Artigos da categoria: Relacionamentos
A vida às vezes cansa, principalmente quando você mora em uma cidade que é uma máquina de fazer estressados, como é São Paulo. Paulistanos parecem estar sempre com pressa, vivem correndo como se estivessem fugindo de algo, afobados feito o coelhinho da Alice no País das Maravilhas. Não é possível manter esse ritmo ad eternum, e é por isso que às vezes sou obrigado a recorrer ao ópio cinematográfico. Nada como entrar em uma sala de projeção, apertar a tecla pause do meu cérebro e esquecer deste mundo louco por algumas horas, imergindo em filmes que a gente assiste como quem come Chokito, no maior dos descompromissos.
Poucas coisas são mais eficazes na arte de anestesiar as neuras da vida moderna do que os filmes de Hollywood. Não à toa, o cinema norte-americano está cumprindo a ameaça de Pinky & Cérebro, de dominar o mundo. Porém, não pretendo discutir agora os méritos artísticos dos blockbusters da Gringoland. Quero, apenas, compartilhar com vocês a minha tese: filmes hollywoodianos apostam no que eu chamo de Teoria Maquiavélica do Amor.
Recordemos filmes como Duro de Matar, Velocidade Máxima, O Vingador do Futuro, Inferno na Torre, A Múmia: carros batem, prédios explodem, pessoas morrem, toda uma gama de desgraças perpassa nossos sentidos em aproximadamente duas horas, e tudo isso para quê? Para que o filme acabe em um beijo apaixonado. Ou seja, o fim (no caso, o happy end amoroso) justifica os meios. Como se os roteiristas piscassem os olhos para a gente, nas entrelinhas, afirmando que toda sorte de desgraças humanas e materiais exibidos na tela grande se justifica em nome do tal do Amor. Porque nós, incautos espectadores, precisamos de um justo quinhão de diversão lobotomizante, coroada, invariavelmente, com a cereja de um beijo enamorado no final.
E assim, todos vivem felizes para sempre. Bem, ao menos até que seja rodada a próxima continuação.
Na vida real Lois Lane teria morrido soterrada, assim como Trinity jamais regressaria a Zion. Ou não. Afinal de contas, vai saber. O tal do Amor não deixa de ser uma loteria; de repente é possível acertarmos os números da Mega Sena, por que não? E, do alto da mais improvável das improbabilidades, em meio ao dilúvio de bilhões de pessoas perdidas neste mundo vasto mundo, não é possível encontrar alguém que ature nossas idiossincrasias, tiques irritantes ou pneuzinhos na cintura e que ame a gente assim mesmo, mesmo que não tenhamos os músculos de um Russell Crowe ou as curvas de uma Charlize Theron? Este mundo, felizmente, é maluco e cheio de possibilidades.
Nunca me envolvi com uma mulher que conheci em uma balada. Mas o motivo não é preconceito, muito pelo contrário. Meu problema é outro: absoluta falta de cara de pau para fazer aquele approach clássico, de abordar uma garota do nada e proferir uma cantada qualquer. E, ainda que conseguisse envolver alguma incauta, como conseguir trocar um mínimo de idéias qualquer na balbúrdia de uma pista de dança ou no zunzunzum de um bar com música ao vivo? Particularmente, prefiro trocar palavras com mulheres que estejam razoavelmente lúcidas e minimamente interessadas em entabular uma conversa agradável.
Mas o fato é que, já ciente da minha absoluta falta de xaveco, limito-me a ficar em meu canto, bebericando alguma coisa, ensaiando alguns passos desajeitados de dança e, principalmente, olhando as pessoas. Porque uma das ocasiões mais propícias para se conhecer o comportamento humano é observar como homens e mulheres agem durante uma festa, front estratégico de embate entre os sexos.
Estávamos, eu e meu amigo Ricardo, descansando após horas de desabalada dança, às duas da madrugada da festa de aniversário de uma amiga nossa, quando começamos a contemplar as estratégias de sedução de nossos incautos colegas de sexo e, principalmente, os seguidos furos n’água cometidos por eles. Nosso primeiro alvo de risos foi uma dupla que insistia em assediar seguidamente todas as garotas do ambiente, com cantadas do tipo “você é um anjo que caiu do céu“. Começavam pelas mais bonitas, e iam descendo o nível de exigência estética a cada investida fracassada que faziam, sem perceber que carbonizavam cada vez mais seu filme entre as mulheres da festa. Como homens são burros, meu Deus. Continue Lendo
Hoje não quero mais pensar, e imagino como seria bom estar na pele daqueles hare krishnas que passam o dia inteiro entoando aqueles mantras hipnóticos, hare hare hare hare, esvaziando a cabeça de qualquer manifestação supérflua dos neurônios, esses bichos amaldiçoados que jogam squash na quadra do meu crânio. Ah, que inveja dos cachorros que sorriem como naquela canção do Roberto, arfando com a língua de fora, despreocupados feito velhos hippies emaconhados, pedindo migalhas de brownie em troca de carinho ilimitado, sem aquelas cobranças exasperantes, “você me ama?”, “você me ama?”, maldito mantra dos amantes inseguros. Elos de ligação, chuvas molhadas, monopólios exclusivos, amantes inseguros, minha mente enfileira uma série de redundâncias pleonasticamente repetitivas, e eu sei que tudo não passa de subterfúgio barato para driblar essa saudade que me come por dentro feito um Alien recém-nascido. Mas eu só sei que nada sei, baby.
O café já esfriou, a piada perdeu a graça e as batatas fritas murcharam. A noite está tão quieta que chego a ouvir o ponteiro dos segundos se arrastando no relógio. Ligo a tevê para abafar o barulho do silêncio, recordando com saudade dos tempos em que assistia a comerciais de facas Ginsu e meias Vivarina, nada poderia ser mais eficaz para desligar as tomadas da minha cabeça, bastava sentar na poltrona, relaxar e acionar o screen saver do meu cérebro. Mas agora está passando um filme do Truffaut, e o que menos quero é pensar no delírio consciente da paixão. Continue Lendo
Nós sempre teremos Paris.
Enquanto caminhávamos pelas ruas de Botafogo, conversando sobre a vida e seus estranhos desígnios, o filósofo de boteco Fábio Costello cunhou, sem querer querendo, o seguinte aforismo: “um homem amedrontado é incapaz de amar“. Seria esta a explicação para a minha fase atual, na qual penso em comédias românticas como ficções científicas que se passam em mundos vagamente inspirados em fatos reais? Não sei, mesmo porque ando numa fase na qual minhas certezas vêm se dissipando paulatinamente, enquanto meus pés tropeçam em poças de estrelas.
Hoje de manhã recebi a notícia de que uma ex minha vai se casar. Quase que inconscientemente, meus pés começaram a bailar um tango argentino.
Afirma Joel Barish em um dos melhores filmes dos últimos anos: “O Dia dos Namorados é uma data inventada pelos fabricantes de cartões comemorativos para fazer as pessoas se sentirem como lixo“. Não concordo totalmente com essa frase. De qualquer modo, aproveito o mote do dia 12 de junho para prestar um pequeno tributo a esta obra-prima concebida pela dupla Michel Gondry e Charlie Kaufman. Como bem escreveu Bernardo Krivochein, é um filme sem o qual sua vida terá sido uma experiência incompleta.
Haja o que houver, encontre-me em Montauk.
Assim, pelos olhos, o amor atinge o coração:
Pois os olhos são os espiões do coração.
E vão investigando
O que agradaria a este possuir.
E quando entram em pleno acordo
E, firmes, os três em um só se harmonizam,
Nesse instante nasce o amor perfeito, nasce
Daquilo que os olhos tornaram bem-vindo ao coração.
(poema de Guiraut de Borneilh citado no livro "O Poder do Mito", de Joseph Campbell e Bill Moyers)
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Uma pessoa racional, frente ao desafio da edificação de um labirinto, cartesianamente chegará à conclusão de que ele deverá ser construído de dentro para fora. Caso contrário, o arquiteto correrá o sério risco de se ver perdido dentro de sua própria criação.
Pois bem, o que faz o tal do amor? Contraria todas as regras mais básicas, inclusive essa.
Amar é construir um labirinto de fora para dentro. Continue Lendo
À guisa de introdução: o texto a seguir foi criado a seis mãos, por Renata Parpolov, Ian Black e este que vos escreve, e publicado originalmente na edição 004 do Spam Zine. O texto, descompromissado feito uma boa conversa numa mesa online de bar, aguarda por novos pitacos no espaço destinado aos comentários. =)
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Inagaki: Ainda bem que depois que cresci deixei de alimentar meu coração com a pobre dieta das paixões platônicas, que só têm graça para filósofos gregos e adolescentes cheios de espinhas e dúvidas existenciais.
Parpolov: Que nada, Inagaki, amor platônico é muito legal! Tem amor que sem dúvida é pra ser vivido, sentido, com todas as suas bocas, beijos, e fluidos. Mas tem amor que você sabe que não é pra você, mas mesmo assim insiste em sentir. Amores que você só fica pensando na pessoa, imaginando como será que ela beijaria, ou faria sexo. E, claro, você imagina que a pessoa é perfeita, absurdamente perfeita em tudo, e que saberá te agradar da maneira mais detalhista que você jamais imaginou. Continue Lendo
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