O lugar dos homens-seta é no museu de grandes novidades (publieditorial)

Por Alexandre Inagakisegunda-feira, 17 de junho de 2013

A época de profissões como datilógrafo, amolador de facas e técnicos de telex já passou, junto com expressões como “vacinado com agulha de vitrola”, “queimar o filme” ou “caiu a ficha”, que daqui a alguns anos precisarão de notas de rodapé pra serem compreendidas. E o fato é que essas profissões e expressões surgiram em tempos nos quais pessoas assistiam TV sem poder compartilhar suas impressões em tempo real no Twitter, casamentos gays e interraciais eram inimagináveis de se assumir em público, telefones eram aparelhos que só serviam para conversar e a gente precisava esperar meses até conseguir ouvir as novas músicas de uma banda inglesa ou japonesa.

O mundo mudou, a sociedade mudou, as famílias mudaram. O mercado imobiliário, porém, parece ter parado numa época em que home-office era coisa de livro de ficção científica ou eufemismo para a condição de um desempregado. E basta folhear qualquer revista de arquitetura e decoração para encontrar matérias que falam em como reformar sua casa para que ela se torne mais adequada ao seu estilo de vida, ou como aproveitar melhor o espaço de um imóvel minúsculo, com espaços estanques e padronizados. Os empreendimentos imobiliários que são oferecidos pelo mercado podiam satisfazer as necessidades de nossos avós, mas já não respondem aos anseios de uma geração que é empreendedora, expressa suas ideias e pensamentos na internet e não se satisfazem com produtos e soluções padronizadas, incapazes de refletir as diversidades de cada indivíduo.

São mensagens,/ Letras falantes,/ Gritos visuais,/ Ordens de uso, abuso, reincidências./ Costume, hábito, permência,/ Indispensabilidade, /E fazem de mim homem-anúncio itinerante,/ Escravo da matéria anunciada.

Ainda é comum, ao percorrer as ruas de uma cidade, se deparar com jovens que passam horas em pé, seja sob sol, chuva ou frio, trabalhando inclusive em fins de semana e feriados, segurando setas que indicam as direções de empreendimentos imobiliários à venda. Subempregos que trazem à lembrança os versos de “Eu Etiqueta”, poema de Carlos Drummond de Andrade, sobre a “coisificação” de pessoas trabalhando como dublês de postes.

Em nota recente, a MaxHaus anunciou que não usará mais homens-seta ou homens-placa para indicar onde estão seus endereços. Segue um trecho do manifesto: “Francamente, não cabe o discurso do emprego para justificar um trabalho no mínimo desumano, especialmente num país com escassez de mão de obra em setores produtivos. Se isto fizesse sentido, quem sabe caminharíamos para que todas as lâmpadas públicas fossem também portadas por seres humanos. Para as pessoas desta época, existem maneiras muito mais rápidas e inteligentes de se achar um imóvel.”

Nada mais coerente. Na época em que vivemos, a “profissão” de homem-seta há muito tempo já deveria estar fazendo companhia a máquinas de escrever, disquetes, yuppies, enciclopédias impressas, cursos de Wordstar, Lotus 123 e dBase, lambada, cabelos mullet e outros itens, coisas e comportamentos que viraram peças empoeiradas de museu. Afinal, vivemos uma época de mudança de conceitos, rompimento de paredes e de paradigmas, misturas de gêneros e aceitação de diferenças. E temos a grande sorte de sermos testemunhas e protagonistas destes novos tempos.

Pense Nisso!
Alexandre Inagaki

Alexandre Inagaki é jornalista, consultor de projetos de comunicação digital, japaraguaio, cínico cênico, poeta bissexto, air drummer, fã de Cortázar, Cabral, Mizoguchi, Gaiman e Hitchcock, torcedor do Guarani Futebol Clube, leonino e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos, não necessariamente nesta ordem.

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Pense Nisso! Alexandre Inagaki

Alexandre Inagaki é jornalista e consultor de comunicação em mídias digitais. É japaraguaio, cínico cênico. torcedor do Guarani Futebol Clube e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos. Já plantou semente de feijão em algodão, criou um tamagotchi (que acabou morrendo de fome) e mantém este blog. Luta para ser considerado mais do que um rosto bonitinho e não leva a sério pessoas que falam de si mesmas na terceira pessoa.

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