SpamZine_______________
039
18 de novembro de 2001
são paulo  recife  belo horizonte  buenos aires  curitiba
 
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n e s t a   e d i ç ã o:
 
inferno - josué - épocalipse - riso ensaiado - vinte e poucos - mercutio's wake
 
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editorial
orlando tosetto junior  [email protected]

eufemismos

Meu amigo Francisco da Silveira Bueno define eufemismo como o "recurso lingüístico pelo qual se substituem por palavras e expressões mais elevadas outras mais plebéias ou mal significantes".

Gostaram dessa? Palavras e expressões plebéias, é isso mesmo. Silveira Bueno deu seu dicionário à luz no Rio dos anos 50, uma cidade e um tempo em que se podia falar, sem grita, em "palavras plebéias". Hoje não é mais assim; até mesmo as tais expressões plebéias têm de ser eufemizadas para, digamos, "carentes de expressividade".

Exemplos de eufemismo: trocar a plebéia palavra "churrasqueira" por "espaço gourmet externo"; mudar a plebeiíssima expressão "lugar em que não te enchem
o saco" por um elevado "nicho de relaxamento na realidade urbana"; transformar a chula afirmação "meu livro fala de" em um elegante "o que eu ofereço é"; trocar os bregas "bonito e prático" por "design arrojado e alta funcionalidade". Manjaram? Pegaram o lance?

Às vezes os eufemismos podem fazer com que uma expressão banal adquira ares de profundidade ou sensibilidade extremadas. A frase "gosto de escritores contemporâneos" pode ser eufemizada com sucesso para "descobri que quero isso, sabe? Pessoas que escrevam hoje, agora". Vai da veia artística do eufemizador.

Vivemos cercados de eufemismos. Covardia retórica, ou, melhor dizendo,
emasculações semânticas. Quando peitados, temos sempre à disposição a saída da enrolação, à direita ou à esquerda de quem entra, depende. O famoso "não é que eu esteja dizendo o que estou dizendo", entenderam? É fácil: "Não é que você seja um inútil; apenas, suas capacidades não vêm de encontro às nossas necessidades momentâneas". Ou: "Não é que você seja dispersivo e sem objetividade; é que nós precisamos de alguém mais focado".

Outro nome disso é desconversa. Mudam as palavras, permanece a demissão, o pé na bunda, a reprovação, o desprezo, a desfaçatez - e esses sim atestam, sem contorções verbais, aquilo que a palavra ouriversada quer escamotear: a simples verdade.

O fato é que palavras não obedecem a hierarquia social nenhuma. Não há palavra aristocrática ou plebéia, de bom ou de mau gosto. Há, como quiseram nos ensinar os poetas, a palavra certa no lugar certo. Em francês: mot juste. Fora disso, é frescura, perfumaria ou mau-caratismo.

Ou ironia. Mas essa é muito mais difícil de explicar.
 
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Liliana Delfino é argentina; ela estréia nos nossos bits com um texto denso e (mal) traduzido por mim. Quem vir semelhanças com Rimbaud aperte a minha mão; e quem resolver escrever pra ela não esqueça de caprichar no portunhol. Ela é uma de muitas mulheres que povoam esta edição: Silvana Guimarães, Alyuska Lins, a também estreante Daniela Abade (que tem um dos blogs mais interessantes que já vimos: o Mundo Perfeito), e a volta triunfal de Miss Bee, Nicole Lima.

O Spam Zine gosta de mulher, tão percebendo? Mas tem homem também: Sérgio
Faria, às vésperas de comemorar o primeiro aniversário do seu famoso e influente blog Catarro Verde, nos brinda com seu memorialismo galináceo; Ian Black conta tudo sobre "Nostalgia", peça da Sutil Companhia de Teatro em cartaz em São Paulo; e Ricardo Sabbag encerra a saga de Mercutio, no primeiro folhetim informatizado da história, o SPAMOLGIVAGO.
 
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Ella disse assim, ó: don't throw bouquets at me, don't please my folks too much, don't laugh at my jokes too much: people will say we're in love, e a língua dessa gente é uma desgraça.
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inferno
silvana guimarães  [email protected]

Sua lembrança entra com o vento frio pela janela e vai me doendo toda. É sempre assim quando inverna e você vem. Lembra daquilo? Nosso amor feito de todas as paixões, de todos os silêncios, de todos os sons? Lembra? Lembra de mim? Era nós dois ardendo no fogo do inverno. Noite amanhecendo dia anoitecendo a gente se invernando um no outro se embolando eu por cima eu por baixo eu de lado do outro lado tão misturado que eu nem sei onde eu começo nem onde você acaba ah eu sei você acabava era em mim ai em mim. Ai de mim, que à essa altura da vida dei pra filosofar em vez de ir à reza, cuidar da família e levar vida certa. Custosa que sou de entender, fui inventar de entender que tem gente que sofre é de lembrança, pensando que sofre de saudade. Saudade a gente tem é do que não aconteceu. No carnaval de 1986, Tia Zeca - que Deus a tenha! - afirmava em tom solene "carnaval bom é no Rio de Janeiro, estive lá em 1915." Coitadinha da Tia Zeca, sofria de lembrança antiga, coitada de mim, tão nova ainda, que estou morrendo de lembrança. Deslembrança. Com saudade de você amanhã, depois de amanhã, no mês que vem, no próximo Natal, naquela viagem do outro ano que a gente combinou. Porque a gente combinava e tanto. E tanto a gente pecava enroscado naquele inverno. Fala que você é só minha fala fala de quem você é sou sua só sua toda sua de mais ninguém eu vou vou ai. Aí a andorinha cantou lá fora, passei o dia à toa à toa e a gente nem ouviu. Tem gente que vai custar a entender que a saudade alucina mais que a lembrança, porque lembrança a gente guarda e saudade é só perda. Você me falta. Faz muita falta. Por isso, andorinha, minha cantiga é mais triste, passei a vida à toa à toa. E ainda está pra existir alguém que consiga inventar um modo de guardar o que não teve tempo pra existir e se perdeu, a gente sentindo tanta precisão daquilo. Isso é que é saudade pura. Viu, Riobaldo? O demônio existe sim e daqui a pouco ele vem me pegar pra fazer mingau au au. Que moça séria, temente a Deus, não fica se perdendo nessas lembranças de mal proceder. Invocando inebriada invernos indecentes inesquecíveis. Nem tanta querência de você. Ó amor, todas as minhas deslembranças são suas, meu amor, feito de todos os amores. No mais, está fazendo muito frio e eu, doida varrida sozinha sem você, estou sofrendo baby baby. Nunca mais acorrentada no seu calcanhar, desde quando outro anjo maldito disse amém. Sem mais nem menos. No mais, sem mais, não mais.


meu galinho josué
sergio faria  [email protected]

Hoje senti saudade do meu galo Josué. Sou muito ligado à vida urbana, mas já tive minhas veleidades galináceas, por assim dizer. Não, nada a ver com galinhar. É que já criei pato, galinha, codorna, garnizé, marreco e outros bichos. Tudo num quintal grande, chão de terra e grama.

Um dia, no meio de uma grande ninhada de pintinhos, nasceu um que mal conseguia ficar de pé. Parece a estória do patinho feio. O bichinho praticamente se arrastava, porque uma das pernas funcionava muito precariamente. Foi crescendo junto aos irmãos e irmãs, e nada da perninha sarar. Tomei as providências que pude, mas tratava-se de um aleijadinho incurável. O momento que me dava mais pena [ooops] dele era à noite, quando todos dormiam num poleiro que fiz usando cabos de vassoura. Como não conseguia subir no poleiro, o coitado tinha que dormir embaixo, no chão. E os outros passavam a noite cagando em cima dele. Precisava da companhia dos demais para dormir, eu acho, e habituou-se à humilhação por causa disso. De manhã, antes de sair, eu limpava as penas do cagadinho.

No quintal havia um galo só, claro, chamado Gilberto - o rei do terreiro, que comia todas as galinhas. Meu regulamento era mandar os machos todos pra panela, mantendo vivas as fêmeas. Assim o quintalzão me garantia rangar frango saudável e ovo de quintal, daqueles que têm a casca azulada e a gema vermelhinha, vermelhinha. Nada de ração com hormônio e antibiótico. Todos e todas se viravam ciscando e aproveitando os restos da cozinha. E o dia da panela foi chegando praquela ninhada do aleijadinho. Franguinhos quase no tamanho e peso ideais pra dançar. E franguinhas quase no tamanho e altura ideais para serem enrabadas pelo galo Gilberto. Ia ser também o fim do sofrimento do franguinho cagado, eu me resignava.

Na manhã do abate, não sei por que, mudei o combinado com a empregada e adiei. Fui trabalhar. De repente, no meio da tarde, ela me liga. Pasma. O franguinho aleijado tinha começado a andar! Peguei o carro e voei pra casa. Quase não acreditei quando vi o bicho normalzinho ali, andando de um lado para o outro, ciscando na companhia dos irmãos. Naquele instante decidi que jamais o mataria.

Batizei-o de Josué, por razões políticas que não cabe explicar aqui. E, pela primeira vez, aquele terreiro passou a ter dois galos. O Josué cresceu e a porrada comia solta entre ele e o Gilberto. Até que aprenderam a dividir os territórios e as galinhas, cada bando pro seu lado, o pau quebrando só uma vez ou outra. Meu galo Josué ficou grandão, vistoso, um galo bacana, compensou a infância humilhante com um jeitão imponente, garboso, bom de espora, a crista altiva, o canto alto e afinado. Dava pra perceber que o antigo rival já o respeitava. E de longe, sem encarar.

Um dia dei o Gilberto de presente para a empregada, homenageando o Josué com
a posse total do terreiro e das galinhas. Ele soube reinar absoluto, com dignidade e paixão, tornando-se o pai competente de várias ninhadas. Hoje está enterrado ao pé de uma mangueira que plantei e que cresceu com ele. A alguns metros de distância, ao pé de um abacateiro, está a Ula, uma das minhas vira-latas desse tempo. Alguma coisa matou os dois no mesmo dia. Nunca vou saber o que foi. Chorei muito, como estou chorando agora, de tanta saudade que me deu do meu galinho Josué. Desculpe não terminar, mas não consigo mais escrever.


p e r g u n t a r   n ã o   o f e n d e
"se você pudesse criar um mundo, o que e quem você colocaria nele?"

levi quennehen  [email protected]
tudo, menos seres humanos... não quero que meu mundo dê errado!!!

paula pimenta  [email protected]
se eu pudesse criar o mundo, eu colocaria chocolates que emagrecessem,
cachorros que conversassem e árvores que dessem dinheiro! o mundo não seria
bem melhor assim?

edney soares de souza  [email protected]
eu pegava o mundo de Tolkien que já tá criado e colocaria só os brasileiros nele - pra quê o resto do mundo? pra eu ter que aprender mais um monte de línguas? tô fora! aqui já tem gente de tudo que é raça, tem corrupção e violência mais que suficiente, e tem otimismo e festa pra divertir um mundo! só que o anel ia ser meu: louco eu já sou, ficar invisível de vez em quando ia ser o maior barato.

mário r. mendes júnior  [email protected]
bem, eu pensei em colocar muita água... muita água doce! mas descobrimos, eu e a Flaviane semana passada, que informação vale mais que a água; então troco por uma televisão um aparelho de DVD e uma cadeira confortável. sim, ia me esquecendo: todas todas todas (sem exceção) as músicas e todos os shows que a Marisa Monte cantou e fez na vida, em forma de CD e DVD para morrer vendo e ouvindo. siiiiim!

jefferson ribeiro dos santos  [email protected]
criaria um mundo onde eu não sentisse fome, pra não ter que perder tempo com
isso. faria uma piscina cheia de mulher e faria como o Tio Patinhas... pularia sobre elas e ficaria nadando. criaria uma fonte inesgotável de cachaça onde eu pudesse sempre dizer essa frase (que por sinal é a minha preferida): 'Abre-te boca, arregaça-te dente, que lá vai aguardente!'

raulzito  [email protected]
no meu mundo teria:
- o quê: máquinas que fizessem os serviços braçais;
- quem: máquinas que fizessem sexo e me fizessem rir;
- o porquê: só assim eu poderia fazer a mulher perfeita, estilo aquelas minas andróides daquele filme que se passa no deserto.

pergunta da próxima semana:
"Se você pudesse escolher outra vida para si mesmo(a), como essa vida seria?"
Escreva: [email protected]. As respostas mais inusitadas, pungentes e/ou
embaraçosas serão publicadas na próxima edição.


épocalipse
liliana delfino  [email protected]

Uma idéia massiva. Algo massivo golpeando as têmporas. Disfarçando-se em formas incrédulas. A luz se abre no horizonte e abraça tudo. Isto é o amanhecer.

A alva dos teus dias. O despertar dos teus sonhos mais vermelhos. Aonda vais, homem? Os tímpanos ajoelham-se no deserto do Saara. O Aconcágua se abaraça ao Himalais sem saber por quê.

Uma idéia de algo massivo acumulando alucinações; e cantos de galos a anunciá-lo.

Talvez amanhã floreçam unhas de gato na janela de Julieta, e não haja Romeu. Nada massivo. Um a um vertendo seu nada no dorso de um iguana de papel. destruição final, mas em separado.

Nada massivo. Fantasias de outros mastigando o verso esquecido do morto que nunca nasceu.

Épocalipse em cada um de nós.

Uma égua abrirá as ancas para parir uma rede de néon atravessada por barcos
carregados de espuma e saliva de um louco que felizmente se esqueceu do outro.


da versatilidade
alyuska lins  [email protected]

Haveria carros,
Haveria pessoas entre nós
E eu estaria linda.
Como nunca.
Meus cabelos ao vento
Meus olhos inesquecíveis
Aquela camisa costas-nuas-de-parar-a-rua
E ele, então, olharia para mim absorto
Choraria de remorsos, claro.
E eu sorriria, óbvio.
Riso de cinema.
Depois eu levantaria o braço como se fosse dar tchau
E diria:
- Aqui, farropilha!
Seria nosso reencontro.
Não, não, não.
Não me venha com perdões
Nem buquês e poesias de Neruda.
Teria que ser cinema-mudo
O dia que voltaria a lhe ver.
Sem a parte que eu me jogaria aos seus pés
E diria que sim, desculpo tudo, tudo.

Mas... segunda-feira.
8:37.
Meu cabelo preso com uma caneta.
Eu, de óculos.
Eu, de óculos e com olheiras.
Eu de óculos com olheiras e blusa por fora da calça.
E ele pára com o carro ao lado do meu no semáforo...
Claro que me abaixei.
Mudei de rádio vinte sete vezes,
Contei dezoito grãos de areia no tapete
Até que começaram as buzinadas.
Levantei a mão, abaixada,
Fazendo sinal que o carro havia quebrado.
Seguem os xingamentos e as frases desaforadas...
Em uma das principais avenidas.
Deus.
Só eu mesmo.
Eis, então, que me levanto
E dou de cara com um rosto familiar e tranqüilo
Em um carro parado
Ainda ao meu lado
Em pleno semáforo aberto.
Ouvi cinco segundos a gargalhada:
- Sabia que era você...
Uma das principais avenidas... Ha... ha... ha... só você mesmo!!
E tudo isso para não me ver?

O riso ensaiado não saiu,
Mas a minha boca ficou aberta.
O braço não se ergueu para o gesto desatinado
Porque eu, aliás, toda era um desatino ali.
Eu quero morrer eu quero morrer eu quero morrer
- Não fala mais com os amigos??
Eu quero morrer eu quero morrer eu quero morrer
- Ué, será que é mesmo verdade aquela história do gato que come língua?
Ha... ha... ha...
Eu vou matá-lo eu vou matá-lo eu vou matá-lo
Foi, então, que me ocorreu a única idéia, estúpida, aliás, como tudo que é único
Mas era uma idéia.
- Acho que você está me confundindo com outra pessoa, moço.
E me fiz corcunda, e disfarcei a voz
E sai fazendo careta, protruindo a mandíbula, fechando um olho,
E enrugando o nariz com uma miopia exagerada.
Acho que até hoje ele não sabe se era mesmo eu.


n a v e g a r   i m p r e c i s o

new yorker
http://www.newyorker.com
Se é que tem alguém que nao sabe - bom, tudo bem, tem muita gente que não
sabe - este é o sítio da revista New Yorker, finalmente aberto à visitação. Requisito é ler inglês, e achar que sofisticação é mais que comer ovo cozido em boteco dos jardins. A revista já foi melhor, e já foi pior também; o conteúdo atual é acima da média de toda imprensa escrita, falada ou bytezada, e atenção para os cartuns: o graaaaande Saul Steinberg está lá.

primeira leitura
http://www.primeiraleitura.com.br
Este é o sítio do qual saiu a nova fase da revista República. Fala de política (nacional e internacional) e economia. A revista já dá de dez nos nossos tristes semanários; o sítio dá de vinte nos similares, incluindo os jornalões e seus portais. A ênfase é na análise de notícias e acontecimentos - o que anda fazendo falta.


22 anos...
nicole lima  [email protected]

22 anos... (quase 23, mas não conte pra ninguém) e ainda assistindo à Sessão da Tarde, Dirty Dancing na Rede Globo. Dia (cinza): 16 de novembro de 2001 (nada de odisséias no espaço, só um remake do planeta onde os macacos jogam basquete). Ai ai ai, como diria minha mãe... que dia mais cocô... pós-ressaca de feriado na quinta-feira, trabalhar sexta e no sábado é um alívio para o tédio (outra coisa que não existia).

Tenho observado um rosto diante do espelho, rugas ainda não há, mas as mãos já não são as mesmas. Cicatrizes e uma ou outra história boa pra contar. Loção tônica e creme hidratante, FPS 8. Fator de proteção Solar, coisa que não se usava quando eu era criança. "Eu sou do tempo em que..." se encomendava RAÍTO de sol do Paraguai, a Tônia Carrero ainda fazia propaganda do Hidratante Monange, a Luciana Vendramini era a Garota do Fantástico  e a Malu Mader não tirava as sobrancelhas. Quanta coisa... quanta coisa eu vi (você também viu?) nascer, voltar, sumir?

Não, isso não é um texto saudoso sobre como foi bom ter crescido nos anos 80.

Pode-se dizer que é um... CONVITE À REFLEXÃO.

Responda rápido: Quantos anos você tem? Quanta coisa passou a (ou deixou de)
existir desde que bateram na sua bunda pra fazer você chorar? Quanta coisa a gente não vive sem desde que foram inventadas? Ok, não precisamos falar do Atari, nem das revistas do pelezinho... mas você lembra?

Video cassete ninguém tinha, minha primeira TV tinha seis canais. E quando veio a TV a cabo? Máquina de secar, pranchinha para o cabelo, silicone (para o carro para os seios e pontas duplas no cabelo) Frango com Catupiry, caneta de dez cores, guarda-chuva automático, CD, DVD, computador, internet e seus derivados. Papaya com Cassis, Pizza quatro queijos, Tomate seco com rúcula, Marguerita, malha cotton, calça jeans com stretch, air bag (duplo), Claudia Schiffer, cinto de segurança obrigatório, alarme para o carro, cartão magnético, crédito pessoal, banco 24 horas, farmácia 24 horas, pílula do dia seguinte, AIDS, o novo sentido do verbo "ficar", mosaicos de azulejos, cursos de degustação de vinho, enxurrada de restaurantes chineses e japoneses, pancake, maquiagem a prova d'água, mountain bike, mochila da Company, carpet de madeira, sandálias melissa, tecidos fluorescentes, pátina, texturas de parede, duralex, tupperware, silver tape, hiking boots, disk-água mineral, a volta dos colchões de mola, Tok & Stok, rollerblades,
cafeteria elétrica, forno de microondas, scanner, edredon, capuccino, limonada suíça, mousse de maracujá, torta de limão, trufas, esmalte com glitter para unhas, lip gloss, papel toalha, rolopac, jogo americano, restaurantes fast food, lojas americanas, cachorro quente prensado, batata palha, fricassé de frango, husky siberiano, Pit Bull (que fim levaram os dobbermans?), areia para gatos, carne de avestruz, Presunto Tender no natal, amigo secreto, Sex shop, revista de homem pelado (por que falam revista de mulher pelada e revista de homem nu?) rádio toca fitas removível para carro... agora sai só a frente... e aquela trava jurássica para a direção? Tira limo de banheiro (com refil), Resolv tira manchas, Pass Comfort, diarista, garrafa de 2 litros de plástico, papel reciclado, latinha de
alumínio, puxadores de gaveta que custam caro, unha francesa, placas brancas nos automóveis, controle remoto, shampoo 2 em 1, KY gel lubrificante, gilette mach 3, junco que era mato e virou arranjo de mesa, lentes de contato, ímã de geladeira, óculos espelhados, Ikebana, limpador de pára-brisa traseiro, ar condicionado, fogão com acendimento automático, forno auto-limpante, geladeira frost free, freezer, panela de fondue, quadro branco para pincel atômico, grupo Positivo, cursos pré vestibular, top model, carros importados, filmes do Steven Spielberg, cinema cult, óculos cult, roupas fashion, multi processador com espremedor de suco, sanduíche natural com maionese, livrarias que vendem café e luminárias instaladas atrás de quadros, peixinhos beta, baleia assassina, sapato 775, velcro, ziper invisível, estação tubo, ônibus biarticulado (exclusivo para residentes em Curitiba), luau na praia, grunge, Rap, Funk, Reggae Revival, Michael Jackson, Madonna, Leonardo DiCaprio, Axé Music, filmes de terror em universidades americanas, Videokê, piscina de bolinhas, máquina de lavar louça, sabão em pó com amaciante, papel higiênico extra suave, Ob, Tampax, absorvente com abas, refrigerantes Diet, tudo diet, comida light, colesterol alto, cooper, piercings, pulseirinha no pé, tatuagem tribal, henna, água oxigenada, Cancún, Disneyland, Pubs, long neck, intercâmbio, escolas de inglês em cada esquina, prancha de bodyboard, patinete, pokemón, Tactel, Teflon (II), Terrorismo, Antraz, detector de metais, DNA, CPMF, FHC, FMI, Xou da Xuxa, Bambuluá, Sítio do Pica Pau Amarelo (1 e 2), CD acústico, fotografia preto e branco, música eletrônica, e-zines, amigos que nunca se abraçaram, namorados que nunca se viram, No Limite, e-mail, weblogs, icq, almas gêmeas que se separam, filho de proveta, doação de sêmen, leite reconstituído, mussarela de búfala, antepasto, curso de mergulho, sexo tântrico, massagem do-in, açucar mascavo, macarrão instantâneo, massa al dente, creme dental com flúor, escova de dente que avisa quando está velha, cola quente, superbonder, telefone sem fio, Tang, Clight, água de coco em caixinha, Ice Tea de pêssego, futon japonês, lençol antialérgico com elástico, persianas coloridas...

coisas coisas coisas... o que seria das executivas de sucesso não fossem as fraldas descartáveis? o que seria das nutricionistas e dos (fisio)terapeutas se o mundo não fosse o mundo?

"minha tendinite já está pegando, minha rinite está um horror e hoje ainda não tomei meu antidepressivo. Acho que vou desmarcar com o psiquiatra e encontrar meu personal trainer"

é... melhor parar de espremer meus cravos, passar um adstringente e um creminho com ácido retinóico, dormir uma horinha e acordar pra ir trabalhar. Celular programado para despertar no lugar do cebolão de cordas que virou rádio-relógio digital e ficava piscando aquele 0:00 quando faltava luz. (Imagina quando o mundo fizer 33...)


m e n i n o s   e u   v i
 
nostalgia - teatro do sesi, são paulo - 09/11/2001
ian black 
[email protected]

"Nostalgia", de Felipe Hirsch, com Guilherme Weber, Ana Kutner, Erica Migon, Beto Matos, Edson Rocha, Paulo Alves e Rosana Stavis. Em cartaz até 02 de Dezembro de 2.001

Um barulho ensurdecedor. Então a secretaria eletrônica dispara o título acima. Dá-se então à escuridão uma colagem de situações cotidianas embaladas por "A Night Like This", do The Cure. Artur, o personagem principal, é transportado para 1987, onde ele tentará encontrar o amor que outrora fora negado a Arturo Bandini, personagem de John Fante, um dos muitos autores que embalaram a infância e juventude do protagonista.

Já é a terceira vez que eu presencio todos aqueles diálogos, mas aqueles risos escapulidos dos personagens de Guilherme Weber e Ana Kutner são inéditos. O esquema utilizado pela Sutil Companhia de Teatro foi testado com sucesso na feliz adaptação de "Alta Fidelidade", de Nick Hornby. A tela na frente do palco serve para projeções que vão de ícones da cultura pop a frases quebradas, que podem auxiliar ou confundir o seu entendimento.

Se você não sacar que a peça passa-se sim em 1987, mas não no Brasil, acabará por não identificar diversos fatores, entre músicas e livros. Ficamos na dúvida se Artur é inglês ou norte-americano. As referências que vão de Morrissey à Glasnost compõem o cenário de época, mas podem fazer com que o espectador atual, alienado destes fatos, não aprecie a peça e ainda a tome como pedante.

O monólogo da personagem Karen, affair do protagonista, interpretada por Ana
Kutner, em que ela disserta sobre seus familiares, já vale o ingresso. Seu pai usa o diafragma da mãe na cabeça para participar das reuniões dos judeus ortodoxos, entre outras bizarrices. (Nóis tem gravada esta parte). Mas a peça ainda reserva ótimos momentos, como a primeira experiência de Artur com uma prostituta, servidos por um garçom Neonazista que banca o travesti (será influência do espetáculo lá do Mel Brooks???). Assim como A.I., de Spielberg, você encontrará dois finais, com a diferença de que ambos são ótimos. E, falando em Spielberg, um dos monólogos de Artur é uma comparação entre diretores de cinema. Quando chega na vez de Spielberg, ele diz que o diretor explodiria a Virgem Maria... Errou feio, Artur: Spielberg faria a Virgem Maria voar num momento redentor. Explosão é com o John Woo.

Porém, não é respondida, em momento algum, a questão central da peça. Não ficamos sabendo se Artur buscava respostas para sua vida adulta enquanto vasculhava móveis, discos dos Smiths e livros de Salinger e Bernard Shaw, cobertos pela poeira das reminiscências. Ou se apenas tentava esconder-se do seu presente.
 
nota: viu jogo do Flamengo, peça do Sartre, filme brasileiro, passarinho verde? mande sua colaboração para [email protected].


pequenos prazeres
daniela abade 
[email protected]

Afiava a navalha meticulosamente. Pensou em todos aqueles pescoços entregues
à sua vontade. Quantos já foram? 200. Talvez 300. Não sabe ao certo. O fato é que todo mês aparecia um rosto novo pela sua frente que, mesmo com medo, com algumas objeções, acabava por ceder aos apelos de sua navalha. Às vezes usava a tesoura. Gostava disso também. Eram cortes precisos, estudados. Com alguns demorava-se mais. Só pelo prazer de continuar cortando. De ver aquela sujeira acumulando no chão. De observar aqueles pedaços, aquele monte, aquilo que há poucos minutos seguia os desígnios da vida - cair, morrer, virar puro lixo. Simplesmente deixar de existir. Ele tinha esse poder. Ele gostava de ter esse poder.

Em nenhum momento se arrependeu de ficar com o dinheiro daquelas pessoas. Sabia que tinha feito por merecer. Ele, naturalmente, também sabia que elas nunca teriam como reclamar. Elas pediram por isso. Elas sempre pediam por isso. E ele era um profissional.

A navalha já se mostrava brilhante, certeira e - porque não - mortal. Olhou-se no espelho. Com um pente, colocou seus cabelos lisos e já grisalhos para trás. Sorriu. Sabia que naquele dia não faltaria trabalho.

Abriu a barbearia.


r á p i d a s   r a s t e i r a s

"Partindo do pressuposto de que a mulher é perecível..."
(ISADORA RIBEIRO, respondendo à pergunta: mulher bombada transa melhor?)

"Quero agradecer uma graça que recebi... eu perdi o meu marido..."
(ANÔNIMA E SINCERA, na igreja do pastor R. R. Soares, aquele do hino pornô
"Toca Em Mim".)


s p a m o l g i v a g o

Termina aqui a primeira joint-venture literária da internet brasileira; o primeiro folhetim multiveicular (boa, essa, hein?) dos bits nacionais - a saga de Mercutio, escrita pelo nosso editor Ricardo Sabbag.

A primeira parte saiu no GivagOnline de 07/11...

//// [email protected]
         http://www.givagonline.cjb.net ////

... e a segunda, no Mutantes Online S/A (MOL) de 12/11.

  //// [email protected]
         http://www.mutantesonline.cjb.net ////

E o final sai aqui, agora. Quem juntou as três partes terá - surpresa! - o texto completo, que só voltará a sair na Veja, em 2060, nas comemorações da morte do autor. Quem não colecionou os três fascículos tem mais uma chance: assine JÁ o Givago e o MOL, e peça os números anteriores. E-zine unido jamais será vencido. Nem vendido: é tudo de grátis.
 
 
meu amigo mercutio - parte 3
ricardo sabbag  [email protected]

Beijar alguém na boca significa muita coisa. E acho que não significa mais só para mim. Acho que se tornou uma espécie de emblema da sexualidade pós-hippie que define quem é quem, quem curte o que e quem quer curtir o quê com quem.

Eu e Carolina havíamos nos beijado bastante aquela noite. Mas foi em outro momento. Foi em um momento em que os hormônios falaram mais alto e eu não me importava se estivesse fazendo merda ou não. Queria ficar com ela, e sofrer com todos os carinhos que ela faria em mim durante o sexo, mas que guardaria para si no momento que nossos corpos se separassem.

Mas agora a questão era outra. Responder ao beijo de Carolina significaria muita coisa. Como um casal que se encontra em uma noite e perpetua seu estágio de relação duradoura após a quebra do dogma. Existe uma grande diferença entre um beijo qualquer, desses que se dá em alguém conhecido em momentos de paixão, como os que eu e Carolina havíamos dado naquela noite, e o beijo promissor; o ponto de partida. A entrada para uma aventura que não se sabe quando vai parar ou se vai parar. O beijo, amigo, é a véspera do escarro.

- Nós não podemos fazer isso, Carol.

- É cinismo, né? Só pode ser cinismo.

- Não, não é. Não quero mais isso. Não quero mais que a gente passe esse tipo de noite, e que...

- A gente só fez sexo.

- Tá vendo!? Não é só sexo, porra nenhuma, não! Você sabe o que isso significa pra gente. Não é a mesma porra de sexo que você fez com o cara no ano novo.

- Ai, de novo isso...

- É, de novo isso. Porque é exatamente esse tipo de exemplo que serve pra te
mostrar como eu me sinto nessa história toda. Antes nós fazíamos sexo, até que você "só" fez sexo com o cara pra depois vir "só" fazer sexo comigo. Tá pensando que eu sou o quê?

- Não, você que deve tá pensando que eu sou... que eu sou puta, sei lá. Isso não é legal, Mercutio. Você sabe que não é isso que eu sinto por você.

...

Minutos, segundos, frações de segundo que demoram uma eternidade. Tem horas
que o silêncio te consome, e já não há mais nada pra se dizer, porque o silêncio conta tudo. Nem o beijo há mais de resolver. Beijo depois de silêncio desses, só de despedida.

- Um beijo, tchau...

E saiu, como se estivesse desligando um telefone na minha cara.


f a l a   q u e   e u   t e   e s c u t o
como Deus, o Spam Zine é quentinho, e está ao seu lado na alegria e na tristeza - com a vantagem de que não larga a toalha molhada em cima da cama. confissões, perguntas & demanda por atenção: [email protected].

"Sou psicóloga  e perdi a lucidez há muito tempo... rssssss, leio sempre o boletim, mas esse ultimo está muito...muito bom... 11".
Eliana

tosetto responde: mademoiselle Hong, do alto do belo trabalho da semana passada, agradece em primeira voz; eu, Inagaki e Sabbag ficamos no coro, fazendo tchup-tchu-ruuu em três notas diferentes, e estalando os dedos no final do compasso. Doo-wop é isso, Michael Jackson!


c r é d i t o s   f i n a i s

editores
Alexandre Inagaki [[email protected]]
Ricardo Sabbag [[email protected]]
Orlando Tosetto Junior [[email protected]]

staff
Aline Sanfelice [[email protected]]
Alyuska Lins [[email protected]]
Daniela Abade [[email protected]]
Ian Black [[email protected]]
Liliana Delfino [[email protected]]
Nicole Lima [[email protected]]
Sérgio Faria [[email protected]]
Silvana Guimarães [[email protected]]
Suzi Hong [[email protected]]

colaboradores
Edney Soares de Souza [[email protected]]
Jefferson Ribeiro dos Santos [[email protected]]
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Mário R. Mendes Júnior [[email protected]]
Paula Pimenta [[email protected]]
Raulzito [[email protected]]

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p. s.

tosetto: quem puder ou quiser deve dar uma espiada no Bigornas Lisérgicas,
e-zine novo cujo nome é maravilhoso. Quem edita é a Maria Luzia ([email protected]).

sanfelice: não sei onde passou isso, mas foi mais ou menos assim:
Entrevistador: - Então, Gisele, seu nome é com trema no "U", né?
Gisele Bündchen: - É. Com duas...

hong: pia limpa me dá tesão. Acho que sou uma Amélia pervertida.

hong: não assistam a filmes de suspense ou terror comigo. Meu grito poderá ser o seu.