silly
love songs
Que amar emburrece, isto é fato líquido e certo. Noites de insônia, olhar
perdido e bobado dirigido a lugar algum, e crises de choro a cada reprise
de "As Pontes de Madison" são apenas alguns dos efeitos colaterais
mais perceptíveis. Mas há muitos outros. Andar com um sorriso bobão e feliz
no rosto, de mãos dadas e com os braços balançando pra lá e pra cá. Acompanhá-lo
no futebol em frente à TV, mesmo que o jogo seja entre Friburguense e XV
de Jaú. Elogiar o pavê de jaca da sogrinha. Ah, os estranhos desígnios da
paixão.
Amar, mais do que nunca, é um ato de coragem. Porque estes são tempos em
que "in" é ter sempre um certo ar blasé estudado ("não esquecer
de arquear as sobrancelhas, citar ussell e Vidal"), com um quê de cinismo
e outro de ceticismo. Ter sempre uma tirada corrosiva na ponta da língua,
e manter as emoções sempre sob rígido controle. Apelidos carinhosos como
"Mozinho" ou "Free Willy" em absoluto sigilo. Evitar
beijos-desentupidor-de-pia em público. NUNCA, NEVER, JAMAIS, NECAS DE PITIBIRIBA
confessar que pediu no Dia dos Namorados aquele CD do Kenny G.
Ah meus caros, não tem jeito: amar é brega, é piegas, é meloso e é bom pra
dedéu. Como bem disse Paul McCartney, nada como "silly love songs"
para descreverem as estranhas e maravilhosas sensações que nos acometem
quando somos pegos pela arapuca da paixão. Um exemplo: poucas vezes vi uma
descrição tão exata como nos versos cantados por Carmen Silva -
O amor é um bichinho
Que rói rói rói
Rói o coração da gente
E dói dói dói.
Sim, dói. Mas é demais de bão. =^)
* * *
tá bonito, tá gostoso
A edição de hoje não tem seções, pelo simples motivo de que está robusta,
repleta de textos legais relacionados com a data. Humor, erotismo, ironia,
lirismo, ficção, reminiscências: Pedro Vitiello, Nicole Lima, Carolina Linden,
Ricardo Sabbag, Eduardo Fernandes, Aline de Mello, Orlando Tosetto Junior,
Cecilia Giannetti e o convidado especial Gustavo de Almeida, meu colega
de Falaê, me ajudaram
a fazer uma das melhores edições do Spam Zine em termos de textos. Árdua,
apenas, foi a tarefa de fazer um editorial que não afastasse vocês das boas
leituras a seguir.
Mas antes de se desvencilharem de mim, dois recados.
Antes de mais nada, preciso dar meus parabéns a Sergio Faria, colaborador
do Spam Zine e que, como vocês já cansaram de me ouvir dizer, é responsável
por um dos melhores blogs da Internet brasileira, o Catarro
Verde, responsável pela descoberta de que o discurso de renúncia de
ACM plagiou descaradamente um discurso do deputado Afonso Arinos pronunciado
em agosto de 1954. Com a preciosa ajuda de outro blogueiro, Charles
Pilger, a descoberta de Faria chegou aos jornais de todo o país, mostrando
que a Web, por meio de iniciativas pessoais, pode muito bem ser mais do
que estéreis webcams e e-commerce.
Last, but not the least. Já está no ar a nova edição da Enloucrescendo,
desta vez comandada a oito mãos, todas elas de amigos & colaboradores
do Spam Zine: Renata Parpolov, Ian Black, Erick Muller e Orlando Tosetto
Junior.
* * *
todo casal já passou por isso
Atrasou, e MUITO. Mas enfim, o Spam Zine finalmente chegou. Ufa!
Agora, é relaxar e gozar. Bom Dia dos Namorados!
(ilustração da página: Henrick
Manreza)
meias palavras
pedro vitiello [[email protected]]
Normalmente eu faço o gênero "engraçadinho" nos textos porque
toda vez que escrevo sério me acho um chato. Vou tentar (não muito) falar
sério desta vez. Quase todo mundo consegue achar seu pé-de-meia na vida,
cedo ou tarde (exceto se a sua amada faxineira tiver perdido ele, mas isso
é outra história), quando o assunto é amor. É verdade que as vezes o pé-de-meia
pode ser velho, mal-cheiroso, com um sensual furo no dedão ou gostar de
futebol, mas que a gente encontra, geralmente encontra.
Eu achei o meu pé-de-meia, que se chama Patrícia, não tem furos no dedão,
odeia futebol (como eu) e cheira muito bem, obrigado, e sou muito muito
feliz de poder estar com ela (o que é uma sorte, já que a gente se casou
na igreja sábado passado, hehehe).
Em uma época como a nossa, sem romantismo que não seja aquela coisa piegas
do Leonardo di Caprio em um barco que vai afundar (viva o iceberg!), e músicas
do Wando, Katinguelê, etc, é mais difícil ser romântico sem fazer o seu
objeto de amor vomitar.
Desde que o mundo é mundo, o amor é objeto de discussão, seja entre teólogos
e filósofos, entre cientistas, artistas, pessoas inteligentes, eleitores
do Maluf, etc etc. A bem da verdade, o amor é motivo de discussão até entre
casais (neste caso normalmente quando um deles pega uma carta de amor a
outra pessoa).
Sua natureza não importa, mas apenas saber que o amor arruma a vida da gente,
que nem a minha faxineira deveria fazer com minha casa; dá uma sensação
de segurança, que nem meu porteiro deveria fazer; leva a gente a lugares
longínqüos, como o meu mecânico deveria fazer meu carro ir. Ou seja, é o
sentimento mais sublime de se ter - além de não pedir caixinha, não tocar
seu interfone às três da matina, e, principalmente, não faltar sem
avisar, deixando você com pilhas de louça na pia. Amor é uma coisa incrível!
Por isso, no dia dos namorados, ame, dê vexame, cante Fuscão Preto em uma
serenata para ela, agrade à sua sogra, não chute o cachorro poddle dela,
seja bobo, seja divertido, seja criativo, seja feliz!
Espero que dia 12 possa ser um dia para se descobrirem com alguém especial
como eu já me descobri!
Ps: Se algum dia você estiver derretido de amor e em um barco com a Celine
John gritando, por favor verifique se os blocos de gelo na região também
estão. Não custa nada e você ainda pode jogar aquela canadense histérica
num deles!
você já beijou o seu
monitor hoje?
nicole lima [[email protected]]
A primeira vez foi há mais de um ano, durou uns dois meses (o que nesses
casos já é muito) entre e-mails, links, attachments e webcards atrás da
moita.
Na época eu ainda não tinha internet em casa... nem número de icq.... matava
aula na faculdade pra ir ler meus e-mails nos computadores do laboratório
de informática... e quando teve greve então? Quase morri, liguei até pra
telefônica de São Paulo pra descobrir o telefone do moçoilo... Achei que
nem ia ter telefone nenhum... mas tinha. Tava lá o número e o nome completo,
tudo anotadinho em cima da mesa num pedaço de papel...e aquele papel olhava
pra mim de um jeito... Demorei dois dias pensando se devia ligar ou não,
claro que não devia... (Primeira lição: nunca telefone sem ter sido devidamente
autorizado a fazê-lo...a menos que queira fazer papel de psicopata neurótico-obsessivo)
Liguei...
Só pela voz de susto do meu ALMO Gêmeo percebi a caca que sucedeu o meu
nada criativo "adivinha quem tá falando????"
Aliás, o teste da voz... muito sério esse negócio de voz... porque você
fica semanas lendo e-mails mudos, mas eles têm uma voz, uma entonação...
eles têm ummmm...uma alma.
Depois de um tempo, não se sabe porque, os e-mails foram sumindo...
Acabou É estranho acabar um amor que você nem sabe pra quem deu... imagina,
mas não sabe... meio que nem bola de sorvete que cai no chão antes de você
dar uma lambida.
Também não é difícil achar outro. Tem gente que manda até o mesmo e-mail
recortado e colado para várias pessoas para ver o que dá... deve ser algum
tipo de egolatria mal resolvida... "diga-me como eu sou lindo legal
e interessante" vai saber! Site é o que não falta... parperfeito, loveconnection,
almas gêmeas, eutofacinho... (atrás do trio elétrico só não vai quem já
morreu)
Há várias maneiras de saber se você foi contaminado por esse love bug: o
primeiro indício é uma súbita alegria seguida de gargalhadas solitárias
frente a tela do computador... computador que aliás pode ser QUALQUER UM
(Nunca deixe um desses seres apaixonados se aproximar do seu... a menos
que você não tenha amor a sua cadeira...). Apaixonados virtuais têm uma
atração inexplicável por computadores de qualquer espécie, desde que equipados
de um modem e uma linha telefônica... é a clássica "posso ver o meu
e-mail?"...só que repetida a cada meia hora... o pobre não consegue
ficar mais de duas
horas afastado de um computador sem ter suadeira, taquicardia, dor nas juntas,
falta de ar e coceira na mão.
O segundo indício são as freqüentes visitas a sites de cartões virtuais,
o que na verdade não passa de uma desculpa muito da sem vergonha para disfarçar
todo o tempo que se perde com a florzinha do icq verdinha verdinha
esperando aquele outro infeliz aparecer... e espera e espera e espera
(ir ao banheiro depois da meia noite só em caso de vida ou morte)... até
que... "toc toc toc... o ou"...
Caso brabo mesmo é quando o fulano conquista uma pastinha amarela só pra
ele no seu outlook.
Passa uma semana... duas... aí um belo dia aparece uma mensagem
com um attachment em JPG.
(oi tum... tum... bate coração oi tum coração pode bater.... )
Vai lá..abre... aí você amplia amplia amplia amplia... e vai despindo aquela
figura idimensional pixel por pixel... olha meio de lado, vira ao contrário,
inverte, muda a cor... não adianta, você não vai conseguir ver quem é aquela
cabeluda (ou será um cabeludo?) atrás dele. Depois de alguns dias aquela
foto dele já conta com uma sua recortada e sobreposta, só pra ver
como vocês ficam juntinhos... UTI para os que colocam a foto do amor virtual
de fundo de tela.
A média de um viciado em amores virtuais é de cinco a seis casos de amor
eterno por ano... e o mais engraçado é que eles sempre marcam seus primeiros
encontros nos mesmos cafés... é só olhar aquele cara que sempre chega e
fica lá sentando no fundo, com um livro na mão, a capa bem visível, olhando
sem parar pra porta. não sei porque, mas deve ter alguma coisa a ver com
o fato de que os homens sempre vão a um motel conhecido quando estão com
uma namorada nova.
Tem gente que vai buscar na rodoviária (hábito não recomendado para pacientes
cardíacos). Ano passado no dia dos namorados eu ganhei um cartão virtual,
um coração
todo costuradinho do BOL...
Este ano vou ao vivo, vou deixar de ser um holograma vou com o coração na
mão, cara lavada e chuteira velha... mamãe estou indo pra São Paulo tchi
bummmmm rodoviária aqui vou eu (amor virtual bom é aquele que não mora na
sua cidade... qualquer coisa
mais próxima é realidade excessiva).
Dessa vez é sério, vou casar e tudo (será que tem marcha nupcial em MP3?)
vou encontrar meu loiro tatuado de 1,93 de altura o amor da minha vida :o)
(eu tento me levar a sério, me aprumar, mas é o vício é o vício.)
os lemingues
e a renúncia
gustavo de almeida [[email protected]]
Mais gelo, por favor. É o que eu conseguia dizer naquela noite. Tédio. Aquela
frase, que eu ouvira de uma mulher mais velha e sábia, "eu já conheço
esse filme", ecoava, e eu só pedia mais gelo e pensava na lógica dos
lemingues. São como pequenos ratos, quase hamsters (alguém consegue entender
o que é ser "quase um hamster"?), que em determinado momento de
suas vidas seguem em bando para o alto de uma falésia, e de lá vão se atirando
às cegas. Sou um ignorante, nunca li nada sobre os motivos que levariam
os lemingues a esse suicídio coletivo. Gosto da mitologia, de pensar que,
como Ícaros oedores, o que eles querem é virar morcegos. Mas outro dia,
vendo o site Darwin
Awards, vi uma explicação terrível. Este site relata casos em que o
processo seletivo de Darwin é confirmado, por meio de mortes estúpidas.
Segundo o site, seres demasiadamente estúpidos morrem de uma forma estúpida
tendo como objetivo "limpar" a raça, dando lugar a outros que
não morrerão de forma estúpida. Assim, os lemingues, ao se suicidarem, contribuem
para a melhora de sua espécie, pois assim ficam na Terra apenas os lemingues
que não se suicidam.
Essa lógica assusta. Teriam os nossos suicidas este ímpeto embutido em seus
genes? Não sei. Será que os homens suicidam como lemingues? Pensei em Camus,
quando disse que o suicídio é o grande problema filosófico do século 20.
Mas respirei aliviado, já estamos no século 21, o suicídio não é mais um
problema. Pensei então, naquela noite, que o grande problema do século 21
será a falta de lágrimas. Estamos acostumados a entender as mecânicas da
sedução, da atração, e principalmente da rejeição. Sim, sim. Mais gelo.
E vem uma moça e começa dançar com o cara, e pede para ele guardar a comanda
das bebidas, como se ele fosse passar a noite com ela, mas na verdade ele
guarda e a moça se afasta. Em outro canto, uma mulher tenta se encontrar,
procurando o homem de sua vida através das simples aparências. Há pré-requisitos:
pelo menos 1,70m, cabelos lisos, moreno, bons ombros, olhos podem ser castanhos.
E tomara que ele seja um cara legal. Tomara. Às vezes não é.
O que fazem os outros, nesta noite tão especial? Como lemingues, se dirigem
ao abismo. Mais gelo, por favor. Acende outro. Bate mais uma. Cadê a seringa?
A evolução cumpre seu doloroso papel. Empurra os lemingues com a ajuda da
timidez, da insegurança, da frustração.
Mas, neste sonho, é incrível, mas os lemingues voam. Em direção ao sol,
mas o que derrete suas asas é o amor.