Todos os artigos de Alexandre Inagaki
Pense Nisso!
Alexandre Inagaki é jornalista, consultor de projetos de comunicação digital, japaraguaio, cínico cênico, poeta bissexto, air drummer, fã de Cortázar, Cabral, Mizoguchi, Gaiman e Hitchcock, torcedor do Guarani Futebol Clube, leonino e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos, não necessariamente nesta ordem.
Como diria Fausto Silva, o rei dos chavões: ô loco, meu! Afinal de contas, mais do que nunca é preciso louvar estes monstros sagrados da blogosfera brasileira, respeitados por todo o meio por suas sátiras aos clichês que assolam a língua portuguesa. E que nesta próxima segunda-feira, dia 22, estarão lançando o livro do Homem Chavão na Livraria Cultura do shopping Villa Lobos, em São Paulo (afinal de contas, quem sabe faz ao vivo). Clique aqui, pois, para visualizar o convite oficial do lançamento, desde já agradecendo a sua audiência e a sua paciência! Continue Lendo
Deus é justo, aconteceu no meu programa!!!
(GILBERTO BARROS, apresentador do programa “Boa Noite, Brasil”, incapaz de disfarçar sua alegria quando uma mulher sofreu um ataque cardíaco na platéia justamente no dia em que seu programa explorava o caso da morte do jogador Serginho do São Caetano.)
Senti uma dor física quando vi a minha foto, uma dor misturada com frustração. Se eu quisesse mostrar, já teria feito a Playboy, estaria rica. E o pior, por incrível que pareça, é que eu consumo isso. Eu me lembrei do dia em que a minha amiga me ligou dizendo ‘você não sabe o que eu tenho aqui - uma revista com o Brad Pitt pelado’. Eu falei: ‘mentira’ - e fui para a casa dela ver. E quando isso aconteceu comigo, eu me lembrei desse momento. Eu pensei: ‘meu Deus do céu, onde vai ter um ponto final?’ Depois que inventaram isso, bem depois do Fellini, depois que isso virou alvo de consumo mesmo e que neguinho descobriu que isso é uma máquina de fazer dinheiro, isso só aumenta. A fábrica de celebridades está cada dia maior. É uma foda. É o cachorro correndo atrás do rabo.
(LUANA PIOVANI, comentando o episódio da foto em que apareceu sem calcinha na capa do jornal carioca “O Dia”, em reportagem de Walmor Pamplona para o site No Mínimo sobre paparazzi.)
Quando ficamos completamente nus, puxo-a para a cama, com cuidado para não ir com sede demais ao pote. Mas ela contraria meu prognóstico, movimentando-se com surpreendente desenvoltura. A acoplagem dos corpos processa-se suavemente. Seu sangramento é pequeno, nada que atrapalhe a perfeição deste momento ímpar que estamos tendo o privilégio de usufruir. Permanecemos assim, por um longo tempo abandonados nos braços um do outro, como se de repente o mundo todo se resumisse a nós dois.
(Trecho de “Amizade Sem Fim”, romance de estréia de RENATO ARAGÃO, a.k.a. Didi Mocó Sonrisal Colesterol Novalgina Mufumo, no qual o ex-trapalhão descreve o momento em que o protagonista do livro desvirgina a enfermeira Sofia.)
As que ajeitam os cabelos são as piores. Há as que olham para o chão. Aquelas de peitões sob camisetas translúcidas olham para eles. Talvez para fazer uma rápida checagem ou então como se dissessem: são meus e você os quer, né? As de óculos escuros: há aquelas que olham por cima deles para você, e outras cujo olhar a gente perde completamente e fica apaixonado por elas. A não ser que ajeitem o cabelo. As de óculos de grau geralmente são as que olham para o chão. As mais raras são as que enfrentam o seu olhar, seguram-no, desaceleram o passo e aceleram o meu próprio passo e o meu coração. Destas você, o tímido, tem medo, mas também se apaixona por elas, a não ser que ajeitem os cabelos, claro. Apaixonar-se quer dizer levar o impacto da sua imagem gravado na retina durante um certo tempo.
(Excerto do texto “Como as Mulheres Reagem Quando Você as Encara na Rua: Pequeno Catálogo Desorganizado”, de MARCELO ROTA. Tem mais aqui.)
Um dos melhores filmes baseados em HQs é, sem dúvida nenhuma, Super-Homem, dirigido por Richard Donner em 1978. Desse longa-metragem, retive uma cena em especial na memória: quando o Super-Homem recebe a notícia da morte de sua amada Lois Lane em um terremoto. Desesperado, o super-herói voa várias e várias vezes em torno da Terra na direção inversa à sua rotação, cada vez mais rapidamente, até fazer com que o planeta passe a girar em sentido contrário. E assim, por causa de uma mulher (como diz a canção de Gilberto Gil), o Superman consegue fazer com que o tempo recue, trazendo Lois de volta à vida.
Ok, desconte-se o fato de que a História não é como uma fita cassete na qual se pode dar pause, forward ou rewind, manipulando-a cronologicamente ao gosto do freguês. Mas, liberdades científicas à parte, considero belíssima a concepção filosófica por trás dessa seqüência, na qual o Super-Homem joga todo racionalismo para o alto e usa seus poderes com o intuito egoísta (e por isso mesmo extremamente humano) de ressuscitar sua amada.
Hoje de manhã, quando soube da morte de Christopher Reeve (1952 - 2004), não pude deixar de lembrar dessa cena, em contraste com a inexorabilidade da vida. Por coincidência ou sincronicidade, recebi ontem (antes mesmo de sabermos do falecimento de Reeve) um e-mail do meu amigo Paulo E. Miranda sugerindo que eu comentasse neste blog uma fala de Kill Bill 2 na qual o personagem de David Carradine faz a seguinte observação: “o Super-Homem não se transformou em Super-Homem, ele já nasceu assim. Seu alter ego é Clark Kent. O que Clark veste, os óculos e as roupas de trabalho, aquele é o seu uniforme, é o que o Super-Homem usa para misturar-se conosco. Clark Kent é como Superman nos vê. E quais são as suas características? Ele é fraco, inseguro… é um covarde. Clark Kent é a visão que o Super-Homem possui da raça humana”.
Antes de mais nada, vale a pena ressaltar que o diálogo redigido por Quentin Tarantino foi 99% inspirado por uma tese escrita por Jules Feiffer em seu livro “The Great Comic Book Heroes”, publicado em 1965. Não sei se concordo com a fala de Carradine, mas subscrevo na íntegra a bela sacada de Feiffer: não era Clark Kent quem usava o uniforme de Super-Homem, e sim o super-herói quem se fantasiava sob os trajes de um jornalista tímido e medroso. Quanto à suposta visão crítica que o Superman teria sobre a raça humana, duvido sinceramente que esse baluarte da América fosse capaz de ter um olhar tão cínico a nosso respeito, por mais verdadeiro que possa ser.
E é.
Já escrevi, em ocasiões passadas, sobre as ameaças de processo judicial feitas a blogueiros como Alessandra Félix, Edney Souza e Cristiano Dias. Esses imbróglios foram os primeiros indícios de que a visibilidade crescente dos blogs e a liberdade de expressão exercida por quem os escreve começavam a incomodar.
Pois bem, agora é oficial: surgiu o primeiro caso de um blog brasileiro retirado do ar por conta de um processo judicial. O caso, inédito no país, limou da Web o blog coletivo Imprensa Marrom (disponível para visitação apenas no cache do Google). O aspecto mais surreal desse imbróglio é que a ação foi motivada por um… comentário. O autor do processo sentiu-se ofendido por um comentário deixado no blog, entrou com uma liminar na justiça e o Imprensa Marrom saiu do ar.
O precedente é perigossímo. Em um país que teoricamente defende a liberdade de expressão, ver um site fora do ar por causa de um comentário que sequer foi redigido por seus autores é algo de kafkiano. Fernando Gouveia, que escreve na Internet com o pseudônimo Gravataí Merengue e é o responsável pelo registro do domínio imprensamarrom.com.br, não esconde a angústia com o caso e alerta, sem esconder sua ironia: “muito cuidado com os comments que vão ao ar. Apaguem tudo que pareça minimamente ofensivo, pois alguém pode optar por, em vez de pedir a retirada do comentário, simplesmente processar o blog“.
O aspecto mais aterrador de todo esse caso é constatar que mergulhamos, oficialmente, no território das incertezas. A partir desse precedente, sou obrigado a fazer alguns questionamentos sobre a natureza de meu blog. Até que ponto posso emitir as minhas opiniões sem que algum melindrado ameace tirá-lo do ar por algum critério subjetivo? Chegará o tempo em que necessitaremos de consultoria jurídica prévia para a publicação de um post? Vale a pena permitir a publicação de comentários, ou será mais prudente limitar a interação do meu blog? Devo me limitar a escrever sobre o cardápio do meu café da manhã e as cólicas do meu cachorrinho?
Com a palavra, Fernando Gouveia:
“Esta é a PRIMEIRA AÇÃO JUDICIAL promovida contra um blog por causa de comentário. Vamos criar jurisprudência. Essa causa, desculpe o pieguismo, é ‘de todos nós’. Não podemos deixar que ‘o outro’ ganhe essa ação, porque aí vai ser uma festa contra todos nós. Qualquer assuntinho mais polêmico pode ser alvo de uma medida assim, e os blogs definitivamente se condenam a ser um diarinho bundamole que versa sobre o umbigo do dono (e cuidado para que o umbigo - ou uma aliança do mesmo com o resto do abdômen - não processe o autor)“.
Você já deve ter participado de uma dessas rodinhas de violão em que algum camarada seu toca “Stairway to Heaven”, “Pais e Filhos”, “Patience”, “Maluco Beleza” ou qualquer outra música pra lá de batida, e toda a galera (a essa altura do campeonato pra lá de manguaçada) canta desajeitadamente em uníssono, acendendo isqueiros enquanto paqueras se desenrolam e a lua tapa os ouvidos com tamanha desafinação. Até aí, tudo zen. Mas o que dizer quando esses mesmos cantores de rodinhas de amigos tornam-se os campeões de vendas da indústria fonográfica brasileira?
O cantor mineiro Emmerson Nogueira vendeu mais de 700 mil cópias dos quatro álbuns que gravou pela Sony Music até hoje. Detalhe: nenhum deles possui qualquer composição própria e um ainda foi gravado ao vivo. Seu repertório? Regravações de sucessos conhecidos do pop/rock internacional em versões acústicas. Ou, como afirmam seus produtores, “com cara de barzinho”. É uma fórmula sem erros: ao regravar músicas conhecidas de bandas e cantores como Pink Floyd, Extreme, Eric Clapton, Oasis e Janis Joplin, com arranjos apurados e fiéis às versões originais, Nogueira montou um repertório apinhado de sucessos. O resultado: sucesso comercial garantido. Quem pensa que ele poderia se incomodar com o fato de fazer sucesso às custas de composições alheias engana-se. Em entrevista concedida ao site Universo Musical, Emmerson declara: “A cada dia lembro de uma música que poderia ter gravado. É algo que ainda quero fazer por muito tempo”. Continue Lendo
Esta é uma das verdades mais óbvias: propagandas enganosas levam a expectativas equivocadas. Vide, por exemplo, o trailer veiculado em cinemas e TVs de “A Vila” (EUA, 2004), que levou muitos espectadores a pensar que assistiriam a um “Sexto Sentido II - A Missão” e provavelmente saíram decepcionados, o que é uma pena. Porque “A Vila” é um belo filme, talvez o melhor do diretor M. Night Shyamalan desde aquele do garoto que via fantasminhas nem sempre camaradas.
Seu ilusório trailer leva a crer que estaremos diante de um daqueles filmes com final retumbantemente surpreendente, induzindo o espectador a assisti-lo como quem brinca de Detetive (“foi o Coronel Mostarda, com o candelabro, na sala de estar!“). De fato, não foram poucas as pessoas que saíram da sala de cinema se gabando por terem descoberto o grande “segredo” da trama após alguns minutos de exibição. E assim, porque a “charada” é mais ou menos previsível, o espectador sai fazendo biquinho, dizendo que o filme é uma porcaria e que foi ludibriado pela propaganda.
No entanto, “A Vila” é uma envolvente parábola de tempos nos quais armas de destruição de massas são tão verossímeis quanto monstros na floresta. Se seus espectadores apreciassem o filme menos preocupados em montar supostos quebra-cabeças, talvez pudessem admirar a capacidade que Shyamalan possui em criar climas de suspense a partir de uma escolha precisa de enquadramentos (vide a cena em que a cega admiravelmente interpretada por Bryce Dallas Howard estende as mãos na varanda de sua casa enquanto as misteriosas criaturas se aproximam).
E assim, a partir da história de um pequeno vilarejo aterrorizado por criaturas que habitam as matas ao seu redor, M. Night Shyamalan constrói aquela que talvez seja a melhor parábola cinematográfica produzida até agora sobre o novo estado de coisas surgido após o dia 11 de setembro de 2001. Veja as pesquisas que apontam Bush Júnior em vias de se reeleger (isso sim é o que eu chamo de uma história de terror) às custas de campanhas em cima do discurso do Medo e da Paranóia, e pense nos métodos utilizados pelos líderes da vila para convencer os jovens a sequer cogitarem uma fuga para a cidade.
Quem leu o imperdível livro de entrevistas que Alfred Hitchcock concedeu a François Truffaut (recentemente reeditado pela Companhia das Letras) certamente se lembra do conceito de McGuffin: um elemento na trama que serve para distrair a atenção do espectador e alavancar a ação do filme, mas que não passa de um pretexto para que o verdadeiro tema da obra seja abordado pelo autor. Por exemplo, a maleta de “Pulp Fiction”, os microfilmes de “Intriga Internacional”, o dinheiro roubado por Janet Leigh em “Psicose”. Pois bem: ouso dizer que toda a trama em torno “daqueles-de-quem-não-podemos-falar” não passa de um McGuffin engendrado em um filme claramente inspirado pela cultura do medo.
Vale a pena citar ainda a recorrência de um tema caro ao diretor e roteirista M. Night Shyamalan: o ressurgimento da esperança em tempos sombrios. Temática que já se fazia presente ao final de filmes como “Sinais” (uma trama sobre ETs como pano de fundo para a história de um pastor que recupera sua fé) e “Corpo Fechado” (o surgimento de um super-herói em um mundo infestado por serial killers e lunáticos), e que volta a ser apresentada nesta espécie de paráfrase da caverna de Platão, sob a personificação de um amor (literalmente) cego.
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