Renato Aragão e os Trapalhões: mudou o humor ou mudei eu?
Por Alexandre Inagaki ≈ quarta-feira, 29 de dezembro de 2010
Na primeira vez em que vi o número dos Heavy Trap’s em Os Trapalhões no Reino da Fantasia, de 1985, devo ter caído na gargalhada, como costumava fazer com todos os filmes estrelados por Didi, Dedé, Mussum e Zacarias nos anos 80. Pois bem: após muitos anos, finalmente revi o número musical protagonizado por eles, claramente inspirado no show que o AC/DC fez na primeira edição do Rock In Rio (vide o figurino de Zacarias e, em especial, a performance de Didi Mocó Sonrisépio Colesterol Novalgino Mufumbbo dando uma de Angus Young).
Ok, a performance ainda tem seu valor. Mas não foi capaz de despertar um sorriso na minha cara. E cá fiquei eu matutando: será que os Trapalhões eram realmente bons ou só me agradavam naquela época porque eu era uma pessoa menos exigente e rabugenta? A princípio, sou mais pela primeira opção. Afinal, o mesmo YouTube que resgatou essa cena dos Heavy Trap’s tambem disponibiliza momentos que ainda julgo serem muito bons. E que não necessariamente tinham as crianças como público-alvo, vide o quadro musical sobre Marlon Brando manteigando a Maria Schneider ou as esquetes do cacoetólogo, do Mussum no ponto de ônibus e do Didi no motel.
Quem só conhece Renato Aragão por intermédio do seu melancólico programa atual, em que Marcelo Augusto e Jacaré (ex-É o Tchan) aparecem nos lugares que já foram de Mussum e Zacarias, deve ter achado um absurdo a produção de um especial como “Nosso Querido Trapalhão”. Que me soou como um daqueles prêmios de Oscar honorários, destinados a corrigir injustiças e homenagear em vida grandes artistas do passado.
Eu, cuja família só jantava aos domingos depois de assistir ao programa dos Trapalhões, que era exibido sempre às sete da noite, gostei de ver a homenagem a Renato. E me surpreendi ao descobrir, por exemplo, que o eterno Didi Mocó já sobreviveu a um acidente de avião, tal qual um sobrevivente de Lost. Pena que Renato Aragão, que junto com seus comparsas de Trapalhões ainda hoje é responsável por 4 das 10 maiores bilheterias da história do cinema brasileiro, já não exibe a mesma verve humorística de antigamente.
P.S.: A música dublada pelos Heavy Trap’s chama-se “Hoje Não é Meu Dia de Sorte” e, acreditem se puder, foi composta por Lenine. Seus versos singelos merecem ser transcritos neste post.
Jussara bateu a porta na minha cara
Maria José deu um pisão no meu pé
Cecília arrebentou o meu rádio de pilha
Simone me disse um palavrão no telefone
Eu sei que todas elas querem me namorar
Mas é que hoje não é meu dia de sorte
E Juliana me jogou uma casca de banana
Margarete colou no meu cabelo chiclete
Conceição soltou o seu pastor alemão
Carlota me mandou um chute de canhota
Eu sei que todas elas querem me namorar
Mas é que hoje não é meu dia de sorte
E Renata botou no meu sapato uma barata
Catarina quase me afogou na piscina
Leonor me aplicou um golpe de judô
Gertrude roubou a minha bola de gude
Eu sei que todas elas querem me namorar
Hoje não é meu dia de sorte
Alexandre Inagaki
Alexandre Inagaki é jornalista, consultor de projetos de comunicação digital, japaraguaio, cínico cênico, poeta bissexto, air drummer, fã de Cortázar, Cabral, Mizoguchi, Gaiman e Hitchcock, torcedor do Guarani Futebol Clube, leonino e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos, não necessariamente nesta ordem.
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