A tira mais triste de todos os tempos

Por Alexandre Inagakiquarta-feira, 14 de dezembro de 2005

Em 21 de março de 2005 postei em meu endereço antigo no Gardenal.org uma tira desenhada por um fã de Bill Watterson que retratava o hipotético momento em que Calvin deixava de ver Hobbes como seu amigo (imaginário ou não), e o tigre tornava-se um mero bicho de pelúcia.

Na época houve uma certa repercussão, mas nada comparado ao que aconteceu quando a tira foi descoberta pelas comunidades no Orkut dedicadas ao personagem. Em uma comunidade de fãs de Calvin & Haroldo, por exemplo, um mero tópico com um link simples para o meu blog recebeu 154 postagens, com direito a um bate-boca dos mais exaltados entre os participantes, que discutiram a validade de uma tira que não havia sido desenhada pelo criador original do personagem. Mais recentemente, o post também acabou indo parar em uma comunidade em inglês, gerando novas discussões acerca de suas possíveis leituras.

Como meus arquivos no Gardenal sumiram, desapareceram, escafederam-se, e junto com eles todos os posts que publiquei em 2005, aproveito a ocasião para republicar aqui o texto original. Em tempo: a tradução da tira que ilustra este post foi feita por Eduardo Couto e publicada em 12 de abril.

* * * * *

Bill Watterson, provavelmente acometido pela Síndrome de Bartleby, teve publicada sua última tira de Calvin & Haroldo em 31 de dezembro de 1995, e nunca mais publicou um desenho sequer de sua maior criação. Desde então Watterson vive recluso com a esposa em Chagrin Falls, Ohio. Não vai a convenções de quadrinhos, não assina autógrafos, não concede entrevistas e ainda solicitou à Universal Press Syndicate, que distribui mundialmente as tiras de Calvin & Haroldo, para que ela não lhe encaminhasse mais correspondências de fãs.

É inevitável comparar suas atitudes com as tomadas por escritores como J. D. Salinger, Raduan Nassar ou Juan Rulfo, que espontaneamente abdicaram da literatura e foram cuidar de suas próprias vidas; que eles sejam felizes, porque merecem. Quanto à tira publicada ao lado, é preciso dizer que ela não foi desenhada por Bill Watterson. Encontrei-a em uma comunidade de fãs de Calvin, e infelizmente desconheço o seu autor. É, para mim, a mais triste, mas também uma das mais belas tiras que já vi na vida, por toda a riqueza de significados que ela apresenta. Poderia tergiversar horas sobre o universo de Calvin, amigos imaginários, conformismo social ou as asas que desaprendemos a usar. Mas, por ora, limito-me a citar as últimas palavras do último quadrinho desenhado por Watterson:

- “It’s a magical world. Hobbes, ol’ buddy… let’s go exploring!”

* * * * *

P.S.: Eis um blog brasileiro exclusivamente dedicado à publicação de tiras do personagem: Depósito do Calvin.

Pense Nisso!
Alexandre Inagaki

Alexandre Inagaki é jornalista, consultor de projetos de comunicação digital, japaraguaio, cínico cênico, poeta bissexto, air drummer, fã de Cortázar, Cabral, Mizoguchi, Gaiman e Hitchcock, torcedor do Guarani Futebol Clube, leonino e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos, não necessariamente nesta ordem.

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  • M

    Meu deus, como essa gente transforma a ritalina num monstro. Devem estar assistindo muita televisão.
    O problema não é o objeto e sim a maneira como você o usa.

  • Daniel

    Ao contrário do que foi dito no último comentário, a droga mais perigosa não é a Ritalina, mas a ignorância.
    Existe uma linha tênue, mas muito importante, entre tratar uma condição psiquiátrica (a qual justamente é classificada como tal pelo sofrimento e incapacidade cognitiva e/ou social que a mesma traz) e fazer uso abusivo do conhecimento científico para subjulgar alguém.
    Além do mais, eu vejo a tira como uma crítica não ao uso de medicação, mas ao próprio fato de que nós crescemos… Nós crescemos e continuamos a fantasiar, mas com uma crítica maior ao conteúdo fantástico (o que não ocorre quando se é criança).
    Dependendo das coisas que se passam, ficamos cada vez mais duros - e um pouco daquela fantasia que precisamos para que o mundo fique mais leve se vai. Obviamente, não podemos fantasiar de forma desenfreada, mas não podemos perder aquela “faísca” que torna a vida mais leve.
    Por isso, embora a tira não esteja em acordo com o que Watterson pretendia expor com os personagens, eu considero a mesma sensacional - pela própria capacidade de provocar discussão sobre essa tal “normalidade”. Falo isso pois trabalho com saúde mental, e essa é uma das maiores discussões, que nem Freud conseguir elaborar por completo: o que é ser normal.

  • Gustavo de Paula

    Pessoal, que final ruim
    Calvin nunca seria assim
    vejam o final mesmo
    ou melhor… FINAL PRA QUÊ?
    http://www.orkut.com.br/Main#AlbumZoom?uid=15006515562548933632&pid=1290790699929&aid=1290743289$pid=1290790699929

  • Selena

    Nossa, eu sempre amei Calvin e Haroldo…só de pensar q um dia o Calvin perderia toda a sua imaginação para uma droguinha q supostamente controla o cérebro é deprimente!

  • Fernanda

    éééé minha gente… eu chorei muito.

  • http://crackpotideas.blogspot.com/ Andira

    Suspirei.

    R: Andira, eu também suspirei…

  • Mi

    eu simplesmente adoro o Clavin, eu comprava o jornal o Estado de S. Paulo todos os dias, para poder ler suas tirinhas, são simplesmente maravilhosas, e esta que mesmo não sendo original, me fez chorar. Obrigada pela partilha.

  • Iuri Martins

    De fato, acho de grande importância lembrar que não foi o criador que escreveu essa tira, mas isso não tira a mérito de artista do autor desconhecido. Na tira, ele demosntrou uma situação bastante próxima à real e que, se Calvin fosse uma criança de verdade, seria esperada. Todos nós que fomos como o Calvin passamos por isso um dia.
    Não há como negar que a sacação do autor foi grande, mas eu vejo essa tira como o enterro de Calvin & Hobbes, pois acabou exatamente com a beleza da obra de Watterson.

  • http://michelleparaujo.multiply.com Michelle Araújo

    Que post, caro Inagaki.
    As tirinhas do Calvin deveriam vir nas caixas de cereais e encantar mais umas cinco gerações, no mínimo.
    Abs.

    R: Michelle, de minha parte já lhe digo que comprei vários livros do Calvin que serão repassados adiante, para outras crianças que merecem conhecer essa obra-prima das HQs.

  • NaNa

    Chorei!

  • bruno

    tenho que deixar meu comentário aqui: porra, chorei.

  • Karl
  • http://www.professorvaz.blogspot.com prof.vaz

    … não se preocupem sempre haverá uma vaga na Mansão Foster para amigos imaginários… a fantasia tem que continuar!

  • http://intensidade.wordpress.com thahy

    nossa…
    bateu a tristeza, agora…
    lembrei do meu filho…

  • hugo Mendes

    sempre gostei de quadrinhos, e do calvin sempre fui fã, essa tirinha é triste, mais mostra que todos mudamos.

  • Karla

    Amigos, li os comentários de vocês e percebi que interpretaram esta tira como o fim do “Mundo imaginário” do Calvin, porém, minha visão é totalmente diferente. Tenho usado as tirinhas do Calvin em minhas aulas de Psicopedagogia e, como Psicopedagoga, observando toda a trajetória do Calvin, suas histórias, entendo que ele não está abandonando seu imaginário. Se notarem, ele fala de pílulas. Em todas as suas tirinhas demonstra sua desatenção, falta de concentração, agitação, é como se estivesse sempre “ligado na tomada”, cheio de energia, esta, interminável. Minha concepção é de que Calvin, claramente demonstra, “numa visão da psicopedagogia”, ser portador de um transtorno que acomete muitas crianças e, que não compromete em nada sua inteligência, mas torna complicado o processo de aprendizagem. Me refiro à Hiperatividade. Minha leitura, é que ao ser diagnosticado, Calvin passa a tomar remédios para a concentração e controle de seus implulsos, o que o faz mais responsável e dedicado aos estudos. Este é meu parecer e, por sinal, acho super interessante a idéia de quem elaborou esta tira, pois se refere a um problema, que, muitas vezes não diagnosticado, passa a ser um grande problema na vida de qualquer criança, adolescente ou adulto.
    Um abraço a todos!
    Karla

  • Mariana Reis

    Cheguei aqui através da comunidade do orkut. Li os 444 comentários de lá e todos daqui! A diferença de comentários sádios daqui, para discussões agressivas de lá, é nítida. Tem um tal de André lá - que pelo amor - desde 2005 vem com os mesmos comentários grosseiros e sem o mínimo respeito à opinião dos outros.
    Como, devido a isso, não me senti confortável de deixar minha opinião lá, deixo aqui:
    A tira é sim, muito triste, mas ao mesmo tempo muito linda. Mostra a mais pura realidade.
    Quantas pessoas não tiveram amigos imaginários na infância? Muitas!
    E quantas delas mantiveram esses amigos na adolescência? Poucas!
    E quantas, então, os tiveram na fase adulta? Quase nada.
    Talvez o autor até está fazendo uma comparação do fato de Calvin não ver mais Hobbes como seu amigo imaginário - e somente como um bixinho de pelúcia - com o fato de B.W. ter abandonado os quadrinhos e deixado milhares de fãs com saudade.
    É triste sim, arrepiei as inúmeras vezes que li, mas não acho que a tira vai mudar a minha visão sobre o verdeiro Calvin e seu eterno amigo imaginário, como muitos dizem. Porque, assim como Calvin, eu tenho a imaginação fértil o suficiente para conseguir ler as tiras oficiais, sem que essa, feita pelo talentoso fã de B.W, mude o mínimo que seja a mágia que me trás a cúmplicidade entre Calvin e Hobbes. A levo somente como um outro ponto de vista, e um outro ponto de vista é sempre bem vindo.
    Podemos interpretar de várias maneiras, e devemos respeitar qualquer tipo de interpretação, coisa que na comunidade não acontece.
    E o autor dessa tira, merece sim, os meus parabéns pela inteligência e criatividade.

  • http://malbergarias.zip.net Ma

    Meu caro,” crescer dói…”
    Essa frase eu ouvi de uma amiga minha aos prantos quando seu filho descobriu que papai Noel não existe e das explicações que a mãe lhe oferecia…
    Crianças são sensívei e nõs dão presentes como a frase acima.
    Mas , infelizmente elas crescem.
    Cheguei aqui atraves de um link, la na comunidade do Calvin e Haroldo.
    But, no matter, it always be magical!!!!

  • breno

    só eu pensei na Ritalina e na tristeza que é começar a tomá-la?

  • http://www.davidlucena.blogspot.com DvD

    [chorando]
    como há muito tempo não acontecia.
    =’(
    =’)

  • Tonzeira

    Internet está matando os amigos imaginários!

  • Estevan

    eu acho o seguinte….a partir desse momento o calvin cresceu…

  • Aline Berg

    Puxa! Eu gostava tanto das tirinhas do Calvin! Depois de um tempo passei a recortar e guardar as tiras e as tenho até hoje. Fico feliz em saber que não sou só eu…rs…Achei este blog no Orkut, procurando comunidades sobre o Calvin.
    Estarei sempre por aqui.

  • julia

    realmente….não gostei desta tira…o fato de calvin crescer é realmente verdadeiro….mas acho q esse dois amigos não deveriam se separar…é de chorar essa tira..meus amigos choram com esta tira….que eles não se separem

  • henrique

    Acho que o próprio Bill deve ter se emocionado com a tira. Será que não bateu nele uma vontadezinha de voltar a escreve-las?

  • Renato Hanói

    Essa tira me lembrou de um amigo.
    Estávamos em uma festa e não hora de vir embora (eu ia viajar no dia seguinte cedo), com pressa acabei não indo cumprimentá-lo. Ele saiu 20 minutos depois de mim.
    Como havíamos bebido muito (voltei de taxi), ele dormiu ao volante, bateu, ficou preso no carro, ficou em coma por uma semana e faleceu!
    O que isso tem a ver com a tira? Pouco antes de eu sair da festa, ele me chamou pois queria falar comigo (sei lá o quê) e não dei importância pois sabe como é, papo de bêbado…Apesar de sermos amigos desde a infância, estudamos juntos, praticamos esportes juntos…
    Sabe que depois disso fiquei uns 3, quase 4 anos sem beber? Isso foi em 98…
    Apesar de não ser do “pai”, gostei da tira! Calvin assim como todos nós cresceria mesmo…Acho que o que foi retratado é que muitos de nós, a maioria, cresce e deixa morrer esse espírito infantil, que se alegra com coisas simples como tomar banho de chuva, ganhar uma bala de alguém que gosta, brincar de guerra de cosquinhas, essas coisas…rs
    Fiquem na paz!

  • henrique

    Um gênio!!! Nunca algo tão triste me fez tão feliz!!

  • David Contesini

    O Bill é que perdeu de ter desenhado essa tira - não dá pra tapar o sol com a peneira, cedo ou tarde isso acabaria acontecendo. Essa tira pode até estar sendo odiada por muita gente, mas é a que fala mais alto. Excelente.

  • Regina Gasparetto

    Oi …Olá…espero realmente que vocês possam me ajudar…
    O caso é o seguinte, eu encontrei um papel de carta com estes dois encantadores personagens, porém, gostaria de salva-lo em meus documentos, mas não encontro mais a mesma figura em nenhum Site. Procurei em muitos e muitos e não encontrei, portanto, decidi descreve-lo para que facilite a identificação.
    Se possível, me enviem a mesma imagem…ou me indiquem algum site onde eu poderei encontrar.
    Segue descrição:
    -São vários quadrinhos, coloridos, sobre dias de verão, descrevi quadro a quadro:
    1ºacordam
    2ºcomem cereais e lêem jornal
    3ºsaem pela porta da rua
    4ºbrincam de polícia e bandido-atrás de árvore
    5ºtiram foto um do outro
    6ºfazem escavações
    7ºbanho de piscina-Calvin sem a sunguinha
    8ºlevantam pedras
    9ºmascarados com bola e bandeirinha
    10ºdeitados na grama olhando nuvens
    11ºlutam
    12ºjogam bexigas d’agua nos outros
    13ºsobem em árvore
    14ºvendem suco (suicide drink)
    15ºfogem de uma cobra
    16ºde binóculos olham as estrelas
    17ºcaçam vaga-lumes
    18ºpai o carrega pela camiseta para casa
    19ºdeitadinhos com o seguinte diálogo:
    Calvin-Summer days are supposed to be longer. But they sure seem short to me.
    Hobbes-I’ll say. We didn’t get to do half our itinerary.
    Pessoal, espero realmente que vocês possam me auxiliar nesta busca.
    Beijinhos a todos!!!!!!!!!!!

  • http://www.google.com amigo

    a realidade eh perigosamente próxima disso!

    vi a charge brasileira do Calvin e Hobbes. Curiosamente isso combina com o pesnamento Hobbesiano não acha? Força opressora da Ritalina para controlar quem sai dos trilhos.
    Ritalina, o maior veneno que poderia existir. Depois de uma pequena dose fica querendo organizar tudo, querendo terminar os trabalhos, limpar as coisas.. Mas vc vai a uma festa e fica pensando q seria melhor se estivesse em casa organizando as coisas.
    Detalhe: vc perde a opinião e criatividade.

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Pense Nisso! Alexandre Inagaki

Alexandre Inagaki é jornalista e consultor de comunicação em mídias digitais. É japaraguaio, cínico cênico. torcedor do Guarani Futebol Clube e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos. Já plantou semente de feijão em algodão, criou um tamagotchi (que acabou morrendo de fome) e mantém este blog. Luta para ser considerado mais do que um rosto bonitinho e não leva a sério pessoas que falam de si mesmas na terceira pessoa.

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