Qual é a cara do Brasil?

Por Alexandre Inagakiquinta-feira, 13 de setembro de 2012

Eu estava esparramado na rede/ Jeca urbanóide de papo pro ar/ Me bateu a pergunta, meio a esmo:/ Na verdade, o Brasil o que será?/ O Brasil é o homem que tem sede/ ou quem vive da seca do sertão?/ Ou será que o Brasil dos dois é o mesmo/ O que vai é o que vem na contramão?

Qual é a característica principal de um brasileiro? Seria o papo de que, por termos nascido nesta terra abençoada por Deus e bonita por natureza, não desistimos nunca? Brasilidade é ter samba no pé, comer um bom churrasco ou aquela feijoada clássica de sabadão, e depois fazer a digestão tomando uma caipirinha, um cafezinho ou talvez um chimarrão? Ou, recorrendo à citação clássica de Sérgio Buarque de Hollanda, o brasileiro é aquela pessoa cordial, que detesta formalidades, age movida muito mais pela emoção do que pela razão, e acha que é possível dar um “jeitinho” em tudo, tal como previsto na clássica Lei de Gérson? Quais são as gírias, os ritmos musicais, as comidas típicas, os símbolos, as características, enfim, capazes de sintetizar esse conceito por vezes tão abstrato de brasilidade?

Como toda boa pergunta aberta, taí uma questão capaz de suscitar longos debates sem que seja possível encontrar um consenso. Afinal, o Brasil é um país continental, que poderia ter se fragmentado em diversas nações, tal qual aconteceu com a finada União Soviética ou a América hispânica. E que, no entanto, manteve-se unida com todos os seus estados e sua mistureba rica de sotaques, culturas e pessoas. Afinal, este é o país do oxente, do uai, do orra meu e do bah tchê, do mash-up de ritmos como o forró, o maxixe, o tecnobrega e o funk carioca, de pratos como o acarajé, o bolo de rolo, o açaí, o barreado.

Todas essas questões vieram à mente em um encontro promovido pelo Viva Positivamente, plataforma de desenvolvimento sustentável da Coca-Cola Brasil, que reuniu blogueiros, o designer de fluxos de conversação Luiz Algarra e o jornalista Maurício Kubrusly, ex-blogueiro, criador e apresentador do quadro Me Leva Brasil, no qual mostrava causos e histórias surpreendentes de personagens espalhados por todas as 27 unidades federativas deste país tão fascinante e multifacetado.

O mote deste encontro, realizado há duas semanas, foi o lançamento de um aplicativo da Coca-Cola no Facebook, através do qual você pode deixar sugestões de coisas bem brasileiras (na forma de textos, fotos ou vídeos), a fim de que o tatu-bola já definido como a mascote da próxima Copa do Mundo (evento patrocinado pela Coca desde 1978) possa se tornar “o mais brasileiro dos brasileiros”, representando do melhor modo possível o Brasil lá fora. Um jeito interativo de começar a entrar no clima da competição. E, convenhamos, de um modo bem mais construtivo do que ficar bradando o bordão-mimimi “quero ver na Copa”, clichê já amarfanhado de tanto ser papagaiado em filas e redes sociais.

O Brasil é o lixo que consome/ Ou tem nele o maná da criação?/ Brasil Mauro Silva, Dunga e Zinho/ Que é o Brasil zero a zero e campeão/ Ou o Brasil que parou pelo caminho:/ Zico, Sócrates, Júnior e Falcão?

Através dos papos inicialmente catalisados pelo Luiz Algarra, passamos horas conversando a respeito do que é essa tal de brasilidade, e sobre o que poderia representar melhor este país. Obviamente não chegamos a nenhum consenso; mas, nestes tempos nos quais o Brasil é considerado a “bola da vez”, atraindo curiosidade e investimentos de todos os lugares, e de quebra sediando as próximas edições das duas competições esportivas mais importantes do mundo, foi bacana poder discutir quais os laços que unem pessoas de lugares tão distintos quanto São Paulo, Tocantins, Rio de Janeiro, Pará, Pernambuco e Paraná, fugindo dos estereótipos e dos ufanismos baratos que costumam permear essas discussões.

Eu, que ainda conheço poucos estados brasileiros (por enquanto, apenas 12), cheguei pelo menos a uma conclusão: distância geográfica é um dos aspectos fundamentais para a compreensão plena do significado de ser brasileiro. O relato do Renato Guimarães, por exemplo, contando de sua experiência de ter morado quase oito anos no Peru e narrando a história de uma amiga jornalista que esteve no Iraque e conseguiu a imediata simpatia dos soldados quando encontraram em sua mochila uma camisa da Seleção Brasileira, é bastante significativo. Lembrei também do olhar estrangeiro do meu cunhado, que nasceu nos Estados Unidos e mora na Espanha, e vislumbra comportamentos tipicamente brasileiros que passam batidos sob o nosso olhar cotidiano e não distanciado, e das encomendas que minha irmã, residente em Madri, costuma fazer quando alguém da família vai para lá, e que incluem misturas pra fazer pão de queijo e bombons Sonhos de Valsa. :)

P.S. 1: Outros relatos sobre o evento do Viva Positivamente: O mais brasileiro de todos os brasileiros (Sam Shiraishi), O Brasil somos todos nós (Renato Guimarães), O Brasil, não conhece o Brasil? (Elenara Stein Leitão), Qual a cara do brasileiro? O Mascote da #Copa2014 quer saber e é você quem vai responder! (Daiane Santana), Inspiração Brasilidade (Regiane Ivanski), “Brasilidade” (Claudia Chow), Mais Brasileiro de Todos os Brasileiros (AJ “Nerd Pai” Freire), Mauricio Kubrusly e o empreendedorismo criativo (Anderson Costa) e Brasilidade, qual a principal característica de um brasileiro para você? (Aline Kelly).

P.S. 2: Os versos citados neste post são de A Cara do Brasil, composição de Celso Viáfora que foi gravada por Ney Matogrosso.

P.S. 3: Mais uma citação sobre este país. Desta vez, os versos são de Sousândrade.

- Brasil é braseiro de rosas:
A União, estados de amor:
Floral… sub espinhos
Daninhos;
Espinhal… sub flor e mais flor.

P.S. 4: E por falar no Instituto Coca-Cola Brasil, vale citar que, como parte das iniciativas do programa de reciclagem “Reciclou Ganhou” (mantido pelo Instituto), sábado, dia 15 de setembro, vai rolar uma ação bacana coordenada pela ONG The Ocean Conservancy, junto com o Instituto Ecológico Aqualung, marcando o Dia Mundial de Limpeza de Rios e Praias.

Pense Nisso!
Alexandre Inagaki

Alexandre Inagaki é jornalista, consultor de projetos de comunicação digital, japaraguaio, cínico cênico, poeta bissexto, air drummer, fã de Cortázar, Cabral, Mizoguchi, Gaiman e Hitchcock, torcedor do Guarani Futebol Clube, leonino e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos, não necessariamente nesta ordem.

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  • Hsafabres

    Sou separatista, estou disposto a enfrentar outra guerra pela Rep. Rio Grandense e um dos motivos é a atenção desnecessária para futebol e carnaval, o jeitinho brasileiro e generalizações sobre o lado poético da forma fútil de vida brasileira. Poético e utópico, assim eu vejo um brasil unido, um exemplo disso é o preconceito sofrido por gaúchos no rio de janeiro e caricas no sul, preconceito sustentado pela mídia e pela fé das grandes massas. O brasil não tem uma cara, tem várias, e poucas delas tem algum potencial de importância, por isso prefiro não ser visto como brasileiro, mas sim como Gaúcho, aquele Gaúcho que não basta ser forte, aguerrido e bravo, se necessário, por liberdade, se é um pouco mais. Aquele mesmo também que ao definhar, quer apenas aproveitar um fim de tarde ao sol, e que desde guri ama onde vive. Se é pra ter uma cara, não aceito outra, nada que venha do resto.
    (Adaptações do Hino Rio Grandense e do Canto Alegretense)

  • Renato Xavier

    Gostei de ler conteúdo inteligente divagando sobre o tema de ser brasileiro, como nesse blog… Porém quero divagar também expressando minha opinião:

    Como aceitamos de maneira tão romântica que nossa cultura se pauta em entretenimento superficial (futebol e carnaval) e nos definimos como moralmente sub-desenvolvidos (corrupção, jeitinho brasileiro) ? 

    Me preocupa muito que pensadores como os daqui desse blog tirem conclusões tão “bem pensadas”, mas que com um ar de “que graça, somos assim mesmo”… não expressam nenhum ínfimo senso de indignação…

    Sou um eterno INDIGNADO por que o Brasil é assim como é… e se aceita assim como é… incapaz inclusive de mobilização popular CONCRETA para mudança, fica tudo no campo da retórica e do discurso mas não da vontade de mudar e da ação para tal…

    O Brasil precisa é de uma revolução moral e cultural, quem sabe daqui a algumas gerações os dizeres como: ”
    Talvez a cara do Brasil seja a do que fura a fila e corrompe, ” e 
    “a gente é torto igual Garrincha e Aleijadinho, ninguém precisa consertar”, mudem para refletir um brasileiro menos culturalmente vulgar, mais capaz de construir uma nação!

  • http://www.facebook.com/profile.php?id=655946500 Cíntia Citton

    Pois é Alexandre, dá para passar algum tempo divagando sobre
    o assunto, não é?

    Eu mesma tenho a impressão de estar me fazendo esta pergunta
    desde a primeira vez que saí do país e ouvi de algum gringo que eu “não
    tinha cara de brasileira”. É um pouco frustrante você não ter cara do que
    é, confesso. Mas aos poucos fui entendendo que o problema não era querer ter
    esta ou aquela cara, o problema era alguém achar que um país como o Brasil poderia ter uma cara só.

    Acho que é difícil sintetizar melhor do que seu texto e a música que você postou aqui
    “se não der certo a gente se vira sozinho”, pois mesmo que a gente não
    saiba fazer, tenta.
    Talvez a cara do Brasil seja a do que fura a fila e corrompe, mas também é a daquele senhor que apareceu no jornal da semana passada varrendo os escombros do seu barraco destruído pela segunda vez em um incêndio na favela, a de um monte de empreendedores sociais e por aí vai. Pode ser que a gente pudesse recomeçar melhor, mas tenho a impressão de que o que não falta aqui é energia para recomeçar.

    Bom, vou ficando por aqui, valeu por mais esse post recheado de links e pílulas de poesia para fazer pensar (e enlouquecer?) um pouco…

    Um beijabraço ;-)

     

    • http://www.pensarenlouquece.com/ Alexandre Inagaki

      Pois é, Cíntia, se a gente for parar pra pensar no assunto, e em tudo que pode representar brasilidade, é papo pra render um novo blog só sobre esse tema. Entendo o que você diz com “não ter cara de brasileira”; alguns parentes meus que foram trabalhar no Japão, e que assim como eu são japaraguaios e não falam nada do idioma, sofreram discriminação porque os nativos achavam um absurdo descendentes não dominarem a língua. Não à toa, nunca me animei muito a visitar o Japão, uma vez que das minhas raízes nipônicas pouco restaram além dos olhos puxados e do fuso horário no qual prefiro estar acordado.

      Volta e meia recorro à música do Viáfora porque ela é muito feliz em sintetizar algumas das imensas contradições brasileiras. No país da gambiarra (um termo que eu creio que deve ser muito mais difícil de traduzir para estrangeiros do que aquela história envolvendo a palavra saudade), de fato “a gente é torto igual Garrincha e Aleijadinho, ninguém precisa consertar”. Somos uma nação que se reinventa a cada dia.

      Um beijabraço e obrigado pelo comentário! :)

  • http://www.facebook.com/profile.php?id=655946500 Cíntia Citton

    Pois é Alexandre, dá para passar algum tempo divagando sobre
    o assunto, não é?

    Eu mesma tenho a impressão de estar me fazendo esta pergunta
    desde a primeira vez que saí do país e ouvi de algum gringo que eu “não
    tinha cara de brasileira”. É um pouco frustrante você não ter cara do que
    é, confesso. Mas aos poucos fui entendendo que o problema não era querer ter
    esta ou aquela cara, o problema era alguém achar que um país como o Brasil poderia ter uma cara só.

    Acho que é difícil sintetizar melhor do que seu texto e a música que você postou aqui
    “se não der certo a gente se vira sozinho”, pois mesmo que a gente não
    saiba fazer, tenta.
    Talvez a cara do Brasil seja a do que fura a fila e corrompe, mas também é a daquele senhor que apareceu no jornal da semana passada varrendo os escombros do seu barraco destruído pela segunda vez em um incêndio na favela, a de um monte de empreendedores sociais e por aí vai. Pode ser que a gente pudesse recomeçar melhor, mas tenho a impressão de que o que não falta aqui é energia para recomeçar.

    Bom, vou ficando por aqui, valeu por mais esse post recheado de links e pílulas de poesia para fazer pensar (e enlouquecer?) um pouco…

    Um beijabraço ;-)

Pense Nisso! Alexandre Inagaki

Alexandre Inagaki é jornalista e consultor de comunicação em mídias digitais. É japaraguaio, cínico cênico. torcedor do Guarani Futebol Clube e futuro fundador do Clube dos Procrastinadores Anônimos. Já plantou semente de feijão em algodão, criou um tamagotchi (que acabou morrendo de fome) e mantém este blog. Luta para ser considerado mais do que um rosto bonitinho e não leva a sério pessoas que falam de si mesmas na terceira pessoa.

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