Entrevista com Stefen Fangmeier, diretor de Eragon
Por Alexandre Inagaki ≈ quarta-feira, 24 de janeiro de 2007
Graças à Fox Filmes e, em especial, à senhorita Renata Pimentel, tive a oportunidade de fazer algumas perguntas a Stefen Fangmeier, diretor de Eragon, filme que descrevi na resenha que fiz para a Rolling Stone como um mashup razoavelmente bem remixado e remasterizado de diversas histórias conhecidas (em particular, de O Senhor dos Anéis), fazendo jus ao preceito lavoisieriano de Hollywood: nada se cria, tudo se refilma. A entrevista deixa claro que Fangmeier é um cineasta de estúdio. Quando perguntei se não estava em seus planos dirigir filmes que prescindam de efeitos especiais, ele afirmou: “primeiro terei que me estabelecer como um diretor de sucesso“. Ou seja, nem lhe passou pela cabeça a hipótese de desenvolver um projeto independente, fora do abrigo (e das exigências comerciais) de um grande estúdio.
Independentemente de seus eventuais méritos artísticos, é interessante saber o que se passa na cabeça de um cineasta que, anteriormente indicado três vezes ao Oscar por ter integrado as equipes de efeitos especiais dos filmes Twister (1996), Mar em Fúria (2000) e Mestre dos Mares - O Lado Mais Distante do Mundo (2004), aventurou-se pela primeira vez na direção em um filme que já faturou mais de US$ 226 milhões nas bilheterias do mundo inteiro. Enjoy it!
Logo em sua estréia como diretor, você assumiu um filme com orçamento de US$ 100 milhões, que está sendo encarado pelo estúdio como possível prelúdio de uma nova franquia. Como foi lidar com tamanha pressão?
Evidentemente, havia muita pressão para que eu entregasse um filme extremamente excitante, que fosse capaz de atingir um público muito grande e que se tornasse um sucesso comercial. Isso também exigiu um alto grau de envolvimento de todas as pessoas envolvidas na produção. Não pude, pois, tomar decisões realmente significativas sozinho. Algo que eu até já esperava, mas não no nível em que aconteceu. Tentei ser muito colaborativo com essas pessoas do estúdio e sempre procurei ver o lado positivo do seu envolvimento. Ver que, na verdade, eles estavam dividindo comigo a responsabilidade de produzir um filme tão grandioso logo na minha estréia. Afinal das contas, eu sou o diretor e a maior parte do público pensa que sou responsável por todos os detalhes do que eles assistem. Embora esta seja a percepção geral do processo de fazer um filme, certamente não é a realidade em grandes produções na indústria de Hollywood. A não ser, é claro, que você seja Steven Spielberg ou George Lucas.
Você foi diretor de segunda unidade de Heróis Fora de Órbita, filme que satirizava o universo dos fanáticos por Star Trek. Agora que você foi o responsável pela adaptação de um best-seller que arrebatou uma legião de fãs radicais, como foi a experiência? Foi complicado lidar com as reclamações daqueles que se queixaram das mudanças do livro para o filme?
Logo que comecei a trabalhar no roteiro de Eragon com uma equipe de escritores, eu já imaginava que alguns fãs do livro não iriam ficar satisfeitos com as mudanças que estávamos fazendo. Mas não há como agradar a todos. Adaptar um livro tão denso para o cinema significa, necessariamente, ter que deixar de fora alguns elementos que não nos pareciam ser tão essenciais, reestruturando partes da trama. Como nesse caso também houve muita participação do estúdio, não sinto que esta seria a minha adaptação própria. Mesmo que os fãs queiram culpar o diretor pelo que não ficou tão bom, em seus julgamentos.
O uso dos efeitos especiais no cinema contemporâneo não está sendo supervalorizado? Na sua condição de expert em efeitos visuais, com várias indicações ao Oscar no currículo, você não pensa em um dia dirigir um filme que prescinda de efeitos do tipo?
Efeitos especiais são apenas uma ferramenta para o cineasta – algo que certamente pode criar uma série de elementos muito interessantes para se utilizar quando contamos uma história. No entanto, creio que alguns filmes apelam demais para os efeitos especiais e deixam a história num plano secundário em relação ao espetáculo e à ação.
Sim, eu tenho muito interesse de dirigir um filme que não precise de efeitos especiais, embora creia que seja difícil convencer um estúdio a me escolher para dirigir um roteiro assim neste estágio da minha carreira. Por isso, primeiro terei que me estabelecer como um diretor de sucesso (e, para isso, é preciso mais que apenas um filme), para depois poder me envolver em projetos diferentes dos filmes pelos quais sou conhecido agora.
Quais são seus cineastas prediletos?
Sou muito eclético com relação a cinema, arte e música. Mas sempre identifico imediatamente quando gosto ou não de alguma coisa. Por isso, acho mais fácil listar os meus filmes prediletos, como Blade Runner, Chinatown, Lawrence da Arábia, O Samurai, Beleza Americana e Gallipoli. Mas há muitos outros, até de outros estilos, como comédia. A maior parte dos cineastas faz filmes muito diferentes ao longo da sua carreira. Às vezes gosto de vários trabalhos de um diretor na seqüência, às vezes não. Então, prefiro fazer uma lista de filmes favoritos do que de diretores.
Qual foi o filme que você assistiu e fez você pensar: “um dia quero trabalhar com cinema”?
Não houve um filme específico que me fez pensar isso. Comecei a gostar de ver filmes com vinte e poucos anos, em Los Angeles. Mas naquela época eu estudava computação e nunca imaginei que ia acabar trabalhando com cinema. O desejo de dirigir apareceu gradualmente, devido à minha experiência como supervisor de efeitos especiais nos sets de filmagem, e também pela relação muito próxima que construí com os diretores com quem trabalhava.
Já existe algum contrato acertado para a adaptação de Eldest, o segundo volume da trilogia escrita por Christopher Paolini? Está em seus planos dirigi-la?
Até onde eu sei, ainda não existe um contrato para os próximos dois livros da trilogia. Particularmente, estou muito curioso para saber como a história é resolvida no terceiro livro – eu teria que lê-lo antes de tomar qualquer decisão. E eu sugeriria que os filmes 2 e 3 fossem filmados juntos, pois saber como é que toda essa história acaba é que é, na verdade, o ponto de partida de todo o processo.
Sob seu ponto de vista, quais são as principais diferenças entre Eragon e produções anteriores com as quais seu filme tem sido inevitavelmente comparado, como O Senhor dos Anéis, Harry Potter e Guerra nas Estrelas?
Com relação à história, Eragon é mais próximo do primeiro filme de Guerra nas Estrelas. É certamente mais focado em um personagem único do que O Senhor dos Anéis, que tem tantas camadas de histórias e personagens que às vezes fica até difícil de acompanhar. Harry Potter me parece ser um personagem muito episódico. Não é sempre clara a maneira como ele mudou do início até o final de um filme, qual foi o seu arco na história. Saphira se destaca mais obviamente como um elemento bastante único de Eragon…
Mesmo assim, acho que é praticamente impossível criar algo que é completamente novo em termos de pura narrativa. Sinto que cineastas conseguem dar uma roupagem para histórias e idéias para dar a elas um ar novo e atraente, mas, essencialmente, todas elas já foram contadas e continuarão sendo contadas novamente. Eu fiquei pessoalmente atraído pelo tema básico de Eragon, sobre o destino de alguém e como essa pessoa deve sofrer uma transformação, porque é isso que a vida está exigindo dela.
Como foi conviver em um set com diversos atores premiados ou indicados ao Oscar, como Jeremy Irons, John Malkovich, Djimon Hounsou e Rachel Weisz? Eles o ajudaram nesta sua primeira experiência como diretor de que maneira?
Bem, em primeiro lugar, eles confiaram em mim quando aceitaram estrelar o filme mesmo sabendo que eu era um diretor iniciante. Já tive convivência com muitos atores conhecidos (Tom Hanks, George Clooney, Mel Gibson, etc) nos sets de vários filmes que eu trabalhei, então eu sabia que a maioria desses artistas é muito profissional e eles só esperam ser tratados com o mesmo profissionalismo e respeito por todo mundo no set. Também me empenhei em ouvir suas contribuições, em perceber quando eles queriam fazer algo de um jeito diferente e em guiar mais do que controlar. No final, foi uma experiência muito positiva.
Com qual astro ou estrela você gostaria de trabalhar, e por quê?
É difícil responder essa pergunta. Existem tantos atores bons. Adorei trabalhar com o elenco de Eragon e espero poder repetir essa experiência. Há tantos artistas que gosto de ver em filmes, mas minha relação com eles é muito ligada ao papel que interpretam, ao personagem, embora haja alguns que eu admiro em quase todos os papéis, como Ed Harris e Cate Blanchett. Também aprecio muito o trabalho de Ian McShane na série Deadwood, da HBO – li recentemente um roteiro que seria perfeito para ele. Acho excitante pensar como um ator seria ideal para aquele papel específico.
Se um estúdio lhe desse carta branca para você desenvolver o projeto que quiser, qual o livro que você desejaria adaptar?
Existem muitos livros que eu gostaria de adaptar. No topo da lista, está Bangkok 8 de John Burdett – um suspense que se passa na Tailândia. Depois, vem The Diamond Age, de Neil Stephenson, uma ficção científica bem inspirada. Leio muito e compro mais livros do que consigo ler. Ficou muito mais excitante para mim entrar nas livrarias agora e ficar pensando que livro daria um grande filme – uma perspectiva que eu não tinha antes de me tornar um diretor.
P.S. 1: Sergio Fonseca e Cynthia Feitosa escreveram posts que me fizeram lembrar daquele verso clássico de Gilberto Gil: “Porque mistério sempre há de pintar por aí“.
P.S. 2: Já está no ar o “superblog” que a Motorola criou para a São Paulo Fashion Week, e que eu havia citado neste post: é o Moto-à-Porter. Mas devo confessar que estou mais curioso em acompanhar a cobertura da SPFW que será feita por um outro blog, o SP Machion Week, a cargo de Wagner Martins, o senhor Cocadaboa.
P.S. 3: Saíram os indicados ao Oscar 2007. Meus palpites sobre quem levará a estatueta, respectivamente, nas categorias de melhor filme, diretor, ator e atriz são: Babel, Martin Scorsese, Forest Whitaker e Helen Mirren. Eu torcerei por: Cartas de Iwo Jima, Martin Scorsese (embora o prêmio seja mais merecido pelo conjunto de sua obra do que por Os Infiltrados), Leonardo Di Caprio (excepcional tanto em Diamante de Sangue, filme pelo qual foi indicado, como em Os Infiltrados) e Kate Winslet (que, além de ser talentosíssima, merece figurar em qualquer lista que possam fazer de “mulher pra casar, andar na rua de mãos dadas e braços balançando e apresentar aos amigos a fim de se exibir”).
Alexandre Inagaki
Alexandre Inagaki é jornalista, consultor de projetos de comunicação digital, japaraguaio, cínico cênico, poeta bissexto, air drummer, fã de Cortázar, Cabral, Mizoguchi, Gaiman e Hitchcock, torcedor do Guarani Futebol Clube, leonino e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos, não necessariamente nesta ordem.
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