[S
p a m Z i n e]
_____________
: 25 de março de 2001
: curitiba, londrina, são paulo, rio de janeiro, goiânia
INSUPORTÁVEIS
SENSAÇÕES
Não
sei mais o que virá adiante. A luz do quarto está fraca, a estação de
rádio saiu do ar, o barulho da vizinhança se apagou e agora o que resta
sou eu e meus pensamentos. Demônios, bradaria um amigo distante. Fique
sozinho com seus demônios e enlouqueça. O homem é o animal social; a
perversão, seu escape. A solidão eu já não sei mais o que é. Achava
que era método, hoje acho conseqüência.
Pois
ficar sozinho com seus demônios pode ser muito perigoso. Estava sendo,
para mim, nas últimas semanas. Deita tua cabeça no travesseiro, olha
para o teto escuro e vai pensar, menino. Vai pôr a cabeça no lugar,
as idéias em ordem. Hoje já não sei mais porque pedem tanto por ordem.
O caos, diria alguém amado, é potência, devir, brilho e movimento. Já
a ordem é estagnadora. A ordem mata a criatividade.
Uma
vez fui matar meus demônios em um campo distante, onde o que se via
eram só pedras e outras paisagens devastadas. Uma carvoaria, talvez.
Daquelas cheias de meninos cobertos de fuligem, fumaça e calor. Lá,
tive que expurgar meus demônios assim como um desses pastores evangélicos.
É dolorido, sim. Como também apaziguante.
Mas
há os dias que não se consegue matar seus demônios, ou sequer
dialogar com eles. Há os dias em que o homem é tomado por cólera e seu
produto é só raiva. E raiva pode ser autodestruição. Um círculo vicioso,
pois. A raiva que sinto de ti é o ódio que sinto de mim mesmo,
por alguma razão inexplicável.
Agora,
a descompassada solidão acomete novamente. O soluço da dor incontornável.
Falta de ar. Câncer. Olha para cima e não reconhece ninguém. Olha à
esquerda e verá tua própria morte. A morte, amigo, que te acompanha
em todos os momentos. Que te toca o ombro quando quer avisar do perigo.
Ela é paciente e perspicaz.
Olhar inconsolável
para o alto é flagrar-se olhando de perto para seus próprios demônios.
Que fazer com essa insuportável sensação? Resguardar-me-ei de hoje em
diante. O que sinto é só para mim. O expurgo da alma inconsolável é
a morte.
***
EDIÇÃO
O I T O
Oito
é um número tão bonitinho... Fico feliz de estar lhes entregando a edição
OITO do Spam Zine. Essa edição, para que todos saibam e para que eu
possa bradar aos quatro ventos o que me incomoda, está sendo editada
em meio a uma série de reportagens cabeludas e ao X Festival de Teatro
de Curitiba.
Está
sendo duro descobrir como eu não gosto de reportagem. Quando decidi
ser jornalista, queria ser por vários motivos. Estar em contato
com as palavras. Acho que era isso. Mas as coisas não são tão fáceis
como parecem. Entrar nesse clubinho requer jogo de cintura e saber engolir
muitos sapos. Mas não gosto. Não gosto mesmo de reportagem. Outrora
o jornalismo era feito de repórteres e redatores. Eu queria ser redator.
Hoje não dá mais. Tem que ser de tudo. Tem que apurar, escrever, editar,
revisar e às vezes até publicar.
Mas
agora é isso, virei repórter. Anos de dedicação e estudo para eu ter
que ficar conversando com delegado sobre como aconteceu o crime. O jornalismo
é boçal. Gira em torno do furo. E o furo é uma merda, sempre me lembra
daquele tipo de gente que adora dar 'em primeira mão' as novidades,
por mais patéticas que sejam. A velha fofoca, sacam? Eu nunca fui desse
tipo. Não me importo em ser o mais bem informado. Aliás, o que será
que me importa. Diga lá: LEITOR, O QUE TE IMPORTA? Respostas para [email protected].
Tudo
bem, tem o Festival de Teatro, que é bem legal, e esse ano está
cheio de coisas. De peças, evidentemente. Só na mostra paralela, o Fringe,
são mais de cem. Já pensou ver cem peças em dez dias? Não tem como,
né? Claro que não. Daí você arrisca, vê muita porcaria e de repente
pode até encontrar algo de bom. Mas é legal. Legal, mesmo. Se um dia
vierem perguntar pra mim "E aí, seu Sabbag, que me diz desse Festival
de Teatro?", eu vou responder: legal.
***
ENFIM
AO QUE INTERESSA
Vamos
lá. Hoje temos o melhor do que está sendo produzido em termos de jornalismo
alternativo e literatura inventiva. Quero crer que esse seja o nosso
caminho: apresentar autores novos e de qualidade COM resposta do público.
Portanto, escreva. A sua participação faz os nossos dias mais felizes.
O
destaque desta edição fica por conta da estréia no Spam de Orlando Tosetto
Junior. As letras de Orlando também poderão em breve ser conferidas
no site Enloucrescendo, gerenciado pelo colega
spamzineiro Ian Black. Aliás, a bela página de Ian também reserva alguns
textos de outros de nossos colunistas. E teremos mais reforços no ar,
aguardem pela semana que vem. Mas e você, também quer ser um colaborador
do Spam Zine? Fácil, envie mail para [email protected]. Suas letras serão analisadas
por uma equipe de especialistas e, conforme disponibilidade, colocadas
no ar. Duvida? Qual o quê, rapagão! Nesta edição estreamos a seção Mãe,
olha eu no [S p a m Z i n e]!!, elaborada especialmente
para acolher textos de leitores colaboradores.
Agora,
chega de falatório. Beijos a quem merece.
::: pedido
de desculpas, papo-aranha & recado final
rapêize, desculpem pela demora, mas é que a minha banda tem tomado
realmente muito tempo. (espíritos zombeteiros, www.mp3.com/espritos_zombeteiros
-- 'espritos' mesmo, aqueles americanos analfabetos).
mas não temam, que Chico e Cíntia não serão esquecidos assim, como
dois personagens de uma novela barata publicada num fanzine qualquer.
a história tem um fim, sim, que já está escrito, mas como vou levar
até lá ainda não sei ao certo, e isso de certa forma me excita.
se
excitá-los também, melhor, e se alguma garota bonita, morena de preferência
(mas tenho boa tolerância com as outras), com idade entre 19 e 23
anos, coluna bem formada, saudável e suavemente sinuosa (coluna é
fundamental, como lembrava o Daniel Galera), que goste de beijar,
de fazer e receber sexo oral e que saiba distingüir relações casuais
de casos amorosos; se uma moça assim ficar excitada também, por favor
envie e-mail para [email protected] para um
possível contato físico num futuro próximo.
e
me escrevam falando sobre as colunas. usem acento nos e-mails, por
favor.
divirtam-se.
:::
Novelinha barata em alguns capítulos (parte 3)
. trilha sonora .
|+| sometimes, hail hail, last exit - pearl jam.
|+| se leonardo dá vinte, seqüestraram minha sogra - bezerra da silva
|+| kick out the jams, sister anne, high school - mc5
|+| japan trees, red dress, lay me down, fetch, bite my hand - sweet
75
|+| the actress - the delgados
|+| you send me - sam cooke
[frase da semana: 'vamo si invorvê!']
a lua brilhava solitária no céu sobre a BR-369. Cíntia olhou pela
janela e o brilho iluminou todo o seu rosto e o gato no colo. a luz
enegrecia mais ainda seus cabelos e deixava seu longo pescoço totalmente
exposto e branco. apesar de estar olhando em direção à lua, seus olhos
iam além, como se pensasse em outra coisa.
aquele ângulo do rosto dela era realmente bonito, o melhor que eu
tinha visto até agora, e eu quis muito tirar uma foto, mas nunca tive
câmera e sempre fico na mão em situações como essa.
passamos num grupo dessas lombadas de acordar motorista e ela virou-se
de repente, como se acordasse assustada de um sonho. me pegou de espectador
e tirei os olhos um pouco. voltei a olhar para ela, que ainda me olhava
com uma certa expressão de susto.
sorri com um sem-gracismo cínico, já tentando ironizar. ela sacudiu
a cabeça, riu também e voltou a olhar pela janela. começou a tocar
Soul Sister, do Allen Toussaint, e ficamos em silêncio por uns 5 minutos,
até a música acabar.
a música me lembrou Paula, de como nosso relacionamento tinha ido
pro lixo, e tive vontade de olhar para através da lua também, mas
tentei esquecer e me concentrar em como faria para conseguir entrar
na casa da garota da feira de animais.
seguimos pela estrada até que ela disse para pegarmos uma via lateral,
que dá acesso ao Jardim Sabará, um bairro suburbano de casas do BNH
enfeitadinhas e conjuntos de prédios caixa-de-ovo, quase na divisa
com Cambé. logo que a música acabou, ela quebrou o silêncio antes
que ele ficasse constrangedor.
"você vai saber voltar daqui, depois?"
"claro. eu conheço esses lados. e você não mora tão longe assim".
"você não deveria fazer isso.", ela disse, olhando para os dedos da
minha mão direita.
"isso o quê?"
"roer unhas".
escondi minhas unhas. "quem é você pra me dizer o que eu devo ou não
fazer?"
"é só um conselho".
"pois vou te dar um conselho, também: troque de bolsa". então foi
ela quem olhou espantada para a bolsa e pôs as duas mãos em cima.
"o que há de errado com minha bolsa?"
"além de feia por si só, não combina com o seu tamanho, nem com suas
roupas, nem com seu cabelo".
a expressão no rosto dela transformou-se de espanto em fúria muito
rapidamente. acho que acabei falando demais.
"ora
vejam só, um estilista me dando carona, e nem me dou conta disso!
e você por acaso acha que em algum momento me enganou com essa história
esdrúxula de gato para o seu sobrinho? pensa que sou burra, ou o quê?
fiz uma venda e ganhei uma carona, e você deve estar se achando o
mestre da sedução".
virei o rosto para a frente e fiquei muito vermelho. peguei a direita
depois de um trevo, e parei o carro. ela tinha conseguido fazer baixar
o escroto em mim.
"tudo bem, então acho que a sua carona furou. você desce aqui".
havia começado a chover uma garoa bem fina, o frio era cortante e
ventava. não fazia idéia do quanto ela ainda teria que andar para
chegar em casa, mas seria cruel de qualquer maneira.
ela desceu, e foi levando o gato.
"e deixe o meu gato aqui, por favor".
bateu fortemente a porta e atravessou a rua bem rápido, sem olhar
para trás. arranquei com o carro, andei um quarteirão e voltei. ela
estava andando pela outra pista, e parei do seu lado. ela parou também,
virou-se de costas e abaixou-se. não vi o que estava fazendo, mas
parecia pegar algo no chão.
"vem, entra aqui".
Cíntia virou-se, aproximou-se da janela e, num gesto rápido, jogou
muita lama gelada no meu rosto e na minha roupa. o gato, que estava
no meu colo, pulou com uma rapidez incrível para o outro banco, e
saiu ileso.
Cíntia
entrou no carro sem dizer uma palavra.
chegamos ao prédio onde ela morava, uma das caixas-de-ovo. parei,
ela desceu. a lama no meu cabelo, rosto, jaqueta e na camiseta fedia,
devia estar misturada com merda, ou lixo, ou alguma coisa assim. o
vento na roupa molhada castigava.
antes que ela fosse embora sem dizer nada, eu falei.
"bem... desculpa a grosseria".
Cíntia virou-se, veio até mim, e fiquei com medo de outra reação agressiva.
"tudo bem", ela disse.
"mesmo?"
"mesmo, tudo bem. você é que não está nada bem, com essa sujeira".
"eu agüento".
"não, suba e se limpe. eu te empresto uma roupa".
aceitei.
ela dividia um apartamento minúsculo de dois quartos com outra garota,
enfermeira, que segundo ela nunca estava em casa. ela não estava no
apartamento, então estávamos a sós.
(continua)
:::
P a p o - A r a n h a
::: O
guia moderno da cantada virtual. Quer achar a tampa da sua
panela? Envie uma cantada criativa para [email protected].
Nada
como uma cantada ridícula a sério
1) Menino: Oi... Estava te olhando e desculpa te perguntar, mas...
Posso te perguntar uma coisa?
Menina: HUMN?.. (Levantando a sobrancelha, de mau humor, com aquela
cara de "já sei o que ele vai falar, que me achou gata e que tá
afinzão de mim... Pobre coitado, estou preparada!")
Menino: Teu pai é ladrão?
Menina: (Perdendo o rebolado pelo inusitado, pronta para meter a
mão no engraçadinho, assim que sair do choque) O QUE VOCÊ PERGUNTOU,
gasp, COF COF???
Menino: (com voz meiga) ...É porque só assim para entender como
ele roubou o brilho das estrelas para colocar no seu olhar...!
Menina: (Suspirando, sorrindo e com voz de encantada...) Hahnmm!!!!!
Funciona melhor se a menina tivar olhos claros, mas funciona de
qualquer jeito. Não se esqueça de lançar um olhar James Bond para
prolongar os efeitos.
2) Parece fraquinha, mas funciona se for por "torpedo" (aqueles
bilhetinhos que se manda em um bar):
"Oi... eu estou aqui da minha mesa olhando você e pensei uma coisa.
Sabia que você é quase perfeita? É sim, eu juro! Mas agora você
deve estar se perguntando porque quase perfeita, se você tem tudo?
Tem charme, inteligencia, bom-humor e beleza? Bom, porque falta
uma coisa... eu ao seu lado ...!"
Se ela rir, já é um bom sinal. Agora, se ela rir e, ao encontrar
o seu olhar, sorrir mais ainda, levanta da mesa e vai falar com
ela seu lerdo!
P.S.:
Só homem dá cantada? As mulheres bem que podiam participar (com
as melhores e piores que já deram e/ou receberam, pelo menos)
NOTA
DO EDITOR MAL-HUMORADO: Faço coro às palavras do Pedrão. Mulheres,
onde estais vós que não nos presenteiam com as melhores ou piores
garganteadas que já receberam? E não tem mulher sozinha no mundo,
não? Até parece que todo mundo é feliz e contente...
:::
A coreografia das quatro taças de vinho