Luiz Gonzaga do Nascimento Junior, o Gonzaguinha

Por Alexandre Inagakiquarta-feira, 14 de novembro de 2012

Gonzaga - de Pai para Filho, filme lançado no ano em que Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, faria 100 anos de idade, traz as marcas registradas de seu diretor, Breno Silveira, um cineasta que domina como poucos a arte de emocionar plateias. Mas eu, que já escrevi neste blog sobre os dois longas anteriores dele, 2 Filhos de Francisco e Era Uma Vez, devo confessar que o que mais me marcou, na sessão em que vi o filme, foi uma cena que testemunhei quando já tinha aproveitado os créditos finais para enxugar as lágrimas, e me dirigia à saída.

Os créditos eram exibidos ao som de “O Que é, O Que é”, uma daquelas músicas que já se tornaram patrimônio cultural brasileiro, uma vez que todo mundo conhece sua letra. E uma prova inconteste disso foi quando vi a faxineira do cinema, uma senhora sorridente que aguardava pelo final de sessão na porta da saída, cantando animadamente os sintomáticos versos:

Somos nós que fazemos a vida
Como der ou puder ou quiser
Sempre desejada
Por mais que esteja errada
Ninguém quer a morte
Só saúde e sorte

Um dos melhores frutos do filme de Breno Silveira é este: trazer à tona não apenas as canções de Luiz Gonzaga, artista que imortalizou o Nordeste em composições antológicas como “Asa Branca”, “Respeita Januário” e “Que Nem Jiló”, mas especialmente do seu filho. Um cantor e compositor que morreu precocemente, aos 45 anos de idade, em um acidente automobilístico. Tempo suficiente, de qualquer modo, para ter deixado como legado uma obra repleta de sucessos, embora não tenha recebido o correspondente reconhecimento da crítica.

Em maio de 2001, a Folha de S. Paulo perguntou a 214 músicos, críticos e personalidades da cena cultural qual é a melhor música brasileira de todos os tempos. A vencedora da enquete foi “Águas de Março”, de Tom Jobim. “Asa Branca”, de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, ficou com o honroso 7º lugar. Os votantes citaram dezenas de compositores, sendo que Tom Jobim (com 110 votos), Chico Buarque, Vinicius de Moraes, Caetano Veloso, Jorge Ben, Erasmo Carlos, Roberto Carlos, Gilberto Gil, Noel Rosa e Ary Barroso foram os dez mais lembrados. Luiz Gonzaga recebeu 13 votos. Gonzaguinha, apenas um.

Nenhuma composição de Gonzaguinha foi citada na lista de 100 Canções Essenciais da Música Popular Brasileira publicada pela revista Bravo! em 2008, enquanto duas músicas do Gonzaga pai foram lembrada: “Asa Branca” (em 8º lugar) e “Assum Preto” (na 44ª colocação). No ranking das 100 Maiores Músicas Brasileiras, organizado pela Rolling Stone Brasil em outubro de 2009, o compositor de “Explode Coração” e “Começaria Tudo Outra Vez” foi novamente esquecido (enquanto “Asa Branca” ficou na 4ª posição, consolidando sua inclusão no cânone musical brasileiro).

Torço para que a cinebiografia de Gonzaga e Gonzaguinha faça com que o autor de “Grito de Alerta”, “Espere por Mim, Morena” e “É”, que nos anos 70 teve a impressionante marca de 54 composições censuradas pela ditadura militar, ganhe, enfim, o justo reconhecimento de seu talento, que superou as inevitáveis comparações feitas com a obra de seu pai, ganhando luz própria na história da MPB.

P.S.: As imagens deste post foram extraídas do excelente site dedicado à vida e obra de Gonzaguinha, mantido por Paulo Vanderley e Walmar Pessoa.

Pense Nisso!
Alexandre Inagaki

Alexandre Inagaki é jornalista, consultor de projetos de comunicação digital, japaraguaio, cínico cênico, poeta bissexto, air drummer, fã de Cortázar, Cabral, Mizoguchi, Gaiman e Hitchcock, torcedor do Guarani Futebol Clube, leonino e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos, não necessariamente nesta ordem.

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Comentários do Blog

  • Hélio Santa Rosa Costa Silva

    Concordo com vc Inagaki, Gonzaguinha é um dos melhores da MPB, as suas letras são de uma profundidade e autencidade como poucos. Lamentável é o fato dele ser ainda tão pouco conhecido no cenário nacional da nossa vasta MPB. A questã permeia também identificação com a música, como suas letras fazem muito protesto, daí a nossa sociedade Infelizmente, não se identificar com estas..
    Saudações,
    Hélio.

  • Thyago Costa Santos

    Parabéns pelo artigo!

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  • Odnir dos Anjos

    Se fosse para escolher os 10 melhores sambas de todos os tempos  música “É “ de Gonzaguinha iria ficar entre elas com certeza: que samba magnífico.

  • Jaynne

    Boa tarde…
    Passo aqui neste espaço para divulgar um novo blog:

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    Obrigada pela atenção,
    Beijos.
    Jaynne Santos.

    NÃO É VÍRUS E VALE APENA CONFERIR!

  • http://twitter.com/claudiorubio Cláudio Rúbio

    oi, Inagaki! creio que a distância com que a crítica e parte dos formadores de opinião mantêm da música de Gonzaguinha deva-se, em boa parte, à distância que sempre mantiveram do próprio Gonzaguinha - distância que ele, por seu lado, também não se importou em diminuir.

    ele sempre apareceu - mostrou-se ou foi mostrado - como um cara esquisito.

    lembro-me de que, para mim, não foi nada fácil gostar do trabalho dele, nem da figura dele. eu não o entendia, e o entendia ainda menos quanto mais o via em cena.

    isso só foi mudar, em mim, muito lá na frente, quando ouvi Lindo Lago do Amor. era outro Gonzaguinha, mudou absolutamente tudo em minha cabeça. foi a chave para que eu ouvisse diferente tudo o que era dele e eu havia ouvido antes.

    depois de Lindo Lago do Amor, de repente, senti enorme simpatia por aquele poeta, aquele músico, aquela voz, aquele brasileiro, e o reli, reouvi, repensei. a ele e a todas as canções que havia feito antes. e gostei de tudo.

    sei lá se por castigo, quando eu comecei a gostar - e muito - daquele Gonzaguinha, ele foi embora, num susto. foi como se dissesse pra mim: não quero esse sucesso, você ainda não me entendeu.

    assim é o Gonzaguinha pra mim, Alexandre. uma arte e um artista para além do reconhecimento: para a descoberta.

    aquele abraço, senhor!

    • http://www.pensarenlouquece.com/ Alexandre Inagaki

      Cláudio, estava lendo a reportagem de capa da revista Veja que é citada no filme (publicada em 26 de setembro de 1979). 

      Eis um trecho da matéria: “Apesar de não ter alcançado toda a fama de seu pai, construiu um trabalho em torno do qual gira uma quase unanimidade: daqui para a frente, ele estará ocupando um lugar na música brasileira moderna onde só mesmo Chico Buarque e Milton Nascimento já se instalaram. Luiz Gonzaga Júnior é, com toda a certeza, o mais brilhante compositor saído da geração dos festivais universitários. Ele tem tanto o domínio fácil da linguagem quanto a sensibilidade para passar suas próprias experiências a um estado geral, além de uma musicalidade extremamente pessoal.”

      No fim, a profecia da matéria acabou não se concretizando, e a obra de Gonzaguinha sequer obteve o reconhecimento destinado ao Gonzaga pai. Mas, como você bem pontuou, ele é um artista para além do reconhecimento. :) Um abraço!

  • Cintia

    Pois é Alexandre,

    É uma grande injustiça com um cara que escreveu o que, para mim, é um hino brasileiro paralelo (o que é o que é). Eu nao imaginava que pudessem esquecê-lo dessa forma, acho qté intrigante, pois as músicas dele nao sao esquecidas. Entender a relaçao do público com a arte é mesmo tarefa pra lá de complicada e pode render boas e longas discussoes sobre os motivos desse esquecimento (até que ponto é carisma pessoal, ou talvez seja a audiência dele mais fragmentada/menos fiel que a do pai?)…
    O bom é ver iniciativas como a desse filme, que buscou mostrar a relaçao entre pai e filho com uma sensibilidade ímpar, bom é ver que existem páginas dedicadas a resgatar a memória desse grande artista, e principalmente, ver aqui no seu blog um texto sobre ele trazendo à tona essa injustiça. Com a marca registrada de quem serve bem, para servir sempre, você escreveu mais um texto cativante.
    Beijabraço,
    Cíntia

    • http://www.pensarenlouquece.com/ Alexandre Inagaki

      Cintia, tenho a tese de que houve um esquecimento geral dos compositores que se destacaram nos anos 70, uma geração que além do Gonzaguinha inclui nomes do naipe de Belchior (que até rendeu uma série bizarra de reportagens no Fantástico sobre seu suposto desaparecimento), Taiguara (mais um que morreu precocemente), Walter Franco e Guilherme Arantes. Não sei apontar quais os motivos para isso. No caso específico do Gonzaguinha, fico mais intrigado com esse fenômeno, uma vez que suas canções permanecem no imaginário coletivo brasileiro (recentemente, inclusive, a Adriana Calcanhoto gravou uma versão muito bacana de “Lindo Lago do Amor”). Espero que o filme ajude a mudar esse estado de coisas. :)

      • http://twitter.com/claudiorubio Cláudio Rúbio

        Inagaki, com licença, posso? o que vejo em comum entre esses cinco artistas é a aversão que tinham - tiveram ou pareceram ter - à idolatria mutiladora, que mistura e tenta confundir arte e artista. manifestavam-se contrários à vulgarização do que faziam e avessos à confusão entre as canções e os compositores. mesmo o popularíssimo Guilherme Arantes não permitia facilmente regravações de outros, não as autorizava. apesar de artistas populares, demonstravam comportamentos que, se aos populares parecia elitista, à elite parecia popular, e aos jornalistas, comentaristas e divulgadores desagradavam. viam - ou fizeram parecer que vissem - o sucesso como algo que nada lhes acrescentava - e isso passava, passou, muitas vezes, um certo ar esnobe. creio que tenha sido por aí que saíram da cena tão facilmente, sobretudo depois que o Chacrinha deixou o Brasil. abraços.

        • Eliel

          Cláudio, estou impressionado com sua leitura do tema. Poderiam te dar um espaço aqui para que você escrevesse suas impressões sobre nosso moleque Gonzaga Jr. Como admirador da obra dele, digo que você foi brilhante! Parabéns!

Pense Nisso! Alexandre Inagaki

Alexandre Inagaki é jornalista e consultor de comunicação em mídias digitais. É japaraguaio, cínico cênico. torcedor do Guarani Futebol Clube e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos. Já plantou semente de feijão em algodão, criou um tamagotchi (que acabou morrendo de fome) e mantém este blog. Luta para ser considerado mais do que um rosto bonitinho e não leva a sério pessoas que falam de si mesmas na terceira pessoa.

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