E foi tanta sacanagem da vida que eu tive a coragem necessária de olhar naqueles lindos olhos tão azuis, procurando um sinal de fumaça daquele amor que nunca morreu, o que me fez tremer toda, marcando vários pontos na escala Richter. O atual equivocado amor percebeu, o cumprimento que seguiu à apresentação foi uma série de grunhidos e uma pressa de ir embora me arrastando pra longe daqueles olhos...que me seguiram sem piscar enquanto eu controlava a vontade de voltar para olhar de novo naquela íris perturbadora...

Não comi, não durmi, não pisquei nem respirei mais naquele dia... O ex-novo amor já nem sabia mais como chamar minha atenção... Só conseguia era pensar naquele amor doido, naquelas coxas que me enlaçavam, naquele corpo quente que me envolvia, naquela voz que me deixava louca, o sorriso de menino, as brigas que sempre acabavam no chão, na terra, no asfalto, na água, no fogo... Será que eu ainda estava lá, como ele ainda estava em mim? E aquela sensação de ainda ser dele, destruindo a minha convicção de que estava bem melhor longe... A ironia é justamente o conflito entre o melhor e o inevitável... Que lugar comum fudido!!

A cama ficou pequena, o sono não vinha, o futuro ex-amor profundamente adormecido e a minha pele queimando... Levantei, desci as escadas da casa, a chave do carro, o maço de cigarro, a garrafa de cerveja, a noite sem lua...Tudo passava como nada na minha frente, eu completamente sonâmbula tentando aliviar o pensamento enquanto agia. A porta aberta devagar pra não fazer barulho, o carro empurrado até o fim da rua... hoje nem me lembro como fiz, só sei que aconteceu...

Rodei muito pela cidade antes de ir parar em frente a sua casa. Como num sonho, pisquei várias vezes pra ver se sumia aquela miragem... E abri e fechei a porta do maldito carro, que nem era meu, umas quinhentas vezes antes de me decidir sair... Fumei um maço de cigarro e voltei de novo pro carro... saí de novo... demorei uns quinze minutos pra trancar a porta pela décima vez... Droga!!! Atravessei o quintal, devagar, testando o chão...não podia e nem devia estar ali... O dia já ia nascer, o carro largado na rua, e se ele estiver com alguém, o que pode ter acontecido com o meu bom senso, isso não pode estar acontecendo, eu só posso estar louca...

Bati na porta. Abriu na hora, como se estivesse me esperando... Não disse nada, eu também não... Me puxou pra dentro, aqueles olhos me queimando, me roubando o ar, me trazendo de volta de onde nunca saí... nunca foi tão bom, nem tão perfeito, completo, a única vez em que não discordamos de nada...

Não trocamos nenhuma palavra... nem neste dia e nem nunca mais... Eu saí de lá completamente desnorteada, peguei o carro ainda tremendo, voltei pra casa... O desconhecido que encontrei me perguntou aonde fui e só pude dizer, estava sem sono...

Perdoe-me Pai, porque pequei... mas não seja muito gentil porque ainda não me arrependi... a culpa nunca veio...

e na minha trilha sonora ainda tem "I've got you under my skin"... e lindos olhos azuis...

p.s.: caro leitor, você também pode se redimir de seus pecados. Escreva para [email protected] relatando as lembranças mais sórdidas de seu passado imundo (não se esqueça de incluir os detalhes mais picantes). Spam Zine & rtfm por um mundo melhor: redenção digital ao seu alcance.
 
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beatlebox george
(arlã()  [email protected]

From Goiânia:

Era tarde da noite do dia 30 de novembro quando o telefone yellow-pequi gritou. Isso era ruim. A última vez que ele havia tocado foi quando Paul teve um acidente de carro em New York, dias antes de um boeing cair no bairro do Queens.

Sir Xis, na Central BeatleEverything, me avisara naquela ocasião que Paul estava bem e, caso eu visse ou lesse alguma notícia que não fosse aquela - shit press -, que eu não me aborrecesse, pois ele nada tinha sofrido, além de um leve susto, e me mandava um abraço e ...um soco no nariz. Velho Paul.

Sir Xis estava chorando e eu senti que tinha chegado a hora de ouvir aquela terrível notícia. Notícia que nos últimos dias parecia um bicho de geléia tentando se segurar numa estalactite, mas que escorregaria e se esborracharia inevitavelmente.

George fora embora.

Imediatamente corri até a minha beatlebox, onde estavam as duzentas e oitenta e sete fitas cassete gravadas pelos meus amigos John, Paul, George e Ringo, desde a nossa separação em 1969.

As de Lennon, datadas até 2.005, eu já havia escutado - nosso trato foi o de que a cada um que morresse as fitas tinham que ser ouvidas imediatamente - e as de George, que eram em número bem menor, tinham a last date em 25 de fevereiro de 2.003 (quando ele completaria 60 anos).

Sua voz, com apenas 26 anos, ecoou pelo quarto naquele indefectível: "Hello, big Charles", carregado no "erre" como um bom inglês, e não tive como, ali mesmo, não interromper sua voz formidável e deixar o choro me arrebentar.

Baby George se fora mesmo, man? Porra!

E não tive como ouvir mais nada até hoje, 03 de dezembro.

Nesses praticamente três dias após a sua partida nada mais faço além de olhar no espelho e tentar achar as partes de John - como estás, velho? - e agora de George...

Meu Deus! Paul! Ringo! O que está acontecendo com a nossa face?
 
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f a l a   q u e   e u   t e   e s c u t o
quando você estiver sozinho no meio da madrugada e não tiver a quem recorrer, lembre-se de [email protected]. A melhor equipe de parapsicólogos e embromadores de plantão. Servimos bem para servir sempre.

"Parabens (a quem fez!) pelo site!
Esta' excelente! Deve ter dado uma trabalheira...
Abracao"
Julio Daio Borges

sabbag responde: prezadíssimo Julio, todas as honras do novo sítio do Spam Zine devem ser creditadas a Suzi Hong, responsável por todo o webdesign e organização, e Nicole Lima, que tratou as imagens de nossos editores e colaboradores. Ah, nunca é demais repetir: novo site do Spam Zine você confere em: http://www.spamzine.net. O quê? http://www.spamzine.net. Não entendi. http://www.spamzine.net. Mais uma vez! http://www.spamzine.net.

"Enfim , eu escrevo poesias , se pode-se assim dizer , e meu amigo gostou bastante , o q me fez pensar q estava boa... Pois então , mando-a prA VCS . SE Ñ FOR PUBLICADA , TUDo BEM , PELO ,mENOSD ALGUÉM VAI TER LIDO , e isso já vai ter sido suficiente ,eu espero .(desculpem-me se estiver , na mensagem , muitos erros ortográficos , é que estou num dias daqueles em que vc enche a cara pra er seesquece o tédio . É  isso mesmo, vcs estão presenciando um momento de desespero de uma intediada lesada por um cancer mortal de denominação tédio)"
Heleine Fernandes

sabbag responde: uau, Heleine, sua carta foi, sem dúvida, das mais interessantes que nossa redação já recebeu. Estamos avaliando seu poema para tentar entender se ele é neo-concreto ou coisa assim. A mensagem saiu como veio, mas o fala que eu te escuto é isso mesmo. O leitor faz seu testemunho e nossa equipe tira o mau-olhado do seu corpo. Brincadeiras à parte, nós a encorajamos a escrever mais vezes. Estamos aí para o que der e vier.


c r é d i t o s   f i n a i s

while my guitar gently weeps
Ricardo Sabbag [[email protected]]
Alexandre Inagaki [
[email protected]]
Orlando Tosetto Junior [
[email protected]]

give me love (peace on earth)
(arlã() [[email protected]]
Daniela Abade [
[email protected]]
Esdras Passos [
[email protected]]
Indigo Girl [
[email protected]]
Marcel Novaes [
[email protected]]
Marco Aurelio Brasil [
[email protected]]
Mariana Fazzini [
[email protected]]
Sara Fazib [
[email protected]]
 
when we was fab
Edney Soares de Souza [[email protected]]
Eduardo Makoto [
[email protected]]
Flaviane Lopes [[email protected]]
Fred Leal [[email protected]]
Gabriel Pancera [[email protected]]
Henrick Manreza [[email protected]]
João Verde [[email protected]]
Luiz Andrioli [[email protected]]
Naira Marcatto [[email protected]]
Noah Mera [[email protected]]
Paula Pimenta [[email protected]]
Társis Schwald [[email protected]]
 
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p. s.

sabbag: triste foi que o George morreu bem no dia do meu aniversário.

landão & rick manreza: carro é pra andar, loira é pra foder.

sabbag: quem se sentir ofendido com o aforismo acima deve remeter suas reclamações para: [email protected]. Afinal, pra quem tá se afundando, jacaré é tronco.