O Orkut será pago
Por Alexandre Inagaki ≈ quinta-feira, 27 de abril de 2006
Por favor, reserve alguns minutos do seu precioso tempo e leia esta mensagem IMPORTANTÍSSIMA.
Seguinte: o Orkut vai passar a ser pago. Nós, cidadãos pertencentes a um país com alta capacidade de indignação diante de causas irrelevantes, precisamos fazer algo urgentemente! Por isso mande imediatamente um e-mail com esta mensagem para 25 pessoas de sua lista, e um Orkut plus atualizado (seja lá o que quer que isso signifique) aparecerá em sua tela! Depois, envie esta baboseira para mais 25 pessoas, porque o Google, interessado em aumentar sua base de cadastrados, presenteará você com um celular da Nokia pintado de ouro e uma viagem para a Disneylândia, e fará ainda uma doação de 100 mil dólares à Fundação das Macacas Bulímicas que Dançam Macarena Compulsivamente no Zoológico de Xiririca da Serra!
ADVERTÊNCIA: Herbert Steira, 42, ignorou esta mensagem e morreu de indigestão após ter comido três hambúrgueres do McDonald’s feitos com carne de minhoca. Juninho Billy, 27, também a desprezou, foi seduzido pela prima do concunhado da vizinha do seu melhor amigo e acordou no dia seguinte numa banheira cheia de gelo, encontrando ao seu lado um bilhete informando que um rim e metade dos seus neurônios haviam sido roubados.
Já Bete Tuda, 34, passou um dia inteiro no Orkut fazendo comentários na comunidade “Eu Acredito no Zé Dirceu e na Velhinha de Taubaté” e deixou seu filho contrair leptospirose ao tomar Fanta Citrus em uma lata contaminada com urina de ratos. Last, but not least: Indignada da Silva, 19, encaminhou um e-mail indignado aos seus amigos no Orkut desmentindo este boato, queixando-se da “ignorância de certas pessoas que crêem em tudo que lêem na Internet e abarrotam caixas postais alheias com correntes idiotas”, e encerrou seu desabafo solicitando a todos que repassassem adiante o seu esclarecimento…
Uma semana após o Orkut ter implantado a tal função de “visualização de perfis”, saltou aos olhos o crescimento repentino de perfis falsos, criados com o intuito óbvio de driblar o Bina e permitir que você, voyeur das tragicomédias alheias, continue bisbilhotando à vontade o scrapbook dos outros. De resto, é mais uma ferramenta a atiçar algo que necessita de pouco estímulo para manter-se em riste: a curiosidade humana. Reclamam da falta de privacidade, mas, oras, convenhamos: desejar isso em um site como o Orkut é algo tão sem nexo quanto subir no banquinho e fazer um discurso em defesa da moral e bons costumes no meio de uma orgia com cabritas besuntadas.
E o fato é que Orkut é uma ferramenta excelente de networking, um lugar no qual conheci pessoas interessantíssimas e um manancial de informações qualificadas sobre assuntos segmentados. No entanto, tornou-se uma barafunda de pessoas que montam álbuns de figurinhas compostos por usuários que conectam-se com o intuito de espiar scraps de terceiros e vigiar ex-namorados. Ou para participar de comunidades cujos tópicos de maior sucesso são joguinhos do tipo “bata a cabeça no teclado pra ver o que sai” ou “com que personagem dos Smurfs a pessoa acima se parece?”.
Retomo aqui uma reflexão que fiz anteriormente na comunidade Pensar Enlouquece: o Orkut nada mais é do que a representação virtual da vida off-line. O fato de pessoas ingressarem em comunidades pelo simples fato de desejarem incluí-las em seus “currículos”, declinando da oportunidade de discutirem idéias, nada mais é do que mero reflexo do status quo. A vasta maioria da gleba prefere ficar de braços (e neurônios) cruzados, limitando-se a espiar outras pessoas tomarem atitudes para só depois externar suas opiniões nada próprias, baseadas no copy-and-paste regurgitado de idéias alheias.
Alexandre Inagaki
Alexandre Inagaki é jornalista, consultor de projetos de comunicação digital, japaraguaio, cínico cênico, poeta bissexto, air drummer, fã de Cortázar, Cabral, Mizoguchi, Gaiman e Hitchcock, torcedor do Guarani Futebol Clube, leonino e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos, não necessariamente nesta ordem.
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