Bloguinho e a questão dos créditos em HQs
Por Alexandre Inagaki ≈ sábado, 10 de dezembro de 2005
Chegou recentemente às bancas a edição nº 221 da revista “Cebolinha”, que traz na capa o anúncio de um novo personagem da Turma da Mônica: Bloguinho, personagem que se comunica com os outros através do “internetês”, aquele dialeto da língua portuguesa recheado de expressões como blz, chat, emoticon e a indefectível risada usada por nove entre dez internautas adolescentes, KKKKKKKKKKK. Uma das intenções dos estúdios Maurício de Sousa com a criação de Bloguinho é utilizar a interface dos quadrinhos para “traduzir” aos leitores a peculiar linguagem usada em chats de Messenger, blogs e fotologs de adolescentes. Admito que necessito de ajuda, afinal de contas como é que existem pessoas capazes de IxCrEvEr kOiZaX dExXe DjEiTuM?
O press-release enviado a respeito do personagem fornece uma estatística estarrecedora: cerca de 7 milhões de usuários já são fluentes nesse tal de “internetês”, esse tal linguajar crivado de expressões como “vc quer tc?“, “sua fotinha tah d++++, mtoooo xow, me adiciona no msn!!!“, ou “lôko o seu blog, naum ker trocar links?“.
* * * * *
Deixando discussões linguísticas de lado, tenho a sólida impressão de que uma das próximas HQs de Bloguinho introduzirá seus leitores para o mundo do Orkut. Afirmo isso pautado no fato de que boa parte dos roteiristas (senão todos) dos quadrinhos de Maurício de Sousa participa ativamente do Orkut, em comunidades como o da própria Turma da Mônica, através da qual descobri quem escreveu a história de estréia do Bloguinho: Flávio Teixeira (que, diga-se de passagem, é responsável pelas melhores sátiras a filmes publicadas nas revistas do Maurício).
A questão da atribuição dos créditos de autoria nas histórias em quadrinhos é um tema historicamente delicado. Durante décadas grandes estúdios como os de Walt Disney jamais se preocuparam em informar aos leitores de suas revistas os nomes dos verdadeiros responsáveis pelas histórias publicadas. Como consequência dessa política, artistas como o genial Carl Barks, criador de personagens como Tio Patinhas e Professor Pardal, tardaram a receber o devido reconhecimento. Barks, por exemplo, apesar de ter roteirizado e desenhados inúmeros clássicos dos quadrinhos para a Disney entre 1942 e 1967, só veio a ter a sua importância reconhecida início dos anos 70, e isso graças aos esforços de fãs que lhe enviavam correspondências em busca de informações sobre seu trabalho. Só recentemente as revistas Disney passaram a trazer informações sobre os nomes de roteirista e desenhistas responsáveis por cada HQ.
A princípio os estúdios Mauricio de Sousa não pensam em adotar a mesma prática. Ao ser questionado sobre o assunto pelo site Universo HQ, o pai da Mônica afirmou: “Eu não farei isso e posso dar uma razão muito simples: copyright. Um artista tendo seu nome na frente de um personagem pode, mais tarde, reclamar algum tipo de direitos sobre ele. Claro que perderá na justiça, mas é algo que não há necessidade no meu pessoal. Assim, nas minhas revistas isso não acontecerá“. Durante o lançamento do desenho animado “Cine Gibi, o Filme”, Mauricio elencou outro motivo para a ausência de créditos: cultivar um sentimento de equipe entre todos e não criar vaidades.
Com todo respeito ao talento de Mauricio de Sousa, cujas criações levaram várias gerações de jovens a adquirirem o gosto pela leitura, não creio que suas razões citadas para não creditar roteiristas, desenhistas, arte-finalistas e letristas dos seus gibis sejam plenamente convincentes. Mais: graças ao advento do Orkut, eu e centenas de leitores das revistas da turma da Mônica estamos descobrindo os nomes de roteiristas como Paulo Back, Gerson Teixeira, Emerson Abreu e o já citado Flávio Teixeira, assim como quem escreveu o quê. Perguntar não ofende: será que os estúdios Mauricio de Sousa tomarão alguma providência a respeito do assunto, a partir das revelações obtidas através do Orkut?
(texto publicado originalmente em 12 de dezembro de 2004.)
Alexandre Inagaki
Alexandre Inagaki é jornalista, consultor de projetos de comunicação digital, japaraguaio, cínico cênico, poeta bissexto, air drummer, fã de Cortázar, Cabral, Mizoguchi, Gaiman e Hitchcock, torcedor do Guarani Futebol Clube, leonino e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos, não necessariamente nesta ordem.
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