Mônica Toy e a capacidade de reinvenção da Mauricio de Sousa Produções
Por Alexandre Inagaki ≈ quinta-feira, 27 de março de 2014
Desde que deu seus primeiros passos no universo dos quadrinhos, com a publicação das primeiras tiras do Bidu e Franjinha em 1959, Mauricio de Sousa permanece mantendo uma incrível capacidade de conceber novos universos e realizar projetos criativos e surpreendentes. Os gibis da Turma da Mônica foram algumas de minhas primeiras leituras, e assim como eu diversas gerações de brasileiros começaram sua alfabetização se divertindo com os personagens concebidos por este mestre de 78 anos de idade meramente cronológica.
A Mauricio de Sousa Produções (MSP) há muito tempo não se resume a HQs, sendo responsável pela produção de livros, animações, espetáculos, eventos temáticos, exposições, projetos institucionais e licenciamento de produtos. Suas revistas são consumidas por cerca de 10 milhões de leitores por mês (conquistando aproximadamente 86% do mercado brasileiro na área de quadrinhos), e os personagens de Mauricio aparecem em cerca de 3.000 produtos de mais de 150 empresas parceiras. São números que fazem da MSP o quarto maior estúdio do setor no mundo: um exemplo de sucesso e um genuíno motivo de orgulho para qualquer brasileiro.
Mas como manter a relevância e a curva de crescimento em um mundo cada vez mais diversificado, volúvel, fragmentado? Junto com uma reestruturação financeira, que levou a decisões como o fechamento do Parque da Mônica no Shopping Eldorado, a MSP apostou na criação de novidades que fossem capazes de cativar não apenas o público infantil, mas também os adolescentes e os adultos que, como eu, cresceram lendo gibis da Turma da Mônica. Tudo começou com o maior sucesso editorial da área nas últimas três décadas: Turma da Mônica Jovem, série que em 2008 reinventou os personagens clássicos da Turma do Limoeiro, mostrando-os na fase adolescente, com traços inspirados na arte dos mangás (naquele ano, aliás, escrevi um post descrevendo meu choque ao ver personagens que embalaram minha infância com hormônios em ebulição).
Mauricio também soube como delegar tarefas, contratando talentos capazes de ampliar e enriquecer seu universo. Destaco em especial dois nomes: Sidney Gusman, responsável pelo planejamento editorial da Maurício de Sousa Produções, e Bruno Honda Leite, diretor artístico da MSP.
Sidney, jornalista e um dos maiores especialistas de quadrinhos no Brasil, idealizou projetos que reconquistaram os leitores adultos, como a Coleção Histórica Turma da Mônica (republicando as primeiras edições de gibis originalmente publicados nos anos 70, acrescidas de comentários feitos pelo roteirista Paulo Back), Ouro da Casa MSP (álbum no qual a equipe de profissionais da MSP, repleta de talentos como Flavio Teixeira de Jesus e Emerson Abreu, ganhou a oportunidade de recriar os personagens de Mauricio de acordo com seus próprios traços) e, especialmente, as graphic novels do selo Graphic MSP, que, como comentou Gusman em entrevista a Ramon Vitral, transformaram a Maurício de Sousa na “maior editora indie do Brasil”.
Enquanto isso, Bruno Honda lidera uma equipe na área de comunicação da Mauricio de Sousa Produções, focada em design de produtos, planejamento e concept design de personagens, desenvolvendo projetos especiais como a Turma da Mônica Toy. Concebida por Bruno, virou uma série de animações curtas e família de produtos. Veiculados no canal oficial da Turma da Mônica no YouTube e no Cartoon Network, os desenhos animados de Mônica Toy já acumularam mais de 7 milhões de visualizações. Nesta semana, estive no evento de lançamento da segunda temporada desta série animada, que contou com as presenças de Bruno e de outra figura-chave para o sucesso do grupo: Mônica Sousa, diretora comercial da MSP (e musa inspiradora da clássica personagem que é a dona da rua do bairro do Limoeiro).
A nova temporada de Mônica Toy terá 26 episódios de 30 segundos, que serão veiculados semanalmente no YouTube. Os traços dos personagens são minimalisticamente simplificados, mas reconhecíveis, seguindo a estética do universo da toy art. Não há diálogos (facilitando a internacionalização da marca) e toda a sonoplastia é composta por barulhos com a boca feitos pelos animadores. Como os desenhos são voltados para o público juvenil e adulto, buscando atingir a enorme quantidade de fãs que têm a Turma da Mônica em sua memória afetiva (#tamojunto), há mais liberdade criativa e temática: a estética é up-to-date e a “porrada come solta” nos episódios. Comentou Bruno: “Nos quadrinhos, as coelhadas que o Cebolinha leva são sempre encobertas por um ‘POF’. Nas animações de Mônica Toy, podemos brincar um pouco mais.”
Há um cuidadoso pensamento estratégico por trás dessa nova linha de personagens. A marca Mônica Toy já aparece em mais de 60 produtos, estampando uma coleção de objetos de decoração da Tok&Stok, uma linha de brinquedos colecionáveis e customizáveis da Multibrink, bolsas e mochilas Pacific e cadernos Tilibra, dentre vários licenciamentos. Além disso, os desenhos no YouTube são pílulas de 30 segundos, que podem ser vistos a qualquer hora do dia e, mais importante, em qualquer plataforma (pensando especialmente na geração que assiste a vídeos em tablets e smartphones): não possuem diálogos e não dependem de conhecimento prévio do universo dos quadrinhos.
Em matéria de Vanessa Jurgenfeld para o Valor Econômico, reproduzida pelo Observatório da Imprensa, Mauricio de Sousa declarou: “Hoje a evolução da cabeça da garotada é galopante. É um desafio acompanhar ou eventualmente tentarmos nos antecipar ao que o pessoal vai gostar e vai consumir. As agências de publicidade estão apanhando pacas. Os produtores de filmes, mais ainda. Gastam milhões de dólares e às vezes os filmes são um fracasso. E são coisas que no passado deram certo. Mas fórmulas definitivas não existem mais.” São declarações certeiras. Mas é bom constatar que a MSP não parou no tempo, trazendo profissionais criativos e buscando permanentemente a inovação. E está sendo ótimo acompanhar todos os passos de Mauricio e sua equipe neste cenário permanentemente em fase beta.
Alexandre Inagaki
Alexandre Inagaki é jornalista, consultor de projetos de comunicação digital, japaraguaio, cínico cênico, poeta bissexto, air drummer, fã de Cortázar, Cabral, Mizoguchi, Gaiman e Hitchcock, torcedor do Guarani Futebol Clube, leonino e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos, não necessariamente nesta ordem.
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