Artigos do mês de: maio 2008

A biografia não-autorizada de Indiana Jones

Por Alexandre Inagakiquarta-feira, 21 de maio de 2008

Se aventura tem um nome, só pode ser Indiana Jones. Ao protagonizar três filmes - Caçadores da Arca Perdida (1981), Indiana Jones e o Templo da Perdição (1984) e Indiana Jones e a Última Cruzada (1989) - que juntos arrecadaram mais de 1 bilhão de dólares nas bilheterias do mundo inteiro, o arqueólogo criado pela dupla Steven Spielberg e George Lucas entrou para a história do cinema como o maior aventureiro de todos os tempos.

Se você se lembra do terceiro filme da saga, sabe que Indiana na verdade chama-se Henry Jones Jr., e que o herói interpretado por Harrison Ford, por detestar ser chamado de Júnior, assumiu a alcunha de Indiana Jones pegando emprestado o nome do seu cachorro. Do mesmo modo, deve ter acompanhado as peripécias vividas por Indy em lugares tão exóticos e distantes quanto os desertos do Egito, as selvas da Índia, catacumbas subterrâneas em Veneza, vilarejos no Tibete, a floresta amazônica e a Terra Santa, e está ansioso para assistir a Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal, que estréia no dia 22 de maio, certo? Porém, se você pensa que as aventuras de Indy se resumem apenas ao que foi exibido nos cinemas, saiba que elas foram apenas o começo. Porque nosso herói prosseguiu com sua saga nos livros, histórias em quadrinhos, videogames e o seriado O Jovem Indiana Jones (1992), todos produzidos pela Lucas Licensing (empresa de George Lucas).

Graças às informações adicionais trazidas por todos os spinoffs da saga cinematográfica, é possível fazer uma biografia quase completa deste personagem que foi interpretado por cinco diferentes atores durante as várias fases de sua vida. Além de Harrison Ford (que filmou Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal do alto de seus 65 anos de idade) e River Phoenix (intérprete do jovem Indy na seqüência inicial de Indiana Jones e a Última Cruzada), o arqueólogo ganhou na série de TV os rostos de Corey Carrier (aos 8 anos de idade), Sean Patrick Flanery (dos 17 aos 21 anos) e George Hall (o Indy ancião). O seriado, aliás, começa com a exibição de um velhinho Indiana Jones de tapa-olho, aos 93 anos de idade, contando a dois jovens a primeira aventura que viveu ao lado do pai: uma viagem ao Egito na qual conheceu duas figuras históricas, Lawrence da Arábia e Howard Carter, o arqueológo que descobriu a tumba de Tutancâmon.


Indiana Jones aos 8 e aos 93 anos de idade, em imagens extraídas da série de televisão.

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Henry Jones Jr. nasceu na Escócia, no dia 1 de julho de 1899. Filho de Anna e Henry Jones, desde pequeno acompanhou o pai, arqueólogo formado na Universidade de Oxford, em suas viagens ao redor do mundo. Em 1908, conhece seu primeiro amor: a Princesa Sofia, filha do arquiduque Franz Ferdinand. Porém, por se tratar de um plebeu, Júnior é proibido de vê-la novamente - seria o primeiro de tantos desencontros amorosos em sua vida. Ainda criança, decide adotar o nome de Indiana, nome de seu cachorro, por abominar ser chamado de “Júnior”. É o primeiro ato de rebeldia contra o pai.

Em maio de 1912, sua mãe Anna contrai febre escarlate e morre, aos 34 anos de idade. Abalado pela tragédia, Indy viaja, junto com sua tutora, para a América. Mais especificamente, para a cidade de Boston, onde seu pai dá aulas em uma universidade. No verão daquele mesmo ano Indy adquire seu famoso chapéu, seu chicote, a cicatriz no queixo e a fobia por cobras, em uma aventura retratada no prólogo de Indiana Jones e a Última Cruzada. Em 1913 encontra pela primeira vez Marcus Brody (personagem interpretado por Denholm Elliott, ator falecido em 1992, nos três primeiros filmes), com quem viaja em uma expedição para o Egito. Depois, decide contrariar os desejos do pai, que queria que Indy prosseguisse seus estudos na Universidade de Princeton, partindo em viagens mundo afora em busca de aventuras que o levarão a encontrar personagens históricos como Pancho Villa, Ernest Hemingway e Mata Hari, e a lutar na Primeira Guerra Mundial.


Fotos de um álbum de família: Henry e Anna Jones, os pais de Indiana.

Com o fim da guerra Indy retoma aos Estados Unidos, a fim de estudar Arqueologia na Universidade de Chicago. Lá, torna-se aluno do professor Abner Ravenwood e apaixona-se por sua filha, Marion (apresentada em Caçadores da Arca Perdida na pele da atriz Karen Allen). Distancia-se dela, no entanto, ao mudar-se para a França a fim de fazer graduação em Lingüística em Sorbonne. O ano é 1922, e Indiana já domina nada menos que 27 idiomas. Em 1925, surge seu primeiro emprego: professor na Universidade de Londres. Porém, como parece ter formigas na bunda, Indy não pára quieto, transitando entre empregos na Inglaterra e Estados Unidos. Em 1930, envolve-se até mesmo com discos voadores (em história narrada pelo livro Indiana Jones and the Sky Pirates). Os romances que trazem Indy como personagem principal também relatam suas caças pela pedra filosofal, ovos de dinossauros e múmias roubadas. Em 1935, o videogame Indiana Jones and the Emperor’s Tomb mostra como ele acaba se envolvendo na busca pelo Coração do Dragão, uma poderosa pérola negra que dá ao seu dono a capacidade de controlar mentes alheias. No mesmo ano Indy se envolve em uma aventura que envolve as Pedras de Sankara: é o enredo do filme Indiana Jones e o Templo da Perdição.

Em 1936, Indy viaja até as selvas do Peru em busca de um ídolo dourado. Para sua desgraça, o amuleto acaba nas mãos de seu rival Belloq. Alguns meses depois, reencontra seu inimigo e uma paixão de juventude, Marion Ravenwood, em meio ao deserto da África, durante a busca por uma certa Arca da Aliança. Em 1937 consegue um emprego no Barnett College, em Nova York. No ano seguinte recebe a visita de um colecionador de antiguidades, Walter Donovan, que informa que seu pai, Henry (personagem impagavelmente interpretado por Sean Connery), desapareceu enquanto buscava pelo Cálice Sagrado. Viaja até a Itália, conhece uma certa doutora Elsa Schneider e envolve-se mais uma vez com nazistas. Ao final de mais uma jornada reconcilia-se com o pai, de quem estava afastado há anos.

Novas aventuras envolvendo os diários de Marco Pólo, o continente perdido de Atlântida, a espada de Genghis Khan, os tesouros de Eldorado e as ruínas da Torre de Babel entreteriam nosso herói até meados de 1947, último ano em que suas aventuras são abordadas pelos livros e videogames. O que acontece com a vida de nosso arqueólogo predileto em 1957 é retratado no filme Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal. Já a série de TV dá um salto no tempo, resgatando as histórias de Indy no ano de 1992, quando, flagrado aos 93 aninhos de vida (porém, com corpinho de 83), Indiana é mostrado morando em Nova York junto com sua filha e netos. Será que, após o quarto filme para o cinema, conheceremos mais histórias do maior aventureiro de todos os tempos? Aguardemos pelas cenas dos próximos capítulos…

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P.S.: Diego Maia foi um dos sortudos que assistiram ao novo filme de Indiana Jones antes de sua estréia oficial nos cinemas, e neste texto ele explica porque o grande desafio de Indy será conquistar crianças e adolescentes 19 anos após o lançamento de Indiana Jones e a Última Cruzada. E de Detroit, Lola Aronovich também compartilha suas experiências sobre Indy IV.

Roda Viva, Blogumentário e cidadania na internet

Por Alexandre Inagakiterça-feira, 20 de maio de 2008

Participei ontem do programa Roda Viva, da TV Cultura, convidado pela produção para fazer uma espécie de cobertura online, via Twitter, dos bastidores da entrevista realizada com o coreógrafo e educador Ivaldo Bertazzo. Assistir in loco a um programa que já legou entrevistas históricas com personalidades como Ayrton Senna, Leonel Brizola, Oliviero Toscani e Orestes Quércia foi uma experiência ímpar. Durante o programa, procurei relatar o clima no estúdio (enquanto Ivaldo falava, todos ficavam em silêncio compenetrado e respeitoso - quase não me mexia na cadeira, a fim de evitar os rangidos) e garimpar os melhores insights da entrevista, em paralelo às twittadas das minhas colegas de bancada Helena Nacinovic e Ana Carmen.

Como bem observou Pedro Markun ao comentar essa experiência pioneira da TV Cultura, há diversos layers paralelos de informação, tanto para o espectador que acompanha o Roda Viva pela TV e pela internet, quanto para o twitteiro encarregado de fazer a cobertura paralela da entrevista. Naquela hora, eu mantinha um olho no Ivaldo, o centro das atenções, mas também observava os entrevistadores, meus colegas de bancada e os posts que o pessoal do Twitter escrevia naquele momento. Coisas da nossa geração Alt + Tab.

Enfim, a oportunidade de participar do Roda Viva foi bastante enriquecedora. Só lamento pelo fato de os twitteiros não terem a oportunidade, ainda, de interagirem diretamente com o convidado do programa ou com os entrevistadores. Fica aqui a sugestão, pois, para que nos próximos programas, os posts escritos pelos twitteiros de plantão apareçam na forma de legendas na tela da Cultura. Também julgo interessante o uso de uma aplicação que, nos mesmos moldes do Twemes.com, permita aos internautas que assistem ao Roda Viva no site do programa acompanhar toda a repercussão do programa no Twitter.

Em tempo: você tem conta no Twitter e também deseja ter a oportunidade de participar de uma cobertura online do Roda Viva? Então envie um e-mail para [email protected], dizendo quais são suas áreas de interesse, ou acompanhe o Twitter da TV Cultura. B)

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Durante o programa de ontem, twitteiros como @renatotarga, @neitor_now, @uatafoc e @bodas comentaram os meus bicos e caretas quando a câmera da Cultura focou o meu rosto. Meus caros, não posso fazer nada: é mais forte do que eu. Não é do meu feitio aparecer na TV ou em fotografias.

Imaginem, pois, minha situação quando fui convidado para dar um depoimento para o Blogumentário, documentário sobre blogs produzido pela Live AD, Zeppelin Filmes e Gafanhoto. Aceitei participar do Blogumentário, é lógico, mas até agora não tive a pachorra de assistir ao vídeo abaixo.

Gravado durante a Campus Party Brasil, o Blogumentário em breve estará disponibilizado na íntegra. Enquanto isso, acompanhem o blog oficial do documentário.

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P.S. 1: Iniciativas como o projeto Formigas com Megafone, precisam ser divulgadas. O blog, idealizado por Miguel Abuhab, fundador da Datasul, é um espaço colaborativo criado para a discussão de iniciativas que visam melhorar este país e fomentar o espírito de cidadania na internet.

Recomendo em especial a entrevista realizada com a consultora tributária, Maria José Paulin, na qual ela fala dos impostos no Brasil.

P.S. 2: E por falar em iniciativas bacanas envolvendo cidadania, você já visitou o site Ação Global 2008, do Sesi? Confiram mais informações sobre este projeto no blog do Edney.

Ideologia S/A

Por Alexandre Inagakisexta-feira, 16 de maio de 2008

Li uma notícia no jornal O Globo que chama a atenção tanto pela comicidade involuntária quanto pela pateticidade de nossos parlamentares. Eis a manchete: Troca de palito por fio dental em restaurantes é rejeitada. O texto comenta um projeto de lei apresentado pelo deputado estadual João Pedro, que propunha que os restaurantes cariocas trocassem a oferta de palitos por fio dental. Esta importantíssima proposição por pouco não foi aprovada por aclamação; o pedetista Paulo Ramos puxou o freio de mão ao afirmar, num arroubo de bom senso, que a Assembléia seria ridicularizada caso o projeto fosse aprovado.

Tão bizarra quanto a lei foi a justificativa dada pela deputada Beatriz Santos para votar contra a proposta: “Não tenho certeza se é fio dental pra ir à praia ou fio dental para os dentes. Por isso, voto não”. |-|

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Outro projeto de lei que anda dando o que falar foi apresentado pelo deputado federal Jorge Bittar, que trata do mercado de TV por assinatura. O trecho mais polêmico diz respeito à implantação de cotas destinadas a “incentivar o conteúdo audiovisual brasileiro”. O projeto criaria duas cotas: uma sobre os pacotes fechados vendidos aos assinantes, propondo que 25% dos canais obrigatoriamente sejam programados por empresas brasileiras, com veiculação expressiva de conteúdo nacional; a outra incidiria sobre todos os canais, estipulando que estes deverão exibir três horas e meia semanais de conteúdo brasileiro, sendo metade desse período obrigatoriamente preenchido por programas feitos por produtoras independentes. Tais cotas deverão ser implementadas ao longo de 4 anos.

Não me agrada nem um pouco esse tipo de proposta que impõe regras a fórceps. Mas devo dizer que fiquei mais irritado ainda com as falácias propagadas pela campanha Liberdade na TV, fartamente divulgada em intervalos comerciais. Segundo o site oficial do “movimento”, nós, clientes de TV por assinatura, devemos nos engajar contra esse projeto de lei por vários motivos simplesmente risíveis. Vide este argumento patético: “AMEAÇA DE UM FUTURO CHEIO DE REPRISES”. Pelamordedeus. Há anos filmes e episódios de séries são reprisados ad nauseam, que o digam telespectadores de canais como TNT, Sony, Fox e Warner. Porém, pior ainda é ter de agüentar aquelas chamadas infames da Sony falando de “mentes perigosas” e “machos de respeito”, que são marteladas a cada bloco comercial.

A tal campanha, patrocinada pela “Associação Brasileira de Televisão por Assinatura”, também fala que estão “ameaçando nossa liberdade de escolha”. É mesmo, cara pálida? Hmm, que tal se a ABTA der um bom exemplo e permitir que nós, assinantes, possamos escolher quais canais queremos adquirir, em vez de sermos obrigados a comprar pacotes fechados repletos de documentários tediosos, desenhos desanimados, programas de telecompras e outros entulhos que nos são empurrados goela abaixo? Não seria interessante também ver novos assinantes livres de imposição de firmar contratos de no mínimo 1 ano, sendo obrigados a pagar multa rescisória caso desejem exercer seu direito legítimo de reprovar os serviços oferecidos por uma operadora e cancelar suas assinaturas antes desse prazo?

É incrível constatar como certos grupos banalizam a palavra “liberdade” e ainda tentam usar pessoas como massa de manobra de seus interesses. Não à toa, o site Liberdade na TV não possui qualquer fórum de discussões ou espaço livre para que internautas possam discutir o assunto. Também é significativo o uso constante de verbos no modo imperativo: “ASSISTA. MOBILIZE-SE. PROTESTE!”. O que mais faltou ordenar ao seu rebanho de ovelhas apascentadas? FAÇA BIQUINHO? DÊ A BUNDA? NÃO CORRA, NÃO MATE, NÃO MORRA? TOQUE RAUL?

Mais decente foi a atitude de Jorge Bittar, relator do polêmico projeto, que criou um blog com diversas informações para todos que quiserem compreender melhor suas propostas e debater o assunto. Por mais que eu discorde de vários posicionamentos do deputado Bittar, ao menos encontrei lá um espaço aberto para críticas. Enquanto isso, aguardo desesperançoso pelo dia em que esse pessoal da ABTA decidir criar um espaço efetivo para discussões, implementar serviços decentes de atendimento por telefone e, enfim, oferecer a opção de assinarmos apenas os canais que nós desejamos assistir.

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É difícil não tornar-se cético e cínico diante de certas notícias. Por exemplo, quando soube que Ziraldo (chamado por Ivan Lessa de “o subversivo da caneta Pilot”) e Jaguar ganharam o direito de receber indenizações milionárias, às custas dos cofres públicos, sob a justificativa de “reparação e indenização pelos traumas que sofreram como vítimas da ditadura militar”, não pude deixar de concordar com a observação que Millôr Fernandes fez: “Eu pensava que eles estavam defendendo uma ideologia, mas estavam fazendo um investimento”.

Nestes tempos nos quais a imagem de Che Guevara virou ícone banalizado de camiseta, percebo que é difícil criticar essa juventude despolitizada que, ao contrário do que apregoava a letra de Cazuza, não está nem aí para a busca de ideologias. Parafraseando Drummond, constato que as utopias de 1968 tornaram-se apenas um retrato na parede (ou, pior ainda, uma mera foto num álbum de Orkut). E isso dói.

5 Frações de uma Quase História

Por Alexandre Inagakiquarta-feira, 14 de maio de 2008

Filmes em episódios são uma tradição do cinema contemporâneo que, curiosamente, não chegou a vingar aqui no Brasil, um país repleto de contistas e cineastas que se destacaram mundialmente pela qualidade de seus curtas-metragens (vide Ilha das Flores de Jorge Furtado e Couro de Gato de Joaquim Pedro de Andrade, ambos selecionados na lista dos 100 curtas mais importantes da história do cinema segundo o festival de Clermont-Ferrand). E, embora os resultados obtidos por essa estrutura de filme costumem ser naturalmente irregulares, por conta da diversidade de diretores e roteiristas envolvidos nesse tipo de empreitada coletiva, quase sempre o cinéfilo é premiado com um bom resultado final.

Recordo obras como Histórias Extraordinárias (adaptações de contos de Edgar Allan Poe assinadas por Louis Malle, Federico Fellini e Roger Vadim), Boccaccio 70 (do quarteto Luchino Visconti, Federico Fellini, Mario Monicelli e Vittorio di Sica), Os Novos Monstros (comédia em nove episódios dirigidos por Mario Monicelli, Dino Risi e Ettore Scola) e os mais recentes Cada um Com Seu Cinema (33 episódios de diretores de todo o mundo homenageando o cinema e o Festival de Cannes) e o adorável Paris, Eu Te Amo (18 episódios dirigidos por nomes do quilate de Olivier Assayas, Alexander Payne e os irmãos Coen) para atestar o que digo.

5 Frações de uma Quase História, primeiro longa-metragem realizado pela produtora mineira Camisa Listrada, entra com méritos nesta galeria de bons filmes divididos em episódios. A começar, pelo alento que é ver retratada nas telas Belo Horizonte, uma cidade poucas vezes retratada pelo cinema brasileiro. São seis diretores narrando (como o título do filme já entrega) cinco episódios habilmente amarrados nas transições entre cada história e no modo como os personagens de uma e outra trama se entrecruzam, tangenciando seus pequenos grandes dramas, desenredos, solidões, angústias e dilemas, criando uma unidade narrativa apesar da heterogeneidade de visões.

Dentre os cinco episódios de 5 Frações, há vários destaques que merecem ser feitos. Por exemplo, o modo como a obsessão do fotógrafo Carlos (Leonardo Medeiros) por pés (ao melhor estilo Alex Castro) é exibida pela câmera, que parece compartilhar, através de seus enquadramentos, o fetiche do personagem. A presença carismática de Jece Valadão, no episódio “A Liberdade de Akim”, fazendo jus às melhores atuações de sua carreira, em filmes como Os Cafajestes, Boca de Ouro e Rio 40 Graus. A direção de arte, merecidamente premiada no Festival Cine-PE. E o bom-humor do episódio que encerra o filme, “ZYR 145″, no qual a aparentemente frágil mocinha interpretada por Cynthia Falabella surpreende o conquistador barato vivido por Murilo Grossi (em impagável caracterização).

É uma pena que, em tempos nos quais blockbusters hollywoodianos como Homem de Ferro e Speed Racer invadem de assalto as salas de cinema brasileiras com centenas de cópias, um filme da qualidade de 5 Frações de uma Quase História, produzido e dirigido por uma nova geração de cineastas brasileiros, encontre dificuldades para se destacar e ganhar espaço na mídia em meio às superproduções massificadas de sempre. Deixo aqui, porém, a recomendação: 5 Frações já está em cartaz nas cidades de São Paulo e Brasília, e estreará dia 16 no Rio de Janeiro e em Belo Horizonte. Não deixe passar a chance de variar o seu cardápio cinematográfico e conferir esta bela produção vinda de Minas Gerais.

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P.S.: Dos poucos filmes brasileiros em episódios que conheço, o melhor deles talvez seja Contos Eróticos. São quatro episódios que adaptaram histórias vencedores do Concurso Status de Literatura Erótica Brasileira que era promovido anualmente pela finada revista Status. Para quem desconhece a história, a Status foi uma publicação de altíssima qualidade voltada para o público masculino, que circulou no final dos anos 70, antes da chegada da revista Playboy ao Brasil. Um dos pontos altos da revista, que conheci fuçando alguns exemplares que meu pai guardava debaixo da cama, era a sua seção fixa dedicada a contos. Philip Roth, Ray Bradbury e Julio Cortázar foram alguns dos autores publicados pela Status.

Outro destaque era o seu concurso anual de contos eróticos. Para que vocês tenham uma idéia do nível de qualidade dos concorrentes, o vencedor da primeira edição, promovida em 1976, foi Dalton Trevisan com o conto “Mister Curitiba”. Na terceira edição, em 1978, o primeiro lugar ficou com “O Cobrador”, de Rubem Fonseca. Já em 1977, o melhor conto foi “Vegetal”, de Luis Fernando Emediato, singela história sobre um homem cuja tara era manter relações sexuais com… frutas. O genial cartaz ao lado foi obviamente inspirado por esse conto, magistralmente adaptado por Joaquim Pedro de Andrade em um dos episódios do filme, rebatizado como “Vereda Tropical”, que deu um novo sentido para a palavra “vegetariano”. Contos Eróticos volta e meia é exibido no Canal Brasil. Fique atento!

8 clipes do rock brasileiro dos anos 80

Por Alexandre Inagakiterça-feira, 13 de maio de 2008

Metrô - “Beat Acelerado” - A letra deste que foi o primeiro grande sucesso do grupo Metrô é de uma ingenuidade quase comovente: “Minha mãe me falou que eu preciso casar/ Pois eu já fiquei mocinha/ Procurei um alguém e lhe disse:/ - Meu bem, você quer entrar na minha?”. A banda, que antes de ser contratada pela gravadora CBS (atual Sony) chamava-se A Gota Suspensa, lançou “Beat Acelerado” como um single cujo lado B continha outro hit, “Sândalo de Dândi”, em 1984. Graças ao sucesso dessas duas músicas nas FMs, o Metrô teve moral dentro da gravadora para lançar Olhar, seu primeiro LP, naquele mesmo ano. Curiosidade: nesse álbum, “Beat Acelerado” ganhou uma nova versão diferente daquela que estourou nas rádios, em arranjo a la Bossa Nova e um verso em francês, idioma natal da vocalista Virginie Boutaud. Porém, a boa fase não duraria muito. Virginie saiu da banda e o Metrô descarrilhou. Até chegou a lançar um segundo álbum, A Mão de Mao, em 1987, com o português Pedro Parq assumindo os vocais. O disco não agradou nem público nem crítica, e o Metrô acabou por encerrar suas atividades. Em 2002, a banda se reuniu novamente para gravar o álbum Déjà Vu, e desde então está na estrada, fazendo shows aqui e acolá. Continue Lendo

Razões (e emoções) para amar São Paulo

Por Alexandre Inagakisexta-feira, 09 de maio de 2008

São Paulo é uma cidade que me desperta sentimentos ambivalentes. Anos após ter afirmado que Sampa é uma cidade poluída, estressante e instigante que amodeio e odeiamo de coração, permaneço assinando embaixo, em cima e dos lados da afirmação de Carlito Maia: “Amo São Paulo com todo o ódio”. Mas um fato é inequívoco: não há como não admirar uma cidade que me deu a oportunidade de assistir a um show histórico como o que Luiz Melodia deu no Teatro Municipal, cantando todo o repertório de sua obra-prima Pérola Negra durante a Virada Cultural recentemente promovida pela Prefeitura.

Ter caminhado pelas ruas do Centro velho de Sampa às duas da manhã, me deparando com exibições de dança do coco no Viaduto do Chá, shows de rock no Pátio do Colégio ou discotecagens eletrônicas na XV de Novembro é o tipo de coisa que quase me fez conseguir abstrair as ruas sujas e cheirando a mijo tão características desta metrópole amarfanhada e maltratada. Não posso, ademais, me queixar de viver em um lugar tão multifacetado e pluricultural. Desajeitadamente comparo São Paulo a uma mulher feia e charmosa que, por algum motivo que não saberia explicar, me agrada aos olhos e à libido de tal maneira que seria incapaz de trocá-la pela mais bela das top models.

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Desde Fogo e Paixão, filme dirigido em 1988 pela dupla de arquitetos Isay Weinfeld e Marcio Kogan, não via uma obra cinematográfica que retratasse a cidade de São Paulo de modo tão fascinante como faz o desconcertante Otávio e as Letras. A direção é de Marcelo Masagão, idealizador e coordenador do Festival do Minuto.

Otávio e as Letras é uma obra abstrata como um poema repleto de espaços em branco e entrelinhas em cada estrofe. Filme sobre o dilúvio de informações que inunda nossos sentidos na poluição de imagens, palavras, sites e slogans cotidianamente, narra (ou melhor, sugere) as histórias de três personagens: Otávio, um sujeito que ronda sebos e consultórios de dentistas e coleciona livros, revistas e folhetos publicitários repletos de palavras que ele, metodicamente, risca uma a uma com sua caneta Bic; Arthur, um taxista que estampa mapas das ruas de São Paulo no teto de seu Fusca e fotografa a cidade em imagens nas quais nenhuma presença humana possa ser vislumbrada; e Clara, mulher de solidão refratária que coleciona rostos pintados por artistas como Munch e Matisse e fotos que tira de pessoas que voyeuriza da janela de seu apartamento.

Não é filme para as massas. Pois, como bem desexplicou Jean-Claude Bernadet em seu blog, Otávio e as Letras é “extremamente inquietante, verbalmente irrecuperável”, uma obra que “ao desestruturar a narrativa, ao eliminar propostas explicativas, coloca um desafio psicanalítico, social e poético”. E, provavelmente, não perdurará muito tempo em cartaz (quando o assisti, na Reserva Cultural, estive na companhia de outros 7 espectadores). Em um circuito cinematográfico invadido por dezenas de cópias de Homem de Ferro e outros blockbusters, deixo aqui, pois, o convite para os paulistanos que desejarem variar sua dieta cinéfila com um biscoito fino de difícil deglutição. Aos que moram em outras cidades, recomendo que fiquem de olho no site do Masagão.

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Let’s Lomo é uma exposição coletiva de imagens fotográficas capturadas por câmeras lomo (máquinas analógicas de origem russa), cujas fotos exibem cores saturadas, obtidas sem quaisquer correções digitais. Nas palavras de Larissa Ribeiro, autora da fascinante imagem que ilustra este post, “fotografar com câmeras precárias significa a busca de um olhar mais aberto ao mistério, negando a ilusão de que o homem pode dominar a natureza e apreender o real de forma objetiva e clara”.

Mais de 1.000 lomografias tiradas por 40 fotográfos de todo o Brasil foram reunidas em uma exposição aberta para visitação até o dia 24 de maio no Coletivo Galeria, na Rua dos Pinheiros, 493, em Sampa City. E neste sábado, dia 10, será promovido um Congresso Lomográfico, que incluirá atividades como um sensacional “Workshop de Gambiarra” e uma Lomowalk. Despertei sua curiosidade? Então visite o site do projeto Let’s Lomo. ;)

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O título deste post meio que parafraseia “50 razões para amar São Paulo em 2008″, matéria de capa da recém-lançada revista Época São Paulo. Mais do que bem-vinda novidade editorial, trata-se de uma publicação de periocidade mensal editada por Alexandre Maron, cuja proposta é a de fazer uma revista que seja capaz de refletir a complexidade paulistana por meio de reportagens de fôlego entremeados por extenso roteiros culturais e gastronômicos. A julgar por matérias como “Vá com Deus, Rafa”, reportagem de Lira Neto que narra os desdobramentos do crime que Fábio Nanni cometeu ao assassinar Rafael Fortes, colega do curso de Jornalismo, no estúdio da Rádio USP, em 14 de outubro de 2005, creio que os objetivos foram plenamente atingidos nesta primeira edição, ainda nas bancas.
Também gostei de constatar, ao visitar o site da Época SP, que há diversos blogs mantidos pela redação, complementando e amplificando o conteúdo publicado na revista. E não posso deixar de destacar que um dos colaboradores da Época SP é Cristiano Mascaro, um dos meus fotógrafos prediletos ao lado de nomes como Henri Cartier-Bresson.

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P.S. 1: O suíço Markus A. Hediger, um dos criadores do Litblogs, que reúne alguns dos principais blogs literários em língua alemã, depois de ter passado a infância no Nordeste do Brasil decidiu voltar a morar no Brasil após ter casado com uma carioca. E criou, ao lado do escritor Luiz Alberti, o site e_spaços, revista literária online que objetiva revelar novos escritores em língua portuguesa. Recomendada para autores que ainda não conquistaram visibilidade e internautas interessados em literatura de ficção.

P.S. 2: Enquanto isso, Mario Amaya publicou em seu Flickr uma ilustração mostrando seis razões convincentes para odiar São Paulo.

P.S. 3: Confiram no site do Itaú Cultural “Forma, função e beleza na internet”, matéria que escrevi para a versão online da Continuum, revista editada pelo instituto, cujo tema desta edição de maio é design. Em tempo: você não gostaria de criar uma capa para ser publicada na edição de junho?

P.S. 4: Toda vez que termino um post fico com a sensação de que esqueci de escrever algo que gostaria de compartilhar. Imagino que seja o equivalente virtual à mesmíssima sensação de quando termino de fazer as malas para uma viagem, sabendo que certamente esqueci de botar alguma coisa na bagagem…

Pense Nisso! Alexandre Inagaki

Alexandre Inagaki é jornalista e consultor de comunicação em mídias digitais. É japaraguaio, cínico cênico. torcedor do Guarani Futebol Clube e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos. Já plantou semente de feijão em algodão, criou um tamagotchi (que acabou morrendo de fome) e mantém este blog. Luta para ser considerado mais do que um rosto bonitinho e não leva a sério pessoas que falam de si mesmas na terceira pessoa.

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