editorial
eduardo fernandes
[http://fraudeorg.terra.com.br]

SPAM AUTO-AJUDA

Falaí, sangue. Certo? O Alexandre Inagaki cometeu o despautério de me convidar para editar este Spam. Esperei até receber as colaborações para sentir que caminho deveria seguir. Deixei-me levar pelo acaso. Como diriam alguns budistas, aceitei "o incomensurável".

E qual foi o resultado? 99% dos textos tratavam dos seguintes temas:

1 - amores perdidos e frustrações;
2 - amores perdidos e frustrações;
3 - amores perdidos e frustrações.

Nas entrelinhas, notavam-se sentimentos como: autocomiseração, tristeza, tédio, baixa auto-estima etc. Tudo mesclado à velha característica de citar letras de músicas, filmes hollywoodianos, tecnologia, seriados de tv, entre outros itens do que se convencionou chamar de cultura pop.

Passei três dias internado em uma clínica de recuperação de viciados em filmes de Julia Roberts, tomando soro e comendo papinha transgênica da Nestlé. Até que me bateu a seguinte iluminação: é preciso achar saídas.

Ok, respeitemos a nossas dores. Mas sofrimento por si só não é arte, muito menos reflexão. É preciso algo mais. Não é possível que tantas pessoas fiquem gravitando em torno de um mesmo círculo vicioso. Será que não há nada mais para pensar, escrever e viver?

Será que montamos fanzines, estudamos e gastamos pilhas de dinheiro para, no fim, nos tornarmos frustrados (e frustrantes), obsessivos, chorões e doentes? Gente que é capaz de entrar num processo de autodestruição só porque um telefone não toca?

Por isso, este Spam não poderia ter outro nome além de Auto-ajuda. É uma tentativa de mudar de assunto, de tirar o foco da frustração e centrar-se na reação.

Todos sabemos que não há uma felicidade imaculada e que a vida não tem happy end. Mas podemos subvertê-la, rir da sua cara (ao mesmo tempo em que aceitamos ser alvo de piada às vezes), criar felicidades biodegradáveis a cada segundo, agindo com coragem e, principalmente, leveza.

Assim, se você gosta de se prender à própria dor porque acha isso poético ou elevado, volte mais tarde. Há beleza, elevação e poesia em outros sentimentos. Não vamos confundir sensibilidade com senilidade. Aqui se acredita em Oswald de Andrade (rimou):

Amor
Humor

* * *

Esta é uma edição cheia de notas, comentários e dicas. Não traz muitos textos e variedade de autores. Democracia nunca foi a minha especialidade. O destaque vai para o texto de Pedro Vitiello, que será incluído no programa dos cursinhos a partir do próximo ano. Pode usar na Fuvest que eu garanto.

Temos Alexandre Inagaki (que também reclama do amor, mas com classe e inteligência), Meg Riot, uma garota bem peculiar que conheci quando tentei fazer o caminho de Santiago no Chile (e descobri que algo ali estava errado). E, é claro: há uma seçãozinha dedicada a amores que deram certo na literatura. Agora scroll, baby, scroll. E chega de urucubaca!

(ilustração da página: Henrick Manreza)

 

a estória do mundo segundo brooke shields
pedro vitiello
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]

Capítulo 3: Grécia e Roma

GRÉCIA: Os Gregos já foram um povo menos idiota, e não construíram pirâmides no deserto, até porque não moravam num deserto. Se insistissem em fazer pirâmides no deserto, sem ter um disponível, iam se dar mal e não seriam considerados o berço do nascimento humano. Diz a lenda que o primeiro filósofo foi Tales de Mileto, que era um comerciante de oliva e azeitonas, que em longas horas de ócio pensava sobre o mundo.

Nasceu na cidade de Atenas, inimiga de Esparta (e todos sabem a fama dos espartanos), a brilhante figura de FÓCRATES, o SODÃO (ou algo assim). Ele foi o primeiro filósofo a se preocupar com a moral e com o ser justo e bom. Em 2.500 anos ainda não tivemos grandes progressos, mas isso não tira o mérito do rapaz.

Depois veio Platão, que acreditava que as idéias eram inatas ao sujeito. Tinha a língua presa, Platão, e era gago, tornando-se incompreensível, originando assim a expressão "está falando grego". Como todo mundo dormia em seus discursos e tinham vergonha de dizer isso, elogiavam para não ficar chato. De sua mania em dar como presentes seus discursos por escrito veio a expressão "presente de grego".

Aristóteles, que falava de lógica, foi seu discípulo e grandes obras escreveu. Aristóteles porém era um pouco distraído, e muitas de suas obras se perderam.

Dentre as contribuições gregas para a humanidade, podemos citar o desenvolvimento de indústrias de pratos (negócio fértil por lá), filmes do cachorrinho Benji, estátuas desmembradas, Zorba (a cueca grega), inspiração de desenhos para os lucros dos Estúdios Disney, e, é claro, o berço do pensamento formal cristão, mas isso não é tão legal.

As Olimpíadas, também surgidas na Grécia antiga, eram um momento de grande festa, principalmente porque não havia Galvão Bueno para narrar os Jogos. Nelas competiam jovens para provarem se eram cidadãos de ouro, prata ou bronze, recebendo prêmios nestes valores. Os melhores mesmo dos eram os de Dólar.

Das poucas canções que sobreviveram ao tempo restou o trecho do belo hino dos militaristas espartanos (e todos sabem a fama dos militares):

Olha que espada mais linda
Mais cheia de Grécia,
É aço que vem, que vem lá da Pérsia,
Fazendo a cabeça da galera dançar...

Os Gregos tiveram na Macedônia o gênio militar de Alexandre, que conquistou o mundo antigo e criou no Egito a cidade de Alexandria. Nada como a modéstia. Os gregos foram atacados pelos romanos e dançaram, se vingando através da criação do churrasquinho grego, muitos milênios depois, vitimando milhares de italianos residentes no bairro do Bexiga, em São Paulo.

ROMA: Diz a lenda que Roma surgiu quando Rômulo, irmão de Remo, matou seu irmão e batizou a cidade assim em sua homenagem. Isso é que é amor fraternal. Os romanos inventaram a orgia (palmas para os romanos). Vem das orgias a origem da expressão "em Roma, coma os romanos".

As orgias romanas era coisas bem legais para ir caso, é claro, você estivesse a fim de fortes emoções e tivesse cuequinha de aço à mão. Ao chegar em uma orgia, guardadores de bigas (no bom sentido) o aguardavam na entrada (no bom sentido) do local. Uma vez lá, você era conduzido a aconchegantes aposentos (no bom sentido), levados pelas mãos (no bom sentido) para se banhar (no bom sentido), vislumbrando depois mulheres maravilhosas, anões besuntados e cabritas... Depois, começava a putaria (no melhor sentido), mas se algum anão chegasse perto ia ver só. Depois de comer... comer! E comer era jantar como um porco. E depois, vomitar o que havia comido para comer mais e mais, e depois vomitar de novo... Humm... Ok, ok, esqueçam as orgias romanas.

O circo romano era legal, pena que as pessoas de dentro do picadeiro não gostavam muito... Havia gladiadores, leões, cristãos (por pouco tempo), corrida de bigas (no bom sentido) e figurantes do Ben Hur.

O exército romano era djóia também, e eles levavam seus valores em qualquer lugar que fossem. Se você estava na Galícia, eles levavam todos os seus valores de lá. Se fosse na Fenícia também, e te deixavam na miséria.

O Império Romano caiu após perder um pênalti na Copa, virou missinha (digo, católico) e, com o auxílio de Carlos Magno e do padre Marcelo, começou a Idade Média.
 
 
w h a s s s s u p ?
News e outras novidades que acabaram de sair
 
All Star vermelho causa depressão
A conceituada revista de divulgação científica Nature acaba de publicar um estudo no qual pesquisadores da universidade de Manchester demonstram que há uma estreita relação entre o tênis All Star vermelho e a depressão. A empresa responsável pelo produto foi punida e terá de retirar o modelo do mercado. Ele será substituído pelos antigos Bambas Monobloco (popularmente conhecidos como "cabeção"). Basta dirigir-se a sua feira favorita e efetuar a troca.
 
Novo Fantômas
Desde o final de julho, é possível encontrar o novo disco do Fantômas, The Directors' Cut, nas importadoras. Desta vez a banda fez releituras de trilhas sonoras de filmes de terror e suspense. De O Poderoso Chefão ao Bebê de Rosemary, passando por Twin Peaks e Der Golem (1977). Se você já conhece o Fantômas, sabe o que pode esperar: death metal estranho e complexo, produzido pela doentia mente de Mike Patton. Se não conhece, basta citar quem são os outros membros da banda: Dave Lombardo (ex-baterista do Slayer), Buzz Osbourne (do Melvins) e Trevor Dunn (do Mr. Bungle). O cd causa o mesmo tipo de estranhamento que a leitura de um livro de Kafka. Confira alguns MP3 em http://www.ipecac.com.
 
Revista da MTV dá uma dentro
Pode comprar a nova revista da MTV sem medo. Ela traz uma matéria impagável, que mostra como são as diversas cidades retratadas nos desenhos animados. Vai de Springfield (Simpsons) até South Park. Infelizmente, ficaram de fora muitas cidades interessantes. Mas só a idéia já vale os R$ 5,00 da revista.
 
Seu Canalha!
Conhece a revista Canalha? Não confunda com a Veja. Canalha é uma revista de histórias em quadrinhos, no estilo das saudosas Animal e Chiclete Com Banana. Está no número três e é da Plurale Editora. Por enquanto, o projeto é modesto e não se sabe se vingará. Mas torçamos para que sim (e ajudemos comprando a revista, claro). Nesta edição você poderá ler hqs de Antonio Segura, Jose Ortiz, Jaime Martin e Spacca. Ah, Canalha custa R$ 4,90.
 
Livros do Mal
Daniel Pellizzari, escritor e colunista do e-zine Cardoso Online, agora é empresário. Ele montou uma editora com os colegas de COL Daniel Galera e Guilherme Pilla. Ela chama-se Livros do Mal. Para saber mais sobre o empreendimento, leia a entrevista que Pellizzari deu ao e-zine K. Não perca que é trimmmassa.


o medo das incertezas
meg riot
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Deve haver algum surto de mal entendidos, uma epidemia de frustração nos rondando. Todos sabemos de onde vem isso: da "descoberta" da subjetividade. Isto é: quando uma conspiração de filósofos yankees imperialistas do século 18 nos convenceu de que somos um "eu", que possui liberdade e cujo maior objetivo é ser feliz e evitar a dor.
 
De lá para cá, as coisas tomaram um rumo incontrolável. A idéia de felicidade foi ganhando um significado bem específico: ter um grande amor. Hmmm... e dinheiro pra vivê-lo plenamente.
 
Todas as felicidades possíveis (amizade, política, religião, status, entre tantas outras), foram re-significadas: viraram meras satisfações, subordinadas a algo maior, o amor romântico.
 
No início do século 20 nasce a indústria da felicidade. Somos martelados diariamente pela mídia e por outros tipos de formadores de consciência (filosofia, artes, ciência) de que a tal felicidade está ao alcance de todos.
 
E hoje a felicidade virou uma espécie de obrigação. Se você não é feliz, só pode ser doente, ou ser um neurótico, inadaptado etc. E, aparentemente, há remédios para todas as necessidades, já que vivemos num mundo livre e cheio de possibilidades.
 
Basta fazer suas escolhas. Nada de tensões sociais, a felicidade tornou-se uma questão meramente individual.
 
É claro que esse é um quadro bem simplificado. Mas dá uma idéia da pressão em que vivemos atualmente. Somos intolerantes e impacientes com os nossos problemas: tudo precisa ser "resolvido" imediatamente.
 
Passamos a acreditar que precisamos ser constante e linearmente felizes, nos livrar de todo e qualquer indício de "neuroses". Assim, dedicamos um tempo absurdo ao sofrimento. Diariamente. Superdimensionamos os problemas, nos concentramos obsessivamente neles. Resultado: mais confusão.
 
A história da humanidade é a própria história da luta contra a incerteza e a possibilidade de surgirem frustrações. Uma vez que não estamos mais tão protegidos pelos instintos, temos de nos virar com esse estranho instrumento que é o cérebro.
 
E ele nos ilude, entra em pane, é lento. Como diria Edgar Morin, não somos só hommo sapiens, somos também demens, que se enrolam com as próprias idéias.
 
A ciência, a religião, a política, a idéia de amor e de felicidade são apenas algumas das nossas criações, tentativas desesperadas de fugirmos das incertezas e das frustrações. E certamente essa luta vai nos acompanhar por muito tempo ainda.
 
Hoje adquirimos mais forças para prosseguir? Temos maior capacidade de suportar frustrações? Ou apenas acumulamos ideais e conceitos que se tornaram nossos próprios algozes? Uma coisa e outra.
 
É necessário um pouco de desprendimento dos próprios valores e ideais para conseguir sobreviver. É preciso amar sem se deixar consumir pelo amor, é preciso ter força sem exigir de si mesmo heroísmo. Enfim, é preciso criar e recriar diariamente meios termos e bom sensos.
 
Mas, principalmente, às vezes é preciso parar de pensar. E se deixar levar, sem medo das conseqüências. Isso pode parecer insensato. Mas a nossa idéia de sensatez não seria mais um reflexo da nossa loucura e medo de viver?
 
É preciso nunca esperar demais da vida. E mesmo assim ser capaz de se entregar a ela e agarrar todas as felicidades possíveis. Sabendo que são fugazes, incertas e que, geralmente, pagamos um preço alto por elas.
 
Fortalecer a si mesmo, ter coragem para prosseguir sustentando-se, ou pelo menos sem precisar de muletas insubstituíveis. Qualquer livro de auto-ajuda poderia dizer isso. Mas por que será que essas coisas nunca entram na cabeça?

 

dicas para deixar de ser um perdedor
diretamente da "sabedoria popular" (algum lugar entre Mauá, SP, e Pelotas, RS)

+ Todos os dias, ao acordar, corra para o espelho e diga, em voz alta: "ogum ogunhê!". Repita várias vezes. De preferência, cumprimente as pessoas com a frase. Ela é muito usada na Umbanda como uma espécie de "Deus me livre", "problemas, fiquem longe de mim".
 
+ Uma dica vinda do Feng Shui. Organize adequadamente sua coleção de discos. Sempre que tiver algo como Smiths, Sigur Ros, Belle & Sebastian, coloque-os ao lado de Stevie Wonder (dos anos 70), Kool & The Gang, James Brown, Maceo Parker, Trio Mocotó etc. Para equilibrar as coisas. O excesso de branco traz negatividade para sua casa.
 
+ Se você mora em São Paulo, deve se lembrar de um adesivo que a rádio Jovem Pam criou e distribuiu pela cidade. Ele dizia: "já fui assaltado". Era como aquelas placas que os moleques colam nas costas uns dos outros quando estão na quarta-série: "sou trouxa", "chute-me". Sabe que a idéia não é tão estúpida? Cole um adesivo no seu carro: "não sou um perdedor". Se preferir posar de cool, escreva "não sou loser". Pensamento positivo sempre ajuda.

 

bons amigos
alexandre inagaki [http://inagaki.blogger.com.br]

Torneiras abertas à toa. Leila, eu ainda não tô bêbado, relaxa. Quando eu me levantar desta mesa e gritar pra todo mundo que encontrei a Resposta Definitiva, aí sim é motivo pra você começar a se preocupar, ok? Teve uma vez que bebi tanto que achei que tinha virado médium, incorporei o Nietzsche, a Rita Hayworth e o Wilson Grey na mesma noite. Meus amigos sentiram que era hora de me arrastar pra casa quando comecei a cantar Put the Blame on Me e a fazer um strip no meio do velório. Mas eu tô bem, eu tô bem. Do que é que estava falando? Ah sim, torneiras.
 
O problema deste mundo são esses amores não-correspondidos e desperdiçados a toda hora, entende? Como paixões que são despertadas negligentemente, ilusões platônicas que acabam com gosto de soco na alma, noites de sexo mal interpretadas, amores exilados que não encontram seu lugar no mundo, como peças extraviadas de um quebra-cabeça. O problema todo se resume nisso: corações e cérebros não falam a mesma língua. A vida seria muito menos dolorida se a gente tivesse o dom de se apaixonar por aquela pessoa que nos oferece o coração. Deveria ser tudo questão de um clique, e pronto: aquele amigo que a gente só consegue enxergar como confidente assexuado se transformaria no príncipe encantado. Mas não, não nesse rascunho porco de mundo em que vivemos. Quem sabe na versão 2.0.

Sim, eu sei, não precisa falar. Você falou que eu ia me estrepar com aquela menina, mas deixou de usar pedagogia comigo, pô. Sim, pode rir, vou fazer o quê? Leila, você se esquece do quanto todo homem é crianção e imaturo, e de como a gente se torna repentinamente burro quando se interessa por alguém? Esses lances de sermão, do tipo filho não coma o que caiu no chão, cuidado com as más companhias, não aceite balas nem arquivos attachados de estranhos, yada yada yada, não dão certo. Tem que quebrar a cara pra aprender, errar, cometer novos erros. Mas deixa pra lá. Fala sério, esse vinho não parece que fica melhor a cada gole? Ih, relaxa, tá tudo sob controle. Cê tá parecendo minha mãe, só falta pedir pra que eu arrume meu quarto. Meus livros estão todos empilhados, um dia te mostro a Torre de Pisa que fiz com meus Goethes, Fonsecas, Borges. Uma lindeza. Cê tá ansiosa pra ver o meu quarto? Você não sabe do que está falando, aquilo lá é um buraco negro, tudo que entra some e vai parar em outra dimensão.

Mas olha só: talvez o amor não passe de um erro de programação. Um bug atravancando o perfeito funcionamento do sistema. Um vírus no código-fonte da Matrix. Uma maldição que surgiu com a intenção única de inspirar cornos a escreverem músicas sertanejas, e de fazer minhocas treparem fulminantemente no drive-in do meu cérebro, numa putaria incessante que me atormenta 25 horas por dia. Leila, eu juro pra você: um dia vou espirrar e minhoquinhas sairão voando de minhas orelhas. Não ri não, eu tô falando uma verdade trágica: esses bichos promíscuos estão me deixando mais pirado ainda, enchendo minha cabeça com a imagem onipresente daquela vagabunda incapaz de retribuir todo o amor que eu poderia dar a ela. Vou parecer alienado, e talvez eu seja mesmo, mas a verdade é essa: amores desperdiçados são a grande tragédia da humanidade. Se Franco, Pinochet, Suharto e todos esses babacas tivessem uma mulher legal, talvez não ficassem tanto tempo pensando em merdas totalitárias. Caralho, tô ficando mesmo bêbado. Ops, desculpe aí. Falo palavrões pra caralho.

Tem vezes que dá vontade de dizer pra aquela menina: porra, será que você não vê que eu não sou só ombro, que eu tenho boca, mãos, língua, pau? Porque estou farto de ouvir as desventuras amorosas daquela vadia com Danilos, Gérsons, Alans, Rodrigos e todo um bando de putos batizados com esses nomes típicos de classe média metida a burguesa, uns mauricinhos prestáveis pra trepar, mas que roncariam estrepitosamente se fossem obrigados a ouvir um quinto das lamúrias e confidências que a desgraçada me faz. Isso é que dá virar confidente. Se eu quisesse realmente comê-la, jamais poderia deixar que nós nos tornássemos amigos. Com certeza ela só consegue me ver como um terapeuta assexuado, um ombro-travesseiro, jamais como um macho. Caralho. Se ela soubesse que por detrás desta fachada inofensiva se esconde um gigolô pós-graduado em usos alternativos de chantily e algemas. Jura que você pagaria pra ver isso? Engraçadinha. A verdade é que você só conhece uma pessoa entre quatro paredes, despida, literalmente e simbolicamente, de todas as máscaras que a gente usa no dia-a-dia.

Mas ainda bem que tenho você pra me agüentar. Ouvir meus desabafos é como pagar pecados em vida, quando você morrer vai direto pro céu. Onde mais eu acharia uma amiga como você, que presta atenção em tudo o que eu digo? Ou isso, ou você arqueia as sobrancelhas como ninguém. Brincadeira. Às vezes me pergunto o que leva você a aturar minhas rabujices. Você deveria ser terapeuta. E não adianta me dizer que você só faz essas coisas por minha causa. Você é uma santa, a Madre Teresa dos chatos bêbados como eu. Um dia ainda ganho na Sena e encontro uma mulher tão linda e inteligente como você. Um clique? Ué, não entendi. Burro? Sim, mas qual é a novidade? Não, não. Pode deixar, eu pego um táxi. Ok. Garçom, a conta.

Leila, como é bom ter uma amiga como você.
 


amores que deram certo na literatura

Intermezzo

Ora, a fornicação é deleitável...
São Tomás de Aquino.
De Malo, art. 9, ad 7, q III

 

Dinorá a todo cérebro

ou seja

A estranha mulher do Copacabana Palace

ou seja

A ex-peitudinha do Hotel Fracaroli

ou seja

O mais belo amor de Cascanova.

- Como são finas as tuas meias!
- Malha 2360.
- São duráveis?
- Duram três, quatro horas...

O mar lá fora urra querendo entrar em Guanabara.

- Não. Lindas são as minhas calças. Olha, ninguém tem este recortezinho... Mas como estás mudo... sem espírito...
- Comovido porque te conquistei...
- Não. Não é uma conquista...
- Que é então?
- Uma revanche...
- De que?
- Da vida.

O telefone estraçalha o silêncio.

- Alô! Quem é? O tintureiro? Faça subi-lo! Espere! Não faça não! Recebo-o amanhã às três e meia...

Lá fora o mar.
O mar sem par. Serafim amanhece. Ela o envolve, o laça. É uma mãozinha que tem cara, cabelos de recém nascido à la garçonne.

- Te esmigalharei como um pequenino inseto...
- Levada!

Bocas que se beijam como nos melhores folhetins do Planeta Marte, que se lambem como nos melhores canis.

Oswald de Andrade, em Serafim Ponte Grande (um livro que você tem de ler).
 

Imagina-te, Clódia, encontrei uma mulher inimaginável, belíssima. Ela é de Caicó. Jamais pensei que uma caicoense pudesse ter tais atributos. É tudo tão longe, não é? E a gente nem sabe direito onde é Caicó. E se existe. Pois existe e muito! A mulher é inteira existente. Existe em maravilha da cabeça aos pés. Não te preocupes, mas balancei um bocado. É alta, loira e letrada! Conhece literatura de cabo a rabo. O marido, o professor Gutemberg, viajou anteontem para um lugarzinho perto daqui chamado Muiabé. Não deu outra. Já sabes. Mas a mulher tem tamanhas qualidades que fiquei tímido, lasso, brocha e despeitado. E ontem, odiento, mandei-lhe o primeiro poema aí de cima. Pois imagina-te, hoje me respondeu com o aí de baixo. Estou mal. Prostrado. Manda-me algumas palavrinhas. Caicó, meu Deus! Vou comprar hoje mesmo um mapa desse Brasil bandalho. Que surpresas! Que país! Que grelos insolentes e cultivados tão de repente! Eu fedo, Clodinha? Manda-me carícias e um fio do teu pentelho. Ela se chama Líria.

Hilda Hilst, em Contos d'Escárnio (não leu ainda?).
 


uma história pastelão, mas real
carlos jazzmo
[direto da lista e-zine]

O problema com a diversidade cultural é a coexistência de costumes e a cumplicidade na neurose. Vai morar com um paquistanês pra ver se é moleza. Os caras são verdadeiros ascetas e consideram tudo supérfluo. Você não consegue nem sentar de pernas abertas e fumar um cigarro em paz. Mas enfim, o fato é que São Paulo é um caldeirão de neuroses.

Quinta-feira, coisa de três da manhã, saem Jazzmo, Clarah Averbuck, Fábio Sooner e Maverick (Guilherme, esse menino) de um show do Zé Maria - grande banda, de Vitória - no Orbital, rumo a uma rústica e simpática pizzaria na mesma Rua Augusta. Rua que, aliás, àquela hora, estava realmente augusta da paz.

Seguimos então trocando gracejos e converso com Sooner sobre como amigos precisam de amigos para resolverem seus problemas amororos. A fofura paira no ar e é como se fôssemos todos brothers de infância.

Certo. Mas aí chegamos à porta da casa e começamos a nos esgueirar por um corredor de tijolos aparentes. O gerente nos manda sentar em à grande mesa, daquelas típicas de cantinas italianas ou ainda de grandes famílias italianas e me sinto absolutamente em São Paulo. Tudo que quero agora é uma grande família italiana.

E o papo sobre amigos e amor continua rolando, enquanto registro os elementos do local. Paredes de tijolos, pizzas diversas, movimentação de clientes, pimenta, alho, balcão, corredor, mesa, bandejas, mulher debruçada sobre comida com os peitos de fora, orégano... Ouch! Registro rapidamente a menina e lanço um rápido "poorrrra!" para Sooner e sigo falando.

Oquei. Sentamos então na mesma mesa que aquele povo - lá na ponta da grande mesa, e já percebo um malandro com sotaque do Bexiga me dizendo algo como "E vocês ainda vão sentar aí, né?!", com seu ar de indignação. Respondo candidamente que o gerente nos havia mandado sentar especificamente ali, mas a coisa só faz crescer o clima belicoso e desnecessário da situação.

Clarah observa tudo atônita, maquiada demais para perder tempo com neuróticos, e Maverick só pensa na pizza e Sooner, bem, Sooner está em outro planeta com seu casaco de couro negro, gato, metal, Marlon Brando dos cabelos prata.

Mas aí respondo assim e o neurótico do lado esquerdo, lá na ponta, continua: "tu é folgado, hein, mano!", já num tom de quem está decidido a fazer alguma besteira. Eu, coitado, mignon e pacifista, respondo apenas "hein???" e tento acabar com a discussão. Mas a coisa só cresce.

Cada vez que eu digo, em face da violência verbal, algo como "que foi que eu fiz, bicho???", os monstros do meu pesadelo só crescem e começam a se levantar. Dois caras, duas meninas. Uma delas é a dos peitos de fora. A outra me grita insistente: "você sabe o que você fez para acontecer isso!"

O agressor-primeiro veste camiseta branca e calças pretas e também grita. Sua acompanhante é uma morena forte e gostosinha do vestido cereja de tafetá. Do outro lado, agora crescendo na cena, está a menina dos peitos, de tafetá prateado e um decote escandalosamente divertido, e seu acompanhante - ah, se não - é forte como um touro, moreno, de camisa de seda roxa e cordão dourado no peito.

Man, o cara de roxo ali se levanta gritando e a menina do outro lado começa a berrar num sotaque estranho algo como "não mexe com meu irmão, porra!!!!", enquanto o outro cara brada coisas ininteligíveis e Clarah vira o homem da situação toda, já que eu levo as mãos ao peito, temendo a morte, e Maverick, esse menino, está estático e Sooner vem para trás de mim, impossibilitando um confronto dois-a-dois por ali.

Clarah começa a gritar com os malucões que, sem argumentos para odiá-la, fazem-se representar pela guria do topless, que lança então a máxima: " VAI TOMAR NO CU COM ESSE CABELO!", direto para suas madeixas cor-de-rosa, e preciso gritar "Claraaaaah!" para que ela não piore a situação. Afinal, era o meu rabo que estava em questão por ali.

Mas então é neguinho pulando por todo lado, os caras parecem babuínos do cu encarnado, e um tem a ótima idéia de buscar um pedação de pizza na mesa e arremessar contra nós. Woooooow! Just singing in the rain! Clarah leva uma cebola no meio da testa, recebo uma verdadeira enxurrada de catupiry e, nem sei como, consigo tirar um pedaço de massa detrás da orelha. É realmente fascinante o trajeto daquela guloseima pela casa, atravessando o salão e se espatifando por toda parte.

Quase rio, como quando tomei meu primeiro banho de chuva, mas prefiro ficar sério. Afinal, ainda não sei até onde vai a fúria dos homens.

Oquei, mas então uma das meninas pula na frente dos caras, enquanto eles vêm nos quebrar, e grita; "Pára, Rafael!!!!!". Rafael não pára. Então ela se vira para o gigante roxo e lança "Pááááára, Aboud!!!!!". Caaaara, basta ela dizer "Aboud" para meu cu apertar como uma chave inglesa. Aboud não pára, pragueja em árabe uma meia dúzia de "al'almandrissal'shnitovaray" e já imagino o cara abrindo a camisa, puxando uma cordinha do peito, me abraçando forte e explodindo a porra toda. Cara, me tira daqui!

Oquei, mas aí estamos nessa, nos limpando e rezando para que começasse a chover sapo, quando um monstro negro, de sobretudo e cara de anjo salta por cima do guerrilheiro beduíno como um gato, no exato momento em que o cara vai me mandar a mão no meio da cara, e saaaaaalva - eu disse saaaalva - nossas vidas. A performance do segurança durante o ataque é irrepreensível.

Que perfeição, que precisão.... O cara então doma totalmente as tropas árabes e pergunto seu nome, já que esse será - está decidido - o nome de meu filho. De Paula. guardem esse nome: De Paula.

De Paula controla tudo, ameaça jogar uma cadeira no árabe, e Samira (a irmã de Aboud) é a primeira a capitular. Depois é Rafael e a menina peitos-de-fora. Aboud sai sob empurrões, para então, segundo nos é dito minutos mais tarde, arrumar mais briga na padaria da esquina.

Estamos vivos e amando São Paulo. Não vejo a hora de voltar.
 

d i á l o g o s   i n e s q u e c í v e i s

(Rapaz conversando com garota maravilhosa, na porta de casa).
 
Ele: Eu não tenho auto-estima para que entreis em minha morada, mas dizei uma só palavra e serei salvo.
Ela: Calaboca e me beija logo.
Ele: Por isso é que dizem que só Jesus salva.
 
(História absolutamente real).
 
 
pecados - I
b. f. carvalho [[email protected]]

O ano era 1995 e eu me apaixonei por uma mulher que cagava e andava para mim. Se é que se pode chamar aquilo de mulher. De qualquer modo eu me apaixonei perdidamente e me tornei um imbecil descerebrado, que é o que um homem se torna quando cai nesse tipo de armadilha. A vida de imbecil descerebrado durou alguns meses, talvez tivesse durado mais se a estúpida não tivesse errado a mão nas técnicas de controle da mente. São técnicas complexas que exigem equilíbrio - um tapa, um sopro, um tapa, um sopro, um tapa, um sopro. Nunca dois tapas. Nem dois sopros.

Eu poderia ser um zumbi por anos e anos se lidado apropriadamente, mas a imbecil preferiu ficar me tratando que nem um cachorro constantemente. Obviamente um belo dia eu enchi o saco daquela merda. Não, mentira. Eu fui enchendo o saco daquela merda lentamente. Não houve um dia em que eu acordei e disse "eu estou de saco cheio" (em latim, ego sum bagus plenus). Foi todo um processo no qual ela foi me fodendo cada vez mais e cada vez mais eu enxergava que eu estava saindo no prejuízo.

Um dia, almoçando com ela, ela começou a me criticar por um motivo x. Este motivo x levou a um motivo y, que levou a um motivo z, que levou a um motivo x', que levou a um motivo y' que por sua vez levou a um motivo z'. Tudo virou motivo para me criticar. Em quinze minutos, tudo sobre mim era errado ou inapropriado. Meu corpo, meu sorriso, meu cheiro, minha voz, minha mãe, meu pai, meu irmão, minha casa, minha história, minha vida, em quinze minutos não sobrou nada. E eu lá, impassível, ouvindo tudo. Rock solid like a fucking marine. Macho pra caralho. Estava até começando a aceitar as críticas. Pensando "é, talvez ela tenha razão".

De repente, do meu copo (coca diet com gelo e limão) cai uma gota de água condensada. A água pinga sobre uma joaninha que estava andando pela mesa. Ela começa a encher o saco por causa da porra da joaninha, secando-a com os dedos, delicadamente. Enquanto ela cuidava da joaninha, formei um simples paralelo em minha mente. Eu, aqui, entidade consciente e senciente, mamífero superior, macho da espécie homo sapiens capaz das mais incríveis humilhações por essa piranha. Ela me tratando como se eu fosse um celenterado da pior espécie e dedicando cuidados e mimos a uma porra de uma joaninha.

Não tive dúvidas - assim que ela acabou de mimar a joaninha peguei o cinzeiro e lentamente, mas bem lentamente mesmo, esmaguei a joaninha na mesa. Devagar, curtindo os pequenos estalos do seu exoesqueleto se rompendo sob a pressão do vidro do cinzeiro.

Ela me olhou horrorizada. Eu fiz uma cara de foda-se.

Perdoe-me pai, porque pequei.

OBSERVAÇÃO: Caro leitor, você também pode se redimir de seus pecados. Escreva para [email protected] relatando as lembranças mais sórdidas de seu passado imundo (e não se esqueça de incluir os detalhes mais picantes, please). Spam Zine & rtfm por um mundo melhor: redenção digital ao seu alcance.


r á p i d a s   r a s t e i r a s

"Disco Voador/Venha me pegar/ Me leve para outro lugar".
Poesia concreta e letra da nova música composta por Eriberto Leão, namorado da Tiazinha.

"Ao modelo babaca do comedor corresponde o modelo babaca da comida".
Fernando Bonassi, teorizando na Folha de S. Paulo.

"Seu animal é cidadão?"
Mais um dos títulos surreais da Revista da Folha.

"Moral da história: nem sempre quem tem moral faz a história".
Erton Moraes, na revista Caros Amigos, a cultura da periferia.

 

f a l a   q u e   e u   t e   e s c u t o
A gente responde aos leitores, mas não garante a educação.

"Amigos, O texto de vcs é irresistível. Conseguiram me fazer ler quase tudo em online mesmo. Impressionante. Estou assinando. Seja lá o que Deus quiser".
Ricardo Alfaya

Resposta do editor interino: Pô, mano, você já ouviu falar que monitor emite uma radiação dos infernos?
 
"Gostaria de sugerir que o site possa disponibilizar cópias em arquivos zip das edições anteriores, vez que é meio complicado pra um pobre conectado em pulso telefônico a 56k como eu ficar abrindo páginas web durante o dia... e uma cópia disso sem ter que abrir milhares de páginas e acessível em disco a qualquer hora soa mais dinâmico... reconheço, também é mais fácil para um preguiçoso como eu (não por ser baiano, olha lá a mangação, hein!)... =]"
Eder Rebouças

Resposta do editor interino: Cê acha que o Spam é a Embratel?
 

c r é d i t o s   f i n a i s 

Stress, Depressão e Síndrome do Pânico
Eduardo Fernandes [[email protected]
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Alexandre Inagaki [[email protected]]
Ricardo Sabbag [[email protected]]
 
Borderline e distúrbio obsessivo-compulsivo
Pedro Vitiello [[email protected]]
Meg Riot [[email protected]]
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Cleptomania
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p. s.
 
 - Não tem ps. Tá pensando que eu sou o Gilberto Dimenstein? (Eduardo Fernandes)